LIÇÃO Nº 7 – INTEGRIDADE EM TEMPOS DE CRISE
Confira também leitura diária da lição 06.
Comentado por: Ev. Caramuru Afonso Francisco
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A fidelidade demonstra-se cabalmente nos momentos de aflição.
INTRODUÇÃO
– Na sequência do estudo do livro do profeta Daniel, analisaremos hoje o seu capítulo seis.
– O episódio de Daniel na cova dos leões revela-nos que a fidelidade se demonstra cabalmente nos momentos de aflição.
I – DANIEL SOBRESSAI-SE NO REINADO DE DARIO, O MEDO
– Na sequência do estudo do livro do profeta Daniel, analisaremos hoje o seu capítulo seis, o último capítulo da chamada “parte histórica” daquele livro, em que nos é relatado o episódio de Daniel na cova dos leões, talvez a passagem mais conhecida deste livro das Escrituras Sagradas.
– Conforme vimos na lição anterior, o Império Babilônico ruiu naquela mesma noite em que Daniel se tornou o “terceiro dominador do reino”, ao decifrar e interpretar a mensagem escrita por Deus na parede do salão de festas do palácio real, onde o rei Belsazar estava a realizar um banquete para mil de seus grandes.
– Belsazar foi morto e os medos e persas invadiram Babilônia, pondo fim a este império mundial, o primeiro da sequência de impérios que viria sobre a face da Terra até a redenção de Israel, tudo conforme havia sido revelado ao rei Nabucodonosor no sonho da estátua que foi interpretado pelo próprio Daniel, como vimos ao estudar o capítulo dois.
– Conforme aquele sonho e a própria mensagem escrita por Deus no palácio de Belsazar, Babilônia foi entregue para um novo império, império este que seria constituído por duas nações (daí os dois braços de prata da estátua do sonho de Nabucodonosor): os medos e os persas.
– “…Os medos foram uma das tribos de origem ariana que migraram da Ásia Central para o planalto Iraniano, posteriormente conhecida como Média, e, no final do século VII a.C., fundaram um reino centrado na cidade de Ecbátana.
Sua língua pertencia ao tronco indo-europeu. Os medos destacaram-se pela administração de seu reino, especialmente organizada em comparação aos grandes reinos da época, como a Assíria, a Lídia e a Fenícia. Também mantinham um exército baseado em infantaria armada com espadas de ferro e escudos, arqueiros e cavaleiros com lanças. As demais tribos arianas, como os persas e os partos, permaneceram tributários dos medos por vários séculos. Atualmente os curdos declaram ser os atuais descendentes dos medos.…” (Medos. In: WIKIPÉDIA. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Medos Acesso em 09 set. 2014).
– Os medos se aliaram aos babilônios na época do rei Nabopolassar, pai de Nabucodonosor e ajudaram a vencer os assírios, o que deu origem ao Império Babilônico. Depois se uniram aos persas e passaram a atacar Babilônia, sendo certo que, quando da invasão de Babilônia, já nos dias de Nabonido e Belsazar, havia uma aliança entre os medos e os persas, daí ter o Senhor dito, na mensagem que escreveu na parede estucada do palácio real, que o reino seria dado tanto aos medos quanto aos persas.
– As inscrições encontradas e que relatam a invasão de Babilônia dão conta de que as tropas dos medos e persas eram comandadas por Gobrias, também chamado de Ciaxares e de Dario, precisamente o Dario que é mencionado no capítulo seis do livro do profeta Daniel, que era o sogro de Ciro. Dario era o rei dos medos e Ciro, o rei dos persas.
“…Dario comandou também os exércitos que conquistaram Babilônia, enquanto Ciro se ocupava em suas guerras, no Norte e no Oeste. Dario reinava em seu lugar. Fora predito que os medos seriam os conquistadores de Babilônia (Ver Is.13:17; Jr.51:11,20). Até Ciro assumir o poder, a ordem era ‘medos e persas’ (5:28 e 6:8). Depois, falava-se ‘persas e medos’ (Et.1:14,14,18,.19).…” (SILVA, Severino Pedro da. Daniel versículo por versículo, pp.109-10).
OBS: “…Carl Friedrich Keil e Franz Delitzch, em 1857-78, identificam Dario, o medo, com Ciáxares II, mencionado na Ciropédia de Xenofonte como o sucessor de Astíages; ele era tio de Ciro, o Grande (através de Mandane) e casou sua filha com Ciro. Por não ter filhos homens, ele entregou a Média para Ciro, e teria recebido a Babilônia como satrapia, aos sessenta e dois anos de idade…” (Dario, o medo. In: WIKIPEDIA. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Dario,_o_Medo Acesso em 09 set. 2014).
– Assim, como se pode verificar, os medos e persas estavam unidos na invasão de Babilônia e, num primeiro momento, Dario, o medo, rei dos medos, assumiu o governo da Babilônia, como uma espécie de rei vassalo, um rei com poderes limitados, tendo, depois, sido substituído pelo próprio Ciro, que era o rei dos persas.
OBS: “…Tem sido grande a contenda dos estudiosos, bem como as investidas da falsa crítica em torno deste versículo, e do anterior (5.31), que mencionam Dario, o medo, como o primeiro governante de Babilônia. Dario governou Babilônia enquanto Ciro completava suas conquistas no Norte e no Oeste, por uns dois anos. De fato, em Daniel 9.1 se afirma que ele foi “constituído rei” sobre os caldeus.
A Tradução Brasileira diz em Daniel 5.31 que Dario “recebeu” o reino. Ele foi na realidade um vice-rei. Em Daniel 6.14 se vê que ele nada podia fazer para alterar a lei, ao passo que Ciro, logo que assumiu o trono, libertou os hebreus do cativeiro e acabou com o regime de escravidão de outros povos, instaurado por Nabucodonosor. Belsazar é também chamado “rei” em Daniel 5.30; entretanto, ele era realmente o segundo na escala de comando (5.7b).…” (GILBERTO, Antonio. Daniel e Apocalipse, p.30).
– Pois bem, este Dario, o medo, que assumiu o governo da Babilônia após a morte de Belsazar, de modo milagroso, manteve Daniel como alto funcionário do seu governo, uma situação inusitada e que não se repetiria mais em toda a história da humanidade. Certamente, Dario, o medo foi informado a respeito da mensagem escrita na parede do palácio real e que Daniel a havia interpretado e se tornado o “terceiro dominador do reino” e isto foi de grande impacto para o novo governante que resolveu mantê-lo na administração do novo governo.
– Como dissemos na lição anterior, vemos, mais uma vez aqui, que Deus não estava apenas a falar com os gentios nas revelações que dava a Daniel, mas, sobretudo, através deste profeta, mostrava ao povo judeu que não o havia abandonado e que iria cumprir todas as promessas messiânicas. Simultaneamente, Deus preservava o seu profeta, precisamente para que ele tivesse as visões e relatasse as profecias referentes ao futuro do povo de Israel.
– Dario, o medo, como já pudemos relatar, vinha de um reino muito cuidadoso em termos administrativos, tendo sido este, aliás, o grande legado que os medos e persas deixaram para a humanidade, pois nenhum reino, até então, foi tão bem estruturado em termos de administração pública como o Império Medo-Persa.
– Dentro desta realidade, não é surpresa que Daniel tenha registrado no limiar do capítulo seis, precisamente a preocupação de Dario, o medo em bem organizar administrativamente o seu reino, constituindo sobre ele cento e vinte presidentes (Dn.6:1).
– Mas, além destes cento e vinte presidentes, Dario, o medo, dentro da ótica de que uma boa administração sempre exige descentralização, pensou em constituir três príncipes, que supervisionassem os cento e vinte presidentes e que se reportassem ao rei. Ao nomear estes três príncipes, um deles foi o próprio Daniel, que, como vimos, havia sido encontrado como “terceiro dominador do reino” quando da invasão de Babilônia.
– De pronto, verificamos que a situação de Daniel era inusitada e delicada. A Bíblia não nos relata quem eram os outros dois príncipes, mas é até intuitivo pensar que se tratavam de homens de confiança do próprio Dario, o medo, ou seja, gente que pertencia ao exército dos medos.
Daniel, assim, era um “corpo estranho” neste triunvirato, visto que se tratava de um funcionário do governo anterior, do império anterior que havia sido debelado. Só esta circunstância era suficiente para despertar o ciúme e a inveja dos demais altos funcionários da corte de Dario.
OBS: “…Daniel era um dos 120 administradores, e de tal modo se houve que os seus companheiros se encheram de inveja. Havia nele, em Daniel, aquele espírito excelente, e o rei pensava até em estabelecê-lo sobre todo o reino (v. 3). Em que consistia esta superioridade não sabemos, nem o texto o diz, mas possivelmente seria colocado como chefe do grupo, uma espécie de superintendente-geral. Era isso que os outros não aceitavam. Um exilado governar sobre eles não era tolerável.…” (MESQUITA, Antonio Neves de. Estudo no livro de Daniel, p.46)
– Lembremos, por ser oportuno, que Daniel contava, nesta época, com cerca de noventa anos de idade, pois o primeiro ano de Dario, o medo, coincidiu com os setenta anos de cativeiro dos judeus na Babilônia (Dn.9:1) e, conforme Edward Reese e Frank Klassen, Daniel tinha entre 22 e 23 anos de idade quando foi levado cativo, de modo que possuía, nesta oportunidade, entre 92 e 93 anos de idade. Sua idade avançada, também, representava um outro motivo para que fosse hostilizado pelos demais funcionários da corte de Dario.
– Apesar de toda a hostilidade e das evidentes dificuldades que Daniel teve de enfrentar nesta sua função, diante da sua posição na própria corte, o fato é que Daniel estava se desempenhando muito bem no cargo, a tal ponto que Dario, o medo pensava em constituí-lo sobre todo o reino, fazendo dele uma espécie de “vice- rei” ou “primeiro-ministro”, diante da sua excelência (Dn.6:3).
– Daniel, diante dos acontecimentos decorrentes do banquete de Belsazar, notara claramente que a vontade do Senhor era que ele saísse de sua “aposentadoria” e retornasse a ter proeminência no reino de Babilônia. Este discernimento espiritual não era sem motivo, pois, como haveremos ainda de estudar neste trimestre, desde o primeiro ano de Belsazar, Dario começou a receber revelações do Senhor a respeito do futuro do povo judeu (Dn.7:1; 8:1).
– Daniel bem sabia, portanto, que o domínio dos medos e persas sobre Babilônia fazia parte do propósito divino para a redenção do povo de Israel e que, portanto, não havia sido coincidência alguma a sua volta à administração da Babilônia, seja se tornando, por algumas horas, o “terceiro dominador do reino”, circunstância que o livrou da morte quando da invasão de Babilônia, seja a sua nomeação como um dos príncipes no governo de Dario, o medo.
– Sabendo que era a vontade de Deus que se tornasse príncipe de Babilônia, Daniel começou, então, a dedicar-se com esmero nesta sua nova função, mantendo a mesma lealdade com o novo monarca como havia feito no governo de Nabucodonosor, pois Daniel sabia que não estava a servir apenas a Dario, o medo, mas, sim, estava a servir ao Senhor.
– É esta a postura que deve ser adotada por todo servo de Deus. O apóstolo Paulo ensina-nos que devemos obedecer aos nossos senhores segundo a carne, com temor e tremor, na sinceridade do nosso coração, como a Cristo, não servindo à vista, como para agradar aos homens, mas como servos de Cristo, fazendo de coração a vontade de Deus, servindo de boa vontade como ao Senhor e não como aos homens, sabendo que cada um receberá do Senhor todo o bem que fizer (Ef.6:5-8a).
– Que bom seria, amados irmãos, que tivéssemos esta integridade, como teve Daniel! Daniel era inteiramente dedicado ao Senhor, era inteiramente voltado para agradar a Deus! Havia percebido que o Senhor o pusera novamente na administração pública e que, naquela posição, era deveria ser tão profeta de Deus, tão servo de Deus como era em seus períodos de oração e de busca de intimidade com Deus, quando lhes eram dadas visões e revelações.
– Daniel não era servo de Deus somente quando orava três vezes ao dia em seu quarto, mas, também, quando estava a tomar contas dos presidentes que estavam sob sua supervisão (provavelmente, quarenta presidentes, já que eram três príncipes). Daniel não era servo de Deus apenas na hora da alimentação, quando não se contaminava com a porção do manjar do rei, mas, também, era servo de Deus quando exercia as suas funções de príncipe.
– Integridade representa precisamente esta conduta que faz com que a pessoa inteira, em todas as áreas da sua vida, tem o mesmo porte, o mesmo comportamento e, em termos espirituais, a pessoa que se dedica inteiramente a agradar a Deus, tudo fazendo não para os homens, mas para Deus, precisamente a conduta recomendada pelo apóstolo Paulo como já dissemos supra.
OBS: “…Integridade vem do latim integritate, significa a qualidade de alguém ou algo ser íntegro, de conduta reta, pessoa de honra, ética, educada, brioso, pundonoroso , cuja natureza de ação nos dá uma imagem de inocência, pureza ou castidade, o que é íntegro, é justo e perfeito, é puro de alma e de espírito.
São exemplos de integridade moral e corporal: a vida íntegra, a integridade física, dos bens sociais e individuais, integridade da honra e da fama, a integridade da intimidade pessoal, do nome, da imagem e dos sentimentos. É indiscutível a admissão da existência de determinados bens da personalidade e sua integridade, portanto, esta coaduna com o respeito, e este com a moral, e, quem tem moral, é íntegro.…” (Integridade. In: WIKIPEDIA. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Integridade Acesso em 09 set. 2014).
– É preciso servir a Deus de coração inteiro (II Cr.19:9), pois somente se O buscarmos de coração inteiro, encontrá-l’O-emos (II Cr.15:2; Jr.29:13). O Senhor quer o nosso coração (Pv.23:26) e devemos dar-Lhe todo, pois Deus deve ser amado sobre todas as coisas, não aceita dividir com ninguém o domínio sobre a nossa vida.
– Integridade é, portanto, esta característica de nos deixarmos dominar totalmente pelo Senhor, de nos entregarmos a Ele, de nos rendermos a Ele, de modo que possamos dizer como disse o apóstolo dos gentios: “Já estou crucificado com Cristo e vivo não mais eu, mas Cristo vive em mim e a vida que agora vivo na carne, vivo-a na fé do Filho de Deus, o qual me amou e se entregou a Si mesmo por mim” (Gl.2:20).
– Jesus, durante o Seu ministério terreno, foi íntegro, pois Se dedicou inteiramente à obra que Lhe havia sido dada pelo Pai, a ponto de ter dito que a Sua comida era fazer a vontade d’Aquele que O havia enviado e realizar a Sua obra (Jo.4:34), a ponto de ter resumido a Sua existência terrena como glorificar o Pai na Terra consumando a obra que Lhe fora dado fazer (Jo.17:4).
– Precisamos imitar Jesus Cristo (I Co.11:1), seguir-Lhe as pisadas (I Pe.2:21) e, por isso mesmo, o Senhor nos concita a que, se quisermos segui-l’O, devamos tomar a Sua mesma atitude, renunciando a nós mesmos, tomando a cruz e, só então, segui-l’O (Mt.16:24; Mc.8:34; Lc.9:23). A vida cristã exige integridade, devemos nos entregar totalmente ao Senhor para que cheguemos ao céu. Temos feito isto?
– Daniel entendeu que deveria, no exercício de sua função de príncipe, dedicar-se integralmente, glorificar o nome do Senhor, ter um comportamento de fidelidade a Deus, em primeiro lugar, e, naturalmente, diante desta fidelidade a Deus, ser leal para com o rei Dario.
– Nesta sua conduta dedicada e íntegra, Daniel, mais uma vez, apresentou-se como tendo “um espírito excelente”. A integridade revela a presença do Espírito Santo em nós. Somos o templo do Espírito Santo (I Co.6:19), porque Ele veio habitar em nós quando cremos em Jesus e, por isso, temos de ter um comportamento ainda mais excelente que o de Daniel, no qual o Espírito não habitava, pois isto é prerrogativa apenas daqueles que estão na dispensação da graça (Jo.14:17), mas que vinha visitá-lo frequentemente, já que se tratava de um profeta do Senhor.
– Daniel, ainda no governo de Nabucodonosor, quando talvez contasse com cerca de 40, 50 anos de idade, foi reconhecido por aquele monarca como sendo alguém em quem havia “o espírito dos deuses santos” (Dn.4:8). Já no ocaso do Império Babilônico, quando já contava com cerca de 90 anos, também fora reconhecido como sendo “um espírito excelente” pela mãe de Belsazar (Dn.5:12) e agora, já no Império Medo-Persa, era visto por Dario, o medo como tendo um “espírito excelente” (Dn.6:3).
– Isto nos mostra que Daniel era constante, ou seja, permanecia e perseverava em sua integridade e comunhão com Deus. A perseverança é absolutamente necessária para que alcancemos a glorificação, último estágio de nossa salvação (Mt.24:13). Paulo nos recomenda que sejamos firmes e constantes, sempre abundantes na obra do Senhor, sabendo que o nosso trabalho não é vão no Senhor (I Co.15:58), recomendação esta que encerra o chamado “capítulo da ressurreição”, como a nos dizer que o requisito para que alcancemos a glorificação é, precisamente, esta firmeza e constância.
– A constância não se obtém senão mediante uma vida de meditação nas Escrituras e de oração. A inconstância, na Bíblia, é fruto de quem não se mantém em comunhão com o Senhor e, por isso mesmo, se deixa levar pela carne.
– Jacó deu como característica de Rúben, o seu primogênito, a inconstância (Gn.49:4) e, por causa desta inconstância, Rúben perdeu a primogenitura. A inconstância de Rúben foi a responsável por ele ter desonrado seu pai, mantendo relacionamento íntimo com uma das concubinas de Jacó. Vemos, neste episódio, que a inconstância nos faz deixar levar pelos desejos carnais e a nos fazer perder a nossa filiação divina.
– Não é por outro motivo, aliás, que Tiago afirma que “o homem de coração dobre é inconstante em todos os seus caminhos” (Tg.1:8). Quem não serve a Deus de coração inteiro, como, por exemplo, fez o rei Amazias (II Cr.25:2), tem um fim trágico em sua vida espiritual, pois Deus exige exclusividade e se, não formos íntegros, seremos inconstantes e, nesta inconstância, acabaremos por perder a nossa salvação.
– Os inconstantes, por não servirem a Deus com integridade, não buscarem a sua comunhão, não só são iludidos pela concupiscência da carne como também são alvos fáceis dos enganos do inimigo, notadamente no campo doutrinário. Paulo diz que os inconstantes são levados por todo vento de doutrina, pelo engano dos homens que, com astúcia, enganam fraudulosamente (Ef.4:14).
– As estatísticas mostram que aumenta consideravelmente o número de pessoas que cristãs se dizem ser e que são “flutuantes”, ou seja, que estão a peregrinar de denominação em denominação, de igreja local em igreja local, sem qualquer firmeza espiritual, precisamente porque não se entregaram totalmente ao Senhor, não desfrutam de comunhão com Ele, querendo viver uma religiosidade emocional, meramente carnal. São pessoas que ainda não alcançaram a real e verdadeira salvação, que não se entregaram totalmente a Cristo, sendo, por isso mesmo, inconstantes, facilmente persuadidos por qualquer “vento de doutrina”.
– Os inconstantes são as vítimas preferidas dos falsos mestres que, como diz o apóstolo Pedro, tendo os olhos cheios de adultério e não cessando de pecar, engodam as almas inconstantes, tendo o coração exercitado na avareza (II Pe.2:14). Não é, porventura, o quadro que temos visto em nossos dias? Pessoas inconstantes servindo de meio de enriquecimento de homens inescrupulosos que, com Bíblia na mão, estão a fazer destas pobres pessoas fonte de negócio?
– Os inconstantes, diz ainda Pedro, são também pessoas que são levadas a distorcer e a interpretar equivocadamente as Escrituras para sua própria perdição (II Pe.3:16), precisamente porque, não conseguindo ter comunhão com Deus nem firmeza espiritual, procuram enganar-se, buscando adaptar a Palavra de Deus a suas concupiscências (II Tm.4:3,4).
– Mas aqueles que realmente se entregam a Cristo Jesus, que negam a si mesmos e passam a fazer a vontade de Deus, procurando agradar-Lhe e não aos homens, sendo, por isso mesmo, verdadeiros e genuínos servos de Cristo (Gl.1:10), estes estão inteiramente dedicados ao Senhor e, por isso mesmo, tudo fazem excelentemente, tudo fazem bem e com denodo, querendo glorificar a Deus em suas obas obras (Mt.5:16).
– Era este o caso de Daniel que, em setenta anos em Babilônia, de forma perseverante e persistente era reconhecido como sendo “um espírito excelente”, porque sempre havia se mantido em comunhão com Deus, sempre havia se mantido em santificação.
II – DANIEL É PERSEGUIDO NA CORTE DE DARIO, O MEDO
– Todos sabemos como é o ambiente de uma corte: cheio de intrigas, boatos e movimentos decorrentes destas intrigas e boatos. Evidentemente que, diante das intenções do rei Dario, o medo de estabelecer Daniel como uma espécie de “vice-rei” ou “primeiro-ministro”, isto causou enorme alvoroço na corte de Dario, o medo.
– Daniel era diferente dos demais príncipes e dos presidentes. Como dissemos, era nome ligado ao império babilônico mas, sobretudo, um homem que se distinguia pelo seu modo de viver diferente. Os babilônios que restaram do governo anterior eram idólatras, envolvidos com a religião babilônica, enquanto que os medos e persas que haviam chegado com Dario, o medo, eram adeptos do zoroastrismo, a religião persa, que cria em dois deuses, um deus do bem e outro deus do mal, que viviam a se digladiar.
– Diante da perspectiva de alteração administrativa e da criação do cargo de “vice-rei” ou de “primeiro-ministro”, os príncipes e presidentes iniciaram uma verdadeira “devassa”, uma verdadeira “CPI” para tentar encontrar algo que denegrisse a imagem de Daniel no reino, algum senão, alguma falha que o descredenciasse para a função que se lhe pretendiam dar.
– Verificamos, portanto, que, na corte de Dario, o medo, como em qualquer lugar deste mundo que está no maligno (I Jo.5:19), não faltam inimigos aos servos de Deus, pois o servo do Senhor é um “corpo estranho” neste mundo, é alguém que está no mundo mas não é do mundo (Jo.17:11,14,16).
– A fidelidade a Deus, a vida de integridade traz simultaneamente a nossa consideração por nos apresentarmos como um “espírito excelente”, como também o ódio do mundo contra nós (Jo.15:18-21), porque esta vida de integridade se apresenta como “cheiro de morte para a morte” para os que se perdem (II Co.2:15,16).
– Não há comunhão entre a luz e as trevas (II Co.6:14) e, se vivermos em integridade, estaremos na luz e, por isso mesmo, seremos aborrecidos daqueles que andam nas trevas (Jo.3:20,21).
– Muitos não entendem isto, mas o fato de termos sido escolhidos por Cristo faz com que, inevitavelmente, sejamos aborrecidos pelo mundo e, por isso mesmo, passemos a ser injuriados, perseguidos e vítimas de mentiras, tudo por causa de nossa fidelidade ao Senhor. É, aliás, esta a nona bem-aventurança, uma das características dos discípulos de Cristo Jesus (Mt.5:11,12), uma das marcas dos profetas do Senhor, e, com Daniel, não poderia mesmo ser diferente.
– Diante dos boatos e notícias de que Daniel seria constituído como “vice-rei” ou “primeiro-ministro”, os demais príncipes e os presidentes começaram a procurar algo que viesse a comprometer a imagem de Daniel diante do rei, mas nada encontraram.
– Que exemplo Daniel nos dá! Será que se as pessoas forem fazer uma devassa, uma CPI em nossas vidas terão o mesmo resultado que tiveram aqueles homens da corte de Dario, o medo? Ou será que encontrarão muitos “podres” que haviam sido cuidadosamente escondidos por nós?
– Daniel era íntegro, era fiel a Deus e não houve o que encontrassem que pudesse ser usado contra ele diante do rei Dario. O esforço feito para denegrir a imagem do profeta apenas lhe servira para credenciá-lo ainda mais para o cargo que o rei pretendia dar-lhe. Daniel, após setenta anos de vida administrativa, de uma vida no centro do poder político do sistema gentílico, que era dominado pela rebeldia contra Deus, mantinha-se “ficha limpa”, era uma homem íntegro, honesto e probo.
– Daniel é a prova indelével que não há qualquer senão em um servo de Deus dedicar-se à vida pública, à vida política. Temos, lamentavelmente, a ideia de que a política é um ambiente dominado pela corrupção, pelo vício e pela desonestidade, mas isto, na verdade, é a chamada “politicalha” ou “politicagem”, mas não a verdadeira política que, muito acertadamente, alguém disse ser a maior manifestação do amor, uma vez que o político deve ser alguém que se propõe a realizar o bem comum, o bem-estar de todos, ou seja, aquele que beneficia, com suas decisões, a um grande número de pessoas a um só tempo. Por isso mesmo é que o Senhor Jesus há de reinar sobre todo o mundo por mil anos, proporcionando a justiça e a paz (Sl.85:10).
– Muitos, acertadamente, usam o exemplo de Daniel para defender a participação política do povo de Deus na sociedade, embora o façam, muitas vezes, de forma distorcida. Não resta dúvida de que o Senhor vocaciona homens e mulheres para a vida política e que este é um bem para toda a sociedade, visto que são homens e mulheres que, por serem luzes do mundo e sal da terra, contribuirão para o bem-estar da população e para a melhoria das condições de vida.
– No entanto, quando se fala em Daniel como modelo de vida pública, é preciso salientarmos três aspectos que este discurso apresentado quase sempre negligencia ou desconsidera.
– O primeiro é que Daniel foi chamado por Deus para ser estadista, para ser um homem da vida pública. Deste modo, não é qualquer pessoa que pode se aventurar na política, apesar por ser um salvo na pessoa de Cristo Jesus. É mister que seja alguém que tenha sido chamado para tal e, se foi chamado para este papel, será, necessariamente, alguém que não foi chamado para o ministério pastoral, pois há incompatibilidade entre o pastorado e o chamado político. Daniel não era sacerdote, era da tribo de Judá e, por isso mesmo, foi chamado por Deus para este múnus público.
– Daniel havia sido governador da província de Babilônia e, depois, com a morte de Nabucodonosor, parece ter sido posto no ostracismo. Mas, ao notar que era a vontade de Deus retornar para a vida pública, passou a dedicar-se com denodo, a ponto de, mesmo nonagenário, estar sendo cogitado para assumir todo o governo do reino de Dario, o medo. Tinha consciência de seu chamado e procurava servir a Deus dentro desta ótica.
– O segundo é que Daniel, ao ser chamado para esta função pública, política, desempenhou-a com integridade, pelos diversos governos e impérios aos quais serviu, tanto que não acharam coisa alguma que denegrisse a sua imagem. O chamado por Deus para a vida pública precisa ter uma vida íntegra, uma reputação ilibada, tanto antes quanto depois de ser guindado à função pública, mostrando, com isso, que seu intento é tão somente fazer a vontade de Deus, ou seja, promover uma vida quieta e sossegada, com toda piedade e honestidade (I Tm.2:2).
– Daniel, diz-nos o texto sagrado, era fiel e não se achava nele nenhum vício ou culpa (Dn.6:4). Destarte, aquele que é chamado por Deus para a função pública precisa ser, igualmente, fiel, bem como isento de vício ou culpa. Não pode, por isso mesmo, amoldar-se à “politicagem” ou “politicalha”, não deve envolver- se em falcatruas e em práticas viciadas, distinguindo-se dentre os demais. É muito triste, aliás, vermos que, nas relações dos políticos íntegros, poucos são os que se denominam cristãos. Que lástima!
– O terceiro é a manutenção da sua identidade, mesmo diante do exercício do poder. Daniel não mudara seu modo de ser porque era um dos príncipes do governo medo. Continuava a ser o mesmo “espírito excelente” que havia servido como aluno do curso de sábios, como assessor do rei Nabucodonosor, como governador da província de Babilônia, como príncipe dos magos e, agora, como um dos príncipes de Dario, o medo. Mantinha-se um judeu devoto, servo de Deus, que não se contaminava com o pecado, que orava a Deus três vezes ao dia e que meditava nas Escrituras Sagradas. Não deixava de ser um profeta do Senhor, embora fosse um homem público.
– De igual forma, aqueles que são chamados por Deus para exercer função pública não podem perder a sua identidade de cristãos, não podem negar a sua fé nem querer fazer uma separação entre o político e o salvo, separação esta impossível para quem está inteiramente servindo ao Senhor.
– Por causa desta identidade, aliás, é que se forjou um plano para eliminar Daniel. Diante do fracasso das tentativas de denegrir a imagem de Daniel, seus inimigos chegaram à conclusão que a única forma de eliminá-lo seria confrontar o dia-a-dia administrativo do reino com a fé de Daniel.
– Havia mudado o império mundial, havia mudado o governante, havia mudado o regime administrativo, mas o mundo não havia mudado, os homens continuavam pecadores e invejosos.
OBS: “…A Babilônia tinha caído, um novo império tinha se levantado, mas os homens que subiram ao poder continuavam corruptos. O absolutismo do rei no império babilônico mudou para a descentralização do poder no império medo-persa. O regime de governo mudou, mas não o coração dos homens.…” (LOPES, Hernandes Dias. Daniel: um homem amado no céu, p.80).
– Seus inimigos sabiam que Daniel amava a Deus sobre todas as coisas, talvez já o tivessem ouvido falar que este era o primeiro e grande mandamento da lei de seu Deus e, por isso, tinham plena convicção que, se criassem uma lei que contrariasse as crenças de Daniel, Daniel não titubearia em continuar servindo ao Senhor.
OBS: “…’Procuremos alguma coisa contra ele na lei do seu Deus1 (a religião dele é diferente da nossa, o seu Deus é diferente do nosso e ele leva muito a sério a sua religião). Essa é uma boa acusação. Quando um servo de Deus somente pode ser acusado de sua fidelidade ao Senhor e Sua palavra, disso Deus Se agrada.…” (OLIVEIRA, José Serafim de. Panorama teológico e histórico do livro de Daniel e Apocalipse, p.18) (cópia para revisão, no prelo).
– Não podemos nos iludir. O inimigo de nossas almas sempre nos fará sofrer e nos perseguirá mediante o confronto entre a lei do Senhor e o sistema gentílico em que vivemos. Este sistema, representado pela estátua do sonho de Nabucodonosor, é rebelde contra Deus e sempre será orientado pelo deus deste século para confrontar a nossa fé, para nos levar a uma decisão entre Deus e o mundo e os fiéis, por decidirem servir ao Senhor, serão sempre perseguidos e sofrerão por causa de sua fidelidade. Foi o que disse Pedro, quando afirmou que padeceremos por amor da justiça e, nisto, seremos bem-aventurados (I Pe.3:14).
– Por isso, os inimigos de Daniel urdiram um astucioso plano. Foram até o rei Dario e o adularam, dizendo que o rei fizesse um edito segundo o qual, durante o prazo de trinta dias, não fizesse petição a qualquer deus, senão ao próprio rei Dario e que, quem não fizesse, fosse lançado na cova dos leões (Dn.6:6,7).
– A adulação, a bajulação é um grande mal que deve ser evitado por todos nós, seja como aduladores e bajuladores, seja como adulados e bajulados. Esta conduta é perversa e tende a um afastamento nosso de Deus, porquanto o que adula é um verdadeiro idólatra, alguém que confia mais em pessoas do que em Deus e, por isso, procura obter vantagens de uma pessoa, que é deificada, tornada um deus para que se consiga a satisfação de seus interesses, enquanto que o adulado, o bajulado passa a se achar um deus, alguém digno de honra e mérito. Em ambas as situações, há um grave atentado à soberania divina.
– Todos os príncipes (com a evidente exceção de Daniel), presidentes, prefeitos, capitães e governadores estavam concertados contra o profeta do Senhor e foram até a presença de Dario para conseguir dele este edito real, que, conforme a lei dos medos e persas, não poderia ser jamais revogado. Exaltaram-no, fizeram- no considerar-se um verdadeiro deus, um homem acima de qualquer outro, digno de ser o único alvo de petições durante o prazo de trinta dias.
– Dario, o medo deixou-se levar por esta adulação, por esta bajulação e assinou o edito real, proibindo qualquer pessoa de fazer petição a qualquer deus senão ao próprio rei pelo prazo de trinta dias (Dn.6:9).
– A adulação, bajulação ou lisonja é sempre uma característica de quem não serve a Deus. Eliú afirma que quem usa de lisonjas breve será levado pelo seu Criador (Jó 32:22), sendo esta uma tática utilizada pela mulher estranha para perverter os incautos (Pv.6:24; 7:21), bem como a tática tanto dos falsos mestres (Rm.16:18), dos falsos profetas (Is.30:10) e do próprio Anticristo, como se verifica em Dn.11:32,34. É, portanto, um comportamento totalmente inadmissível para quem se diz salvo na pessoa de Jesus Cristo.
– Dario deixou-se levar e assinou o edito, sem perceber que tudo não passava de uma cilada contra Daniel, de uma armadilha que tinha como prejudicado o próprio rei, que se privaria de seu mais leal e competente auxiliar.
– Daniel, certamente, soube da assinatura do edito real, diante de sua posição proeminente no reino. Aliás, tinha ele pleno conhecimento daquela reunião de adulação da qual não participou, pois era íntegro. Como seria bom que os servos do Senhor seguissem este exemplo e deixassem de participar de reuniões de adulação, bajulação e lisonjas que têm se tornado, lamentavelmente, tão costumeiras e frequentes no meio da igreja do Senhor…
– Todos sabiam da integridade de Daniel. Todos sabiam que Daniel não mudaria seu proceder por causa do edito real. Todos sabiam que, apesar do decreto real, Daniel continuaria a orar a Deus, como sempre fazia, três vezes ao dia, em sua casa, com as janelas abertas da banda de Jerusalém e, por isso, todos foram rapidamente para este local, a fim de apanharem Daniel nesta desobediência ao decreto de Dario.
– Daniel foi para a sua casa, como se nada tivesse acontecido. Entrou em sua casa, abriu as janelas da banda de Jerusalém e começou a orar ao Senhor. Alguns dizem que Daniel foi imprudente, pois, sabendo da escritura do rei, deveria ter mantido as janelas fechadas, para evitar ser descoberto.
– Embora respeitemos tal entendimento, dele não compartilhamos. Daniel era autêntico, homem fiel a Deus e que sabia, como ninguém, que aquele decreto visava tão somente atingi-lo. Ademais, tratava-se de um decreto em que o rei, nitidamente, havia abusado de seu poder, querido disciplinar algo que estava além do que lhe era permitido enquanto autoridade constituída por Deus.
Assim sendo, mais importava obedecer a Deus que aos homens (At.5:29). Além do que, Daniel não orava com as janelas abertas da banda de Jerusalém para se mostrar ou para aparecer, mas em nítido cumprimento das Escrituras, pois havia promessa de Deus de ouvir a oração feita desta maneira, como vemos claramente em II Cr.6:37-39 e 7:12. Orava três vezes ao dia por causa do que estava escrito no Sl.55:17, costume, aliás, que até hoje é seguido pelos judeus ortodoxos.
OBS: “A oração judaica (em hebraico: , tefilá; plural hebraico: , tefillos ou tefillót; em iídiche: tfíle, plural sa oãs (sellíft ו recitações de orações que fazem parte da observância do Judaísmo. Estas orações, muitas vezes com instruções e comentários, são encontradas no sidur, o livro tradicional de orações judaicas. Tradicionalmente, três grupos de orações são recitados diariamente: Shacharit ou Shaharit ( ), do hebraico shachar ou shahar ( ) luz da manhã ; Minchá ( ), as oraç es da tarde designadas para a oferta de farinha que acompanhava os sacrifícios no Templo de Jerusalém; Arvit ( ) ou Ma ariv ( ), de anoitecer .…” (Oração judaica. In: WIKIPÉDIA. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ora%C3%A7%C3%A3o_judaica Acesso em 09 set. 2014).
– Daniel mantinha a sua integridade mesmo diante da escritura do rei e, como tinha habilidade para viver no palácio do rei (Dn.1:4), tinha pleno conhecimento do risco que estava a correr e talvez fosse este o próprio objeto de sua oração naquele dia, procurando entender a vontade do Senhor em todos aqueles acontecimentos.
– Daniel não modificou o seu modo de ser diante da escritura do rei, ensinando-nos que não devemos nos amoldar àquilo que se introduz em nosso meio e que não tem qualquer respaldo bíblico, que não tem origem divina. Um dos grandes erros que temos presenciado, em nossos dias, é esta adaptação a valores mundanos, a práticas pecaminosas, sempre com a desculpa da prudência e da sabedoria.
– Daniel sabia viver no palácio do rei, sempre se conduziu com prudência e cautela e, desta vez, não foi diferente. Daniel soube que a escritura estava assinada e, tranquilamente, foi para a sua casa, onde se dedicava à oração três vezes ao dia, como era seu costume durante todos aqueles setenta anos em que se encontrava em Babilônia. Não se alterou, não foi à presença do rei para tentar eliminar o edito, não fez qualquer discurso contra o decreto real, não incitou o povo à desobediência. Nada disso. Soube da escritura e foi para sua casa, impassível, sem qualquer espetáculo ou ato de desonra ao rei.
– Assim devemos também fazer diante de medidas que sejam tomadas e que contrariam a nossa fé. Devemos nos movimentar com tranquilidade, sem qualquer desonra aos governantes, mas buscando, sempre, a ajuda divina, a orientação do Senhor para que mudemos o quadro. Sem revolta, sem afronta às autoridades, devemos manter, entretanto, a nossa identidade, vivendo inteiramente para Deus, não mudando nosso modo de viver por causa de leis que afrontam a sã doutrina.
– Daniel também mostra que, apesar da vida corrida que vivia, pois era um dos príncipes do rei Dario, tendo de cuidar da supervisão de quarenta presidentes, sem falar nas tarefas adicionais que o rei certamente lhe dava, pois desfrutava da máxima confiança do monarca, tinha uma vida devocional, não deixava de orar por três vezes durante o dia.
– Que lição nos dá o profeta Daniel diante de nossas desculpas a respeito da vida agitada que temos em nossos dias! Certamente, Daniel tinha muito mais atividades do que nós e não deixava de ter o seu período de oração e de meditação nas Escrituras e isto, com cerca de noventa anos de idade! Que exemplo que devemos seguir! Deixemos de lado a desculpa do corre-corre, da agitação da vida hodierna e passemos a ter um tempo para Deus! Isto é fundamental para que sejamos vitoriosos e exitosos como foi Daniel!
– Todos sabiam que Daniel iria orar e, por isso, seus inimigos, juntos, foram até a casa de Daniel, pois tinham plena convicção que o velho profeta estaria orando, de joelhos, com as janelas abertas da banda de Jerusalém, e, deste modo, estaria fazendo petições ao seu Deus, em flagrante desobediência ao edito real.
– Dito e feito. Daniel estava orando, como sempre fazia. Os inimigos de Daniel então se apresentaram ao rei Dario e lhe contaram a desobediência do profeta com relação ao edito real, exigindo que ele fosse lançado na cova dos leões, como constava na lei (Dn.6:12,13).
– Dario, então, percebeu o erro que cometera, o que estava por trás daquela adulação e bajulação que o fizera se achar um deus. Diante disto, imediatamente propôs no seu coração livrar Daniel daquela cilada que ele mesmo havia armado, mas seus esforços foram em vão, não havia como evitar a condenação de Daniel, pois o delito havia sido praticado e a lei não podia ser revogada. Até o pôr do sol, tentou livrá-lo, mas nada pôde conseguir (Dn.6:14,15).
– Observemos que Daniel não foi ao encontro do rei para pedir clemência ou para que o rei pudesse encontrar um meio para livrá-lo. Daniel era conhecedor da lei e sabia que não havia escape, em termos humanos, para si. Por isso, havia ido orar ao Senhor, pois sabia que, se fosse para ser liberto da cova dos leões, era em Deus que se encontrava o livramento, não no homem.
– Dario, mesmo sendo o rei, mesmo sendo um deus único durante aqueles trinta dias, nada podia fazer. O mundo nada pode fazer para nos ajudar, devemos aprender isto, amados irmãos. Só em Deus está o nosso livramento, só em Deus poderemos superar as dificuldades e adversidades que este mundo, a carne e o diabo colocam procurando nos impedir de chegar ao céu. Creiamos nisto e busquemos ao Senhor!
– Na hora do pôr do sol, enquanto Dario buscava um meio jurídico para livrar Daniel, certamente o profeta estava, uma vez mais, fazendo sua oração, a terceira do dia, pedindo ao Senhor misericórdia, querendo entender qual era a vontade de Deus para a sua vida. Daniel não estava desesperado. Sabia que Deus podia livrá-lo ou, então, se não fosse esta a vontade de Deus, que ele estivesse preparado para morrer por causa do nome do Senhor, o que é deve ser considerado uma honra para todos os que servem a Deus.
– Os inimigos de Daniel puseram o rei contra a parede. Mostraram a ele que não era possível a revogação do edito real e que a lei deveria ser cumprida, com o lançamento de Daniel na cova dos leões. Não tendo mais o que fazer, Dario ordenou que trouxessem a Daniel e fosse ele lançado na cova dos leões. Dario, porém, demonstrando todo seu desconforto com a situação, despediu-se do seu auxiliar com a seguinte afirmação: “O teu Deus, a quem tu continuamente serves, Ele te livrará” (Dn.6:16 “in fine”).
OBS: “…Em primeiro lugar, Daniel relata que o rei ficou perturbado quando percebeu a malícia de seus nobres; algo que antes lhe escapara. Pois jamais passaria por sua mente o que realmente estava por trás ou aonde desejavam chegar. Agora, porem, enxerga que fora enganado e encurralado. Por esse motivo, sentia-se perturbado. Isso novamente nos ensina o quanto os reis deveriam suspeitar dos conselhos solertes.
Eles se acham cercados de todos os lados por pessoas traiçoeiras, cujo único propósito é enriquecer-se através de falsas acusações ou pela ação de seus inimigos, numa ocasião ou noutra, oprimindo aqueles que esperam despojar, e ainda noutra oportunidade simplesmente favorecendo as causas do mal. Já que os reis estão rodeados de tantas armadilhas, deveriam ter mais cuidado c pondo mais atenção nos suspeitos de astúcia.
Do contrário perceberão tarde demais que foram enganados, quando não houver mais remédio, cm parte porque temem c cm parte porque desejam cultivar sua reputação.…” (CALVINO, João. Daniel. Trad de Eni Del Mullins Fonseca. Digitaliz. Jogois2006, v.1, p.382)
– Estas palavras do rei Dario, que traduziam mais uma esperança, mais um desejo do que efetivamente uma confiança em Deus, eram, de todo modo, tocantes. Confirmam o testemunho que Daniel dava do Senhor na corte real. Ele era visto e tido como alguém que continuamente servia ao Senhor, que não se envergonhava de servir a Deus, que tinha uma fé pública e autêntica, confirmada por um testemunho inatacável. Era irrepreensível, exatamente o que se exige de cada um de nós (Fp.2:15). Temos este testemunho diante dos homens? Pensemos nisto!
– Daniel sabia viver no palácio do rei, respeitava a religião do rei, mas não tinha deixado de dizer quem era o único e verdadeiro Deus, a ponto de Dario ter dito que Deus o livraria, pois fora, certamente, informado pelo próprio Daniel de que se tratava de um Deus Todo-Poderoso. Daniel não perdia as oportunidades, mesmo em tantos trabalhos, em tantas tarefas e do caráter secular de seu trabalho, de falar a respeito de Deus para o rei Dario. Temos feito o mesmo?
– Os inimigos não queriam dar qualquer chance ou oportunidade para Daniel, de modo que, conforme o rito, trouxeram uma pedra e a puseram na boca da cova, pedra estava que foi selada com o anel do rei e com o anel dos seus grandes (muito provavelmente os outros dois príncipes) para que não se mudasse a sentença acerca de Daniel.
– “…Tem sido interpretado que ‘a cova dos le es’, onde Daniel foi lançado, tinha duas entradas: a primeira era um espécie de ‘rampa’ pela qual os animais entravam e a segunda uma espécie de ‘buraco’, na extremidade superior, pelo qual os animais eram alimentados…” (SILVA, Severino Pedro da. Daniel versículo por versículo, p.117).
– Começa, então, uma longa noite para todos os envolvidos. Para Daniel, uma noite na cova dos leões, onde o profeta deveria aguardar a vontade de Deus. Assim que lançado na cova, pessoa idosa, Daniel certamente aguardou por alguns segundos. Por primeiro, viu que caiu no chão da cova, que os leões não o devoraram, tendo, então, percebido que a vontade do Senhor era, realmente, livrá-lo.
– Diante disto, passou a noite em vigília, orando a Deus, aguardando o amanhecer para testificar do livramento e do milagre ocorridos. Estava tranquilo, sem dúvida alguma, porque sabia que Deus havia optado por preservar-lhe a vida, mas não dormiu usando a juba do leão como travesseiro, como andam cantando por aí. Daniel não era atrevido nem alguém que tentasse ao Senhor.
– Enquanto Daniel estava em comunhão com Deus na cova dos leões, vigiando e orando, seus inimigos estavam, certamente, em alguma festa carnal, comemorando a morte daquele a quem odiavam. Para eles, tudo estava resolvido. Daniel fora morto e não era mais obstáculo para seus intentos de poder. Comemoraram a noite toda, mal sabendo que era a sua última noite de vida… Aguardavam ansiosamente o dia seguinte para ver quem Dario iria pôr no lugar de Daniel, quem assumiria o poder.
– Já o rei Dario teve uma noite extremamente angustiante. Não conseguia dormir, não quis que lhe tocassem instrumentos de música, não comeu coisa alguma, estava extremamente arrependido do que havia feito, certamente pensou quão tolo havia sido deixando-se ser adulado e tinha uma esperança, um desejo de que o Deus de Daniel pudesse livrá-lo.
– Veio o amanhecer. Os inimigos de Daniel estavam, certamente, “de ressaca”, embriagados e foram dormir. Daniel continuava em oração na cova e o rei Dario, mais do que depressa, saiu de seu palácio e foi até a cova, clamando com voz triste, visto que não tinha realmente fé em Deus, mas apenas um desejo, uma esperança: “Daniel, servo do Deus vivo! Dar-se-ia o caso que o teu Deus a quem tu continuamente serves tenha podido livrar-te dos le es?” (Dn.6:20 “in fine”).
– Daniel, ao ouvir a voz do rei, saudou-o, demonstrando não ter tido qualquer mágoa ou ressentimento em relação ao monarca, tendo, então, dito ao rei que o seu Deus havia enviado um anjo, fechado a boca dos leões, leões que não lhe fizeram dano algum, porque ele havia sido achado inocente tanto diante do rei quanto diante do próprio Deus (Dn.6:22).
– Estas palavras de Daniel esclarecem que ele esteve em vigília e oração durante toda a noite, a ponto de Deus lhe ter revelado que havia mandado um anjo para aquele lugar e que o anjo havia fechado a boca dos leões. Isto veio por revelação divina, durante a oração de Daniel.
– Cumpre, aliás, aqui esclarecer que, ao contrário do que ocorreu na fornalha de fogo ardente, o Senhor Jesus NÃO esteve na cova dos leões, como um pseudo-hino anda propalando por aí e, infelizmente, tem sido inadvertidamente cantado pelos crentes. A Bíblia diz que o Senhor mandou um anjo que fechou a boca dos leões. Portanto, não houve qualquer teofania na cova dos leões.
– Os le es não dormiram nem “jejuaram” como este mesmo pseudo-hino dá a entender. O anjo fechou a boca deles, de modo que é perfeitamente plausível entendermos que os leões continuaram com fome, cheiravam Daniel, rondavam-no mas não podiam abrir a boca para ataca-lo diante da presença do anjo mandado por Deus. Por isso, não tem cabimento dizer que Daniel dormiu durante a noite ou usou os leões como travesseiros…
– Mesmo com voz triste, mesmo titubeante quanto ao poder de Deus, o rei Dario não deixou de atestar o testemunho de Daniel, chamando-o de “servo do Deus vivo” e repetindo que ele continuamente servia ao Senhor. O testemunho de Daniel falava alto na corte de Dario, o medo e, ainda que tivesse sido morto, continuaria a falar, pois quando o rei fala estas coisas de Daniel não sabia, ainda, que ele havia sido preservado em vida.
– Devemos ter esta mesma perspectiva em nossas vidas: que o nosso testemunho de vida fiel a Deus fale bem mais alto que as nossas próprias vidas, pois é assim que se caracteriza um justo, a começar de Abel (Hb.11:4). Foi assim, aliás, com o Senhor Jesus, cujo testemunho foi exaltado pelos discípulos de Emaús, que o tinham como morto, embora tivesse Ele já ressuscitado (Lc.24:19-21).
– Ao ouvir a voz de Daniel, o rei Dario alegrou-se em si mesmo e mandou tirar Daniel da cova. Daniel foi tirado da cova e nenhum dano se achou nele, porque crera no seu Deus. Crer em Deus significa não termos a nossa vida preciosa e estarmos dispostos a perdê-la por obedecermos ao Senhor e à Sua Palavra. Temos realmente fé em Deus? Pensemos nisto!
– Notemos que o fato de Dario ter tirado Daniel da cova não infringia o seu famigerado decreto, pois o decreto mandava que quem pedisse a qualquer deus senão a Dario fosse lançado na cova, o que realmente havia acontecido, de modo que Dario estava livre para tirar Daniel da cova.
– Na mesma hora, o rei Dario, vendo que aqueles aduladores queriam o mal para o seu reino, vez que o haviam feito lançar Daniel, seu principal auxiliar, na cova dos leões e comemorado tal feito, pouco se importando com o bem-estar do reino e reconhecendo, ademais, que não havia Deus como o Deus de Daniel, imediatamente mandou que fossem trazidos aqueles homens que tinham acusado Daniel e que fossem eles lançados na cova dos leões, juntamente com seus filhos e mulheres e o fato é que, não tinham eles ainda chegado ao fundo da cova, foram devorados pelos leões, que esmigalharam todos os seus ossos (Dn.6:24).
– Após este grande milagre e livramento feito por Deus, Dario não teve dúvida de substituir aquele decreto tolo por um outro, segundo o qual os homens sob seu domínio deveriam temer e tremer perante o Deus de Daniel, porque Ele é o Deus vivo e para sempre permanente e o Seu reino não se pode destruir e o Seu domínio é até ao fim, pois Ele é o Deus que salva, livra, opera sinais e maravilhas nos céus e na terra, pois Ele havia livrado Daniel dos leões (Dn.6:26,27).
– O segundo império mundial reconhecia, assim como o primeiro, que Deus era o único e verdadeiro Deus, o Deus Soberano, aquele cujo reino era eterno, cujo domínio era até ao fim. Daniel, com esta declaração de Dario, tinha a confirmação das visões e revelações que já estava a ter e que serão objeto das próximas lições. Deus confirmava que tinha o absoluto controle da história e que estava acima dos poderes humanos.
– Dario testificava que o Deus de Daniel era o Deus vivo, o Deus permanente, e nós devemos ter esta mesma convicção, amados irmãos, mesmo quando vemos o poder político perseguir como nunca os genuínos e verdadeiros servos do Senhor, mesmo quando vemos que tudo já está montado para o reinado do Anticristo.
Assim como Daniel foi liberto e salvo dos leões, também seremos libertos e salvos daquele que ruge como leão buscando a quem possa tragar (I Pe.5:8), desde que nos mantenhamos sóbrios e vigilantes como Daniel, ou seja, que não nos embriaguemos com este mundo e nos mantenhamos sempre alerta, tendo uma vida de santificação e não nos contaminando com este mundo.
– Daniel entendia, então, o motivo de ser alçado a tão importante posição no Império Medo-Persa. Sua presença ali era necessária para que o nome do Senhor fosse glorificado e era um sinal evidente que se dava não só ao profeta mas a todo o povo judeu de que, apesar do cativeiro, apesar da falta de independência e da inexistência de um trono para a casa de Davi, Deus não havia Se esquecido de Suas promessas e providenciaria a redenção de Israel e implementaria o projeto prometido desde o monte Sinai de fazer de Israel um reino sacerdotal e um povo santo.
– Daniel continuou servindo ao rei, muito provavelmente tendo sido posto como “primeiro-ministro” como era o intuito de Dario e quando este entregou o reino a Ciro, rei dos persas, foi igualmente mantido em sua posição, como nos dá conta Dn.6:28, fazendo de Daniel o único estadista que serviu a três impérios sucessivos em toda a história da humanidade, pois a presença de Daniel em lugar de tamanha envergadura nada tinha que ver com os méritos do profeta, mas como um sinal de Deus de que Ele é soberano, um sinal que nos dá firmeza e convicção até o dia de hoje.
Ev. Dr. Caramuru Afonso Francisco
Site: http://www.portalebd.org.br/files/4T2014_L7_caramuru.pdf