LIÇÃO Nº 6 – A DOUTRINA DO CULTO LEVÍTICO
O culto levítico é a sombra da realidade espiritual revelada na graça.
INTRODUÇÃO
– O culto levítico é a sombra da realidade espiritual revelada na graça.
– O culto levítico aponta para Cristo e, portanto, revela os princípios imutáveis da Palavra de Deus.
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I – O QUE É DOUTRINA
– Na sequência do estudo do livro de Levítico, estudaremos a doutrina do culto levítico.
– Doutrina é palavra de origem latina, cujo significado é “conjunto coerente de ideias fundamentais a serem transmitidas, ensinadas”.
Em latim, “doctrina” significa “ensino, instrução dada ou recebida, arte, ciência, doutrina, teoria, método”. Assim, a doutrina é um ensinamento, uma instrução que alguém dá a outrem.
Aliás, a palavra “doctrina” é derivada de “docere”, que significa ensinar. Doutrina, portanto, é um ensinamento, um ensino, uma instrução que alguém que sabe (o sábio ou “doutor”) dá a alguém que não sabe (o aprendiz).
– Vemos, portanto, pelo seu significado latino, que “doutrina” significa ensino e, portanto, quando falamos em “doutrina bíblica” estamos a falar no “ensino da Bíblia”.
Ora, a Bíblia é a Palavra de Deus e, portanto, o “ensino da Bíblia” nada mais é que o ensino da Palavra de Deus, o ensino de Deus ao homem. “Doutrina”, portanto, é o ensino que Deus dá ao homem a partir da Sua Palavra, da revelação divina à humanidade, que consta da Bíblia Sagrada.
– A primeira vez que surge a palavra “doutrina” nas Versões Almeida (Revista, Corrigida, Fiel e Contemporânea) é em Dt.32:2, onde, no cântico de Moisés, consta a expressão “goteje a minha doutrina”, palavra que é a tradução de “leqach”( )לקח , cujo significado é “ensino”, “instrução”, tanto que a palavra é traduzida por “ensino” em outras versões bíblicas (como a Tradução Brasileira, a Nova Tradução na Linguagem de Hoje e a Nova Versão Internacional).
Neste primeiro aparecimento da palavra, ainda que em um contexto poético, percebe-se claramente que Moisés considera que todos os ensinos que havia dado ao povo de Israel, ensinos estes que eram resultado da revelação divina ao próprio Moisés, constituíam ensinos que deveriam ser continuamente ministrados ao povo e
que representavam para este povo a sua própria fonte de vida, a sua própria renovação, pois deveriam estes ensinos “gotejarem”, ou seja, pouco a pouco, de forma contínua e permanente, cair sobre o povo, a fim de lhe dar vida, assim como a chuva e o orvalho, pela manhã, fazem em relação à terra.
– Esta expressão de Moisés, também, mostra-nos que a doutrina é algo que vem do alto, que vem do céu, seja na forma de chuva, seja por meio da condensação do vapor d’água encontrado no ar(o orvalho), indicando-se que a doutrina não é obra do homem, mas resultado da revelação divina, de um ensino vindo diretamente da parte do Senhor.
– Por fim, a expressão de Moisés dá-nos a nítida noção de que o trabalho da doutrina é manter a vida e uma vida renovada no ser humano, pois é comparada ao chuvisco sobre a erva e a gotas d’água sobre a relva.
Todos nós já divisamos, pela manhã cedinho, o orvalho que está a manter molhadas as ervas e a relva, mantendo-as bem verdes, dando-lhes vida, vigor e exuberância (i.e., beleza).
Os campos verdes, pela manhã, aquele frescor que sentimos quando nos encontramos em uma área verde logo pela manhã, que tão bem nos faz à saúde, é o resultado desta ação refrescante da chuva e do orvalho.
Este é o papel da doutrina em nossa vida espiritual: refrigério para a nossa alma, renovação de nossas forças espirituais, concessão de beleza e de prazer aos nossos corações e a todos quantos travam contacto conosco.
Bem se vê, portanto, que bem ao contrário dos que dizem que a doutrina torna o homem insensível a Deus, vemos que o papel da doutrina é precisamente o de nos conceder vida, vida abundante, refrescor e sensibilidade diante de Deus e dos homens.
– A segunda vez que vemos a palavra doutrina nas Versões Almeida é em Jó 11:4 (é importante lembrarmos que Jó seja, talvez, o livro mais antigo da Bíblia e, portanto, a sua referência seria anterior mesmo a de Dt.32:2), que é a mesma palavra “leqach”( )לקח já mencionada.
Aqui, um dos “amigos” de Jó, Zofar, acusa Jó de dizer que a “sua” doutrina era pura e que ele se sentia limpo aos olhos de Deus.
A palavra “doutrina”, aliás, também é empregada pela Tradução Brasileira, pela Nova Tradução na Linguagem de Hoje e pela Nova Versão Internacional. Temos o mesmo significado do texto anterior.
Embora se esteja a referir a um conjunto de ensinos de Jó, Zofar está a considerar que o patriarca é presunçoso ao querer dizer que seus ensinos são provenientes da parte de Deus.
Doutrina continua a ser considerada como um ensino vindo da parte de Deus, um ensinamento com origem no céu.
– A palavra “doutrina” somente reaparecerá no livro de Provérbios, onde, na Versão Almeida Revista e Corrigida e na Edição Contemporânea de Almeida, é encontrada em Pv.1:8, 4:2, 13:14 e 16:23.
Em Pv.1:8, é tradução da palavra “muwcar”( )מןסר , que a Versão Almeida Revista e Atualizada preferiu traduzir por “instrução” e a Fiel e Corrigida por “ensinamento”.
Com efeito, aqui se tem, basicamente, a ideia de uma orientação, de um ensino feito com base em repreensão e castigo, algo próprio da autoridade paterna.
– Já em Pv.4:2, temos a repetição da palavra “leqach”( )לקח e a opção das versões pelo uso da palavra “doutrina”, que, no contexto, se refere ao ensino da Sabedoria, verdadeira personificação de Deus na linguagem do proverbista.
Este ensino, além de vir do alto, é tido como bom. Fala-se da “boa doutrina”, a nos indicar que o ensino de Deus ao homem é bom por duas razões:
a primeira, porque sendo um ensino de um ser que é bom (e não há ser bom a não Deus – Mt.19:17; Mc.10:18, Lc.18:19), ele só poderia, mesmo ser bom;
a segunda, porque é um ensino que produz o bem aos que o aprendem.
Além do mais, o proverbista faz uma correlação importantíssima: a boa doutrina não nos permite que deixemos a Sua lei.
“Boa doutrina”, portanto, não é aquela que se apresente brilhante do ponto-de-vista intelectual nem que consegue acomodar as nossas crenças e o nosso modo de vida, mas única e exclusivamente aquela que estiver de acordo com a lei do Senhor, com a Palavra de Deus.
– Em Pv.13:14, na Versão Almeida Revista e Corrigida bem como na Almeida Fiel e Corrigida, a palavra “doutrina” é utilizada para traduzir “torah”(תןר) palavra que é comumente traduzida por “lei”, mas cujo significado é mais precisamente “instrução”, “ensino”.
Aqui se diz que “a doutrina do sábio” é fonte de vida para se desviar dos laços da morte.
A doutrina do sábio não é, propriamente, do sábio, pois, como nos ensina o próprio proverbista, o temor do Senhor é o princípio da sabedoria (Pv.9:10), no que é acompanhado pelo salmista (Sl.111:10).
Portanto, a “doutrina do sábio” outra não é senão a Palavra de Deus e só ela é capaz de dar origem à vida e nos desviar dos laços da morte. A doutrina, como se vê, portanto, é o próprio fator criador da vida espiritual e da sua manutenção até o fim.
OBS: A propósito, ensina-nos Nathan Ausubel que a Bíblia, para os judeus, no seu sentido singular de Torah, “…tem sido considerada pelos fiéis como redentora, quando entendida como forma total de vida…” (AUSUBEL, Nathan. Bíblia. In: A JUDAICA, v.5, p.77).
– Jesus, certa feita, disse que tinha vindo para trazer vida e vida em abundância (Jo.10:10). Disse, também, que Ele próprio era a vida(Jo.14:6), bem como o pão da vida(Jo.6:48).
Ao Se dizer a vida, também disse ser a verdade (Jo.14:6) e a verdade, disse em outra oportunidade, é a Palavra de Deus(Jo.17:17).
Por isso, a doutrina, enquanto ensino da Palavra de Deus, só pode, mesmo, ser a fonte de vida, de modo que não tem qualquer sentido alguém vir a dizer que o estudo, o aprendizado da Palavra de Deus seja causa de morte (interpretando, fora de contexto e sem qualquer fundamento, a expressão “a letra mata” de II Co.3:6).
Bem ao contrário, é a doutrina quem nos desvia dos laços de morte, como, aliás, tivemos oportunidade de estudar no segundo trimestre deste ano, quando vimos que só o conhecimento da doutrina da Palavra de Deus nos impede de sermos enganados pelas falsas doutrinas, heresias e modismos que proliferam com cada vez maior intensidade à medida que se aproxima o dia da volta de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.
– Em Pv.16:23, a Versão Almeida Revista e Corrigida utiliza a palavra “doutrina”, que é a mesma palavra hebraica “leqach”.
Entretanto, tal versão ficou isolada nesta tradução, pois a Versão Atualizada traduziu o termo por “persuasão”, a Fiel e Corrigida por “ensino” e a Edição Contemporânea por “instrução”.
De qualquer modo, em que pese o isolamento da versão, temos aqui um outro ensino relevante a respeito da doutrina.
É a circunstância de que a doutrina vem do coração, ou seja, o que o sábio ensina é o que lhe vem do coração e, sabemos, que o princípio da sabedoria é o temor do Senhor.
Por isso, o que vem do coração do sábio é o que aí foi colocado pelo próprio Espírito Santo e, portanto, temos que a doutrina nada mais é que o resultado da operação do Espírito Santo na vida de alguém.
O próprio Jesus nos ensina isto ao dizer que o Espírito Santo, que Ele mandaria para ficar com os Seus servos, nos ensinaria todas as coisas e nos faria lembrar de tudo quanto Jesus, a Palavra, havia dito (Jo.14:26).
Vemos, pois, que a doutrina nada mais é que o resultado do ensino do Espírito Santo, o nosso Mestre por excelência.
Mais uma vez, portanto, sem qualquer fundamento quem acha que o estudo doutrinário é uma exaltação humana. Bem ao contrário, o que temos é uma demonstração de submissão do homem, de reconhecimento da soberania e supremacia divinas.
– A palavra “doutrina” reaparece na Versão Almeida Revista e Corrigida em Is.29:24, onde, mais uma vez, traduz “leqach”, sendo seguido pela Fiel e Corrigida, já que a Atualizada e a Edição Contemporânea traduzem o termo por “instrução”.
No texto, é dito que os murmuradores aprenderiam doutrina quando houvesse a santificação que o profeta prometia para o povo do Senhor.
A santificação e o temor a Deus fariam com que os murmuradores, ou seja, aqueles que se queixam de Deus, que se rebelam contra o Senhor, viessem a aprender “doutrina”.
Vemos que a “doutrina” só é aprendida por quem se separa do pecado, por quem se submete ao Senhor, por quem prima por uma vida de comunhão com Deus.
Por isso, sentimos muita preocupação ao saber que muitos crentes, na atualidade, fogem dos “cultos de doutrina”, dos “cultos de ensino”, prova de que não estão a se santificar.
– A Versão Almeida Revista e Corrigida menciona “doutrina” em Is.42:4, para traduzir, desta feita, “torah”, sendo seguida pela Versão Atualizada.
Já a Edição Contemporânea e a Fiel e Corrigida preferiram traduzir o termo por “lei”, mas, como dissemos supra, o termo “torah”, embora tenha adquirido a conotação de “lei” tem como seu significado o de “instrução”, de “doutrina”.
OBS: “…Há entre muitos judeus, e também cristãos, uma noção errônea muito difundida de que a tradução exata de ‘Torah’ é ‘Lei’.
Esse erro, provavelmente involuntário em sua origem, foi sem dúvida cometidos pelos tradutores judeus de Alexandria, no século III a.E.C., que prepararam a versão grega da Bíblia, denominada Septuaginta.
Estimulados, provavelmente, pela predileção pela lei característica do ambiente cultural helenista, traduziram de maneira incompleta o conceito da palavra hebraica, fazendo-a aparecer como ‘Lei’.
Uma vez que a versão Septuaginta das Escrituras era quase universalmente usada pelos judeus fora da Judéia e das regiões de língua aramaica do mundo greco-romano — poucos judeus ali sabiam hebraico ou mesmo aramaico (targum) — era natural que a tradução de Torah como ‘Lei’ entrasse nas obras judaicas pós-bíblicas escritas em grego ou traduzidas do hebraico para a língua grega.(…).
O conceito de Torah entre os judeus, no entanto, é muito mais amplo e mais profundo do que tão somente a ‘Lei’: no seu sentido etimológico completo, ‘Torah’ também tem a conotação de ‘doutrina’, ‘instrução’ e ‘orientação’.
Mesmo o exame mais superficial do Pentateuco comprova que a Torah tenta ser um inspirado guia absoluto para toda a crença e o culto, e abranger todas as ramificações da conduta individual e social. É, portanto, uma supersimplificação encarar a Torah como sendo somente ‘Lei’.
A Torah também é uma crônica genealógica dos primórdios de Israel e inclui as biografias de seus ilustres antepassados e dos primeiros líderes.
Além disso, é um sermão fervoroso: ensina e moraliza ininterruptamente.
Exorta, incansavelmente, o israelita como indivíduo como a coletividade inteira de Israel, a esquivar-se das más ações e tomar os caminhos da verdade, da virtude, da misericórdia e da justiça, imitando os próprios atributos de Deus;
a abandonar a adoração de ídolos e a encontrar Deuys vivo na prática do preceito ‘Ama teu próximo como a ti mesmo’, o qual, como disse Rabi Akiva no século II, é o princípio central da religião judaica.…” (AUSUBEL, Nathan. op.cit., p.81-2).
– Ao nos depararmos com este texto do profeta Isaías, vemos claramente que o Servo do Senhor prometido para o futuro seria alguém que traria a “doutrina” de Deus para as ilhas, isto é, até as extremidades da Terra.
Neste texto, vemos que a missão de Jesus, o Messias, o Servo do Senhor, era o de levar a “doutrina” do Senhor para toda a Terra, “torah” que havia sido dada inicialmente só a Israel.
Por isso, ao iniciar Sua pregação, o Senhor conclamou Seu povo ao arrependimento e a crer no Evangelho(Mc.1:14,15), o mesmo que determinou que fizéssemos depois de Sua ascensão ao céu (Mc.16:15).
O “evangelho” é a “doutrina de Cristo”, é a “doutrina de Deus”.
Por isso, não podemos crer em qualquer outra doutrina, em qualquer outro evangelho, ainda que seja trazido por anjos (Gl.1:8).
– Após o prenúncio da atuação de Cristo com relação à doutrina em Isaías, encontraremos apenas a palavra “doutrina” em o Novo Testamento, mais precisamente, em Mateus, onde o termo aparece, na Versões Almeida (Revista e Corrigida, Fiel e Corrigida, Atualizada e Contemporânea) em 7:28, 16:12 e 22:33
(neste versículo, a Edição Contemporânea traduz a palavra ‘didaché’ por “ensino”), termo que é tradução de “didaché” (διδαχή), cujo significado é muito similar ao de “leqach”, pois quer dizer “instrução”, “ensino”, “o que é ensinado”.
– Nas três referências de Mateus, a palavra “doutrina” é utilizada para designar o conjunto de ensinamentos ministrados ao povo, sejam os ensinos de Jesus (7:28 e 22:33), seja os ensinos dos fariseus (16:12).
“Doutrina”, portanto, é um conjunto de ensinos, a coleção dos ensinamentos que os mestres dos tempos de Cristo ensinavam, seja Ele próprio, seja o dos fariseus.
– Nas referências de Mateus, a doutrina de Jesus é apresentada como algo que admira, que causa assombro para os ouvintes, mostrando ser algo diferente, algo que não se confundia nem com a religiosidade existente, nem com as filosofias que também faziam parte dos discursos e ensinos ministrados naquela época.
A doutrina de Jesus, portanto, como se pode observar é algo que não obedece a culturas, a costumes, nem à lógica humana.
– Em Mateus, também, vemos que a doutrina religiosa baseada na formalidade, na aparência exterior, no preconceito, nos rituais, nas cerimônias é uma doutrina que não tem o amparo nem a aprovação divinos, tanto que o Senhor fez questão de chamar tal doutrina de “fermento”, determinando aos Seus discípulos que jamais acolhessem, em seus corações, uma doutrina desta natureza.
Já aqui vemos que o Senhor bem diferençava entre doutrina e costumes, entre doutrina e aspectos de somenos importância criados pelos homens para seu engrandecimento próprio.
– É assaz importante observar que a palavra grega “didaché” possui um significado passivo, ou seja, em muitas ocasiões seu significado é “o que é ensinado”, como a demonstrar que a “doutrina” não é algo que seja criação humana, mas, sim, algo que é recebido pelo homem da parte de Deus.
A “doutrina”, portanto, não é algo que venha da imaginação ou da mentalidade de um homem, mas, sim, única e exclusivamente aquilo que tem origem em Deus.
Não foi à toa que, no mesmo evangelho segundo Mateus, vemos a expressão esclarecedora do Senhor: “aprendei de Mim, que sou manso e humilde de coração e encontrareis descanso para as vossas almas” (Mt.11:29b).
– Este é o mesmo significado que encontramos nos outros dois evangelhos sinóticos.
Em Marcos e em Lucas, a doutrina é apresentada como o conjunto de ensinamentos de Cristo, ensinamentos estes que causavam admiração por parte do povo, que também sentia que era um ensino que vinha de quem tinha autoridade, ou seja, de quem vivia aquilo que ensinava (Mc.1:27; 4:2; 11:18; Lc.4:32).
– Não é diferente no evangelho segundo João. Neste evangelho, escrito para mostrar que Jesus é o Filho de Deus, está uma das mais importantes afirmações bíblicas a respeito da doutrina. Interpelado sobre Seus ensinos, o Senhor Jesus limitou-se a dizer:
“…A Minha doutrina não é Minha, mas dAquele que Me enviou. Se alguém quiser fazer a vontade dEle, pela mesma doutrina, conhecerá se ela é de Deus ou se Eu falo de Mim mesmo.” (Jo.7:16,17).
– Jesus mostra-nos, claramente, que a Sua doutrina outra não era senão a doutrina do Pai.
A doutrina não fala do próprio doutrinador, mas, sim, de Deus e somente quem vivenciar a doutrina, quem nela crer e por ela viver, verá que esta doutrina é a verdade, que esta doutrina é a vontade de Deus.
A doutrina é a manifestação da vontade de Deus para o homem. Seguir a doutrina é seguir a vontade de Deus para o homem e é por isso que muitos se têm levantado contra a doutrina, porque ela implica na renúncia do eu, na renúncia do ego, na renúncia de nós mesmos, sem o que é impossível seguir a Jesus (Mt.16:24).
Daí porque Jesus foi interrogado pelo sumo sacerdote a respeito de Sua doutrina (Jo.18:19).
– Se temos a doutrina de Cristo, se a seguimos, não podemos, portanto, ser diferentes.
A doutrina tem de ser a mesma e, neste passo, os doutrinadores não podem querer aparecer ou dizer o que é certo ou o que é errado, como muitos têm feito e já o faziam nos tempos apostólicos, onde já se registravam doutrinas de homens (Mt.15:9; Mc.7:7; Cl.2:22) e até doutrinas de demônios (I Tm.4:1).
Devemos permanecer na doutrina de Cristo, pois quem não persevera nesta doutrina não tem a Deus (II Jo.9).
– Esta doutrina foi mantida pelos apóstolos e tal circunstância nos mostra, claramente, que é a doutrina que deve ser seguida pelo povo de Deus, pela Igreja.
A primeira nota característica que se escreve a respeito dos salvos reunidos para fora do mundo, a partir do dia de Pentecostes, foi o fato de que “perseveravam na doutrina dos apóstolos” (At.2:42).
Na igreja primitiva, o trabalho dos crentes outro não era senão encher Jerusalém da doutrina (At.5:28). A preocupação dos apóstolos era orar e ensinar a Palavra de Deus à igreja, ou seja, dar doutrina (At.6:2,4).
Com estas informações que nos vêm do texto sagrado, temos alguma dúvida por que a igreja prosperava e a todo instante o Senhor acrescentava aqueles que haviam de se salvar (At.2:47) ? Simplesmente porque dava o primeiro lugar, em sua atividade, à doutrina !
– Esta primazia da doutrina foi sempre uma característica da igreja nos tempos apostólicos.
Vemos que o procônsul Sérgio Paulo se admirou da doutrina pregada por Paulo (At.13:12), que não era de Paulo, mas do Senhor, como também, em Atenas, quiseram os filósofos do Areópago ter conhecimento da nova doutrina, precisamente a que era ensinada pelo apóstolo (At.17:19).
Paulo, por sinal, em seus escritos, sempre demonstrou sua preocupação para que a doutrina tivesse sempre um espaço privilegiado não só na vida de cada crente, mas nas igrejas locais, pois entendia que ser salvo era ter adotado uma nova doutrina (Rm.6:17), que os inimigos dos crentes são os que promovem dissensões e escândalos contra a doutrina (Rm.16:17),
que um culto não tem sentido se não houver doutrina (I Co.14:6,26), que a vida familiar deve ser construída, notadamente a educação dos filhos, pela doutrina do Senhor (Ef.6:4), que a vida do ministro está indissociavelmente vinculada ao ensino e à observância da sã doutrina (I Tm.1:3,10; 4:6,16; 5:17; 6:1,3; II Tm.4:2,3; Tt.2:1,7,10).
– O autor aos hebreus também demonstrou sua preocupação para com a doutrina, mostrando ser ela o verdadeiro alicerce que impede a apostasia do crente (Hb.6:1,2).
O apóstolo João, também, mostrou a necessidade de o crente sempre observar a sã doutrina e nela perseverar (II Jo.2,9), bem assim, no Apocalipse, registrando as palavras do Senhor Jesus para as igrejas da Ásia, mostrou quão abominável é ao Senhor que os santos se desviem dos santos caminhos por causa de outras doutrinas (Ap.2:14,15 e 24).
II – O CARÁTER DIDÁTICO DO CULTO LEVÍTICO
– Temos visto, portanto, que “doutrina” significa “ensino”, “instrução” e o culto levítico era uma instituição que Deus criou precisamente para que o povo de Israel aprendesse a respeito das coisas espirituais, a respeito do seu relacionamento com Deus.
– Veja-se que a própria “lei”, que, como vimos, é a palavra “Torah”, tem o sentido de instrução e de ensino e não, como parece ser em nossa língua, de “mandamento”, de “regra”, de “determinação”.
– Não resta dúvida de que Deus determinou, estabeleceu regras e normas a serem seguidas pelo povo de Israel, mas estas normas e regras têm menos o sentido de ordens do que o de ensinamentos,
orientações e instruções para que o povo aprendesse a se relacionar com Deus, aprendesse quem era Deus e como eles deveriam se comportar como “propriedade peculiar de Deus dentre os povos”, como “reino sacerdotal e povo santo”.
– Este ensino, esta instrução era particularmente demonstrada no culto levítico, ou seja, no culto estabelecido por Deus para que os israelitas pudessem adorar o Senhor.
No culto e em toda a sua liturgia, o Senhor procurava mostrar ao povo quem Ele era e quem era o povo e como deveria o povo se portar como Seu povo sobre a face da Terra.
– Neste sentido, aliás, é, para nós, Igreja de Jesus Cristo, de grande valia aprendermos, também, com o culto levítico, quem é Deus, como deve ser o Seu povo e como nós devemos nos relacionar com o Senhor para que, efetivamente, sejamos Seu povo entre os homens,
pois o culto levítico como tudo na lei de Moisés, é sombra das realidades espirituais que seriam totalmente descortinadas e reveladas por Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo e pelo Espírito Santo (Hb.10:1; Mt.23:10; 11:29; Jo.14:26).
– O culto levítico, portanto, tem um caráter didático, ele foi instituído para ensinar Israel a respeito do Senhor, das coisas santas e de como se deveria dar o relacionamento entre Deus e o homem, daí porque ter o apóstolo Paulo dito que a lei serviu de aio para chegarmos até Cristo (Gl.3:24).
– Mas o que é o “aio”? Nada mais é que um escravo que conduzia os filhos de seus senhores à escola nas cidades gregas.
Temos aqui a palavra grega “paidagogos” (παιδγωγός), , “…um líder de meninos, i.e., um servo cuja função era levar as crianças à escola; (por implicação, [figurado] um turo [‘pedagogo’] : instrutor, professor… “ (Bíblia de Estudo Palavras-Chave. Dicionário do Novo Testamento, verbete 3807, p.2333).
– A lei conduz-nos a Cristo. Verificando, analisando e aprendendo com o culto levítico, entendemos quem é o Senhor Jesus e como devemos nos relacionar com Ele, que é o único e exclusivo mediador entre Deus e os homens (I Tm.2:5).
– O culto levítico, portanto, tem uma “doutrina”, tem um ensino, uma instrução a nos dar e é, por este motivo, que é totalmente válido nos debruçarmos sobre ele para melhorarmos a nossa vida cristã, para crescermos espiritualmente.
Afinal de contas, quando o Senhor Jesus disse que as Escrituras d’Ele testificam (Jo.5:39), estava a se referir, naquele momento histórico, única e exclusivamente ao Antigo Testamento, as únicas Escrituras até então redigidas e que eram o objeto do estudo daqueles com quem o Senhor dialogava naquele momento, os judeus que se debruçavam no estudo das Escrituras, nas “sinagogas”, que nada mais eram que “casas de estudo” das Escrituras.
III – ENSINOS DO CULTO LEVÍTICO
– Se o culto levítico tem uma “doutrina”, que ensinos podemos dele abstrair? Sem a pretensão de esgotamento do tema, vejamos os principais ensinos que nos traz o culto levítico.
– O primeiro é que Deus é santo. Já temos insistido ao longo deste estudo do livro de Levítico que a expressão chave do terceiro livro do Pentateuco é de que Deus é santo e nós devemos ser santos (Lv.11:44,45; 19:2; 20:26; 21:8).
– O culto levítico deixa isto muitíssimo claro em todos os seus pormenores.
O lugar da presença de Deus, o lugar santíssimo, é um local à parte, onde o sumo sacerdote só pode entrar uma vez ao ano, e não sem antes fazer sacrifício por si e pelo povo. Deus está, assim, completamente separado dos homens.
– Os homens devem se apresentar diante de Deus, mas, antes disso, devem reconhecer que são pecadores e confessar seus pecados, a fim de que eles sejam cobertos e, deste modo, possam validamente se relacionar com o Senhor, ou seja, é necessária a santificação do ser humano, a sua separação dos pecados para que possa entrar em comunhão com Deus.
– Esta confissão e cobertura dos pecados somente são obtidas mediante o sacrifício de uma vida, mediante o derramamento de sangue, pois, sem derramamento de sangue não há remissão (Hb.9:22),
motivo por que devem sempre os homens, para entrar em comunhão com o Senhor, reconhecer que mereciam morrer e, para tanto, levar um animal para ser sacrificado em seu lugar, para que se obtenha a remissão, o perdão do pecado. Só, assim, o homem estará bem-aventurado (Sl.32:1,2).
– O culto levítico, assim, ensina claramente a depravação total da humanidade em virtude do pecado, mostrando que o homem é pecador e que somente a benevolência divina, a Sua graça e misericórdia, permite um meio pelo qual o homem pode se aproximar de Deus.
– A propósito, o fato de o altar de sacrifícios estar no pátio do tabernáculo (depois do templo), plenamente acessível a todo israelita e, mesmo, a alguns estrangeiros (somente não podiam adentrar ao pátio o amonita e o moabita, bem como os egípcios e os edomitas até a terceira geração, exclusive – Dt.23:3-8),
é a demonstração de que Deus quer que todos os homens se salvem e venham ao conhecimento da verdade (I Tm.2:4), de que Deus quer salvar a humanidade e isto é tanto assim que, no segundo templo, pelo menos, havia um “pátio dos gentios”, onde todos que quisessem podiam entrar, pátio que ficava antes do pátio onde ficava o altar de cobre.
– Esta necessidade da santificação do homem também se demonstra pelas regras de purificação dos sacerdotes.
Os sacerdotes tinham de se lavar para oferecer sacrifícios ou exercer as demais atividades de culto, como a oferta do incenso no lugar santo.
As vestes sacerdotais eram tais que a pureza também era evidenciada seja pela sua cor (brancura), seja pelo material (linho), que evitava, por exemplo, o suor, que era uma impureza orgânica.
– O culto levítico também ensinava que os pecados, embora cobertos pelo sangue de animais, não eliminava a separação entre Deus e os homens, pois continuavam impávidos os véus que separavam o pátio do lugar santo, ali só acessível aos sacerdotes, e o lugar santíssimo, onde apenas o sumo sacerdote podia entrar uma vez ao ano.
O salmista, como já dissemos, dizia que o pecado era apenas “coberto”, não “tirado” (Sl.32:1), de forma que também o culto levítico apontava para a necessidade de um outro sacrifício, o que seria muito bem explicado pelo autor aos hebreus.
– O culto levítico também nos ensina que o relacionamento com Deus não exige apenas a indispensável separação do pecado, mas, também, uma separação para o Senhor, um lado “positivo” da santificação, que é a submissão ao Espírito Santo, à vontade de Deus, que é o de conformação ao comportamento exigido pelo Senhor.
– Por isso, os sacerdotes, que serviam ao Senhor, eram ungidos com azeite, azeite que também era acrescido nos sacrifícios que não eram sacrifícios decorrentes de pecado, como também era acrescido sal a este tipo de sacrifícios (Lv.2:13).
Azeite é símbolo do Espírito Santo, o que proporciona a união do povo de Deus e, conseguintemente, a união de Deus com o Seu povo (Sl.133), assim como o sal é símbolo da presença do Espírito Santo na vida do salvo, a ponto de o Senhor Jesus ter dito que somos o sal da terra (Mt.5:13), sem falar no incenso (Lv.2:15),
que simboliza a oração dos santos (Ap.5:8; 8:4) e das libações, que nos fazem lembrar a dedicação da vida, a entrega da vida a Deus (Lv.23:13), o que, por exemplo, é lembrado pelo apóstolo Paulo pouco antes da sua morte (Fp.2:17).
– A santificação não envolve apenas afastamento do pecado, mas, também, concomitantemente, aproximação de Deus (Tg.4:7,8) e, para tanto, precisamos ser dirigidos e guiados pelo Espírito Santo, precisamos ser homens espirituais (I Co.2:12-16).
O culto levítico ensina esta necessidade de aproximação com muita evidência, já que estabelece regras muito definidas de condutas diferenciadas para os sacerdotes e para o sumo sacerdote e para todos quantos quisessem se dedicar ao Senhor, como era o caso da lei do nazireado (Nm.6).
– O culto levítico, ao estatuir os sacrifícios, também mostra, com absoluta clareza, que o salário do pecado é a morte (Rm.6:23), pois, em virtude do pecado, eram mortos animais incessantemente, durante o dia, inclusive mesmo quando não se soubesse quem era o autor de um pecado oculto (Lv.5:1-13) e,
mesmo que não se tivesse a prática de um pecado específico, como ocorria com o sacrifício contínuo, que era realizado duas vezes ao dia, precisamente para lembrar que o homem tem a natureza pecaminosa e que, por causa disso, mereceria morrer e que isto não ocorre porque Deus quer resgatá-lo, quer salvá-lo.
– O culto levítico também nos mostra que há dois tipos principais de relacionamento entre Deus e os homens.
O primeiro, o de confissão e pedido de perdão dos pecados, pois o pecado impede que haja relação entre Deus e o homem (Is.59:2; Jo.9:31), que são os sacrifícios decorrentes do pecado e o segundo, de gratidão, louvor e adoração, que são as chamadas “ofertas pacíficas” ou “ofertas de manjares”, onde o homem glorifica a Deus, exalta-O, uma vez já estando em comunhão com Ele.
– O culto levítico não apresenta qualquer cerimônia ou ritual em que se peçam bênçãos a Deus, em que se procure fazer qualquer barganha com o Senhor, como é cediço ocorrer hoje entre os que defendem a famigerada teologia da prosperidade.
Pede-se a Deus perdão pelos pecados confessados e, fora isto, vai-se à presença do Senhor para agradecer pelas bênçãos recebidas, para louvar e adorar a Deus, reconhecer o Senhor pelo que Ele fez e pelo que Ele é.
É este que deve ser o nosso relacionamento com o Senhor, nada de busca de bênçãos materiais, de um toma-lá-dá-cá, e, percebam, isto numa aliança em que havia promessa de bênçãos materiais na terra de Canaã.
Se isto não se dava no culto levítico, por que haveremos de querer que isto ocorra na dispensação da graça? Mudemos urgentemente nosso foco, amados irmãos!
– O culto levítico também nos ensina a solenidade e a reverência que se deve ter no culto a Deus.
O culto não era feito de qualquer maneira e quaisquer inobservâncias do rito ocasionaria a reprovação divina, com sérias consequências, como foram as mortes súbitas de Nadabe e Abiú, que levaram fogo estranho diante do altar de incenso (Lv.10:1,2) ou morte decorrente da indevida oferta de incenso feito por Coré e seus seguidores (Nm.16:18-40).
– Como diz Salomão, devemos guardar o pé quando entrarmos na casa do Senhor (Ec.5:1), pois é coisa seríssima nos apresentarmos diante de Deus.
Deus está presente quando há uma reunião feita em Seu nome, para Sua glória e adoração (Mt.18:20) e qualquer atitude irreverente ou inconsequente não ficará sem a devida punição, pois, quando se está a falar de culto, se está a falar da soberania divina.
– Não devemos confundir reverência e solenidade com formalismo, com rigorismo litúrgico.
No próprio episódio da morte de Nadabe e Abiú, vemos que, mesmo no culto levítico, havia espaço para um abrandamento do rigor, quando houvesse justificativa plausível para uma eventual inobservância ritualística, tanto que Arão, Eleazar e Itamar não foram punidos por não terem comido a expiação do pecado no lugar santo (Lv.10:17-20),
como também não houve punição, nos dias do rei Ezequias, pelo fato de não terem alguns celebrantes da chamada “segunda páscoa” não terem se santificado previamente para tanto segundo o rito (II Cr.30:18-20),
tudo a confirmar o que disse o Senhor Jesus, ou seja, que o sábado foi feito para o homem e não o homem para o sábado (Mc.2:27), ou seja, que as normas e regras nunca podem sobrepor a dignidade da pessoa humana, até porque o mais importante da lei é o juízo, a misericórdia e a fé (Mt.23:23).
– Em nossa dispensação, o culto, sem dúvida, é menos formal do que o culto levítico, mas a solenidade e a reverência são até mais intensas, já que nossa adoração não depende de um lugar específico, é em espírito e em verdade (Jo.4:20-24).
Assim, ao contrário do que alguns equivocados pensam, temos, sim, de ter reverência redobrada em nosso culto ao Senhor, lembrando do rigorismo formal do culto levítico, não para copiar suas cerimônias e rituais,
como estão muitos a fazer hoje em dia, mas para que tenhamos alma e espírito devidamente trajados, devidamente conformados à Palavra de Deus, para que venhamos a oferecer um sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, o culto racional (Rm.12:1-3).
– De nada adiantaria, no culto levítico, um culto extremamente formal, se não houvesse esta disposição do coração, que é essencial ao culto a Deus, e que, como nunca, tem de estar presente no culto da dispensação da graça.
Tanto assim é que o Senhor considerou como abominação o culto que lhe era oferecido pelos judaítas do tempo de Isaías, que, em pecado, vinham cumprir as regras e normas do culto levítico (Is.1:118).
– O culto levítico era essencialmente diferente de todos os cultos realizados pelos gentios. Se, em ambos, havia sacrifícios de animais, é de se observar que, nos cultos gentílicos, tais sacrifícios eram feitos para agradar aos deuses, para deles obterem favores, enquanto que, no culto levítico, os sacrifícios eram feitos, primeiramente,
para um acerto de contas entre Deus e os homens, ou seja, não eram os homens que favoreciam os deuses, mas Deus que demonstrava o Seu favor para com os homens, aceitando que animais morressem em lugar do homem que mereceria morrer por causa de seus pecados.
– Os cultos dos gentios buscavam sempre o êxtase, o ápice das emoções e dos sentimentos dos adoradores, tanto que eram, na maior parte das vezes, acompanhados de orgias, festivais e toda a sorte de folguedos, enquanto que o culto levítico era profundamente reflexivo,
levava o adorador a observar a sua pequenez e a grandiosidade do Senhor, sendo que, somente depois dos sacrifícios, em família, numa refeição, se fazia uma celebração, sem qualquer apelo à emoção ou ao sentimento.
– Adoração não é extravagância, não é descarrego emocional, não é atingir êxtase ou frenesi.
Adoração é reconhecimento da soberania divina, é desfrute do amor de Deus, é experiência da Sua vontade. É isso que aprendemos no culto levítico.
Tudo é feito para a edificação espiritual do ser humano, para a sua aproximação a Deus, que é santo e ordeiro.
– A Igreja deve seguir este mesmo padrão, pois é o padrão divino, como bem salientado pelo apóstolo Paulo (I Co.14:26-33).
Nossos cultos em nossas igrejas locais têm seguido que padrão? O padrão do culto levítico ou o padrão do culto feito ao bezerro de ouro?
Lembremos que Paulo disse aos coríntios que devemos observar o que fizeram os israelitas para que não repitamos os seus erros, entre os quais esteve a participação no comer, beber e folgar em volta do bezerro de ouro (I Co.10:6,7).
– O culto levítico era livre e liberdade, ao contrário do que se pensa hodiernamente, não significa fazer o que quiser, mas, sim, fazer o que está de acordo com a vontade de Deus, poder chegar à presença do Senhor e oferecer-Lhe toda a honra e glória, obtendo a comunhão com Ele, livrando-se do maligno e podendo adentrar nas dimensões celestiais.
Liberdade não é libertinagem e, lamentavelmente, muitos têm fracassado em nossos dias por não saber a diferença e, em vez de cultuar a Deus, estar realizando o que, aos olhos do Senhor, não passa de abominação. Tenhamos cuidado, amados irmãos!
– O culto levítico em tudo apontava para Cristo, o Deus feito homem. Desde as peças, as vestimentas, enfim tudo indicava para Nosso Senhor e Salvador Jesus, para a Sua dupla natureza, para a Sua mediação.
Não há como fazermos um verdadeiro culto a Deus se não for em nome de Jesus, se não se estiver na única e exclusiva mediação de Jesus Cristo.
– Os próprios sacrifícios apontavam para Cristo, Ele próprio o oficiante e a vítima do sacrifício perfeito que era tão somente prefigurado no culto levítico.
As peças principais eram de madeira e de ouro, revelando a humanidade e divindade do Senhor, com exceção do altar de sacrifício e da pia, que eram de madeira e cobertas de cobre, simbolizando a divindade de Cristo e o juízo que Ele, como homem, assumiu o lugar do ser humano, pagando o preço dos nossos pecados.
– Nosso culto é feito em nome de Jesus? Temos a Jesus como nosso mediador? Procuramos nos chegar a Deus por intermédio de Cristo? Temos a Jesus como exemplo a ser seguido para podermos glorificar o nome do Senhor em espírito e em verdade?
– Muitos, na atualidade, estão recorrendo a outros mediadores: “apóstolos”, “líderes de células”, “patriarcas”, “paipóstolos”, “santos”, “beatos”, “profetas” , “sacerdotes” etc. etc. etc.
Não é esta a doutrina que nos advém do culto levítico, o qual aponta para Jesus Cristo que, ao morrer e Sua morte causar o rasgo do véu do templo, bem demonstrou que a mediação feita pelos sacerdotes levíticos e peças havia ali terminado o seu tempo, o seu papel, visto que o antítipo havia cumprido o que havia até então sido figurado.
– Por isso, é grave equívoco querer recuperar aspectos cerimoniais e ritualísticos do culto levítico, pois tudo isto se consumou na cruz do Calvário.
Agora, fica tão somente a lição de que o culto levítico apontava para Cristo e, agora, na nova aliança, é em Cristo que temos de ter a mediação para nos chegarmos ao Senhor, como, aliás, é bem claro a respeito o escritor aos hebreus, pois devemos entrar no vivo e novo caminho aberto pela carne de Jesus, que, como sumo sacerdote, está à direita do Pai, intercedendo por nós (Hb.10:19-23).
– Quando entendemos que o culto a Deus se faz por meio de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, procuramos imitá-l’O (I Co.11:1), seguir-Lhe as pisadas (I Pe.2:21), conformarmo-nos à Sua imagem (Rm.8:29), tudo fazendo por orientação do Espírito Santo, Espírito que veio à Igreja e habita em nós para glorificar a Cristo (Jo.16:13,14).
– Assim, no culto a Deus, não há egoísmo, culto à personalidade, motivações carnais de toda sorte, visto que tudo é feito por Cristo e o Senhor Jesus, quando age, age para a glória de Deus Pai (Jo.17:4) e para a salvação das pessoas (Jo.3:17). Por isso, quando há um verdadeiro culto ao Senhor, há salvação de almas, crescimento espiritual e edificação espiritual.
IV – O SENHORIO DIVINO NO CULTO LEVÍTICO
– Por fim, tem-se que o culto levítico está sempre a indicar o senhorio divino sobre todas as coisas.
O culto levítico procura demonstrar, com todo o seu esplendor, que o Senhor nosso Deus é o único Senhor (Dt.6:4), algo que os judeus estão a recitar diariamente desde a destruição do templo, mas que, no cotidiano do cerimonial litúrgico de então, ressoava claramente nos ouvidos de Israel.
– Eram oferecidos a Deus, no culto levítico, todos os componentes da natureza: os minerais estavam presentes, na medida em que, além das peças serem cobertas de ouro ou de cobre, em todo sacrifício se tinha de adicionar o sal (Lv.2:13), que é um mineral. Deus era o Criador dos minerais.
– Mas, também, deveriam ser oferecidas ao Senhor ofertas de manjares, compostas de vegetais, sendo que, no mais das vezes, tais ofertas eram sacrifícios de gratidão pela colheita obtida, tanto que as primícias eram trazidas diante do Senhor, como a reconhecer que Ele era o dono de toda a produção e que, sem Ele, nada existiria (Dt.26:1-11).
– Vemos aqui, aliás, uma grande distinção entre o culto a Deus e os cultos gentílicos.
Nos cultos gentílicos de fertilidade, como o culto a Baal, por exemplo, havia toda sorte de orgias e de festividades em que se praticavam relações sexuais e toda sorte de atividades em que se cria havia o aumento da fertilidade da terra,
ou se motivava a divindade adorada a trazer fertilidade para a terra, numa espécie de troca e de “toma-lá-dácá”, que fazia com que, embora até se reconhecesse o domínio da divindade sobre as forças da natureza e sobre a produção, poderia o homem, de algum modo, controlar isto, agradando ou fazendo uma barganha com a divindade.
– Já no culto levítico, não há coisa alguma semelhante a isto. Depois de ter suado o seu rosto, com o seu labor, uma vez de posse dos resultados, o ofertante vinha à presença de Deus, reconhecendo que tudo que recebera fora em virtude do Senhor, que lhe fora favorável,
tanto que o israelita reconhecia explicitamente a sua miserabilidade e a de seus pais, o seu imerecimento, mas que, em virtude do amor a Deus e da sua própria fidelidade à lei, tinha obtido êxito no sustento de cada dia.
– Com relação aos animais, nem precisamos falar, visto que dezenas e dezenas de animais eram diariamente oferecidos ao Senhor nos sacrifícios, fossem mamíferos, fossem aves. Deus Se mostrava, assim, Senhor, também, dos animais.
– Neste passo, vemos, também, que o culto levítico demonstrava, com absoluta clareza, que o Senhor era também dono de todos os seres humanos.
Ao reconhecer a sua miserabilidade, a sua fragilidade, cada israelita, ao cultuar o Senhor, lembrava que só Ele era o “Eu sou”, o Autoexistente e que o homem, apesar de ter domínio sobre a Terra, também Lhe pertencia.
– Enquanto os cultos gentílicos, não raras vezes, exigia sacrifícios humanos, o Senhor jamais permitiu que isto se fizesse (Jr.32:35), tanto que mandou matar quem sacrificasse seus filhos ao deus Moloque ou consentisse que isto fosse feito, considerando tal atitude como profanação (Lv.18:21; 20:2-5).
– Deus mostrava, no culto levítico, Seu domínio sobre o homem, mas, ao mesmo tempo, revelava ao homem a grande consideração que tinha para com ele e como se devia dar ao homem a sua devida dignidade, visto ser imagem e semelhança de seu Criador.
– O culto levítico era um culto cujas cerimônias e rituais sempre levavam em conta a dignidade do ser humano, sem deixar de considera-lo como criatura. No culto levítico, o homem era preservado nos mínimos detalhes. Senão vejamos.
– As disposições da lei mostravam que todos os homens eram iguais diante de Deus, tanto que as ofertas sempre levavam em conta a condição econômico-financeira dos ofertantes, de maneira a não excluir os mais pobres da possibilidade de adorar ao Senhor (Lv.5:7,11; 12:8; 14:21,22,30-32; 27:8).
– No culto levítico, jamais os israelitas eram considerados como simples “objetos sexuais”, como era o caso dos prostitutos cultuais que praticamente existiam em todos os cultos gentílicos, como também, como vimos, não havia a redução das crianças a meras ofertas sacrificiais, como se dava no culto a Moloque.
– No entanto, era bem claro, no culto levítico, que Deus era o Senhor e que, portanto, não poderia o homem jamais querer fazer o culto ao seu bel prazer, conforme a sua ideia ou conceito.
Não importava quem fosse, se houvesse transgressão aos princípios estabelecidos por Deus, o Senhor castigava exemplarmente aquele que queria cultuar do seu modo.
É o que vemos em casos como os dos sacerdotes Nadabe e Abiú (Lv.10:1,2); do rei Saul (I Sm.13:8-14), do sacerdote Uzá (II Sm.6:6,7) e do rei Uzias (II Cr.26:16-23).
– Este senhorio de Deus sobre o homem ficava patente, também, nas disposições relacionadas com o sacrifício contínuo, que, diariamente, apontava a fragilidade humana e a sua dependência de Deus, a ponto de, todos os dias, duas vezes por dia, ser necessário oferecer-se um sacrifício pelos pecados da humanidade (Nm.28:1-8).
Tal sacrifício apontava para a necessidade que o homem, criatura de Deus, propriedade do Senhor, tem da Sua misericórdia diariamente, pois, como disse o profeta Jeremias, são as misericórdias do Senhor a causa de não sermos consumidos, já que elas se renovam a cada manhã (Lm.3:22,23).
– No culto levítico, ainda, o Senhor demonstrava o Seu domínio sobre as forças da natureza e como tem o pleno controle sobre tudo.
Assim é que, do dia para a noite, fez florescer a vara de Arão (Nm.17:8), como acendeu o próprio fogo do altar de cobre, seja na inauguração do tabernáculo (Lv.9:24), seja na inauguração do primeiro templo (II Cr.7:1).
A propósito, o término do culto levítico para o Senhor se deu, também, diante de uma ação sobrenatural, que foi o rasgar do véu do templo de alto a baixo, quando da morte do Senhor Jesus (Mt.27:51; Mc.15:38; Lc.23:45).
Ev. Caramuru Afonso Francisco
Fonte: http://www.portalebd.org.br/classes/adultos/2587-licao-6-a-doutrina-do-culto-levitico-i