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LIÇÃO Nº 12 – A BONDADE DE DEUS EM NOS ATENDER

INTRODUÇÃO

– Na continuidade da sequência do estudo do sermão do monte, analisaremos o ensino de Jesus sobre a bondade de Deus e os dois caminhos.

– Só Deus é bom.

I – A BONDADE DE DEUS

– Na sequência do estudo do sermão do monte, na sua última parte, em que o Senhor Jesus trata da prudência e da vigilância que devem ter o Seus discípulos na sua peregrinação terrena, analisaremos os ensinos sobre a bondade de Deus e sua ilustração sobre os dois caminhos.

– Depois de ter relembrado aos Seus discípulos que são eles imperfeitos e que devemos levar em consideração esta imperfeição e falibilidade no relacionamento com o próximo, assim como devem os servos preservar a santidade, Nosso Senhor e Salvador vai ensinar a respeito da bondade divina.

– O discípulo de Jesus, embora seja falho e imperfeito, é santo e, como tal, tem plena comunhão com Deus, que é seu Pai. Ante a condição que temos de filhos de Deus, Cristo nos mostra que temos plena liberdade de acesso ao Senhor.

– Por sermos filhos de Deus, por estarmos em comunhão com Ele, temos liberdade de Lhe fazer pedidos e a garantia de que seremos ouvidos.

– Diz o Senhor, com simplicidade e objetividade: “Pedi, e dar-se-vos-á; buscai e encontrareis; batei, e abrir-se-vos-á” (Mt.7:7).

– Jesus mostra-nos que temos agora um diálogo com Deus, que Ele nos ouve sempre. Isto se deve ao fato de não mais estarmos separados d’Ele pelo pecado (Is.59:2). Deus nos ouve porque Cristo retirou todo o pecado de nós.

– Por isso, podemos ir à Sua presença, confiante de que somos ouvidos e que estamos em comunhão com Ele. Como diz o escritor aos hebreus, temos ousadia para entrar no santuário, pelo sangue de Jesus, pelo novo e vivo caminho que Ele nos consagrou, pelo véu, isto é, pela Sua carne, e tendo um grande sacerdote sobre a casa de Deus, cheguemo-nos com verdadeiro coração, em inteira certeza de fé, tendo o coração purificado da má consciência e o corpo lavado com água limpa (Hb.10:19-22).

– Quando nos dirigimos ao Pai, temos fé n’Ele, confiamos n’Ele, de modo que nosso pedido deve ser feito com fé. Como ensina Tiago, não podemos nos apresentar diante do Senhor duvidando, pois quem duvida é semelhante à onda do mar, que é levada pelo vento e lançada de uma para outra parte e, deste modo, não receberemos coisa alguma da parte do Senhor (Tg.1:6,7).

– Ao longo de Seu ministério, o Senhor Jesus sempre enfatizou que o que propiciou o recebimento de bênçãos por parte daqueles que se dirigiram até Ele foi a fé que demonstraram. A expressão “A tua fé te salvou” é frequente nos Evangelhos (Mt.9:22; Mc.5:34; 10:52; Lc.7:50; 8:48; 17:19; 18:42).

– De igual modo, vemos que, em Nazaré, onde Jesus foi criado, tivemos o menor caso de realização de milagres, precisamente porque ali imperou a incredulidade (Mt.13:58; Mc.6:5,6).

– Quando o Senhor Jesus menciona que devemos pedir, também nos mostra que, apesar da comunhão que temos com Deus, não há aqui uma relação senão assimétrica, ou seja, no diálogo que travamos com o Pai, Ele é o Senhor e nós, Seus servos.

– Nosso papel é pedir, sabendo que a vontade d’Ele é que deve prevalecer. Temos liberdade para pedir, mas não deixa de ser um pedido, lembremos sempre disso, principalmente diante dos falsos ensinos da teologia da confissão positiva, que invertem este papel, dizendo que “Deus é obrigado a nos atender”, que podemos fazer “exigências” ao Senhor. Fujamos destes falsos conceitos, que contrariam frontalmente o que Jesus está a nos ensinar aqui.

– O pedido, além de ser com fé, tem de ser de acordo com a vontade do Senhor. Com efeito, em comunhão com o Senhor, passamos a não mais ter vontade própria, mas a vontade do Senhor. O próprio Jesus nos ensinou a pedir que se faça a vontade de Deus e não a nossa (Mt.6:10).

– Ao longo de nossa contínua intensificação da comunhão com o Senhor, vamos nos conformando à imagem (Rm.8:29) e, assim como Jesus, passamos a considerar que fazer a vontade do Pai é a razão da nossa própria existência sobre a face da Terra (Jo.4:34).

– Deste modo, passamos a querer o que Deus quer e, por causa disso, os nossos pedidos passam a ser cada vez mais atendidos, uma vez que passamos a pedir exatamente aquilo que o Senhor quer e a vontade de Deus não pode ser impedida.

– Assim, quando o Senhor disse que o que é pedido, é dado, devemos observar dentro do contexto dos demais ensinos contidos nas Escrituras, para não cairmos no falso ensino de que Deus é obrigado a atender à nossa vontade, aos nossos caprichos.

– Se pedirmos com fé, reconhecendo a soberania divina e de acordo com a vontade do Senhor, não há qualquer dúvida de que o pedido será atendido. Se pedirmos sem fé, nada receberemos; se pedirmos fora da vontade do Senhor, não haverá também atendimento.

– Cristo nos manda também buscar e, então, encontraremos. A palavra grega aqui é “dzeteo” (ζητέω), “…de origem incerta; buscar (literal ou figurado).

Especialmente (pelo hebraico) adorar (a Deus), ou (em um mau sentido) tramar (contra a vida):- ocupar-se de, desejar, esforçar-se, indagar, buscar, requerer…” (Bíblia de Estudo Palavras-Chave. Dicionário do Novo Testamento, verbete 2212, p.2224).

– Pelo que se verifica, portanto, o Senhor Jesus diz que o Seu discípulo, em seu diálogo com o Pai, deve “buscar”, ou seja, procurar com intensidade, adorar a Deus, desejar e se esforçar para que obtenha a bênção almejada.

É preciso que haja esforço, que haja dedicação no relacionamento com Deus para que se tenha, então, o encontro, ou seja, o atendimento, a satisfação daquilo que é pretendido.

OBS: João Crisóstomo (347-407) assim se expressa: “Nisso Ele acrescenta: “Busca e bate”, deu a entender que deve ser pedido com grande insistência e com força.

O buscador separa todo o resto de sua imaginação e olha apenas para o que está procurando. Aquele que bate vem com um espírito veemente e fervoroso” (Homiliae in Matthaeum, hom 23,4. In: Cátena áurea. Mt.7:7,8. Disponível em: https://hjg.com.ar/catena/c87.html Acesso em 14 mar. 2022) (tradução Google de texto em espanhol).

– O profeta Isaías disse que devemos buscar ao Senhor enquanto se pode achar e invocai-O enquanto está perto (Is.55:6).

Ainda que o contexto do profeta seja o daquele que está à procura do perdão divino, do ímpio, que não é o caso de que está a falar o Senhor Jesus aqui, quando já trata dos Seus discípulos, que já se encontram em comunhão, a mensagem do filho de Amós deve aqui ser lembrada.

– No texto do profeta messiânico, “buscar” é a palavra hebraica “daras” (שךד), “…(propriamente) pisar ou frequentar; (usualmente) seguir (para perseguição ou busca);

(por implicação) buscar ou perguntar; (especificamente) adorar: – perguntar, x de alguma maneira, cuidar, ter cuidado, x diligentemente, inquirir (…) questionar, requerer, buscar, procurar (por), x certamente.” (Bíblia de Estudo Palavras-Chave. Dicionário do Antigo Testamento, verbete 1875, p.1599).

– Enquanto o profeta diz que o ímpio deve se esforçar para procurar pelo Senhor enquanto Ele pode ser achado, Cristo diz que Seus discípulos, que já estão em comunhão com o Pai, devem ter a certeza que, ao buscarem a Deus, acha-l’O-ão.

– O que é interessante, porém, que esta certeza do encontro não dispensa a busca, a sequência de procura, a procura incessante e contínua por parte do discípulo de Jesus.

Devemos estar constantemente buscando ao Senhor. Não podemos ter “pausas”, “férias” em nossa vida com Deus. É algo que deve ser feito sem interrupção, enquanto peregrinarmos sobre a face da Terra.

– Jesus ensina-nos, portanto, que devemos seguir ao Senhor continuadamente. A vida com Deus é “segui-l’O”. O Senhor é bem claro ao dizer as etapas para alguém se tornar Seu discípulo: querer vir após Ele, negar-se a si mesmo, tomar a sua cruz e segui-l’O (Mt.16:24; Mc.8:34; Lc.9:23; Jo.12:26).

– Por primeiro, o discípulo de Jesus precisa demonstrar vontade de vir após Jesus. Aqui vemos, claramente, que, ao contrário do que ensinam os calvinistas, há, sim, o exercício da vontade, do livre-arbítrio na decisão de servir a Cristo.

– Por segundo, o discípulo de Jesus precisa negar a si mesmo, renunciar a si mesmo. É indispensável que abandonemos o “eu”, que deixemos a carne, o mundo e o pecado para que venhamos a alcançar a salvação. Torna-se necessário confessarmos os nossos pecados e deixá-los, passando, então, a fazer a vontade do Senhor.

– Por terceiro, o discípulo de Jesus deve tomar a sua cruz, ou seja, assumir a tarefa, a missão, a obra que lhe foi confiada pelo Senhor, sabendo que, ao exercê-la, a exemplo do seu Mestre, será odiado pelo mundo e perseguido (Jo.15:18-20).

Mas isto não pode nos desanimar. Como afirmou a poetisa sacra Frida Vingren (1891-1940): “Não desanimes por ser tua cruz maior que a do teu irmão, a mais pesada levou teu Jesus, te consola, então.

A tua cruz vai levando, como Jesus perdoando, alegremente andando pra o lindo céu” (segunda estrofe do hino 394 da Harpa Cristã).

– Por quarto, o discípulo de Jesus deve seguir a Jesus. Este seguimento nada mais é que esta busca incessante, esta procura ininterrupta pelas coisas de cima (Cl.3:1-3), um viver que esteja de acordo com o exemplo deixado pelo Senhor. Devemos seguir as pisadas do Mestre (I Pe.2:21).

Como diz conhecido cântico: “Vou seguir os passos de Jesus, vou levar comigo a minha cruz, se espinhos ferem os meus pés, eu vou descansar nos braços de Jesus”.

– O Senhor Jesus mostra-nos que, em nossa peregrinação terrena, é indispensável que tenhamos esta sequência, que persigamos o Senhor Jesus, buscando encontrá-l’O a cada momento, até que, no dia de nossa glorificação, vejamo-l’O face a face.

Como diz outro conhecido cântico: “A cada passo que eu dou na vida é um degrau a mais que subo ao céu(…) A cada passo vou me aproximando daquele lar que Cristo prometeu. E passo a passo sigo caminhando, a cada instante mais perto de Deus”.

– Esta ideia do esforço, da persistência está também envolvida na terceira expressão utilizada pelo Senhor: “batei, e abrir-se-vos-á”. Aqui a ilustração é a da porta fechada, que precisa ser aberta.

– Quando entramos em nosso aposento para orarmos ao Pai, Jesus recomenda que fechemos a nossa porta (Mt.6:6).

Para termos intimidade com o Senhor, para desfrutarmos do profundo relacionamento que temos com Ele, faz-se mister que nos desliguemos das coisas desta vida, que nos desprendamos das coisas deste mundo, das coisas terrenas.

– Mas, ao mesmo tempo que fechamos a porta para o mundo, é mister que batamos a porta dos céus. Interessante que temos o poder de fechar a nossa porta, mas não temos o poder de abrir a porta dos céus. Por quê? Porque somos servos e Ele é o Senhor. Porque não temos poder, Ele é o Todo-Poderoso. Aleluia!

– No entanto, se batermos na porta, Ele no-la abrirá. Ele está pronto a nos dar acesso à despensa dos Seus mistérios (I Co.4:1).

– Havendo esta persistência por parte do discípulo , Jesus nos garante que aquele que pede, recebe; que o que busca, encontra e, ao que bate, se abre (Mt.7:8).

Evidentemente, como já vimos, que tal recebimento, encontro e abertura hão de ter as condições já previstas: a fé, o reconhecimento da soberania divina e a conformação à vontade divina.

– Como afirma a glosa pertencente à Cátena Áurea: “Pedimos com fé, buscamos com esperança e batemos com caridade. Devemos primeiro pedir para alcançar, depois procurar encontrar e, depois de encontrar, guardar o que temos para entrar” (Mt.7:7,8. Disponível em: https://hjg.com.ar/catena/c87.html Acesso em 14 mar. 2022) (tradução Google de texto em espanhol).

– Mas, então, o Senhor Jesus irá nos apresentar um outro fator que nos animará a nos apresentar com nossos pedidos diante do Pai: a bondade divina.

– Jesus aqui apresenta a circunstância de que Deus é bom, e só Ele. Este mesmo ensino dado aqui no sermão do monte Cristo repetirá ao chamado “mancebo de qualidade”, a única pessoa que os Evangelhos registram que, mesmo desejoso de conhecer a Jesus, saiu da presença d’Ele triste e sem a salvação (Mt.19:16-30; Mc.10:17-31; Lc.18:18-30).

– Naquela oportunidade, quando este jovem, extremamente religioso, vai à presença de Jesus para indagar-lhe como poderia obter a vida eterna, chama ao Senhor de “Bom Mestre” (Mt.19:16; Mc.10:17; Lc.18:18).

– Jesus, entretanto, ao responder a esta respeitosa saudação, foi aparentemente ríspido, dizendo que não deveria ser chamado de bom porque bom só há um, que é Deus (Mt.19:17; Mc.10:18; Lc.18:19).

– O Senhor Jesus vai mostrar aos Seus discípulos que Deus é bom, o único ser que, por natureza, é bom e, por isso mesmo, não devemos ter qualquer dúvida de que Ele nos providenciará o que há de melhor para nós.

– Tudo quanto Deus faz é bom. Em a narrativa da criação, é dito que Deus viu tudo quanto havia feito e eis que era muito bom (Gn.1:31). Tiago mostra-nos que toda boa dádiva e todo dom perfeito vêm do alto, descendo do Pai das luzes, em que não há mudança nem sombra de variação (Tg.1:17).

– Se Deus é bom e tudo quanto faz é bom, não podemos, em momento algum, nem sequer titubear ou vacilar quanto ao intento de Deus para conosco, quanto às Suas ações em relação a nós.

– Deus sempre nos dá o bem, pois nos quer bem. Deus é benigno (Sl.145:8; Lc.6:35; I Pe.2:3). Deste modo, é contra a Sua própria natureza desejar o mal ao homem, de modo que Ele jamais nos fará o mal.

– As ações de Deus sempre são boas e, como discípulos , devemos ter sempre isto na mente e no coração. O profeta Jonas tinha esta consciência e, por isso, relutou em ir a Nínive, pois sabia que, em fazendo a pregação, Deus perdoaria aquele povo inimigo dos israelitas se ele se arrependesse, como, ao final e ao cabo, acabou por acontecer (Jn.4:2).

– O Senhor Jesus mostra, então, em Seu ensino, que os homens, mesmo sendo maus, sempre dão boas coisas aos seus filhos.

Que pai dará uma pedra ao filho que lhe pedir pão? Que pai dará uma serpente ao filho que lhe pedir peixe? Ora, se os homens, maus como são, dão boas dádivas aos seus filhos, quanto mais o Pai celestial não dará bens aos que lhO pedirem?

– Esta afirmação do Senhor Jesus, tão clara e objetiva, mostra quão pequena é sempre a nossa fé. Assim como fez quando nos ensinou a respeito do sustento material sobre a face da Terra, quando provou que o Senhor que sustenta as aves dos céus e veste os lírios do campo jamais deixará sem sustento e sem vestimenta os Seus filhos,

Cristo também nos mostra que, se os homens pecadores não deixam de fazer o bem a seus filhos, quanto mais o Pai celestial deixará de fazer o bem para aqueles que adotou como filhos por terem crido em Cristo como Senhor e Salvador.

– Entendamos, aliás, que, “bens” aqui é a palavra grega “agatha” (άγαθα), “…’bem’ (em qualquer sentido, mas normalmente como substantivo): – benefício, bom (boas [coisas], bem…” (Bíblia de Estudo Palavras-Chave. Dicionário do Novo Testamento, verbete 18, p.2025).

Assim, seu significado é de “boas coisas”, “benefícios”, e não de “coisas materiais”, de “bens materiais”, como alguns têm ensinado, distorcendo o texto, a fim de conformá-lo à falsa doutrina da teologia da prosperidade.

– Tanto assim é que Lucas, ao retratar estes mesmos ensinos de Jesus, traz-nos uma importante informação, ao apontar qual seria o principal bem que o Senhor quer nos dar, a saber, o Espírito Santo (Lc.11:13).

Este é o principal bem que o Senhor nos quer dar e Ele no-l’O dá quando cremos no Evangelho (Jo.7:38,39; Ef.1:13) e O derrama sobre nós, enchendo-nos d’Ele, quando somos batizados no Espírito Santo (At.2:4), revestindo-nos de poder (Lc.24:49) e nos fazendo Suas testemunhas (At.1:8).

– Não é por outro motivo que o apóstolo Paulo faz questão de dizer que, por sermos discípulos , já fomos abençoados com todas as bênçãos espirituais nos lugares celestiais em Cristo (Ef.1:3).

Não temos, pois, motivo algum para duvidarmos de que Deus nos quer bem, pois já nos pôs num patamar espiritual superior, deixando-nos à disposição todas as coisas de cima, que devemos buscar (Cl.3:1-3).

– Deus quer sempre nos dar o bem e, por isso, tenhamos a plena convicção de que Ele sempre nos dará o bem.

Como disse o Pseudo-Crisóstomo: “Como o Senhor nem sempre concede tudo o que lhe é pedido, mas apenas o que é bom, por isso acrescenta oportunamente coisas boas.” (Opus imperfectum in Matthaeum, hom. 18. In: Cátena áurea. Mt.7:9-11. Disponível em: https://hjg.com.ar/catena/c88.html Acesso em 14 mar. 2022) (tradução Google de texto em espanhol).

– Por isso mesmo, temos aqui mais um fator a acrescentar com relação aos pedidos que apresentamos e cujo atendimento buscamos em nossa persistência ao Senhor: o pedido será atendido se for para o nosso bem.

– Nem sempre o que pedimos é para o nosso bem. Tiago fala-nos desta verdade espiritual ao dizer que, muitas vezes pedimos para gastarmos em nossos próprios deleites e o irmão do Senhor diz que tais pedidos são maus pedidos (Tg.4:3). Tais pedidos não são atendidos, porque Deus não nos quer nem nos faz o mal.

– Há circunstâncias em que o pedido, embora traga um mal, é, sim, concedido pelo Senhor, porque este mal imediato traz um bem maior.

Foi o que ocorreu quando os israelitas pediram um rei. Tal pedido não era bom, pois Israel, ao fazê-lo, rejeitou o reinado do próprio Senhor e quis ser igual às demais nações (I Sm.8:7,8). Deus, inclusive, não escondeu a Sua desaprovação com tal pedido (I Sm.12:17-19).

– Mesmo assim, Deus permitiu que Israel se tornasse uma monarquia porque, através deste novo sistema de governo, o Senhor deu prosseguimento ao plano para a salvação do homem, escolhendo Davi como rei, depois de Saul (I Rs.8:16) e fazendo com que de sua linhagem viesse o Salvador (II Sm.7:12-17).

Assim, o mau pedido trouxe um bem infinitamente superior, que foi a vinda do Salvador para toda a humanidade, Salvador que, necessariamente, tinha de ser rei.

– E notemos, a propósito, que o mau pedido se tornou um bem maior precisamente quando Deus estava a rejeitar um bom pedido de Davi, que queria construir um templo ao Senhor. Só Deus é bom e sabe, por isso, o que é melhor para os seus filhos.

– Por isso, tenhamos a consciência de que, embora falhos e imperfeitos, somos filhos de Deus e, como tal, temos plena liberdade para Lhe apresentar pedidos e para neles insistir, mas nunca nos esqueçamos de que, como Deus é bom, Ele sempre nos dará o melhor e que este melhor nem sempre se coaduna com a nossa vontade.

II – A REGRA DE OURO

– A partir do ensino sobre a falibilidade e imperfeição de Seus discípulos e da confiança que devemos ter em nosso Pai, mantendo-nos em santidade e confiando em Sua bondade, traz o Senhor Jesus o que se costumou denominar de “regra de ouro” e que mostra a síntese de todo o comportamento que Seus discípulos devem ter sobre a face da Terra e que mostram a singularidade da doutrina cristã frente a todas as demais religiões e filosofias religiosas e/ou morais existentes.

– Disse o Senhor Jesus: “Portanto, tudo o que vós quereis que os homens vos façam, fazei-lho também vós, porque esta é a lei e os profetas” (Mt.7:12).

– A chamada “regra de ouro” é apontada como a “síntese de todas as religiões”, como a “essência da ética religiosa”.

É com base nela que se tem defendido o “diálogo interreligioso”, a “união de todas as religiões”, consoante se verifica no “Parlamento Mundial das Religiões” ou “Parlamento das Religiões do Mundo”, uma organização surgida em Chicago, entre 11 de setembro e 27 de setembro de 1893, cuja ideias de “harmonia ecumênica” tem hoje o amplo apoio da Organização das Nações Unidas.

OBS: A “Declaração das Religiões” do referido Parlamento apresenta a “regra de ouro” como esta síntese da religião. Diz o teólogo holandês Hans Küng (1928-2021), seu redator:

“…Para uma atitude autenticamente humana, lembramos especialmente a Regra de Ouro que tem sido

mantida em muitas religiões e tradições éticas há milhares de anos: aquilo que você não quer que seja feito a você, não o faça a outros.

Ou, afirmativamente: aquilo que você quer que lhe seja feito, faça-o aos outros. Essa deveria ser a norma irrevogável e incondicional para todas as áreas da vida, para as famílias e as comunidades, para as raças, nações e religiões.

A autodeterminação e a autorrealização são absolutamente legítimas – enquanto não estiverem separadas da responsabilidade individual e da responsabilidade global, da responsabilidade pelos outros seres humanos e pela natureza.

Toda forma de egoísmo, contudo, toda autorreferência, seja ela individual ou coletiva, seja na forma de pensamento de classe, racismo, nacionalismo ou sexismo, deve ser rejeitada. Por isso impede os humanos de ser autenticamente humanos.

A regra de ouro implica padrões muito concretos aos quais nós, humanos, deveríamos e gostaríamos de nos apegar firmemente, pois concernem ao bem-estar tanto dos indivíduos como da humanidade.

Existem, acima de tudo, quatro antigas orientações para o comportamento humano, que são encontradas na maioria das religiões do mundo. Deveriam ser evocadas junto com uma visão para uma ordem mundial melhor…” (Declaração do Parlamento das Religiões do Mundo. Disponível em: https://www5.pucsp.br/ecopolitica/documentos/cultura_da_paz/docs/Hans_Kung_DECLARACAO_PARLAMENTO_RELIGIOES_MUNDO.p df Acesso em 14 mar. 2022).

– No entanto, quando verificamos a regra de ouro nas mais diversas religiões, há uma profunda diferença.

Em todas as religiões, a regra de ouro é negativa em sua formulação: “não faça aos outros o que não querem que lhe faça”. Jesus, porém, afirma que “faça aos outros o que querem que lhe faça”, ou seja, a formulação é positiva.

– Isto revela, claramente, que, nas religiões que partem do homem, nestas vãs tentativas humanas de se religar a Deus, há um profundo egoísmo, há uma relutância em fazer o bem. Contentam-se os homens em apenas não fazer o mal ao próximo, em se abster de o prejudicar, havendo, com isto, a satisfação do “senso de justiça” puramente humano.

– Não poderia ser diferente. Toda ação humana que se baseia no amor humano, no sentimento puramente humano, esbarra na questão do interesse próprio, do benefício para si e, portanto, não se tem outro comportamento senão da autopreservação,

o da consideração de si próprio como critério de bem e de mal, até porque o homem, na sua tentativa de se religar a Deus, quer que tal religação se faça mediante os critérios e parâmetros humanos, pois tudo parte da crença na mentira satânica de que se é igual a Deus, sabendo o bem e o mal (Gn.3:5).

– Mesmo o judaísmo, que, a princípio, deveria ser diferente, já que Deus escolheu Israel como Sua propriedade peculiar dentre os povos e Lhe entregou a lei, revelando-Lhe a vontade, não fugiu desta situação, porquanto os escribas e fariseus, como Jesus bem mostra no sermão do monte, distorceram os mandamentos e os conformaram à sua pecaminosidade, fazendo surgir uma religiosidade que estava muito aquém do padrão querido pelo Senhor.

– Assim, o grande doutor da lei, Hilel (60 a.C.- 9 d.C.) invocou a regra de ouro na formulação negativa também para o judaísmo, ao ensinar que

“…O que é odioso para você não faça a outro; essa é toda a Torá, e o resto é sua interpretação. Vá estudar.” (Talmude da Babilônia. Shabat 31-a. Disponível em: https://www.sefaria.org/Shabbat.31a.6?ven=William_Davidson_Edition_-_English&vhe=William_Davidson_Edition_-_Vocalized_Aramaic&lang=bi&with=all&lang2=en Acesso em 14 mar. 2022) (tradução Google de texto em inglês).

– Jesus, entretanto, não faz isto. Formula a regra de ouro em seu aspecto afirmativo, porque o Seu discípulo é filho de Deus e Deus é bom, toma a iniciativa de fazer o bem, não o faz por reação, em retribuição a algum mérito que tenha o homem. O homem é mau e, por isso, Deus toma a atitude de lhe querer bem, de lhe fazer bem.

– O discípulo de Jesus deve fazer ao outro o que quer que lhe façam, pois esta é a vontade de Deus. Devemos fazer o bem como o nosso Pai, pois, unidos a Ele, sendo participantes de Sua natureza (II Pe.1:4), temos de querer e fazer o bem, já que, entre as qualidades do fruto do Espírito, estão a benignidade e a bondade (Gl.5:22; Mt.5:7,8).

– O discípulo é portador do amor de Deus que lhe foi derramado no coração pelo Espírito Santo (Rm.5:5) e, portanto, suas ações não são dirigidas pelo amor humano, como ocorre com as pessoas religiosas em geral, mas, sim, pelo amor de Deus, um amor que é sofredor, benigno, não é invejoso, não trata com leviandade, não se ensoberbece, não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal, não folga com a injustiça, mas folga com a verdade, tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta (I Co.13:4-7).

– O padrão para o nosso relacionamento com o próximo, portanto, deve ser sempre o amor. É o mandamento que nos deixou o Senhor Jesus: que nos amemos uns aos outros, como Ele nos amou (Jo.15:12). E Ele provou este amor morrendo por nós quando ainda éramos pecadores (Rm.5:8), dando a Sua vida por nós (Jo.15:13; I Jo.3:16).

– O discípulo de Jesus deve estar pronto a dar a sua vida pelos irmãos (I Jo.3:16), a começar de nosso irmão mais velho, o próprio Senhor Jesus (Rm.8:29). Paulo prova que realmente imitava Cristo ao ter esta consciência e disposição (At.20:22-24; Fp.1:20,21; II Tm.4:6-8).

– Somente seremos exitosos em nossa peregrinação terrena se pautarmos o nosso comportamento pelo amor de Deus, se efetivamente amarmo-nos uns aos outros como Jesus nos amou, se fizermos aos outros o que queremos que eles façam a nós.

III – OS DOIS CAMINHOS

– Depois de ter ensinado sobre a bondade divina e a chamada “regra de ouro”, o Senhor Jesus faz uma ilustração para que Seus discípulos entendam, perfeitamente, a realidade da vida terrena e como devemos nos conduzir enquanto aqui estivermos.

– Jesus mostra que há dois caminhos. Um caminho conduz à perdição, cuja porta é larga e o caminho, espaçoso, sendo muitos os que entram por esta porta; outro é um caminho apertado, cuja porta é estreita, o caminho que leva à vida, e poucos há que encontrem esta porta (Mt.7:13).

– Esta ilustração de Jesus teve efeito imediato em Seus discípulos e na própria multidão que O ouviu, a ponto de que os cristãos foram conhecidos entre os judeus como sendo os do “Caminho” (At.19:9,23; 22:4; 24:14,22).

– Esta concepção dos cristãos como sendo os seguidores do “Caminho” perdurou durante os primeiros anos da igreja, tanto que a Didaquê, o mais antigo “manual de discipulado” conhecido dos cristãos, começa precisamente por relembrar este ensino de Jesus a respeito dos dois caminhos.

OBS: Assim começa a Didaquê: ”Há dois caminhos, um de vida e um de morte, mas uma grande diferença entre os dois caminhos.…” (Apócrifos
e Pseudo-epígrafos da Bíblia. Trad. de Cláudio J.A. Rodrigues. São Paulo: Novo Século, 2004, p.765).

– A palavra grega aqui é “hodos” (ὁδός), “…aparentemente, uma palavra primária, uma estrada; (consequentemente) um progresso (a rota, ato ou distância); (figurado) um modo ou meio:- jornada, caminho, estrada…” (Bíblia de Estudo Palavras-Chave. Dicionário do Novo Testamento, verbete 3598, p.2315).

– Nota-se, mais uma vez, que o Senhor Jesus diz que a vida cristã é uma “continuidade”, uma “estrada”, um “progresso”, exatamente, aliás, como tratará John Bunyan (1628-1688), que intitulou a sua famosa alegoria da vida cristã como “O Progresso do Peregrino”, mais conhecida como “O Peregrino”, mas não sendo este o nome efetivo da obra.

– A vida cristã, a peregrinação terrena do discípulo de Jesus é um “caminho”, uma “estrada”, uma “continuidade”, que começa pela “entrada na porta estreita”. Esta porta estreita é o Senhor Jesus (Jo.10:7,9).

– Notemos que o Senhor diz que devemos entrar pela porta estreita, ou seja, depende de uma decisão de cada ser humano escolher qual caminho deve trilhar, o que faz com que não se possa crer na doutrina da predestinação incondicional.

Estivessem os adeptos deste falso ensino corretos, o Senhor diria que teria posto este no caminho apertado e outro, no espaçoso. Entretanto, somos nós quem decidimos entrar pela porta estreita. Portanto, não é Deus quem escolhe previamente quem irá, ou não, se salvar.

– A porta é estreita, porque Jesus nunca pecou (Jo.8:46; Hb.4:15; 9:28), é o cordeiro inocente (Lc.23:4,14,22), sem defeito, que foi imolado por nós e que, por Seu sacrifício, consagrou um novo e vivo caminho (Hb.10:20), o caminho santo (Is.35:8).

– O caminho é apertado, porque devemos nele apenas seguir as pisadas de Jesus, que nos deixou o exemplo (I Pe.2:21). Não há espaço para o pecado, para a maldade, para as ideias e concepções humanas ou diabólicas. Aqui a religião é única; a doutrina é única; o Senhor é único e as atitudes e palavras também são

“sim, sim”; “não, não”. Não há atalhos, não há bifurcações, encruzilhadas. É o caminho reto, onde estão os de coração sincero, os fíéis a Deus e os servos do Senhor (Sl.101:2,6).

– Ele é apertado, ou seja, cheio de dificuldades, sem quaisquer concessões, que exige equilíbrio e contínua vigilância para que não se tenha qualquer transgressão. No entanto, ele leva à vida, porque, quando entramos pela porta estreita, encontramos o Pai (Jo.14:6), entramos em comunhão com Deus e, se trilharmos o caminho até o fim, chegaremos às mansões celestiais, ao trono do Senhor (Hb.12:2; Ap.3:21).

– O outro caminho tem uma porta larga. É o caminho em que tudo se permite, em que nada se proíbe. É o caminho que aceita toda e qualquer religião; toda e qualquer conduta; todo e qualquer pecado. O caminho é espaçoso, pois se dá espaço a tudo o que se desejar nele pôr.

– Neste caminho espaçoso, o andar é bem mais fácil, não há qualquer preocupação com transgressão, pois há espaço para todos andarem e se pode andar em qualquer lugar, numa extremidade, ou outra, ou mesmo no centro, no meio da pista. Ninguém se preocupa com regras, todos querem fazer prevalecer as suas concepções, as suas vontades, os seus pontos-de-vista.

– É o caminho em que o grande ausente é o Senhor. Como disse, certa feita, o escritor russo Fiódor Dostoiévski (1821-1891), “se Deus não existe, tudo é permitido”. Deus é completamente ignorado neste caminho e, por isso mesmo, este caminho conduz à perdição. Quem vive sobre a face da Terra como se Deus não existisse, viverá também a eternidade sem o Senhor.

– Jesus, por fim, faz uma constatação: são poucos os que encontram a porta estreita. A grande maioria das pessoas irá se perder.

Lamentavelmente, esta é a verdade. São poucos os que crerão em Jesus, que alcançarão a salvação. Lutemos, pois, amados irmãos, para que façamos parte deste “pequeno rebanho” que faz parte do reino de Deus (Lc.12:32).

– Como afirma Jerônimo (347-420): “Falando neste sentido de ambos os caminhos, ele diz que há muitos que andam pelo caminho largo e poucos que andam pelo caminho estreito. Não buscamos o caminho largo nem precisamos encontrá-lo, porque ele se oferece espontaneamente, e é o caminho de quem erra.

Mas o caminho estreito não é encontrado por todos, nem os que o encontram entram imediatamente. Muitos depois de terem encontrado o caminho da verdade, cativados pelos prazeres do mundo, desviam-se do meio do caminho.” (In: Cátena áurea. Mt.7:13,14. Disponível em: https://hjg.com.ar/catena/c90.html Acesso em 14 mar. 2022) (tradução Google de texto em espanhol).

Pr. Caramuru Afonso Francisco

Fonte: https://www.portalebd.org.br/classes/adultos/7384-licao-12-a-bondade-de-deus-em-nos-atender-i

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