LIÇÃO Nº 6 – EXPRESSANDO PALAVRAS HONESTAS
INTRODUÇÃO
– Na sequência do estuo do sermão do monte, veremos o ensino de Jesus sobre o falar dos Seus discípulos.
– Nosso falar expressa o nosso caráter.
I – O TERCEIRO E NONO MANDAMENTOS
– Na sequência do estudo do sermão do monte, veremos hoje como o Senhor Jesus analisa o terceiro e nono mandamentos, “não perjurarás, desdobramento dos mandamentos “não tomarás o nome do Senhor teu Deus em vão” e “não darás falso testemunho”, em que o Senhor Jesus analisa a questão do falar, do trato com as palavras por parte de Seus discípulos.
– Depois de analisar o homicídio e o adultério, Cristo vai comentar a profundidade do terceiro e nono mandamentos, a respeito das palavras, da linguagem.
Os homens são os únicos seres racionais sobre a face da Terra e a razão se expressa aos semelhantes através da linguagem, tanto que o Senhor quis mostrar a superioridade do homem em relação à criação terrena mostrando a Adão que poderia criar palavras (Gn.2:20).
– Por isso mesmo, a língua é um importantíssimo órgão do corpo, pois é através dela que o homem manifesta o que está em seu coração (Mt.12:34; Lc.6:45) e, em virtude da natureza pecaminosa do homem, é esta mesma língua um órgão indomável, um fogo, como mundo de iniquidade, que contamina todo o corpo e inflama o curso da natureza e é inflamada pelo inferno (Tg.3:5,6).
– A questão da palavra foi tratada no terceiro e em o nono mandamentos e o Senhor Jesus os analisa sob a ótica do reino de Deus.
– O terceiro mandamento prescreve que não se deve tomar o nome de Deus em vão. Este mandamento está a exigir que o nome de Deus jamais seja utilizado com algo que seja proibido pelo próprio Senhor. Trata-se da proibição da utilização do nome do Senhor para se fazer algo que esteja relacionado com a fraude, o dolo (i.e., a má-fé), a mentira e o engano.
– Neste sentido, aliás, há quem defenda que a melhor tradução do mandamento fosse: “Não faças o nome de YHWH teu Deus ser falso, inútil, sem valor, sem resultado, uma mentira” (Cf. O judaísmo proíbe a pronúncia, a escrita e a proclamação do nome sagrado de Deus.
Está o movimento messiânico do nome sagrado então em erro por usá-lo? Disponível em: http://www.revelations.org.za/QandA6.htm Acesso em 25 nov 2014) (texto em inglês).
– O terceiro mandamento diz respeito a não se dizer o nome do Senhor em vão, traduzindo a reverência que se deve ter ao Senhor.
Como afirma Tomás de Aquino: “…a reverência ao Senhor exige não proferir coisa injuriosa contra Ele e isto se contém no preceito que diz: Não tomarás em vão o nome do Senhor teu Deus…” (Suma Teológica I, II, 100, 5. Citação de Ex.20:22-26. Disponível em: http://www.clerus.org/bibliaclerusonline/pt/index.htm Acesso em 17 dez. 2013) (tradução nossa de texto em espanhol).
– O terceiro mandamento é claro ao mostrar que não se deve jurar em falso, ou seja, não se pode tomar Deus por testemunha de uma mentira, pois isto é, precisamente, o que se proíbe no mandamento.
A este jurar falso se chama de “perjúrio” e é tanto esse o âmago do mandamento que o próprio Senhor Jesus Se referiu a este mandamento, no sermão do monte, como sendo “não perjurarás” (Mt.5:33).
OBS: “…Este preceito não proíbe qualquer uso do nome de Deus, mas propriamente o que se emprega para confirmar a palavra humana no modo de juramento, já que este uso do nome de Deus é muito frequente entre os homens.
Pode, também, entender-se, como uma consequência, que se proíbe qualquer uso desordenado do nome de Deus.…” (AQUINO, Tomás de. Suma Teológica II-II q.122 a.3. Cit. Ex.20:7,8. n. 2444. Disponível em: http://www.clerus.org/bibliaclerusonline/pt/index.htm Acesso em 25 nov. 2014) (tradução nossa de texto em espanhol).
– Ao “…invocarmos o nome do Senhor em testemunho diz-se, com razão, que estamos atestando nosso reconhecimento de sua divina soberania.
Pois, dessa forma, o confessamos ser a eterna e imutável verdade, a quem invocamos não só como a testemunha idônea da verdade acima das demais, mas ainda como seu enunciador único, que pode trazer à luz as coisas escondidas e, ademais, como o conhecedor dos corações.
Pois onde falecem os testemunhos dos homens, retrocedemos a Deus como nossa testemunha, especialmente quando se tem de asseverar o que jaz oculto na consciência.…” (CALVINO, João. As Institutas ou Tratado da Religião Cristã. Trad. de Waldyr Carvalho Luz, v.2, p.149).
Deste modo, quando juramos em falso, estamos deixando de dar a devida honra a Deus, sendo, pois, certo que o juramento verdadeiro dá ao Senhor a devida honra.
– A Declaração de Fé das Assembleias de Deus, ao fazer menção do terceiro mandamento, assinala que “…O terceiro mandamento;
‘Não tomará o nome do Senhor, teu Deus, em vão’ significa não usar o nome de Deus de forma superficial, em conversas triviais, nem faltar com a verdade em Seu nome, como ao pronunciar um juramento falso [Lv.19:12] ou fazer um voto e não o cumprir [Ec.5:4].
O Senhor Jesus fez menção do terceiro mandamento quando falou contra o perjúrio [Mt.5:34-37].…” (Cap.XVIII.2, pp.157-8).
– Não é diferente o escopo do nono mandamento, que é mencionado explicitamente pelo Senhor na sua terceira comparação entre a lei do reino de Deus e a lei de Moisés no sermão do monte: “Não perjurarás” ou “não darás falso testemunho”.
– Como afirma Tomás de Aquino: “… Já tinha proibido o Senhor que ninguém ofendesse ao seu próximo por obras; agora preceitua que tampouco se lhe ofenda por palavras, ou seja, ‘Não dirás falso testemunho contra o teu próximo’.…” (Os dez mandamentos. Trad. de Salvador Abascal. Cit. Ex.20:12-17. n.173. Disponível em: http://www.clerus.org/bibliaclerusonline/pt/index.htm Acesso em 26 dez. 2014) (tradução nossa de texto em espanhol).
– Verificamos, portanto, que o nono mandamento, na escala hierárquica de valores estabelecida pelo Senhor, está abaixo das ofensas por obras ao próximo.
Depois de o Senhor ter proibido que se matasse alguém, atingindo a própria vida do próximo; que se adulterasse, atingindo a fidelidade para com a pessoa mais próxima de nós sobre a face da Terra, que é o nosso cônjuge e que proibisse que se furtasse, exigindo o respeito ao patrimônio material do próximo, agora proíbe que se diga falso testemunho contra o próximo, ou seja, impede que o próximo seja também ofendido por palavra.
Tem-se, portanto, uma exigência divina para um bom relacionamento com o próximo, relacionamento este que chega agora ao nível das palavras.
– Deus é a verdade (Jr.10:10). Jesus é a Verdade (Jo.14:6). Desta maneira, não há como o povo de Deus viver apartado da verdade, não falar a verdade. Se temos comunhão com o Senhor, devemos sempre viver na verdade, andar na verdade.
Esta era, aliás, a maior alegria do apóstolo João: saber que as pessoas que havia ganhado para Cristo andavam na verdade (III Jo.3).
– Se Deus é a verdade, vemos que a verdade precisa ser revelada ao homem. E foi precisamente o que ocorreu. Deus Se revelou ao homem através de Sua Palavra que, por isso mesmo, é a verdade (Jo.17:17).
É por meio da Palavra de Deus, da revelação que Deus fez de Si mesmo ao homem que descobrimos o que é a verdade e que nos permite viver e andar na verdade.
– Por isso, não há a menor possibilidade de termos comunhão com Deus ou de fazermos o que Deus quer de nós se sairmos da verdade, se andarmos pela senda da mentira.
A mentira nasceu com Satanás, que o Senhor Jesus denomina de “pai da mentira” (Jo.8:44), “…nenhuma mentira vem da verdade” (I Jo.2:21).
– A mentira está ligada ao caráter do adversário de nossas almas, de nosso inimigo, tanto que é algo que é próprio dele, como nos diz o Senhor Jesus (Jo.8:44). Destarte, como Satanás nada tem em Jesus (Jo.14:30), temos que não existe a menor possibilidade de qualquer mentira ser admitida ou tolerada por Deus.
– Por isso, o apóstolo João se alegrava em saber que seus filhos na fé andavam na verdade (II Jo.4; III Jo.3,4).
– A Declaração de Fé das Assembleias de Deus, sobre o nono mandamento, assinala que “…proíbe a mentira, o mexerico e o testemunho falso contra o próximo, tanto no dia a dia como nos tribunais.
Trata-se da proteção da honra e da boa reputação no campo social. O propósito divino nesse mandamento é combater a mentira, a calúnia e a falsidade entre o povo [Dt.19:18-20]…” (Cap.XVIII.6, p.160).
II – O ENSINO DE JESUS SOBRE O USO DAS PALAVRAS
– O Senhor Jesus Se referiu ao terceiro e nono mandamentos no sermão da montanha, quando, dando novo alcance à lei de Moisés, assim Se manifestou: “
Também ouvistes que foi dito aos antigos: Não jurarás falso, mas cumprirás rigorosamente para com o Senhor os teus juramentos.
Eu, porém, vos digo: de modo algum jureis; nem pelo céu, por ser o trono de Deus; nem pela terra, por ser estrado de seus pés; nem por Jerusalém, por ser cidade do grande Rei; nem jures pela tua cabeça, porque não podes tornar um cabelo branco ou preto. Seja, porém, a tua palavra: Sim, sim; não, não. O que disto passar vem do maligno” (Mt.5:33-37).
– Verificamos, por primeiro, que o Senhor Jesus realmente põe no âmago deste mandamento a questão do juramento, que é mais propriamente a que se refere o mandamento, embora não esteja o mandamento circunscrito a este aspecto.
– O Senhor Jesus traz a interpretação corrente que existia entre os doutores da lei, segundo a qual o que o terceiro mandamento estava a proibir era tão somente o juramento falso, ou seja, querer tomar Deus como testemunha por uma mentira, o que é uma profunda desonra contra Deus.
Tal interpretação, no entanto, era uma indevida restrição ao que estava na lei. Como afirma o pastor Geremias do Couto:
“…o princípio farisaico ao qual Jesus Se reporta nesse versículo [Mt.5:33 – observação nossa] não aparece daquela forma em nenhuma parte do Antigo Testamento (ver Ex. 20:7; Lv.19:12; Nm.30:2; Dt.5:11; 23:23), constituindo-se, portanto, apenas numa interpretação estritamente jurídica que os doutores da lei tinham do Pentateuco…” ( Sermão do Monte: a transparência da vida cristã. Lições Bíblicas: jovens e adultos – mestre, 2. trim.2001, p.40).
– Assim, segundo a interpretação farisaica da lei de Moisés, era imperioso que os juramentos feitos ao Senhor fossem cumpridos, ou seja, que, ao se invocar a Deus como testemunha, esteja-se a falar a verdade e, em se tratando de juramentos para o futuro, que o que foi prometido seja rigorosamente cumprido. Com tais requisitos, se estava a cumprir o terceiro mandamento.
– No entanto, o Senhor Jesus vai além desta simples proibição de se jurar em falso, porquanto, ao falar sobre este mandamento, simplesmente manda que Seus discípulos não deveriam jurar, mas seu falar deveria ser sim, sim; não, não.
– À evidência, o Senhor Jesus não estava admitindo o falso juramento, nem tampouco deixando de observar que o juramento era um ato em que se reconhecia a soberania divina, em que se dava honra ao Senhor, na medida em que se punha Deus como a referência da verdade, a garantia da verdade, algo que o próprio Deus fez, ao jurar por Si mesmo, já que não havia ninguém maior do que Ele (Hb.6:13).
– Na verdade, o que o Senhor Jesus estava aqui a ensinar é que o verdadeiro alcance do terceiro mandamento é mais do que jurar de forma verdadeira, criteriosa e justa, mas, sim, que o cristão deve ter uma conduta tal que seja desnecessário todo e qualquer juramento, uma vez que, como espelho da glória de Deus, como imagem , como um “pequeno Cristo”, a credibilidade do cristão deve ser tal que lhe seja totalmente desnecessário jurar.
– O terceiro mandamento nada mais é, portanto, do que a exigência de que o discípulo tenha um comportamento tal, um falar tal que lhe seja totalmente desnecessário fazer uso do juramento.
– Seu falar corresponde à sua condição de estar levando consigo o nome do Senhor. Ele não mais vive mas quem vive nele é o Senhor (Gl.2:20), de sorte que as suas palavras nada mais são que a expressão do próprio falar divino, e, portanto, se está diante de um falar que é impregnado, na sua própria substância, da verdade, do critério e da justiça.
– Jesus exige do Seu discípulo uma tal comunhão com Ele que se torna totalmente supérfluo, desnecessário que a palavra de um Seu discípulo tenha de ser confirmada por um juramento, tenha de recorrer à majestade divina para que seja crida e apreciada, pois o cotidiano, o dia-a-dia do servo é uma constante confirmação de que ele é portador da verdade, que é o próprio Jesus (Jo.14:6), pois o discípulo tem a verdade nele e sempre a terá com ele (II Jo.2).
– Tiago repete este ensino do Senhor Jesus, ao dizer que os cristãos de modo algum ″deveriam jurar para que não caíssem em condenação” (Tg.5:12), reafirmando que o falar do cristão deve ser sim, sim; não, não.
– Tem-se aqui, uma vez mais, uma exigência de uma justiça maior que a dos escribas e fariseus (Mt.5:20), que é a tônica do aprofundamento dado pelo Senhor Jesus aos mandamentos.
Somos instados a ser portadores da verdade, a andar na verdade, de modo tal que seja totalmente desnecessário fazer uso do juramento, desnecessidade esta, aliás, que é considerada como um obstáculo ou impedimento ao jurar.
– Tal posição, porém, encontra divergência entre os segmentos da Cristandade. A maior parte dos segmentos da Cristandade (romanistas, ortodoxos, protestantes) entende que a proibição dos juramentos feita pelo Senhor Jesus foi apenas relativa, ou seja, envolve apenas a proibição dos juramentos falsos, supérfluos, levianos ou que têm por finalidade prejudicar alguém.
– Diz o Catecismo Romano, a respeito: “…Quando o Salvador diz: “Seja o vosso falar: Sim, sim; não, não” – Sua própria expressão dá claramente a entender que Ele só proíbe o costume de se jurar em assuntos familiares e corriqueiros.
Por certo, o sentido principal da advertência de Nosso Senhor é que não sejamos demasiado fáceis para jurar, nem cedamos a qualquer propensão de fazê-lo. Este é um ponto que se deve ensinar com frequência, e inculcar nos ouvidos dos fiéis.… (MARTINS, Leopoldo Pires O.F.M., op.cit., p. 430).
– Nesta mesma linha, o atual Catecismo da Igreja Romana assevera: “…Jesus ensina que todo juramento implica uma referência a Deus e que a presença de Deus e de sua verdade deve ser honrada em toda palavra. A discrição em recorrer a Deus na linguagem caminha de mãos dadas com a atenção respeitosa à sua presença, testemunhada ou desprezada, em cada uma de nossas afirmações.
Seguindo S. Paulo, a Tradição da Igreja entendeu que as palavras de Jesus não se opõem ao juramento quando é feito por uma causa grave e justa (por exemplo, perante um tribunal).
“O juramento, isto é, a invocação do nome de Deus com testemunha da verdade, não se pode fazer, a não ser na verdade, no discernimento e na justiça.” A santidade do nome divino exige que não se recorra a ele para coisas fúteis e não se preste juramento em circunstâncias suscetíveis de interpretá-lo como uma aprovação do poder que o exigisse injustamente.
Quando o juramento é exigido por autoridades civis ilegítimas, pode-se recusá-lo. Deve ser recusado quando é pedido para fins contrários à dignidade das pessoas ou à comunhão da Igreja” (§§ 2153-2155 CIC).
– Tomás de Aquino, aliás, chega a dizer que o juramento é um ato de virtude: “…pelo mesmo fato de jurar por
Deus, o homem declara pública e livremente que se trata de um ser superior, pois é indefectível Sua verdade e universal Seu conhecimento e, assim, de alguma maneira, honra a Deus (…) Que por este mesmo fato de pôr a Deus como testemunha, a modo de juramento, confessamos Sua superioridade, coisa que tem que ver com a reverência a Deus. Com isto, pois, damos algo a Deus: damos-Lhe honra e reverência.…” (Suma Teológica II-II q.89, a.4).
– João Calvino também observa: “…Os anabatistas, não contentes com esta moderação de juramento, execram a todos os juramentos sem exceção, porquanto a seu ver a proibição é total: ‘Eu vos digo, de modo algum jureis; ao contrário, seja vossa palavra: sim, sim, não, não.
O que passa disso, procede do Maligno’ [Mt 5.34]. Desta maneira, entretanto, investem inconsideradamente contra Cristo, fazendo-o opositor ao Pai, como se houvesse descido à terra a fim de cancelar seus decretos.
Com efeito, na lei o Deus Eterno não só permite o juramento como coisa legítima, o que de si deveria ser suficiente, mas inclusive o ordena em caso de necessidade [Ex 22.11].
(…).Entretanto, por haver nas palavras alguma dificuldade, ponderemo-las por uns breves instantes. Aqui, porém, jamais alcançaremos a verdade, a menos que fixemos os olhos no intento e voltemos a atenção para aquilo que aí trata.
Ele não teve o propósito de ou relaxar ou restringir a lei, mas de reconduzi-la ao verdadeiro e genuíno significado, que tinha sido assaz corrompido pelas falsas invenções dos escribas e fariseus.
Se temos isto em mente, não haveremos de pensar que Cristo haja condenado totalmente aos juramentos, mas somente aqueles que transgridem a norma da lei.
Das próprias palavras se faz patente que o povo então de nada habitualmente se guardava senão de juramentos falsos, enquanto a lei proíbe não só a estes, mas ainda os juramentos banais e supérfluos.
Portanto, o Senhor, o mais seguro intérprete da lei, adverte que é mau não apenas jurar falsamente, mas até mesmo o simples jurar. Jurar como? Certamente, jurar em vão. Mas, os juramentos que se recomendam na lei ele os deixa intactos e desimpedidos.…” (op.cit., p.151).
– Inobstante tal entendimento, que se deve respeitar, é importante observarmos que o patamar exigido pelo Senhor Jesus é de termos uma conduta tal que não nos leve a jurar em hipótese alguma, porquanto, como portadores da verdade, temos de ter um falar que não necessite, de modo algum, que venhamos a fazer uso de juramento, pois isto seria desconsiderar a dignidade divina que habita em nós, pois somos templo do Espírito Santo, Espírito Santo que é o Espírito de verdade (Jo.16:13), que é a própria verdade (I Jo.5:6).
– A condição que temos de ser portadores da verdade, receptáculos da verdade torna totalmente desnecessário o juramento e, em sendo o juramento desnecessário, segundo os próprios defensores da tese da “proibição relativa” do juramento, estaríamos diante de um caso de violação do terceiro mandamento.
– Para defender a tese da “proibição relativa” do juramento, é mostrado que o apóstolo Paulo jurou. É o que se vê em II Co.1:23, quando o apóstolo diz que invocava a Deus por testemunha sobre a sua alma que era para poupar os coríntios que o apóstolo não tinha ido até Corinto até o momento em que escrevia esta carta. Ora, se o apóstolo Paulo fez tal juramento, tem-se que o juramento não é, em si, pecado.
OBS: “…Quem ousaria dizer que Paulo haveria de ter jurado, se o juramento fora inteiramente proibido? Com efeito, onde a situação assim exigiu, jura sem qualquer escrúpulo, adicionada até mesmo, às vezes, uma imprecação [Rm 1.9; 2Co 1.23].…” (CALVINO, João. op.cit., p.152).
– Conquanto seja um poderoso argumento, pois se trata de um texto escriturístico, isto não significa que o gesto de Paulo tenha tido o agrado de Deus ou tenha sido uma conduta correta, até porque, nesta mesma carta, que é uma epístola em que se tem um nítido conflito entre Paulo e os coríntios, o próprio apóstolo admite ter agido de forma não muito adequada, quando se vangloriou (II Co.12:11).
Parece-nos, pois, que esta invocação de Paulo foi outro constrangimento que a relação conflituosa entre o apóstolo e a igreja coríntia o levou.
– Outro texto utilizado para justificar o uso do juramento, nas hipóteses previstas na lei, é o constante de Gl.1:20, onde o apóstolo Paulo faz novo juramento, quando conta aos gálatas a sua vida após a sua conversão, mostrando que não havia estado seguidamente com os apóstolos.
Também aqui podemos verificar que o apóstolo, ao fazer uso do juramento, fá-lo diante das circunstâncias graves em que estava a escrever a epístola, precisamente para crentes que estavam começando a se submeter à lei mosaica, como que se “rebaixando” ao nível espiritual que estava sendo adotado pelos crentes da Galácia.
– Em Rm.1:9, o apóstolo Paulo também faz um juramento, na saudação que faz aos crentes em Roma, dizendo que sempre fazia menção daqueles cristãos romanos por onde passava.
Tal expressão revela a necessidade que tinha o apóstolo de mostrar a sua afinidade aos crentes de Roma, ainda que nunca estivera na capital do Império, clima amistoso que era fundamental para que pudesse ser ele recebido por aquela igreja e enviado para a Espanha como seu missionário, como era o intento do apóstolo (Rm.15:24), lembrando-nos de que a igreja em Roma era, a este tempo, profundamente judaica.
– Assim, apesar destes três exemplos do apóstolo Paulo, parece-nos que a prática do juramento não se encontra autorizada pelas Escrituras Sagradas aos servos Jesus, sendo ocorrências que, além de revelarem que o apóstolo não era impecável, são decorrentes de circunstâncias em que havia sérios problemas de relacionamento e entendimento do que fosse, realmente, a natureza da fé em Cristo Jesus.
– Além do mais, amados irmãos, nosso exemplo é o Senhor Jesus, cujas pisadas devemos seguir (I Pe.2:21), o que é ensinado pelo próprio apóstolo Paulo (I Co.11:1).
Ora, não vemos o Senhor Jesus, em momento algum de Seu ministério terreno, fazendo qualquer juramento, mas, bem ao contrário, temos explicitamente consignado que, em Sua boca, jamais se achou engano (Is.53:9; I Pe.2:22).
– Nem se diga que há passagens bíblicas em que Deus tenha jurado, pois estamos, nas referidas passagens, diante de uma expressão “antropopática”, ou seja, da atribuição a Deus de ações tipicamente humanas, sendo que, em tais passagens, o que se está a reforçar é a verdade e a imutabilidade da Palavra do Senhor.
– Neste ponto, trazemos o ensino de George Fox (1624-1691), o fundador do movimento quaker, que é um dos grandes defensores da proibição absoluta dos juramentos.
Diz este grande homem de Deus: “…todos podem ver claramente que aqueles que juravam era para o Senhor e cumpriam o juramento que haviam feito e, com respeito aos juramentos falsos que eles juraram, estavam proibidos pelo Senhor em Sua lei e este juramento que eles deviam realizar ao Senhor foi o juramento que foi proibido por Cristo.(…).
E, agora, vocês pensam que o evangelho lhes dá a liberdade de pronunciar tantos juramentos? Oh, não! Porque Cristo proíbe em Seu evangelho o verdadeiro juramento pelo Senhor, o qual devia ser feito a Ele e tomado somente em assuntos urgentes para terminar as controvérsias no tempo antigo da lei; esse é o juramento ao que Cristo põe fim e estabelece “o sim e o não” sobre ele e sobre a lei (…)
Portanto, agora, se tiver alguma oferta para oferecer pelas transgressões que se fazem ao jurar desnecessariamente no tempo antigo da lei, acaso a oferta não terminou com as ofertas pelas transgressões e é uma oferta pelos pecados e pelas transgressões do homem, que deve ser considerada e obedecida sobre tudo?
Não que o homem deva transgredir mais ao jurar e dizer que Cristo é oferecido por suas transgressões e presumir assim agregar pecado ao pecado. Portanto, Cristo põe fim a todos os juramentos e é a oferta que é oferecida por todos os verdadeiros cristãos por seus pecados.(…).
Portanto, vocês podem ver aqui [Lv.19:12 – observação nossa] que orar falsamente estava proibido pela lei de Deus e jurar ociosamente é profanar o nome do Senhor, porque Deus não deu o juramento a Seu povo para jurar ociosamente em conversações habituais, nem falsamente, senão para ser realizados ante o Senhor em ocasiões especiais e é esse o juramento, como disse anteriormente, que Cristo proíbe e ao qual pôs fim.(…).
Portanto, este juramento pelo Senhor que a gente devia jurar por Seu nome nos tempos da lei era um tipo do juramento que o Senhor jurou com respeito a Seu Filho, que lhe põe fim e proíbe este verdadeiro juramento no tempo antigo da lei, lei que veio cumprir e agora reúne o povo em Seu próprio nome, que está acima de todo o nome, donde vem a salvação e os manda que seu sim seja sim e seu não, não, porque o que seja mais do que isto é ímpio…” (Porque jurar “dizer a verdade” é mal. Disponível em: http://www.hallvworthington.com/spanish/sfoxswearing.html Acesso em 26 nov. 2014) (tradução nossa de texto em espanhol).
– Percebemos, pois, que, para George Fox, com a vinda , desapareceram as razões que permitiam, no tempo da lei, o recurso aos juramentos, recurso este que somente se devia em ocasiões especiais.
Tais ocasiões são as que foram levadas em conta pelo Senhor Jesus no sermão do monte, tendo havido, então, a proibição do uso dos juramentos, pois agora, diante da vinda , os mesmos se fazem desnecessários, devendo os discípulos do Senhor assumirem um novo patamar, o “sim, sim; não,não”, único patamar que corresponde à dignidade de cristão.
– Com respeito aos juramentos exigidos pelas autoridades, como, por exemplo, os juramentos de posse de algum cargo ou de algum ofício, temos aqui que tais atos solenes não se constituem em violação do terceiro mandamento.
Como diz João Calvino, o terceiro mandamento “…trata antes do culto de Deus e da reverência de Seu nome, contudo não da equidade que se deve cultivar entre os homens, daí se evidencia que, em seguida, condenará na segunda tábua o perjúrio e o falso testemunho, com que é agravada a sociedade humana. Ora, seria supérflua repetição se este mandamento tratasse do dever da caridade.
Já a própria divisão dos mandamentos também postula isto, porque, como já se disse, não sem razão Deus atribui duas tábuas à sua lei.
Donde se conclui que Deus está aqui reivindicando para si este seu direito e preservando a santidade de seu nome, não, porém, a ensinar o que os homens devam aos homens.…” (op.cit., p.148).
– Tem-se, pois, que tal juramento não é uma invocação de Deus como testemunha de algo, mas uma promessa de realização de alguma atitude que é perfeitamente possível, que depende única e exclusivamente da vontade de quem promete, via de regra,
o de dizer a verdade ou de cumprir com um determinado corpo normativo, como é a Constituição da República ou as leis, no caso de posse de autoridades, ou o atendimento a um determinado estatuto profissional, no caso de posse de um ofício.
É algo, portanto, que se encontra fora do terceiro mandamento, que é um dever em relação a Deus e não aos homens.
OBS: A Confissão de Fé de Westminster assim trata do tema dos chamados “juramentos legais” ou “juramentos civis”:
“…O único nome pelo qual se deve jurar é o nome de Deus, nome que se pronunciará com todo o santo temor e reverência; jurar, pois, falsa ou temerariamente por este glorioso e tremendo nome ou jurar por qualquer outra coisa é pecaminoso e abominável, contudo, como em assuntos de gravidade e importância o juramento é autorizado pela palavra de Deus, tanto sob o Novo Testamento como sob o Velho, o juramento, sendo exigido pela autoridade legal, deve ser prestado com referência a tais assuntos.…” (XXII,II. Disponível em: http://www.monergismo.com/textos/credos/cfw.htm Acesso em 26 nov.2014).
– Verdade é que os defensores da proibição absoluta do juramento, ao menos os formuladores e defensores desta tese quando da Reforma Protestante (os “anabatistas” de que fala Calvino) não admitem qualquer espécie de juramento, inclusive este “juramento civil”, mas se trata de uma posição radical, que não se sustenta, visto que o terceiro mandamento não fala de relacionamento social, mas, sim, de nosso relacionamento com Deus.
– Temos, pois, que o terceiro mandamento, no alcance dado pelo Senhor Jesus, nada mais é que a exigência de que, sendo nós templo do Espírito Santo, receptáculos da verdade, andemos sempre na verdade pois esta é uma característica indispensável de quem recebeu o mandamento do Pai (II Jo.4). Por isso, o apóstolo João se alegrava em saber que seus filhos na fé andavam na verdade (III Jo.4).
– Se somos portadores da verdade, se andamos na verdade, nosso falar é “sim, sim; não, não” e, por isso, o terceiro mandamento nos impede de jurar, porque não necessitamos de tal conduta, já que nosso falar sempre terá credibilidade, nossa vida demonstrará que sempre somos sinceros e que não precisamos usar deste recurso. Temos andado na verdade?
– Com relação ao nono mandamento, há de se verificar que ele não nos obriga apenas a falar a verdade, mas, também, a zelar pela boa reputação de nosso próximo. Assim, ainda que seja verdadeiro algo que venhamos a falar, caso este algo comprometa a imagem do próximo, a sua boa reputação, o seu bom nome, não há porque passarmos isto adiante, quando não houver necessidade que isto seja dito.
– Agir desta maneira, espontaneamente contribuindo para que o bom nome do próximo fique comprometido, é agir como mexeriqueiro, algo que é abominável aos olhos de Deus, uma espécie que Deus não quer no meio do Seu povo. Não é por outro motivo, aliás, que o apóstolo Paulo diz temer que houvesse mexericos no meio da igreja em Corinto (II Co.12:20).
– Costumamos dizer que, lamentavelmente, este é um dos “dons” que existe na igreja embora não tenha sido posto ali pelo Espírito Santo ou por Cristo. É o “dom da fofoca”, que tanto mal tem causado nos relacionamentos entre os irmãos nas igrejas locais.
Trata-se de uma erva daninha terrível, que deve ser extirpada, a fim de se evitar que, através dela, o inimigo de nossas almas tenha espaço entre os irmãos para realizar a sua obra de matar, roubar e destruir as vidas. Tomemos cuidado, amados irmãos!
– A divulgação espontânea e desnecessária de um fato que compromete o bom nome de alguém é denominada de “detração”. Os detratores são pessoas ímpias, pecadoras, como bem demonstra o apóstolo Paulo em Rm.1:30.
A propósito, a palavra grega original deste versículo, “katalalos”(κατάλαλος) mostra bem a intenção do “detrator”, a saber: falar contra alguém.
A detração não está preocupada com a verdade, como aparenta ocorrer, mas, sim, está preocupada em causar mal ao próximo, daí ser uma atitude que contraria a vontade do Senhor. Tanto assim é que, quase sempre, vem acompanhada de algum exagero ou exacerbação, de algum acréscimo mentiroso à verdade dita.
– O Senhor Jesus mostrou que não podemos assumir a posição de juízes do próximo, nem procurarmos o seu prejuízo, ainda que ele tenha querido nos prejudicar, pois Deus, que é onisciente e o único juiz e legislador, faz que o sol se levante tanto sobre maus como sobre bons, e a chuva desça sobre justos e injustos.
– Destarte, não podemos ter um coração que queira o mal do próximo, pois o coração é a fonte do falar (Mt.12:34), sendo a raiz do falso testemunho (Mt.15:19).
– O falar, ensina-nos Nosso Senhor, é resultado daquilo que há em nosso homem interior e só uma forma de cumprirmos o nono mandamento: tendo a verdade em nosso coração, ou seja, tendo o próprio Cristo em nosso interior, entregando-nos a Jesus e, deste modo, não mais vivendo, mas permitindo que Cristo viva em nós (Gl.2:20).
– Quando falava sobre o novo nascimento com o mestre Nicodemos, o Senhor Jesus mostrou que o nascido de novo é aquele que pratica a verdade e, por isso, vem para a luz, a fim de que suas obras sejam manifestas, porque são feitas em Deus, algo que não ocorre com aquele que faz o mal (Jo.3:19,20).
– O Senhor, então, mostra-nos que não há outro meio pelo qual possamos cumprir o nono mandamento, a não ser entregando nossas vidas a Ele que, sendo a verdade, fará com que pratiquemos a verdade e tenhamos as nossas obras manifestas, porque feitas em Deus.
– Em diversos dos seus ensinos, o Senhor Jesus fez questão de mostrar que tudo quanto dizia, fazia-o na verdade. Daí a sua conhecida expressão, tantas vezes repetida nos Evangelhos: “Em verdade, em verdade vos digo”.
Tudo quanto Jesus fazia ou dizia era na verdade, deixando-nos o exemplo que deve ser seguido por todos quantos queiram ser genuínos e autênticos discípulos Jesus.
– “…Com relação à crítica o Salvador declarou categoricamente: “Não julgueis e não sereis julgados” (Mat. 7:1). O próximo não se corrige através da crítica ou ridicularização, e sim, através do amor, indulgência e bons conselhos.…” (ALEXANDER (Mileant). Trad. de Olga Dandolo e Matuhska Claúdia Oliveira. Os
mandamentos de Deus: fundamentos morais da vida. Disponível em: http://www.fatheralexander.org/booklets/portuguese/commandments_p.htm Acesso em 26 dez. 2014).
– Como se isto fosse pouco, vemos, ainda, que na boca do Senhor Jesus jamais se achou engano (Is.53:9; I Pe.2:22).
O Senhor Jesus deu-nos o exemplo de como devemos agir em nosso falar, jamais falando mal das pessoas, nem tampouco divulgando más notícias ou usando da palavra para angariar interesses escusos.
O Senhor Jesus mostra-nos, com absoluta clareza, qual deve ser o comportamento daquele que ama o próximo: procurar sempre conservar a boa reputação das pessoas, não as denegrir e somente falar o que é desagradável quando instado a isto. O comportamento do Senhor Jesus em Seu julgamento é um exemplo a ser seguido por todos nós.
– A língua tem de ser dominada pelo Espírito Santo. Tiago bem o demonstra, ao mostrar que o homem, por si só, não tem como controlar o falar.
Não é à toa que, como ensina o pastor Luiz Henrique de Almeida Silva, da Assembleia de Deus Celebrando ao Senhor em Santa Bárbara D’Oeste (SP), o pioneiro das videoaulas da EBD na internet, que a língua é tão difícil de ser dominada que o envolvimento completo do cristão pelo Espírito de Deus é demonstrado precisamente pelo falar em línguas, o sinal do revestimento de poder, a apontar que é o último membro a se submeter ao pleno senhorio divino na vida de um cristão.
Pr. Caramuru Afonso Francisco
Fonte: https://www.portalebd.org.br/classes/adultos/7378-licao-6-expressando-palavras-honestas-i