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LIÇÃO Nº 11 – MELQUISEDEQUE ABENÇOA ABRAÃO

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Com Abrão, Deus começa a formar a nação de Israel.

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INTRODUÇÃO

– Damos início ao quinto e último bloco deste trimestre, quando são dadas “rápidas pinceladas” a respeito da segunda parte do livro de Gênesis, que trata da dispensação patriarcal.
– Com Abrão, Deus começa a formar a nação de Israel.
I – O INÍCIO DA DISPENSAÇÃO PATRIARCAL

– Damos início ao quinto e último bloco deste trimestre, quando são dadas “rápidas pinceladas” a respeito da segunda parte do livro de Gênesis, que trata da dispensação patriarcal.

Com efeito, depois de ter narrado o juízo que pôs fim à dispensação do governo humano, qual seja, a confusão das línguas em Babel, Moisés passa a tratar da origem da nação de Israel, a nova nação através da qual viria a “semente da mulher” prometida no Éden para a redenção da humanidade.

– Diante da rejeição unânime de todas as nações, mister se fazia criar uma nova nação para que, nesta nova nação, totalmente criada por Deus, viesse o Salvador.

Deus respeita o livre-arbítrio dos seres humanos e, portanto, ante a rejeição estabelecida pelos gentios, tinha de dar nascimento a uma nova nação, para, nela, cumprir a Sua promessa de redenção.

– Para tanto, o Senhor escolheu Abrão, descendente de Sem e, não é por outro motivo que, logo após a notícia da confusão das línguas em Babel, o livro de Gênesis passe a tratar das “gerações de Sem” (Gn.11:10-32).

– O texto sagrado não nos dá o motivo pelo qual foi escolhida a descendência de Sem, cujo nome significa “rocha”, mas se pode conjecturar que foi dele a iniciativa de evitar a desonra de Noé (Cf. Gn.9:23), iniciativa que teve a adesão de Jafé e, deste modo, teria se credenciado diante de Deus para trazer a bênção da salvação, de ser de sua linhagem a “semente da mulher”.

– O texto nos informa que Sem teve como primogênito a Arfaxade; Arfaxade, a Salá; Salá, a Éber; Éber, a Pelegue, quando ocorreu a divisão da terra (Cf. Gn.10:25), que se entende ter sido o juízo de Babel; Pelegue, a Réu; Reú, a Serugue; Serugue, a Naor; Naor, a Terá e, por fim, Terá a Abrão.

Segundo a genealogia, temos que transcorreram 390 anos desde o nascimento do primogênito de Sem (Arafaxade) até o nascimento de Abrão, ou ainda, 392 anos entre o dilúvio e o nascimento de Abrão.

Verdade é que o texto não é explícito ao dizer que Abrão tenha nascido quando Terá tinha setenta anos, pois apenas informa que, quando Terá tinha setenta anos, tinha gerado a Abrão, Naor e Harã, de modo que pode ter gerado Abrão com menos idade do que os setenta anos. De qualquer modo, se não foram 392 anos entre o dilúvio e o nascimento de Abrão, foi um tempo um pouco menor do que este.

O texto bíblico dá-nos conta também que os semitas ocuparam a região da Mesopotâmia, ou seja, a região primitivamente ocupada pela comunidade única pós-diluviana, não sendo esclarecido porque os semitas, e não os camitas, ficaram na região, já que o governo era conduzido por Ninrode, de forma que se era de esperar que os camitas ficassem na região em detrimento dos demais.

Há uma tradição judaica de que Sem teria matado Ninrode após a confusão das línguas, algo que não se pode, portanto, determinar, até porque há também tradições judaicas que dão conta de que Ninrode teria continuado a reinar na região. De qualquer modo, foram os semitas que ocuparam a região e isto já é um sinal da servidão que os camitas teriam em relação a semitas e jafetitas.

– O fato é que Terá habitava em Ur dos caldeus, cidade que a arqueologia tem demonstrado ser uma das mais antigas metrópoles do mundo. “…Ur (em sumério: Urim; cuneiforme sumério: URIM2KI ou URIM5KI; acádio: Uru) foi uma importante cidade-estado na antiga Suméria, localizada nas proximidades da atual cidade de Tell el-Muqayyar, na província de Dhi Qar do Iraque.

Embora na Antiguidade fosse uma cidade litorânea, situada na foz do rio Eufrates, no Golfo Pérsico, atualmente situa-se no interior do país, ao sul da margem direita do Eufrates, a 16 quilômetros de Nassíria.

O padroeiro da cidade era Nanna, a divindade lunar suméria, e o nome da cidade deriva, em sua origem, do nome do deus, URIM2KI, grafia clássica suméria de LAK-32.UNUGKI, literalmente “a morada (UNUG) de Nanna (LAK-32)”.

O sítio arqueológico de Ur caracteriza-se pelas ruínas do Grande Zigurate de Ur, que continha o santuário de Nanna, escavado na década de 1930. O templo foi construído no século XXI a.C. (cronologia curta), durante o reinado de Ur-Nammu, e foi reconstruído no século VI a.C. por Nabonido.

As ruínas abrangem uma área de 1200 metros de noroeste a sudeste e 800 metros de nordeste a sudoeste, e se elevavam a 20 metros acima do nível atual da planície local.…” (Ur. In: WIKIPÉDIA. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Ur Acesso em 13 out. 2015).

– Ur dos caldeus, como todos os povos surgidos da confusão das línguas em Bebel, era idólatra e isto o demonstram os achados arqueológicos desta metrópole.

A tradição judaica confirma esta idolatria e chega a dizer que Terá, o pai de Abrão, era, ele próprio, um fabricante de ídolos, tradição esta que é reproduzida no Alcorão e outros escritos muçulmanos.

Segundo a tradição judaica, Abrão teria se dedicado ao estudo dos corpos celestes e, neste estudo, chegado à conclusão de que os astros não poderiam ser considerados deuses e que haveria apenas um único Deus e, nesta sua consideração, teria entrado em atrito tanto com seu pai Terá quanto com os próprios moradores de Ur dos caldeus.

É o que diz o filósofo judeu Filo de Alexandria (25 a.C. 50 d.C.), “in verbis”: “…Como os caldeus eram, acima de todas as nações, dedicados ao estudo da astronomia e atribuíam todos os eventos ao movimento das estrelas, pelos quais eles imaginavam que as coisas no mundo eram reguladas (…) foram levados a imaginar que o mundo ele próprio era Deus, na sua filosofia ímpia que compara a criatura com o Criador.

(…) (72) Esta é a razão pela qual Abraão fez a sua primeira migração da Caldeia para Harã…” (Filo. Sobre Abraão, XV. Disponível em: http://www.earlychristianwritings.com/yonge/book22.html Acesso em 09 set. 2015).

– Caminho não muito diverso tem o historiador judeu Flávio Josefo (37-100), “in verbis”: “…Abraão, não tendo filhos, adotou Ló, filho de seu irmão Arã e irmão de sua mulher, Sara.

E, para obedecer à ordem que havia recebido de Deus, deixou a Caldeia na idade de setenta e cinco anos e foi morar na terra de Canaã, a qual deixou à sua posteridade. Era homem muito sensato, prudente e de grande espírito e tão eloquente que podia persuadir sobre o que quisesse.

Como nenhum outro o igualava em capacidade e em virtude, deu aos homens um conhecimento muito mais perfeito da grandeza de Deus, como jamais tiveram antes.

Foi ele quem primeiro ousou dizer que existe um só Deus, que o universo é obra das mãos d’Ele e que a nossa felicidade deve ser atribuída unicamente à sua bondade, e não às nossas próprias forças.

O que o levava a falar dessa maneira era o fato de ter deduzido, após considerar atentamente o que se passava sobre a terra e sobre o mar e o curso do Sol, da Lua e das estrelas, que há um poder superior regulando esses movimentos, sem o qual todas as coisas cairiam em confusão e desordem, por não terem de si mesmas poder algum para nos proporcionar os benefícios que delas haurimos — elas os recebem dessa potência superior, à qual estão absolutamente sujeitas, o que nos obriga a honrar somente a Ele e a reconhecer o que lhe devemos por contínuas ações de graças.

Os caldeus e os outros povos da Mesopotâmia, não podendo tolerar as palavras de Abraão, levantaram-se contra ele. Assim, por ordem e com o auxílio de Deus, ele saiu do país para ir morar na terra de Canaã.…” (Antiguidades Judaicas I,7. In: História dos Hebreus. Trad. de Vicente Pedroso, , v.1, p.31).

– Segundo a tradição, portanto, Abrão pôde deduzir, através das coisas criadas, a existência do único Deus, apreendendo, assim, a chamada “revelação pela natureza”, que é suficiente para que se tenha o conhecimento de Deus, como nos mostram diversos textos bíblicos, como, por exemplo, Sl.19:1-3 e Rm.1:18-20.

– Ainda segundo a tradição judaica, Abrão contradisse seu pai Terá a respeito disto e, em tal contradição, há, então, divergência na tradição: uns entendem que Terá não aceitou os argumentos de seu filho Abrão, mantendo-se idólatra; outros, ainda, que Terá teria se rendido, num primeiro momento, aos argumentos de Abrão, mas depois teria voltado à sua posição de idolatria.

Quando Abrão tinha setenta anos de idade, o Senhor lhe apareceu e mandou que saísse de Ur dos caldeus, da sua parentela e da casa do seu pai e se dirigisse para uma terra que o próprio Deus lhe mostraria, porque faria dele uma grande nação, engrandeceria o seu nome e ele seria uma bênção (Gn.12:1,2).

Nesta chamada de Abrão temos o início da denominada “dispensação patriarcal” ou “dispensação da promessa”, período em que o Senhor trataria com o homem a partir da promessa da constituição de uma nação na qual seriam benditas todas as famílias da Terra.

Sabemos que Abrão tinha a idade de setenta anos quando foi chamado por Deus por meio de dois textos bíblicos: o primeiro se encontra em Gl.3:17, que nos diz que houve quatrocentos e trinta anos entre a chamada de Abrão e a entrega da lei no monte Sinai, de modo que, como o Senhor disse a Abrão que a sua descendência não iniciaria a ida a Canaã antes de quatrocentos anos (Cf. Gn.15:13) e, como Abrão teve Isaque com cem anos, ou seja, trinta anos após a chamada, tem-se que sua idade quando da chamada era de setenta anos.

– O segundo texto é At.7:2, que diz que o Senhor falou a Abrão em Ur dos caldeus, antes que ele fosse para Harã com seu pai Terá, ida a Harã que é registrada em Gn.11:31, prova de que Abrão foi chamado por Deus antes de ir para Harã, de onde só saiu com 75 anos (Cf. Gn.12:4).

– A ordem de Deus foi clara: Abrão deveria deixar a sua terra, ou seja, Ur dos caldeus; a sua parentela e a casa de seu pai.

Vemos que a observância desta ordem divina não se deu de imediato, a nos mostrar que a fé deve crescer ao longo de nosso relacionamento com Deus, é como o grão de mostarda, como nos ensina o Senhor Jesus (Mt.17:20, Lc.17:1-6), nascendo diminuta mas, depois, tornando-se a maior das hortaliças.

Não é à toa que Abraão é conhecido como o pai da fé (Rm.4:12,16; Gl.3:7; Tg.2:21-24), uma referência de fé nas páginas sagradas, precisamente porque desenvolveu grandemente a fé recebida da parte de Deus, pois a fé é um dom de Deus (Ef.2:8), que nos vem através da Sua Palavra (Rm.10:17).

– Abrão, depois de cinco anos em Harã, percebeu que o objetivo de Deus era que deixasse também a casa do seu pai e, por isso, o deixou, embora tenha levado consigo a Ló (Gn.12:4), que não fazia parte da ordem divina.

Foi um progresso, ainda que não se estava ainda no ideal estatuído pelo Senhor. Abrão agiu movido pela fé (Cf. Hb.11:8), confiando na promessa divina de constituição de uma grande nação, embora sua mulher fosse estéril (Gn.11:30).

II – A BIOGRAFIA DE ABRAÃO (I) – O HOMEM QUE É CHAMADO POR DEUS PARA A FORMAÇÃO DE UMA NOVA NAÇÃO

– Estas três últimas lições deste trimestre tratam muito superficialmente da segunda grande parte do livro do Gênesis, ou seja, daquela que vai do capítulo 12 ao 50, que cuida da dispensação patriarcal, das origens da nação de Israel.

– É evidente que três lições não dariam conta da riqueza de pormenores constante de toda esta parte do livro de Gênesis e, com a devida “vênia” da CPAD, teria sido mais produtivo centrar o trimestre letivo nos 11 primeiros capítulos do que deixar estas três últimas lições da forma tão superficial, ainda mais a presente lição, onde o comentarista se limita a analisar o episódio envolvendo Melquisedeque e Abrão.

– Por isso mesmo, o Portal Escola Dominical tem disponibilizado, neste trimestre, uma série de doze estudos complementares, onde busca analisar, ainda que sucintamente, esta segunda grande parte do livro de Gênesis.

– Sendo assim, não faria sentido aqui, portanto, reproduzir os estudos complementares a respeito de Abraão, que são quatro, que já estão disponibilizados no site.

– Deste modo, adotaremos, nesta lição, a linha de apresentar uma biografia de Abraão e, por fim, fazermos uma análise do episódio que foi tratado pelo comentarista.

É interessante notar que, ao partir Abrão de Harã para a terra de Canaã, sem saber que esta era a terra que Deus lhe prometeria dar, Abrão saiu com sua mulher, com Ló, com seus servos e sua fazenda, dando a entender que tinha tido prosperidade material durante o tempo em que viveu em Ur e em Harã.

Mais uma demonstração de que o objetivo do servo de Deus não é obter a prosperidade material, mas, sim, a de atender ao chamado de Deus. Abrão é apontado, sempre, pelos teólogos da prosperidade como um exemplo do acerto de sua teologia, mas, muito pelo contrário, a vida de Abrão, que, espiritualmente, se inicia pela sua chamada, mostra que a prosperidade material, embora seja uma dádiva de Deus, é algo irrelevante no serviço espiritual do crente.

Abrão passou por Canaã, foi até Siquém, até ao carvalho de Moré e observou que a terra ali era habitada pelos cananeus, ou seja, aos olhos humanos, não era aquela a terra que Deus lhe mostraria, uma vez que se tratava de uma terra ocupada e por descendentes de Cão, ou seja, uma terra que, a princípio, Deus havia destinado para outros que não os descendentes de Sem.

Entretanto, nosso Deus é um Deus que fala, que não permite que os Seus servos fiquem confundidos ou desorientados. A Bíblia afirma que Deus apareceu a Abrão e lhe mostrou que aquela era a terra que Ele daria à sua semente (Gn.12:7).

– Profunda promessa esta a de Abrão, vez que Abrão não tinha sequer um filho, que dirá uma semente. A terra estava habitada pelos cananeus, como fez questão de enfatizar o texto bíblico, mas Deus afirma a Abrão que aquele terra, já habitada, seria ocupada pela sua semente, algo até então inexistente e sem qualquer perspectiva de vir a existir.

Este é o nosso Deus! Ele faz as coisas que não são serem como também o contrário. Deus tem lhe prometido coisas que não existem e que as circunstâncias demonstram não ser possível existir? Olhe para este texto e acrescente a sua fé, pois o nosso Deus é o Deus do impossível e tudo que prometeu, fará ! (Jr.1:12; Mt.24:35).

– Abrão, ao ter tido a presença de Deus, edificou um altar ao Senhor. O altar é uma presença constante na vida de Abrão. Se Abrão é chamado amigo de Deus é porque tinha o mesmo sentimento de Deus, tinha uma profunda comunhão com o Senhor.

Comunhão é o estado em que há uma comunidade de sentimentos, de propósitos, de idéias, ou seja, os sentimentos, os propósitos e as ideias de Abrão e de Deus eram iguais, eram idênticos, eram comuns. Será que o querido(a) irmão(ã) tem comunhão com Deus ?

Abrão adorou ao Senhor, edificou um altar ao Deus que lhe aparecera. Temos tido este mesmo comportamento? Temos adorado a Deus com nossa vida, que é o nosso altar nos dias de hoje?

Quando Deus Se revela a nós nos cultos, no cotidiano, temos-Lhe correspondido construindo um altar nas nossas ações, nos nossos pensamentos, na nossa vida? Se somos “filhos de Abraão”, devemos ter a mesma conduta do patriarca. Mas, lembre-se: como diz conhecido cântico, “em altar quebrado, não se oferece sacrifício a Deus”!

Após ter edificado um altar a Deus, Abrão, certamente movido pelo Espírito de Deus, já que se encontrava em perfeita sintonia com a vontade divina, não ficou em Siquém, mas se moveu dali para a montanha à banda do oriente de Betel, que não tinha ainda este nome (será mais tarde Jacó, neto de Abraão, que dará este nome ao lugar, até então conhecido como Luz – Gn.28:19), e armou a sua tenda.

A tenda é outro elemento que encontraremos na vida de Abrão. A tenda simboliza o desprendimento de Abrão em relação a este mundo. Ele era peregrino na terra, mesmo tendo promessas de Deus de domínio sobre esta mesma terra. Da mesma forma, nós, crentes em Cristo, somos peregrinos nesta terra (I Pe.2:11), não é aqui a nossa morada nem o nosso descanso (Mq.2:10).

Será que temos este mesmo desprendimento que tinha Abrão ou o adversário já tem conseguido fazer com que finquemos raízes nas coisas deste mundo e nas coisas desta vida ?

Qual é o nosso propósito: caminhar para o céu e desfrutar do que Deus aqui nos traz, mas sem nos prendermos a isto, armando sempre a nossa tenda segundo o movimento do Espírito ou querermos Cristo apenas para as coisas desta vida, vez que a elas estamos presos e arraigados?

Lembre-se: quem espera em Cristo só nesta vida é o mais miserável de todos os homens (I Co.15:19)!

III – A BIOGRAFIA DE ABRAÃO (II) – O HOMEM QUE, PARA ESPERAR O CUMPRIMENTO DA PROMESSA POR VINTE E CINCO ANOS, PRECISAVA REMOVER OS OBSTÁCULOS NA SUA VIDA COM DEUS

Em Betel, Abrão invocou o nome do Senhor e edificou um novo altar. Aqui, Abrão ensina-nos que não basta esperarmos Deus falar conosco. Mesmo estando em comunhão com Ele, torna-se necessário invocá-l’O, ou seja, buscá-l’O.

Embora a iniciativa da salvação do homem seja divina, como vimos supra, há uma parte humana de esforço e constância na busca da presença de Deus.

Precisamos, por isso, sempre estarmos em atitude de busca da presença de Deus, seja através da oração, do jejum, da consagração, do louvor, da leitura e meditação de Sua Palavra, da frequência aos cultos e reuniões de oração.

O homem que, verdadeiramente, serve a Deus, sabe que não é autossuficiente, que depende da misericórdia do Senhor e de uma constante aproximação de Deus. Como disse o salmista Asafe, “para mim, bom é aproximar-me de Deus” (Sl.73:28).

É com preocupação que vemos que muitos crentes somente se lembram de buscar a Deus quando vão aos cultos e isto uma vez por semana (e olha lá!). Devemos buscar a Deus a todo tempo, a todo instante.

Recentemente, ouvi um testemunho de um irmão dizendo que aprendeu a buscar a Deus a cada instante do seu dia-a-dia e que o Senhor lhe tem falado muito nas mínimas coisas, até mesmo na paisagem à margem das estradas que sempre tem de percorrer por causa da sua ocupação. Que lindo vermos os céus e a terra proclamarem a glória de Deus e podermos ser atentos a isto. Invoquemos a Deus.

– Quando havia esta comunhão e esta crescente intimidade entre Abrão e Deus, surge um sério problema na vida do patriarca: a fome. Dizem as Escrituras, em Gn.12:10, que havia fome naquela terra.

Desta fome, Abrão não foi poupado e, assim, surge, na vida do patriarca próspero e com grande patrimônio, um problema inesperado.

Estava em terra estranha, habitada por gente que não era boa, sem residência fixa, com uma promessa de que aquela terra seria dada à sua semente, sendo que nem um filho sequer Abrão tinha e, agora, vê-se ameaçado o seu patrimônio.

O fato de Deus não ter impedido que Abrão sofresse as consequências da fome sobre a terra de Canaã é mais um episódio que desmente os teólogos da prosperidade, que, desde os tempos do patriarca Jó, propalam que o servo de Deus jamais pode passar por dificuldades econômico-financeiras.

Deus é o dono de todo o ouro e de toda a prata, não há dúvida alguma sobre isto, mas está muito mais interessado em que aprendamos a depender d’Ele inteiramente, a termos comunhão com Ele do que venhamos a ter riquezas e abundância de bens nesta vida, correndo, inclusive, o risco de nos apegarmos a estas coisas e, por conta disto, a exemplo do mancebo de qualidade(Mt.19:16-22), virmos a perder a nossa salvação.

Para que Abrão pudesse continuar crescendo espiritualmente, necessário se fazia que viesse a lição da dependência também nos assuntos materiais.

Lamentavelmente, entretanto, Abrão não aprendera, ainda, esta lição. Sobrevindo a dificuldade econômico-financeira, não invocou a Deus, como fizera em Betel, nem esperou que o Senhor lhe aparecesse, como fizera em Siquém, mas decidiu “descer para o Egito”, então o país mais promissor do mundo, que começava a se apresentar como nova potência mundial, onde a abundante água do rio Nilo, o maior rio do mundo, não permitia que houvesse dificuldades econômico-financeiras.

Era uma decisão acertadíssima do ponto-de-vista humano, uma grande demonstração de sabedoria e inteligência humanas, mas um verdadeiro desastre sob o aspecto espiritual. Com efeito, Deus não participou desta decisão, Abrão decidiu ir para uma terra que não era a mostrada nem a prometida por Deus e, ainda mais, sem consultar ao seu Senhor.

– “Descer ao Egito” passou a ser, por causa disto, uma expressão metafórica para toda decisão humana sem a orientação e a direção divinas. Passou a significar uma atitude de comprometimento com os valores humanos, com os princípios deste mundo, sem qualquer preocupação com a vontade divina.

Infelizmente, muitos são os crentes que estavam caminhando muito bem com o Senhor e, por uma dificuldade ou outra, acabam resolvendo “descer ao Egito”.

Não nos iludamos com a abundância material, com o caráter promissor ou com a hospitalidade e boa aparência do Egito: o Egito é o mundo e nele não há o essencial, o fundamental para a vida de qualquer crente, a saber, a presença, a direção e a aprovação de Deus.

– Uma vista rápida e irrefletida sobre o texto mostra que Abrão se comportara como qualquer pai de família responsável. O texto afirma que ele fora ao Egito apenas para peregrinar, porque a fome era muito grande na terra (Gn.12:10).

Entretanto, Abrão havia feito uma importante decisão em sua vida: a de seguir a Deus e a Sua orientação. Não poderia, pois, mais fazer o que quisesse de sua vida, sob qualquer argumento ou pretexto. Mesmo para peregrinar no Egito, deveria ter a ordem do Senhor, mas tudo fez por sua conta e risco.

Vejamos que Deus não impediu Abrão de descer ao Egito, como também não evitou que as consequências deste gesto tresloucado se fizessem sentir na vida do patriarca.

Do mesmo modo, Deus respeita o livre-arbítrio de Seus servos, avisa-os, aparece-lhes, atende-os quando invocado, mantém-se pronto a ajuda-los e protegê-los, mas deixa que cada um siga o caminho que bem entender, respondendo, naturalmente, pelo que vier a fazer.

– Seguir a nossa decisão, escolhermos o que fazer sem a direção nem a orientação de Deus é algo que nos deixa em péssima condição diante de Deus e dos homens.

Temos esta experiência e podemos afirmar que as vezes em que tomamos decisões por nossa conta e risco pagamos preço muito caro, que só não nos trouxe a completa destruição porque Deus é misericordioso e Seu amor tem impedido que venhamos a ser aniquilados por causa de nossa rebeldia e desobediência.

Nunca desçamos ao Egito. Nunca deixemos de pedir a orientação divina para as decisões de nossas vidas, não somente as decisões fundamentais e que marcam para sempre nossa história, mas as decisões que parecem extremamente singelas e até corriqueiras.

Deus deseja participar de toda a nossa vida e nada devemos subtrair ao senhorio de Cristo.

– Tomemos, porém, cuidado com a busca da orientação divina. Deus apareceu a Abrão e Lhe revelou a Sua vontade. Assim também, como Cristo vive em nós, devemos ter conhecimento da voz de nosso Senhor.

Não há qualquer necessidade de crentes irem correndo atrás deste ou daquele servo para conseguir uma palavra de Deus.

O irmão está em comunhão com Deus? Conhece Jesus? Então, com certeza, conhece a Sua voz (Jo.10:14,27) e, deste modo, sem precisar ir de um lado para outro, como se fosse ovelha desgarrada sem pastor, receberá a divina orientação no tempo, hora e lugar oportunos.

– Fora da direção divina, Abrão começa sua jornada para o Egito, que seria um grande fracasso espiritual. Quando estamos em dissonância com a vontade divina, nossos passos somente nos conduzirão para o abismo, pois, como afirma a Palavra, um abismo chama outro abismo (Sl.42:7).

É o que veremos neste período de Abrão, em que, ausentes o altar e a tenda, estarão presentes os pecados e as dificuldades decorrentes de sua prática.

– Logo ao chegar ao Egito, Abrão concerta-se com sua mulher Sarai para que contassem uma “meia-verdade”, ou seja, que Sarai se identificasse para a sociedade egípcia como irmã de Abrão, sem, entretanto, contar que também era sua mulher.

Vemos aqui que, longe da direção de Deus, logo o homem passa a praticar a mentira, porquanto a “meia-verdade” nada mais é que uma mentira inteira. Ao dizer que Sarai era sua irmã, Abrão não estava mentindo, mas sua intenção era a de enganar os egípcios, fazendo-os crer que Sarai não tinha marido.

Este é o intuito da chamada “meia-verdade”, é contar algo verídico, mas com a intenção de engano e de engodo, o que caracteriza a mentira inteira.

– A mentira é abominável aos olhos do Senhor. Não podemos praticar nem amar a mentira. O pai da mentira é o diabo (Jo.8:44).

Nos dias atuais, o adversário tenta mascarar a mentira, trazendo conceitos como “meia-verdade”, “mentira profissional”, “omissão”, “mentira comercial”, “força de expressão” ou outros que, no entanto, devem estar ausentes da vida do sincero servo de Deus.

Os mentirosos não herdarão o reino de Deus (Ap.21:8; 22:15). Seja nosso dizer “sim, sim; não, não”, pois o que passa disso, disse Jesus, é de procedência maligna (Mt.5:37, Tg.2:12; 5:12).

– É interessante verificar que, assim que Abrão chegou ao Egito, já arquitetou esta mentira com sua mulher. A mentira é a primeira anfitriã que surge no mundo sem Deus e cheio de pecado. Nem poderia ser diferente, pois não há comunhão entre a luz e as trevas e, quando estamos na luz, desfrutamos da Verdade, que é o próprio Cristo (Jo.14:6).

– A mentira traz, como consequência, a hipocrisia, o engano, a duplicidade. O servo de Deus aborrece a duplicidade e, por isso, ama a lei do Senhor (Sl.119:113).

O verdadeiro servo do Senhor é sincero, ou seja, “sem cera”, sem aparência enganosa, sem engodo, sem uma vida dupla, em que a aparência não corresponde à essência. O mais vigoroso discurso de Jesus foi contra a hipocrisia religiosa (Mt.23) e o Nosso Senhor é o mesmo.

Aos crentes aparentes e hipócritas, está reservado duro juízo por parte do Deus que tudo vê e tudo observa (Mt.7:21-23). Podemos enganar muitos por pouco tempo; poucos, por muito tempo, mas jamais conseguiremos enganar a Deus, com quem teremos de tratar (Hb.4:13). Na igreja, em especial, a mentira trará a morte e aos olhos de todos (At.5:1-11).

– Abrão, fora da direção de Deus, resolveu mentir para que fosse bem sucedido na sua vida no Egito. Intentava, com a mentira, evitar que fosse morto por causa de eventual cobiça que se tivesse sobre sua mulher Sarai.

Entretanto, tão esperto estratagema foi inócuo, pois, em razão da formosura de Sarai, aconteceu exatamente o que Abrão temia: Sarai foi levada para a casa de Faraó.

Assim é todo crente que, para ter vantagem, prefere pecar a confiar a Deus. Nunca nos devemos esquecer de que, embora tenhamos de fazer a nossa parte, é de Deus que vem nossa proteção e toda a sorte de bênçãos. Se O deixamos, nada poderemos fazer (Jo.15:5).

Como já dissemos tanto nesta lição, a vida de Abrão mostra-nos que a prosperidade material nem sempre corresponde a um nível espiritual agradável a Deus. Diz a Bíblia que Faraó concedeu a Abrão muitos bens por causa de Sarai.

A mentira trazia aparentes vantagens para Abrão, pois, por força da tomada de Sarai para a casa de Faraó, seu patrimônio foi aumentado e Abrão alcançou posição social de proeminência no Egito. Entretanto, nada disso representava coisa alguma agradável a Deus.

Devemos sempre nos policiar, pois, muitas vezes, as vantagens materiais advindas de uma conduta errônea perante Deus nada significa em termos de aprovação divina, mas, muitas vezes, como foi no caso de Abrão, não passam de ciladas e artimanhas do adversário.

Abrão teve aumentado seu patrimônio, mas não tinha comunhão com Deus, nem altar nem tenda estavam presentes. Muito pelo contrário, Abrão começava a fincar perigosas raízes numa terra que não era a da vontade de Deus.

– Não demorou muito, entretanto, para que Deus mostrasse Seu desagrado com aquela situação. Logo Deus feriu a Faraó com grandes pragas. O servo de Deus que fora chamado para ser uma bênção (Gn.12:2), agora era a causa de males e sofrimentos para os que estavam a seu redor.

Este é mais um vigoroso alerta da Palavra de Deus para os que se decidiram servir a Deus: Deus tem um plano em sua vida, irmão(ã), de ser uma bênção.

Todavia, se houver resistência, se houver relutância, Deus, que respeita o livre-arbítrio do homem, não impedirá que haja esta recusa, mas, inevitavelmente, o(a) irmão(ã) passará a ser causa de males, sofrimentos e de pragas para os que estiverem ao seu redor.

– A Bíblia não nos informa como Faraó descobriu que a causa de todo aquele sofrimento era Abrão, mas o fato é que Deus, que estava no controle de tudo, permitiu que a verdade fosse descoberta.

É importante aqui ressaltar que a revelação da verdade foi obra de Deus e que isto veio a lume por permissão divina, ainda que Faraó tenha chegado a tais conclusões, aparentemente, por obra dos seus magos e adivinhadores.

Deus tem compromisso com Seus propósitos e com Sua Palavra e, para tanto, como é soberano, pode valer-se dos meios que bem entender.

Sua Palavra diz, como já dissemos supra, que toda hipocrisia será revelada, pois nada ficará encoberto (Ec.12:14). Assim, não nos surpreendamos quando houver revelações por meios estranhos ou até repugnantes (como por meio de magos, como deve ter ocorrido no Egito), pois devemos sempre ver nisto o zelo e o cuidado do Senhor, cuja soberania será somente realçada nestes episódios.

– Descoberta a mentira de Abrão, passou ele muita vergonha. Desmascarado publicamente, foi expulso do Egito, juntamente com sua mulher.

O pecado jamais trará vantagem verdadeira e permanente para o homem. Só a bênção do Senhor enriquece e não acrescenta dores (Pv.10:22), enquanto que os supostos benefícios trazidos pela vida pecaminosa, além de efêmeros, somente trazem problemas, dificuldades e derrotas. É por isso que o apóstolo Paulo afirma que a corrida às riquezas nunca têm um final agradável (I Tm.6:9,10).

Abrão saiu, pela misericórdia divina, com um patrimônio grande, mas de forma vergonhosa, humilhante, sem qualquer autoridade moral, como um verdadeiro criminoso, tanto que foi escoltado até a fronteira pelos soldados de Faraó (Gn.12:20).

– Quão distante estava Abrão do propósito divino para a sua vida! Humilhado, escoltado, ainda que rico e cheio de bens e de servos e servas (entre os quais, muito provavelmente, encontrava-se Agar, que lhe seria, futuramente, mais um grande problema, problema, aliás, que perdura até hoje, como se pode ver no Oriente Médio).

Como é triste para um servo de Deus sair da direção e orientação de seu Senhor. Querido(a) irmão(ã), faça um exame na sua vida e verifique se você se encontra em Canaã ou se já desceu ao Egito e lá está envolvido com a mentira, com a duplicidade, com a hipocrisia, com o engano, embora possa até estar desfrutando de uma prosperidade material.

Ainda é tempo, deixe o Egito ainda hoje, fale a verdade (Zc.8:16; Tg.4:4,7-10) e seja mais do que vencedor (Rm.8:37).

Mas, mesmo voltando do Egito, Abrão tinha ainda um problema para se inserir completamente no propósito divino. Ló era um obstáculo para a realização do propósito divino na vida de Abrão.

 Hoje, ao lermos a Palavra, sabemos, temos consciência de que Ló, que era praticamente o herdeiro de Abrão, não poderia ficar na casa do patriarca, que haveria de ter um filho , o filho da promessa.

Hoje o sabemos, mas Abrão não o sabia. Entretanto, Deus havia dito a Abrão que dele faria uma grande nação e, portanto, como a ordem era exclusiva a ele (e a sua mulher, que era carne de sua carne, osso de seus ossos), seu sobrinho não se encontrava nesta promessa e dela não poderia compartilhar.

Observemos que Ló é apontado na Bíblia como justo e que, portanto, não havia erro na vida de Ló. Simplesmente, o propósito de Deus para Abrão exigia a separação de Ló.

Deus, então, na Sua infinita misericórdia, ante a persistência deste obstáculo, permitiu que houvesse um problema na convivência entre tio e sobrinho.

Diz o texto sagrado que a terra “não tinha capacidade para poderem habitar juntos, porque a fazenda era muita, de maneira que não podiam habitar juntos”. Havia uma situação de incompatibilidade entre Abrão e Ló, não pelos seus sentimentos, não pelas suas vidas, mas por causa da falta de espaço.

A prosperidade material de ambos havia tornado impossível a convivência. Apesar desta constatação, nem um, nem outro ousaram propor a separação e o resultado foi que surgiu o conflito, a contenda.

Veio a contenda e, então, o patriarca acordou. Embora gostasse muito de Ló e o amasse, Abrão percebeu que não havia mais condições para que seu sobrinho com ele continuasse convivendo.

Abrão demonstrava estar crescendo espiritualmente, pois, ao propor a separação a Ló, não visou a vantagem, o benefício imediato, nem acusou o sobrinho de estar criando a contenda.

Ao invés de buscar culpados, de “fazer justiça”, analisou a situação, ponderou e verificou que o melhor era a separação, era fazer a vontade de Deus. Quantos crentes não arrumam sérios problemas na sua vida porque não querem enxergar as dificuldades por que estão passando do ponto-de-vista espiritual ?

Buscam culpados, procuram “fazer justiça”, mas, o que devem fazer, que é a o auto-exame, a reflexão do propósito de Deus para suas vidas, não fazem e a contenda não cessa, só aumenta.

Abrão acordou espiritualmente, viu que sua atitude de mantença de Ló contrariava a vontade de Deus e decidiu pôr fim à contenda, assumindo a responsabilidade pelo seu aparecimento, a ninguém culpando e nada visando a não ser o cumprimento da vontade de Deus.

– Abrão dirigiu-se a seu sobrinho e lembrando que estavam numa mesma família, disse-lhe da necessidade de separação em virtude da contenda, algo que não era adequado para uma casa onde Deus estava reinando e guiando os passos de todos.

Que belo exemplo ! Será que temos tido a preocupação de, em nossas relações familiares, darmos testemunho do nome do Senhor ?

Será que temos tido a preocupação, na igreja do Senhor, de testificarmos que “irmãos somos” ? Esta foi a principal preocupação do patriarca, preocupação que lhe fez, inclusive, abrir mão do seu direito de escolha em favor de seu sobrinho.

– Quando não buscamos o que é próprio, quando não agimos com ganância ou cobiça, o Senhor abençoa-nos ricamente.

Abrão buscava vencer a contenda, eliminar aquela situação que era fruto de uma inobservância da ordem divina. Assim, confiante em Deus, propôs a seu sobrinho Ló que escolhesse que parte da terra queria para si.

Este gesto, humanamente errôneo, estava revestido da direção e da aprovação divinas. Ao sair para o lugar aparentemente melhor, não foi Ló que recebeu a visita e a promessa de Deus, mas, sim, Abrão.

 Por quê ? Porque Abrão agiu segundo a vontade de Deus. O crente deve, também, não buscar o que é propriamente seu, mas sempre considerar os outros superiores a si mesmo (Fp.2:3,4).

É este o sentimento que teve Nosso Senhor (Fp.2:5) e devemos ser Seus imitadores (I Co.11:1).

Ló, entretanto, não teve este sentimento. Seus olhos eram puramente voltados para as coisas desta vida e o que viu foram somente as campinas verdejantes da planície.

Viu a fortuna, a prosperidade material, a abundância de pasto para seus rebanhos. Não conseguiu ver a maldade e impiedade dos moradores de Sodoma e das demais cidades da planície.

Uma visão puramente materialista é algo que pode ocorrer na vida de uma pessoa justa, como era Ló. Não podemos olhar com os olhos carnais, não devemos conduzir-nos por vista, mas por fé (II Co.5:7).

Como temos agido no cotidiano de nossas vidas ? Verificado as circunstâncias que nos cercam e raciocinado única e exclusivamente segundo as variantes e os fatores humanos, ou temos procurado entender o significado espiritual das situações em que nos encontramos ? Estamos olhando para os montes ou para o Senhor (Sl.121:1,2) ?

– Neste episódio, vemos que dois justos podem ter decisões completamente distintas, caso não estejam animados pelo Espírito de Deus.

Abrão conscientizou-se da necessidade da separação para que se cumprisse a vontade de Deus e o plano divino para sua vida. Buscava agradar a Deus.

Ló, entretanto,que até ali havia estado com seu tio por livre e espontânea vontade, mesmo sendo justo, quis levar vantagem, quis tirar proveito da circunstância. Era alguém que vagueava sem que tivesse qualquer chamada divina.

Alguém que desfrutava das bênçãos por conta da fidelidade e resposta ao chamado de Abrão.

Era um nítido “crente de carona”, aquele que é abençoado em virtude da vida santa e bem dirigida de quem está a sua volta. Que tipo de servo é o(a) irmão(ã). Tem atendido ao chamado de Deus na sua vida ou está indo na companhia de algum chamado ?

Tem consciência do propósito de Deus na sua vida ou está apenas tirando vantagem, sobrevivendo e até prosperando por conta do chamado de outro? Estejamos conscientes da vontade de Deus para nossas vidas.

Isto deve algo sempre presente na mente do cristão. Daí porque, no Pai nosso, Jesus ter incluído a frase “seja feita a Tua vontade”, numa clara demonstração de que o crente deve estar plenamente ciente da vontade de Deus para ele, algo que Jesus prometeu sempre nos informar (Jo.15:15,16).

Após a escolha feita por Ló, Abrão teve mais uma manifestação de Deus. Deus apareceu a Abrão, diz o texto sagrado, “depois que Ló se apartou dele”(Gn.13:14), o que demonstra o que já dissemos, ou seja, que Ló era um obstáculo a mais a ser removido na vida de Abrão para que o plano de Deus pudesse se realizar plenamente.

 O aparecimento de Deus a Abrão foi uma confirmação ao patriarca de que havia sido superada a fase de desobediência e de desatendimento à vontade de Deus na sua vida.

Terminava um período de prova espiritual para Abrão, Deus renovava Suas promessas e o patriarca encontrava-se vitorioso.

Havia vencido a mentira, o sentimento de auto-suficiência, a ganância e dava um decisivo passo de fé na sua caminhada espiritual. O homem que, ao sentir a fome, correra para o Egito, agora era um homem que abrira mão do seu direito patriarcal de escolher a melhor terra e resolvera viver na dependência exclusiva de Deus.

Ponto interessante é que Abrão, ao se abster de escolher uma parte da terra, teve a promessa de Deus de receber toda a terra.

 O Senhor prometeu-lhe a banda do norte, do sul, do oriente e do ocidente (Gn.13:14), ou seja, tudo(Gn.13:15).

Assim continua ocorrendo na vida dos servos fiéis. Se nos abstivermos das coisas deste mundo, se não buscarmos as coisas desta vida, teremos aqui cem vezes tanto e, no porvir, a vida eterna (Mt.19:27-29).

Nunca nos esqueçamos de que o que temos é muito mais valioso que o mundo inteiro e que a glória que nos está reservada não dá para comparar com coisa alguma desta vida (Rm.8:18).

Como disse o cantor sacro: “Metade da glória celeste, jamais se contou ao mortal !”.

Não bastasse isso, Abrão recebeu, ainda, a promessa divina de que sua semente seria como o pó da terra.

Se os “filhos de Abraão” são inúmeros do ponto-de-vista carnal (veja-se a população de árabes e judeus através dos séculos), que dirá do ponto-de-vista espiritual, ou seja, todos os servos sinceros e fiéis a Deus que, durante as dispensações, têm se levantado para honrar e adorar o verdadeiro Deus.

São multidões, milhões e milhões, como se vê no Apocalipse (Ap.5:11; 19:6).

– Quando se diz que a descendência de Abrão é como o pó da terra, vemos, também, aqui uma observação divina a respeito de Seus servos. Assim como o pó é imperceptível aos olhos humanos, mas está presente e faz diferença onde se encontra, assim são os servos de Deus.

Não há lugar onde não se encontrem servos do Senhor nesta face da terra. Mesmo que haja perseguições, que haja preconceitos, que haja uma luta incessante do maligno para calar e desviar os servos do Senhor, sempre há aqueles que não se dobram a Baal e que exaltam e testificam do Senhor.

Conhecidas são instituições em todo o mundo, mesmo no Brasil, onde há verdadeiro preconceito e cruel perseguição aos servos do Senhor, mas, como o povo de Deus é como o pó da terra, por mais que pelejem contra eles, eles ali estão, vencendo em nome do Senhor e fazendo com que os homens glorifiquem ao nosso Pai que está nos céus por causa de suas boas obras (Mt.5:16). É promessa de Deus desde os tempos de Abrão !

Sem os obstáculos criados por ele mesmo, Abrão atende à ordem do Senhor, arma suas tendas e foi habitar nos carvalhais de Manre, edificando um altar ao Senhor (Gn.13:18).

 A comunhão estava plenamente restabelecida. Voltavam a tenda e o altar. Não havia mais Ló nem a ganância, muito menos o medo e a inércia. O nosso patriarca iniciava o percurso na terra, armando suas tendas e edificando seus altares. Começava a vida de fé.

IV – A BIOGRAFIA DE ABRAÃO (III) – O HOMEM QUE SOUBE ESPERAR O CUMPRIMENTO DA PROMESSA

– Removido este obstáculo, Abrão passou a viver em paz na terra de Canaã, embora fosse um peregrino, inclusive sendo protegido por Deus de uma guerra que sacudiu a região, quando os reis de Sodoma, Gomorra, Admá, Zeboim e Zoar se rebelaram contra o rei de Sinar (Gn.14:1-11).

Abrão tinha a companhia e o consolo de Deus e vivia sua vida nesta esperança, sem se perturbar com a agitação do mundo à sua volta. Assim é o verdadeiro e sincero servo de Deus.

Estará, sim, no meio das grandes turbulências da política internacional, estará no meio das agitações que caracterizam o mundo sem Deus e devem até se intensificar, mas, apesar de todos os conflitos, manterá sua confiança em Deus e tirará destas situações tão angustiantes um motivo maior de esperança para si (Mt.24:4-8).

– Entretanto, Deus mostra toda a Sua misericórdia e Seu amor para com os homens, aproveitando-se desta situação de guerra generalizada.

Com efeito, apesar de toda a força e supremacia do exército dos reis mesopotâmicos, que ninguém e nada puderam resistir, a Bíblia dá-nos conta de que um escapou e foi ter com Abrão para lhe contar o que estava acontecendo.

Com certeza, esta pessoa que escapou era alguém que tinha conhecimento de Abrão e de sua vida diferente. Quem sabe era um servo de Ló, que, por sua insignificância e humildade, nem sequer foi notado pelos exércitos vencedores. Era alguém que não tinha qualquer importância ou relevância e que, por isso mesmo, conseguiu escapar.

Ao chegar até a tenda de Abrão, contou-lhe o que estava passando e o patriarca pôde ver nesta pessoa tão insignificante, a mão de Deus.

Por isso, devemos estar sempre atentos e vigilantes, para que possamos perceber Deus nas mínimas coisas. O profeta Zacarias adverte-nos para não desprezarmos as coisas pequenas (Zc.4:10).

Será que temos estado atentos às pequenas coisas que Deus tem nos mostrado ? Ou temos perdido ricas oportunidades de servir a Deus e de testificarmos Seu nome por conta deste desprezo das pequenas coisas?

– O fugitivo foi direto falar com Abrão, ao seu encontro, numa demonstração de que o testemunho de Abrão já era conhecido pelos povos daquela terra.

Na sua simplicidade, no seu modo pacato de vida, Abrão já se fazia conhecer dos homens, era diferente dos demais, tanto que o texto bíblico faz questão de ressaltar que o fugitivo fora ter com Abrão, o hebreu (Gn.14:13).

Todas as tradições das religiões monoteístas insistem em mostrar o patriarca como um homem diferente dos demais de seu tempo.

 O texto bíblico chama-o de “hebreu”, ou seja, como descendente de Eber (Gn.12:15-17), talvez para ressaltar o fato de que Abrão era descendente de Sem e, portanto, de linhagem diversa dos moradores de Canaã, que eram descendentes de Cão (Gn.10:6-20).

Mas havia algo além disso, porquanto os reis mesopotâmicos, também, em parte, eram descendentes de Sem. Era o modo de vida diferente de Abrão, sua crença num Deus único, sua conduta diversa da dos demais habitantes da terra.

– Será que temos tido o mesmo testemunho que Abrão tinha em Canaã? Mesmo peregrino, sem residência fixa, o patriarca notabilizara-se por ser “o hebreu”, o diferente, o homem dotado de valores distintos dos dos demais homens.

Será que temos sido identificados, em nosso modo de viver, como um “hebreu”, ou seja, como alguém que tem uma outra esperança, que tem uma ética, um sistema de valores e de princípios diferentes dos do mundo que nos cerca ?

Ou será que vivemos numa mistura, numa indistinção, que nos torne comprometidos com o mundo que está imerso no maligno(I Jo.5:19)? Ao contrário de Ló, Abrão mantinha uma distinção, uma diferença que era notada pelos homens de seu tempo e que, certamente, será notada pelos homens de nossos dias ao avistarem um verdadeiro servo do Senhor (Mt.5:14-16).

– O fugitivo chegou até onde estava Abrão e lhe relatou tudo o que estava acontecendo e Abrão pôde ver neste gesto de escape do fugitivo um chamado de Deus para ajudar e libertar não só seu sobrinho Ló, mas todo o povo palestino. Abrão não agiu por impulso, por instinto familiar, como pode parecer à primeira vista.

 Diz-nos o texto que “ouvindo Abrão que o seu irmão estava preso, armou os seus criados”. O texto mostra-nos, claramente, que Abrão primeiro ouviu o relato que se lhe deu e, em seguida, resolveu agir, armando os seus criados. Foi algo feito na direção de Deus, com discernimento espiritual.

 Sim, pois, em termos de lógica humana, Abrão não teria tomado uma atitude desta natureza, pois os exércitos vencedores eram os mais poderosos de seu tempo e os criados de Abrão não eram soldados, tanto que tiveram de ser armados pelo patriarca.

Entretanto, Abrão viu a situação como uma demonstração divina de que era momento de atacar e libertar não só seu sobrinho Ló, mas todos aqueles povos. Abrão, certamente, não poderia entender que Deus estava querendo mostrar a todos os povos palestinos a Sua grandeza, mas tinha consciência de que era do agrado de Deus que fosse efetivar a libertação de seu sobrinho.

– Neste ponto, verificamos que Abrão possuía um caráter bom, sem ressentimento nem rancor.

Poderia, muito bem, ter considerado que o cativeiro de Ló era resultado de sua cobiça, de sua insolência, de sua ingratidão e, tranquilamente, ter deixado as coisas “nas mãos de Deus” ou ter aproveitado a ocasião para ministrar a seus servos sobre as “excelências da justiça divina”, sobre ” o resultado da desobediência e da ganância”.

No entanto, Abrão era um verdadeiro servo de Deus e, como tal, tendo o mesmo sentimento de Deus, não tinha prazer na morte do ímpio, muito menos daquele que havia se deixado comprometer com o ímpio, embora permanecesse justo.

Assim, ao invés de se regozijar no destino triste daquelas pessoas, resolveu lutar e libertar aquelas almas. Qual tem sido nosso comportamento em situações similares ?

Temos nos alegrado com a derrocada dos nossos inimigos ? Temos nos regozijado com o fracasso daqueles que se comprometeram com o mundo e que, até por isso, causaram-nos danos tempos atrás ? Lembremos que não é este o comportamento que se espera de um verdadeiro servo do Senhor ( Pv.24:17).

– Antes, porém, de ir para a batalha, Abrão, além de ouvir o relato do fugitivo e de ter o discernimento espiritual, tomou algumas providências altamente elucidativas para os servos de Deus que vivem em batalha contra o mal (Ef.4:10,11).

 Em primeiro lugar, Abrão “armou todos os seus criados”. Não poderia o patriarca ir enfrentar os exércitos vencedores, a mais poderosa força armada de seu tempo, com os seus servos desarmados.

Entretanto, muitos servos de Deus querem enfrentar o diabo e seus anjos completamente sem qualquer preparação, sem qualquer componente da armadura de Deus ?

 Por isso, muitos têm fracassado e sido derrotados pelo nosso adversário. O apóstolo Paulo é claro ao afirmar que devemos “nos revestir de toda a armadura de Deus”. Muitos pretendem enfrentar o adversário, no dia-a-dia de nossas vidas, com emoções, com sentimentalismos, com recursos humanos, quando precisamos de armas espirituais, pois nossa luta não é contra a carne nem contra o sangue.

– Abrão, também, mostra, com sua atitude de ir socorrer o seu irmão Ló, que não havia apenas chamado e considerado Ló como irmão em palavra, no momento de se evitar uma contenda (Gn.13:8), mas, também, no instante em que havia necessidade de uma ação, de uma luta.

O cristão verdadeiro não ama apenas de palavra, mas com gestos concretos. Não é apenas benigno (ou seja, tem uma índole boa, deseja sinceramente o bem do próximo), mas também é bom (faz coisas boas, age concretamente pelo bem do outro).

Tanto a benignidade quanto a bondade são qualidades do fruto do Espírito (Gl.5:22). O que notabilizou Jesus foi a sua bondade, as suas ações boas (At.10:38). O que fará com que os homens glorifiquem a Deus serão as nossas boas ações, não somente as boas intenções (Mt.5:16).

– Além de ter “armado os criados”, Abrão tomou o cuidado de somente armar os criados que eram “nascidos na sua casa”.

Pela grandeza do patrimônio e da importância que Abrão estava tendo, verificamos que, certamente, Abrão possuía servos e pessoas que para ele trabalhavam para ele temporariamente ou que a ele se agregaram, mas Abrão somente armou os criados que eram nascidos na sua casa, ou seja, aqueles que desfrutavam dos mesmos valores, princípios, da mesma crença.

Isto é importantíssimo para nós como uma lição a respeito de como a igreja local deve operar com relação à obra de evangelização, com relação ao ministério.

Com efeito, não pode armar senão os “nascidos em casa”, ou seja, aqueles que desfrutam da intimidade da comunidade, aqueles que estão sendo formados por nós.

Quanto prejuízo não tem sido causado quando entregamos os púlpitos ou a palavra em nossas igrejas a quem não é “nascido em casa”, a quem tem outra formação e outros pensamentos a respeito da Palavra e do Senhor ?

 Abrão teve até a ajuda de aliados, mas só armou os criados nascidos em casa. Eis porque o apóstolo Paulo, inclusive, afirma a Timóteo que não devemos chamar ao ministério os “neófitos” (I Tm.3:6), pois ainda não estão integralmente formados, não se encontram devidamente armados para estar na linha de frente da batalha.

– Foram encontrados trezentos e dezoito servos, os quais, devidamente armados, iniciaram a perseguição dos inimigos, com esforço, dedicação e determinação.

Quando a Bíblia diz que houve perseguição(Gn.14:14,15), demonstra que houve insistência, que os trezentos e dezoito servos eram determinados e, sob o comando de Abrão, não descansaram enquanto não atingiram seu objetivo, seu propósito.

 O servo de Deus deve ter esta determinação. Somente assim se agradará a Deus. Jesus disse que havia consumado a obra que lhe foi dado fazer (Jo.17:4) e Paulo afirmou que prosseguia para o alvo (Fp.3:13,14), só tendo descansado quando acabou a carreira (II Tm.4:7).

Deus não tem prazer naquele que recua (Hb.10:38). Será que temos sido insistentes na obra de Deus ? Será que podemos tornar realidade o que relatou o saudoso pastor Paulo Leivas Macalão no hino 149 da Harpa Cristã:

“Quando há um temporal, e a pesca corre mal, novamente no meu barco vou pescar! Pode ser que desta vez eu não tenha mais revés, pois Jesus eu levo para m’ensinar”?

– Outra lição que aprendemos neste episódio diz respeito à divisão do trabalho. Embora Abrão tenha tomado cuidado em escolher apenas servos “nascidos em casa”, não apresentou qualquer atitude centralizadora.

Pelo contrário, o texto afirma que Abrão “dividiu-se contra eles de noite, ele e seus criados”. Há necessidade de que as tarefas na luta contra o mal sejam divididas.

A divisão do trabalho foi a forma escolhida por Deus na organização de Seu povo. Moisés seguiu o sábio conselho de seu sogro e dividiu as tarefas de seu ministério com homens fiéis (Ex.18:13-27), Davi dividiu o serviço de louvor no que viria a ser o templo de Jerusalém (I Cr.23-26), Jesus estabeleceu diversos dons ministeriais e espirituais na Sua igreja (Ef.4:11-13; I Co.12).

O centralismo exacerbado não tem respaldo bíblico e muitas igrejas locais têm sofrido com este desvio doutrinário.

– Neste ponto, cabe-nos, aqui, falar a respeito dos “trezentos e dezoito servos de Abrão”, até porque esta passagem tem sido utilizada por algumas denominações evangélicas em prol da teologia da prosperidade.

Os trezentos e dezoito não trouxeram a prosperidade material para Ló e para os demais cativos.

Muito pelo contrário, foram vencedores, não por causa e para que se obtivesse a prosperidade a prosperidade material nesta luta.

A retomada de todos os bens e de todas as pessoas estava relacionada com a necessidade de Deus Se revelar aos povos palestinos como o Deus Supremo, o único e verdadeiro Deus. Não se tratava de obtenção de bens materiais, mas de demonstração do poder divino sobre as circunstâncias.

Abrão não foi à luta com objetivos materialistas, muito menos seus trezentos e dezoito servos, que, aliás, nada obtiveram em termos materiais nesta luta. Assim, não podemos concordar que esta passagem seja usada como um mote para a teologia da prosperidade.

Abrão já era próspero e a luta não aumentou, em coisa alguma, seu patrimônio. Aliás, Ló havia perdido tudo exatamente porque havia feito da prosperidade material o objetivo de sua vida justa.

– O resultado de uma luta na direção de Deus foi o da vitória completa, com a libertação dos povos palestinos, bem como de seu patrimônio. Abrão não quis qualquer despojo e sua vitória foi excepcional, pois, com um grupo de servos, venceu poderosos exércitos.

Não devemos olhar para as circunstâncias, não devemos pensar com nossos pensamentos, mas, sempre, fazermos o que é da vontade de Deus, pois a vitória é uma realidade que virá inevitavelmente, se estivermos na direção do Senhor e imbuídos do propósito de agradá-l’O e glorificá-l’O.

A vitória vem, mas por nosso Senhor Jesus Cristo ( I Co.15:57).

– Sem dúvida, perplexos ficaram os povos palestinos com a demonstração de poderio e de humildade do patriarca que, vencedor de uma grande guerra, mantém-se submisso a seu único Deus, cujo nome é exaltado através de Melquisedeque, bem como rejeita a oferta de riquezas efetuada pelo rei de Sodoma.

De maneira surpreendente, volta para sua habitação, rejeitando a fama, as riquezas deste mundo ou qualquer posição social elevada.

-O capítulo 15 do livro do Gênesis começa, então, com mais uma manifestação divina na vida de Abrão. Afirma o texto que, “depois destas coisas, veio a palavra do Senhor em visão”.

Como é importante estarmos em comunhão com o Senhor, sabermos que Deus tem observado cada gesto nosso e que, ao rejeitarmos o mundo e o que ele oferece, o Senhor está sempre disposto a mostrar o Seu agrado com nossa busca contínua de santificação.

– Deus inicia Sua fala com a expressão “Não temas”. Esta expressão é uma segurança para a vida do cristão.

Reproduzida por 365 vezes na Bíblia Sagrada (uma para cada dia do ano), é a expressão divina de garantia aos fiéis, àqueles que confiam no Senhor, é a certeza de que vale a pena esperar em Deus e confiar em Suas promessas.

 Abrão poderia estar se perguntando o que seria de sua vida dali para a frente. Apesar da conquista militar, tinha observado que não era assim que Deus lhe daria aquela terra que a sua semente havia sido prometida e, muito mais do que isto, que semente era esta que até o momento não havia surgido, sendo sua mulher estéril e ele já avançado em dias?

Todavia, diante destas interrogações, Deus simplesmente diz ao patriarca; “não temas”. Séculos e milênios mais tarde, a um grupo de discípulos apavorados, que se sentiam sós e perdidos no meio do mar, Jesus repete a mesma expressão: “sou eu, não temais” (Mt.14:27).

Da mesma forma, quando estamos atemorizados, sem direção, abalados no rumo que tem tomado nossas vidas apesar das promessas do Senhor, a voz de Deus vem ao nosso encontro e nos repete : “não temas”.

OBS: Como diz o cantor sacro: “Solta o cabo da nau, toma os remos na mão e navega com fé em Jesus e então tu verás que bonança se faz, pois com Ele seguro serás.”(hino 467 da Harpa Cristã).

– Mas Deus não se limita a pedir a Abrão para que não temesse, mas afirma ao patriarca que Ele era “o seu escudo, o seu grandíssimo galardão”(Gn.15:1). Deus é o nosso escudo, ou seja, é a nossa garantia, a nossa defesa, a nossa retaguarda. O escudo é uma arma de defesa, sendo a própria fé assim simbolizada (Ef.6:16).

Por mais vezes nas Escrituras, Deus assim Se apresenta para o Seu povo. Não temos o que temer, Deus é o nosso escudo.

– Além de escudo, Deus Se apresenta a Abrão como o “seu grandíssimo galardão”. Quando tudo parecia ter sido perdido, como tudo demonstrava que Abrão havia perdido uma grande oportunidade de se tornar um poderoso senhor da Terra Prometida, Deus lhe mostra que o servo do Senhor deve ter como único prêmio, como único galardão o próprio Deus. Será que temos caminhado buscando este prêmio, que é o próprio Deus ?

Será que temos o mesmo sentimento que tinha o apóstolo Paulo, que tinha como alvo de sua vida o prêmio da soberana vocação (Fp.3:12-16). O que o irmão tem buscado ? Qual prêmio tem escolhido ? Livramo-nos do prêmio da injustiça – II Pe.2:15.

– Após declarações tão firmes e preciosas, Abrão revela estar em uma grande intimidade com Deus, a ponto de lhe revelar as suas incertezas e agruras. Como homens, somos levados a pensar no futuro e a verificar que as circunstâncias presentes não são possíveis de confirmar as promessas divinas.

Nestes momentos, devemos ir ao encontro do Senhor e manifestar-lhe todos os nossos temores, todas as nossas angústias. Como diz o apóstolo Pedro, devemos lançar toda a nossa ansiedade sobre o Senhor, porque Ele tem cuidado de nós (I Pe.5:7).

Ao invés de darmos guarida a estes temores e de desfalecermos na fé, devemos buscar no Senhor a confirmação de Suas promessas. A vida de comunhão permite-nos tal intimidade. Cheguemo-nos com confiança ao trono da graça, pois. (Hb.10:19-23).

– Para Abrão, não havia como confirmar-se a promessa de Deus, já que não tinha filhos nem força para efetuar uma conquista militar que lhe trouxesse supremacia na Terra Prometida, já que “perdida a oportunidade” após a vitória sobre os reis mesopotâmicos.

Contudo, não era assim que as coisas se dariam e Deus não deixou Abrão perplexo ou duvidoso. Antes, como verdadeiro escudo do patriarca, mostrou-lhe o que haveria de acontecer e, muito mais do que isto, confirmou as promessas de um modo indiscutível.

Tenhamos a convicção que, para os Seus servos, o Senhor sempre revelará o que ocorrerá (Am.3:7; Jo.15:15).

– Deus revela aos Seus servos o que ocorrerá, mas nem sempre como ocorrerá. Nunca nos esqueçamos que Deus é o Senhor e Soberano, de forma que não tem qualquer obrigação para conosco em nos dar pormenores de como tudo se dará. Por Seu grande amor e por Sua fidelidade, Deus revela aos Seus servos o que acontecerá, mas num ambiente de comunhão e de intimidade que tem para com os Seus servos.

Não existe, portanto, qualquer respaldo bíblico para condutas que tem sido apregoadas ultimamente no meio da igreja, como a de determinação da forma como Deus deve agir, por conta da Sua fidelidade, ou, mesmo, uma obsessão de muitos que buscam em profetas, profetisas ou outros irmãos abençoados com os dons espirituais uma confirmação, um caminho para seguir.

Deus orienta também por intermédio desses vasos mencionados, mas o crente não é alguém que deva estar correndo de um lado para outro, como ovelha desgarrada sem pastor, mas, muito pelo contrário, deve ser alguém que tenha discernimento espiritual, que busque em Deus a resposta para seus temores e que aguarde a manifestação do Senhor no seu lugar, pois Deus é o nosso escudo e está pronto a atender ao nosso clamor, pois, como ovelhas Suas, conhecemos a Sua voz (Jo.10:11-16).

Deus, então, diz a Abrão que seu servo Eliezer não seria o seu herdeiro, como ele imaginava, muito provavelmente depois da separação de Ló, mas, sim, alguém que saísse de suas entranhas.

Deus disse o que faria, mas não disse como e, como demonstração de Sua fidelidade e compromisso, pediu a Abrão que fosse ver o céu e que visse as estrelas e tentasse contá-las, o que era, evidentemente, impossível.

Assim, disse o Senhor, seria a descendência de Abrão e o patriarca creu nas palavras do Senhor e, por isso, foi justificado diante de Deus.

Este trecho do livro do Gênesis reveste-se de fundamental importância na compreensão do relacionamento entre Deus e o homem, pois, será o episódio básico para a compreensão pelo apóstolo Paulo da justificação pela fé, a única forma pela qual o homem alcança a comunhão verdadeira e perene com o Senhor, na epístola que escreveu aos Romanos.

De igual modo, este texto paulino será a base da Reforma Protestante de Lutero no século XV.

– Crer em Deus é, como se vê, resultado de se olhar para o céu. Crer em Deus é seguir a direção e a orientação divinas, independentemente do que esteja à sua volta.

Com efeito, o fato de Abrão ter olhado para o céu e ter ouvido a voz do Senhor, não havia alterado, de imediato, coisa alguma na sua vida, mas isto não foi obstáculo para que o patriarca cresse, acreditasse nas palavras do Senhor.

Será que temos tido o mesmo comportamento nas nossas vidas ou será que esperamos que as circunstâncias mudem para que passemos a dar crédito a Deus ?

 Dar crédito a alguém é confiar neste alguém. Como um comerciante dá crédito a um freguês se não lhe vende fiado ?

Como um banco dá crédito a um cliente, se não lhe empresta dinheiro ? Como podemos dizer que damos a crédito a Jesus, se não passamos a fazer o que Ele nos manda enquanto não muda algo em nossa vida ?

Cuidado com aqueles que confundem confiança em Deus, fé em Deus, com submissão divina aos nossos caprichos, com operações imediatas da divindade, porque o salmista disse que “o Senhor é já “.

 Para que sejamos justificados diante de Deus, temos de ter fé em Deus e fé não é barganha, fé não é ver para crer, mas crer sem ver. Aliás, foi por isso que o escritor aos Hebreus definiu fé como o “firme fundamento das coisas que se esperam e a prova das coisas que não se vêem”(Hb.11:1).

– Abrão, ao ouvir, mais uma vez, a promessa de Deus de que a terra de Canaã seria dada à sua descendência, pede a Deus mais uma prova e Deus, então, determina que Abrão ofereça um sacrifício, determinando o modo que isto deveria ser feito.

A apresentação do sacrifício por Deus a Abrão deve ser considerado sob alguns aspectos. Em primeiro lugar, porque Abrão estava acostumado, pela sua formação cultural e pela sua própria forma de servir a Deus, com a oferta de sacrifícios, de holocaustos ao Senhor.

Isto nos mostra que Deus não violenta a cultura dos homens para Se revelar a eles, circunstância que deve estar presente nos membros de Sua igreja, porquanto Deus nos manda pregar o evangelho a todos, mas não de uma só forma. Aliás, as Escrituras revelam que a graça de Deus é multiforme (I Pe.4:10).

– Em segundo lugar, o sacrifício nos mostra que sempre as bênçãos de Deus exigem um esforço da parte do homem, não um esforço que seja necessário para que a vontade soberana de Deus se faça, mas, sim, um esforço, um trabalho humano que confirme e demonstre, por obras, a fé que se diz ter em Deus. O apóstolo Tiago já nos ensinou que a fé sem obras é morta (Tg.2:20,21).

Assim, embora tenha crido verdadeiramente, Abrão deveria prová-lo por gestos concretos, assim como Deus o faria na experiência que faria o patriarca passar.

– Em terceiro lugar, a experiência sobrenatural que se desenvolveria revela que a intimidade com Deus leva-nos a uma dimensão espiritual diferenciada, a operações que estão além da compreensão humana, mas que são consequências de uma vida de intimidade com Deus.

Muitos são hoje os que estão a buscar uma vida com Deus repleta de experiências sobrenaturais e de manifestações do Espírito, mas que se esquecem que isto é consequência de uma vida de comunhão com Deus e não causa disto.

É por causa deste experiencialismo sem fundamento que muitos não veem diferença entre o esoterismo típico da Nova Era e certas condutas levadas a efeito por pessoas que, dizendo-se evangélicas, não têm, na vida, a real transformação do Evangelho.

Feito o que Deus ordenou, com a partição dos animais, menos das aves, o que significava um gesto de compromisso, conforme vemos no comentário da lição, vê-se que Deus não surgiu de imediato.

 Pelo contrário, Abrão teve de ficar um tempo que as Escrituras não nos informam, esperando a manifestação divina, que não saberia como se daria. Nesta espera, as aves de rapina surgiram, querendo, logicamente, apossar-se das carnes dos animais.

 Estas aves de rapina representam as adversidades, as hostes espirituais da maldade que sempre tentarão impedir que mantenhamos nosso compromisso com Deus. No mundo, disse Jesus, teremos aflições, mas devemos ter bom ânimo, pois o Senhor venceu o mundo (Jo.16:33).

Uma vida com Deus sem lutas nem dificuldades é impossível. Deus promete estar presente, cumpre Suas promessas, mas as dificuldades sempre virão.

Ao anunciar a igreja, Jesus não se referiu ao seu futuro glorioso, à vida eterna, mas apenas disse que “as portas do inferno não prevaleceriam contra ela” (Mt.16:18), deixando-nos bem claro que o que sempre haverá na história da Igreja na face da terra é o embate entre ela e as forças do mal, mas que há uma garantia da parte de Deus de que o mal não prevalecerá.

Ao dizer que, “graças a Deus que nos dá a vitória por nosso Senhor Jesus Cristo”( I Co.15:57), o apóstolo Paulo apenas nos está afirmando que sempre haverá lutas na vida do cristão, enquanto estivermos no mundo, pois não há vitória sem que tenha havido luta.

– Abrão, porém, foi constante, mantendo-se diante do altar, embora Deus, aparentemente, nada estivesse fazendo. Esforçou-se para que as aves não tomassem as carnes do sacrifício.

Trabalhou, lutou, batalhou para que as coisas ficassem do jeito que Deus lhe havia mandado ficar, ainda que nada tivesse acontecido até então. Este deve ser o comportamento do servo sincero do Senhor.

Manter as coisas da forma como determinado por Deus, ainda que lhe advenham lutas, dificuldades e oposições. É necessário que sempre estejamos na vontade do Senhor, fazendo as coisas como Deus determinou, pois, só assim, teremos vitória.

O importante que devemos observar nesta passagem é que, pondo-se o sol, um profundo sono caiu sobre Abrão. Abrão lutou contra as aves de rapina durante todo o dia, lembrando-nos de que o sol na Palestina é escaldante, mas, ao se pôr o sol, caiu-lhe um profundo sono.

 Isto comprova que Deus sempre está no controle de tudo e que até o momento determinado, Deus irá permitir que demonstremos a Ele e a todos os demais homens, a nossa fidelidade e o nosso compromisso.

É necessário que assim se faça porque somente pelas nossas boas obras, os homens glorificarão a Deus que está nos céus (Mt.5:16).

Outra lição que aprendemos aqui é a constância de Abrão. Abrão resistiu e ficou enxotando as aves até que caiu profundo sono sobre ele.

Ele foi perseverante, constante e a fidelidade importa nesta perseverança e constância. Daí porque se dizer que só o perseverante alcançará a salvação (Mt.24:13) e que devemos ser firmes e constantes na obra do Senhor ( I Co.15:58).

A despeito de toda esta devoção, a Bíblia nos informa que Abrão e Sarai fraquejam uma vez mais na fé e Sarai dá ao patriarca Agar para que, através dela, se tivesse o filho.

– A “solução Agar” tinha vários inconvenientes, a saber:

a) Agar não era nascida na casa de AbrãoQuando fora lutar para libertar Ló, Abrão somente empregara os servos que eram nascidos na sua casa, ou seja, para que houvesse sucesso, Abrão somente poderia contar com quem tivesse as mesmas crenças, os mesmos valores, a mesma formação, o mesmo Deus.

Agar não era nascida em sua casa e, portanto, jamais poderia ser o instrumento para a obtenção do herdeiro prometido por Deus. De igual forma, muitos hoje buscam obter a promessa de Deus através de elementos estranhos à casa de Deus, de pessoas não comprometidas com a Palavra do Senhor.

b) Agar era vestígio de um período de desvio espiritualTudo indica que Agar fora incorporada à casa de Abrão durante o tempo em que este peregrinara no Egito, que foi, como já vimos, um período de desvio espiritual, de fracasso na vida de Abrão.

 Jamais alguém que se acrescera à casa de Deus num período em que não havia direção de Deus poderia se transformar num instrumento de bênção espiritual.

Agar simboliza as conseqüências dos nossos fracassos, conseqüências que perduram em nossas vidas e que devemos neutralizar e não exaltar.

Assim como o homem velho, que a Bíblia denomina de “carne”, que ainda existe em nós, que não fomos, ainda, libertos do corpo do pecado (o que ocorrerá apenas com a glorificação, último estágio da salvação), deve ser mantido crucificado em nossas vidas, Abrão não poderia exaltar Agar como fez sem que disso adviesse prejuízo espiritual (Gl.2:20; 6:14).

c) Agar subverteria a ordem natural das coisas Agar era uma serva, enquanto que Sarai era a senhora da casa. A solução Agar trazia uma subversão na ordem, pois a serva seria exaltada, passando a ocupar uma posição de disputa e de enfrentamento com a dona da casa, o que geraria contenda e dissabores, como acabou acontecendo.

As soluções humanas são, em si, subversivas, pois representam uma rebeldia de homem contra Deus, pois nada mais são que demonstrações de uma independência, de uma auto-suficiência humana, uma atitude da criatura contra a soberania do seu Criador.

d) Agar era consequência da incredulidade e da desesperança em DeusSarai foi peremptória: ” eis que o Senhor me tem impedido de gerar”.

Nesta sentença, revela-se o total descarte de qualquer intervenção divina na questão. Sarai decreta e sentencia que Deus não lhe dará filhos, apesar de todas as promessas feitas a Abrão.

Graças a esta sentença indevida e totalmente equivocada é que foi possível criar-se a solução Agar. Quando verificarmos decisões e atitudes que nos são sugeridas, devemos observar se, por detrás delas, não está uma demonstração de incredulidade e de desesperança em Deus.

e) Agar era uma solução feita com base na lógica humana e não na direção do Espírito – Como mostra o apóstolo Paulo(Gl.4:21-31), Agar simboliza o concerto feito com base nas ações humanas, o concerto que seria firmado, posteriormente, no monte Sinai, segundo o qual o esforço humano seria primordial para estabelecimento da comunhão com Deus e que, por causa disso, até, redundaria em fracasso, pois não há sequer um homem justo na face da Terra.

Não podemos confiar em nossos esforços, que são totalmente incapazes de nos trazer a redenção (Rm.3:10; Sl.14:1-3; Sl.49:8). O crente não anda segundo a carne, mas segundo o Espírito (Rm.8:1-17).

f) A solução Agar fez com que caísse mais um período de silêncio divino na casa de Abrão, pois somente encontraremos Deus falando com Abrão, novamente, quando este estiver com noventa e nove anos de idade (Gn.17:1).

A desobediência traz, inevitavelmente, o afastamento entre Deus e o homem.

OBS: “…Quando nasceu o menino de Agar, Abrão tinha 86 anos e Sarai, sua verdadeira mulher, 77. Por causa da trapalhada do casal, Deus interrompeu sua comunicação com a Terra, e obviamente com Abrão, durante treze anos… ” (CARVALHO, Ailton M. de. A genealogia dos alienígenas, p.55).

Mas, apesar desta “solução Agar”, Deus não Se esqueceu de Suas promessas e, treze anos depois, torna a falar com Abrão, momento em que, inclusive, muda o seu nome para “Abraão” (em hebraico, Avraham”), cujo significado é “pai de multidões”, a indicar o cumprimento da promessa divina na vida do patriarca. Deus nunca nos desampara, mas é fiel e, no tempo certo, inicia a execução de Sua Palavra, pois vela pela Sua Palavra para a cumprir (Jr.1:12).

– Logo após a renovação das promessas de Deus a Abraão e a retomada do diálogo entre o Senhor e Seu amigo, vemos Abraão recebendo com hospitalidade o próprio Senhor (Gn.18), bem como intercedendo pelas cidades da planície, a indicar que a intercessão é uma consequência natural de quem goza de intimidade com Deus.

 Temos sido hospitaleiros? Temos sido intercessores? Estes gestos de amor e de bondade de Abraão refletem como é o caráter de quem mantém um contínuo diálogo com Deus.

Antes, porém, de a bênção de Deus chegar à casa de Abraão e de Sara, noticia a Bíblia um novo deslize na vida do patriarca.

Mais uma vez, Abraão, talvez animado com as circunstâncias favoráveis de sua vida, sai da direção de Deus e vai para as terras do sul, peregrinar em Gerar, voltando a arquitetar com sua mulher a velha mentira inteira, a “meia-verdade” de que era sua irmã (Gn.20).

Mais uma vez, o Senhor teve de intervir, e de modo mais contundente do que fizera no Egito, para que Abraão saísse de mais esta cilada.

Após ser desmascarado e ter confessado publicamente a sua falta, Abraão precisou orar em favor dos moradores daquela região, para que Deus os sarasse. Depois ouviu a oração de Abraão e pôde ele, então, já completamente em comunhão com Deus, ver o cumprimento da tão aguardada promessa.

O capítulo 21 do livro do Gênesis começa com uma afirmação firme e sem qualquer dúvida da parte do escritor: E o Senhor visitou a Sara, como havia dito e fez o Senhor a Sara como havia falado”.

 Isto revela que Deus é fiel e que vela sobre a Sua Palavra para a cumprir (Jr.1:12). Deus não fez coisa alguma diferente do que havia prometido fazer a Abraão e a Sara. Pouco importou se Sara era estéril e se já não era mais fértil.

Nosso Deus é o Soberano do Universo e tem o controle de tudo nas Suas mãos. Porque resolveu dar a Sara um filho quando já não tinha sequer condições de ser fertilizada, sendo estéril, é algo que não nos compete saber ou entender.

Deus mostrou, com isto, que está além de nossos pensamentos e de nossas concepções (Is.55:8,9). Por isso devemos duvidar muito daquelas doutrinas e filosofias que partem de um pressuposto absolutamente falso, qual seja, o de que podemos conceber os pensamentos divinos.

– É interessante verificar que o texto bíblico é bem claro ao demonstrar que Deus não só fez o que havia determinado, da forma que havia estabelecido, mas também, no tempo determinado (Gn.21:2).

Deus é atemporal. O tempo é uma realidade que existe apenas para nós, que estamos nesta dimensão, chamada por alguns, como o pastor Ailton Muniz de Carvalho, de “universo relativo”.

Ao contrário do que afirma o mundo em ditado popular, segundo o qual, “Deus tarda, mas não falha”, Deus jamais tarda, sempre vem na hora certa, no tempo determinado.

Como afirmou o sábio Salomão, “há um tempo determinado para cada propósito debaixo do céu”(Ec.3:1). Devemos confiar no Senhor e saber que tudo tem o seu tempo determinado. Nunca pensemos que Deus está demorando, pois o pensamento de que há demora é o primeiro passo para nosso fracasso espiritual.

Nascido o filho, Abraão, em primeiro lugar, deu-lhe o nome de Isaque, que quer dizer “riso”, certamente evocando a admoestação que o Senhor havia feito a Sara, quando da visitação um ano antes do nascimento do menino (Gn.18:15).

A escolha deste nome em virtude deste episódio demonstrava o temor que havia tomado os corações de Abraão e Sara, demonstrava o intento de se submeter à vontade do Senhor e de não mais duvidar de Suas promessas, de, a partir de então, cumprir o propósito de Deus nas suas vidas.

Fazer a vontade de Deus seria a fonte de alegria para o casal de idosos. “A alegria do Senhor é a nossa força” (Ne.8:10). Se, efetivamente, dedicarmo-nos a nos alegrarmos em fazer a vontade de Deus, seremos fortalecidos pelo Senhor e triunfaremos ao terminarmos nossa carreira de fé em comunhão com Ele.

– Além de evocar o encontro com Deus, o nome de Isaque refletia a felicidade que inundava os corações dos velhos pais que, após uma longa existência e de uma certeza humana de que jamais teriam filhos, agora podiam ver a realização da promessa divina e se realizarem como seres humanos, pois a plena realização do homem e da mulher está em ter filhos, daí porque a Bíblia afirmar que os filhos são herança do Senhor.

Sara podia dizer que Deus lhe havia feito em riso, tamanha era a sua alegria (Gn.21:9). Assim também, devemos ter a certeza de que o gozo e a glória que estão preparados para os servos do Senhor na eternidade são indizíveis, indescritíveis e vale a pena todo sofrimento, toda angústia e todo problema que venhamos a ter nesta Terra.

Paulo afirmou que a glória futura não dá para comparar com o que temos aqui (II Co.12:4). Como afirmou o inspirado poeta sacro: “Metade da glória celeste jamais se contou ao mortal”!

– Em seguida, Abraão, cumprindo a vontade do Senhor e mantendo o pacto que havia selado com Deus, circuncidou seu filho no oitavo dia de vida de Isaque (Gn.21:4) e o escritor faz questão de demonstrar nesta atitude a intenção de obediência do patriarca: “como Deus havia ordenado”.

Será que temos feito as coisas como Deus tem nos ordenado? Perceba-se que não é somente fazer O QUE Deus ordenou, mas COMO Deus ordenou. Os coríntios celebravam a ceia do Senhor, mas não COMO o Senhor havia ordenado(I Co.11:17,20,28,29).

 Isto é muito importante para Deus, que conhece e sonda todos os corações(Sl.139:1-4). Deus não Se deixa levar pela aparência do homem(I Sm.16:6,7).

V – A BIOGRAFIA DE ABRAÃO (IV) – O HOMEM QUE, CUMPRIDA A PROMESSA, TEM FÉ EXEMPLAR

– Todavia, apesar do cumprimento da promessa de Deus, havia, na casa de Abraão, ainda, uma situação que não correspondia ao planejado pelo Senhor.

Isaque era o filho da promessa e a ele deveria caber a herança de tudo, pois assim era o plano do Senhor.

Inobstante, pelas leis então existentes, quem deveria herdar mais do que os outros seria o primogênito e este era Ismael, quatorze anos mais velho que Isaque e que, lembremos, era filho de igual legitimidade que a de Isaque.

Tendo se livrado de Ló no passado, Abraão deveria, agora, livrar-se de outro problema que sua incredulidade havia trazido para si: Ismael.

 Quantas vezes temos problemas e dissabores em nossas vidas e chegamos até a culpar a Deus pela sua existência, esquecendo-se de que os problemas foram originados de atitudes que fizemos sem a orientação e direção de Deus, que, tendo-nos feito com livre-arbítrio, permite que assim ajamos.

Não havia como tornar compatíveis os dois irmãos, porque suas origens eram totalmente distintas e o nosso Deus não é Deus de confusão.

– Houve até uma convivência durante um certo tempo que a Bíblia não esclarece, dizendo apenas que era o do desmame do filho mais novo. Abraão decide fazer uma festa e, nela, Sara percebe que há zombaria por parte de Ismael.

O filho mais velho, com certeza, fiado na lei humana, na tradição cultural e em tudo o que o cercava nesta vida, certamente descria que Isaque pudesse ter qualquer direito de herança ou viesse a perpetuar a promessa divina sobre a descendência de Abraão.

É muito triste quando a pessoa passa a querer prevalecer na casa de Deus com argumentos puramente humanos, com estratégias, técnicas e valores obtidos e buscados dentro de recursos puramente humanos e materiais.

Quando isto acontece é porque a pessoa já perdeu, totalmente, a direção e a unção divinas. Exemplo clássico do que estamos dizendo é o rei Saul que, a partir da rejeição divina, continuou no trono de Israel mas sem qualquer direção divina, levando seu povo e a ele próprio a uma situação de extrema dificuldade e luta.

Que Deus nos guarde e que não venhamos a confiar em homens, mas que, como o salmista, digamos que “uns confiam em carros e cavalos, mas nós fazemos menção do nome do Senhor dos Exércitos” (Sl.20:7).

– A zombaria de Ismael é uma reação típica de quem está confiado em coisas materiais e que não tem a visão de Deus. Ismael era “o filho segundo a carne”, “o filho da escrava”(Gl.4:29,30), ou seja, representa a tentativa humana de obtenção de salvação, a soberba do homem, a sua autossuficiência, que não traz qualquer resultado efetivo, que não consegue a herança divina, apesar de todos os seus esforços e de toda a observância dos mandamentos humanos.

 De direito humano, Ismael era o herdeiro principal, o primogênito, por isso, confiando nos postulados do homem, zombava de seu irmão mais novo. Mal sabia ele, entretanto, que o que prevaleceria seria a vontade de Deus, o plano que Deus havia concebido bem antes do nascimento de Ismael, na verdade, bem antes da fundação do mundo.

Tomemos muito cuidado quando começamos a zombar de alguém, pois a atitude de zombaria é própria dos incrédulos. Por isso o salmista nos aconselha a não nos determos na roda dos escarnecedores, se quisermos ser bem-aventurados (Sl.1:1).

– Neste ponto, verificamos como estava diferente o nível de vida espiritual de Abraão.

Quando Agar desprezou sua senhora, encontramos um Abraão sem autoridade, que é pressionado por sua mulher para despedir a escrava grávida de seu próprio filho e que, sem orientação divina, divorciado da vontade de Deus, não se impõe e acaba delegando a Sara a decisão que só a ele competia dar, decisão que acabou sendo revogada por Deus.

Agora, já devidamente animado pelo Senhor e dentro da vontade divina, o patriarca, ao ser pressionado por sua mulher, não toma a mesma atitude de antes. Pelo contrário, entendeu que não era boa a ação pretendida por Sara (Gn.21:11), demonstrando, assim, que tinha restabelecido sua autoridade em sua casa.

A autoridade, como dissemos em lição anterior, decorre precipuamente da nossa submissão a Deus. Abraão, entretanto, embora tenha mantido sua autoridade, considerando que a sugestão não era boa (ou seja, não se omitiu, nem delegou o poder de decisão a Sara), não se posicionou como um ditador, como alguém que não tem de dar satisfação ao Senhor.

Foi consultar o Senhor, tanto assim que a Bíblia mostra-nos o Senhor falando com o patriarca e afirmando que ele deveria, mesmo, despedir Ismael e sua mãe Agar daquela casa (Gn.21:12,13).

Por que Ismael e Isaque não poderiam mais conviver? Por que Agar e Ismael deveriam ser despedidos?

Porque não há comunhão entre a luz e as trevas, porque não pode o filho da escrava herdar com o filho da livre, ou seja, não pode o que é fruto de esforço humano, de rebeldia, de autossuficiência humana herdar algo que venha da parte de Deus. Deus é luz e nele não há trevas nenhumas (I Jo.1:5).

A separação determinada por Deus dos dois irmãos é elucidativa para aqueles que acham que podem servir a dois senhores. Isto é impossível e Deus não aceita. Devemos, pois, separarmo-nos do mundo e servirmos unicamente ao Senhor. Sem santificação, que é esta separação contínua do pecado e do mundo, jamais poderemos contemplar o Senhor (Hb.12:14).

O capítulo 22 do livro do Gênesis começa com uma expressão forte: ” E aconteceu depois destas coisas, que tentou Deus a Abraão”.

A expressão “tentou Deus a Abraão” é melhor traduzida como “Deus pôs Abraão à prova” (como consta da NVI e da Almeida Revista e Atualizada) ou “Deus provou a Abraão”, pois, como diz o apóstolo Tiago, Deus não tenta a pessoa alguma (Tg.1:13).

Esta, entretanto, não foi a única prova por que Abraão passou.

Como ensinou o grande mestre e filósofo judeu Maimônides (1135-1204), Abraão teve de suportar dez provas:

 1 – teve de peregrinar como um estrangeiro desde a sua chamada;

2 – a fome que encontrou em Canaã, depois da promessa de que Deus lhe faria uma grande nação;

3 – a violação de direitos humanos elementares quando os egípcios levaram Sara a Faraó;

4 – a luta contra quatro reis conquistadores;

 5 – a tomada de Agar como esposa, depois que perdeu toda a esperança de ter um filho com Sara;

 6 – a circuncisão em idade avançada por ordem divina;

7 – a atrocidade perpetrada por Abimeleque , que prendeu Sara;

8 – a despedida de Agar;

9 – a separação de Ismael e

10 – o sacrifício de Isaque (apud MELAMED, Meir Matzliah. Torá: a lei de Moisés, nota a Gn.12:15, p.30-1).

– Muito se tem discutido a respeito da natureza desta prova imposta ao patriarca Abraão, tendo em vista que, pelo conceito da lógica humana, seria, realmente, impensável que Deus pudesse vir a pedir Isaque em sacrifício.

 Assim, há aqueles que não admitem sequer a possibilidade de que Deus estivesse, mesmo, querendo Isaque em sacrifício, ainda que Deus o tivesse pedido explicitamente, porque uma tal ordem, dizem, contrariaria todo o caráter divino.

Contudo, assim não pensamos, pois são as Escrituras que afirmam que de Deus saiu esta ordem e Deus é soberano, podendo, pois, exigir tal coisa de Seu servo, ainda que, explicite-nos o texto, o Seu propósito fosse o de pôr à prova Abraão e não o de ter Isaque como oferta.

Aliás, é assim que se expressa Flávio Josefo: “… Deus lhe concedeu o que desejava, mas quis antes experimentar a sua fidelidade…” (JOSEFO, Flávio. op.cit., v.1, p.35).

– Todavia, observe-se, apenas Deus sabia deste propósito, que não era de conhecimento do patriarca, assim como apenas Deus e Satanás tinham conhecimento do que estava acontecendo na vida de Jó.

A fé está, precisamente, em crermos em Deus e na imutabilidade de Seu caráter, mesmo quando a própria ordem divina pareça contrariar tanto uma coisa quanto outra.

O propósito de Deus nas provas que nos advêm nem sempre nos é divulgado de imediato, mas devemos, sempre, ter a consciência e a convicção de que tudo que ocorre conosco é o melhor para nós (cf. Rm.8:28).

Não devemos nos angustiar nem perder a esperança, mas, simplesmente, confiar no Senhor, que, muitas vezes, dirige-se para nós como se dirigiu ao apóstolo Pedro: ” o que eu faço não o sabes tu agora, mas tu o saberás depois” (Jo.13:7b).

Isto nos mostra, claramente, que Deus está acima dos nossos pensamentos ou das nossas concepções, de modo que não podemos, jamais, perscrutar Seus propósitos ou intentos (Is.55:8,9; Rm.11:33-36).

Desconfiemos, pois, daquelas doutrinas e filosofias que explicam totalmente todos os pensamentos e caminhos de Deus, tudo racionalizando e tornando compreensível, pois, de modo algum, os homens poderão alcançar o pensamento de Deus, pois sempre serão meros homens (Sl.9:19,20)

Deus chega ao patriarca e lhe dá a ordem tão incompreensível quanto inusitada: “Toma agora o teu filho, o teu único filho, Isaque, a quem amas, e vai-te à terra de Moriá, e oferece-o ali em holocausto sobre uma das montanhas, que Eu te direi.”(Gn.22:2).

A ordem divina tem alguns pontos que devemos frisar, a saber:

a) TOMA o teu filho – Deus não deixa qualquer dúvida. Trata-se de uma ordem, que não admite qualquer discussão. Ao contrário do que ocorrera com as cidades da planície, em que o Senhor revela Seu intento a Abraão, aqui estamos diante de uma ordem.

 Isto explica, aliás, o silêncio de Abraão que intercedera pelos habitantes das cidades da planície com insistência e que se cala com relação ao filho da promessa, algo que intriga muitos até hoje, inclusive os rabinos judeus.

Tratava-se de uma ordem e o patriarca, que agora era íntegro e estava na presença do Senhor(cf. Gn.17:1), com um caráter totalmente transformado(cf.Gn.17:5), não hesita em obedecer ao Senhor. Esta mesma prontidão é exigida aos servos do Senhor (Mt.5:37; Rm.6:16,17).

b) Toma AGORA – A ordem divina é extremamente precisa e não permite qualquer dúvida, porque o nosso Deus não é um Deus de confusão (I Co.14:33).

A ação deveria ser feita de imediato, sem qualquer lapso temporal, no que o Senhor foi atendido prontamente, pois o patriarca, diz o texto sagrado, logo na madrugada, albardou o seu jumento e iniciou a caminhada para o local indicado por Deus (Gn.22:3).

O patriarca nem discutiu com o Senhor que, para Isaque nascer, decorreram longos vinte e cinco anos, mas para ser oferecido, isto deveria ocorrer de imediato.

Não, Abraão sabia bem o seu lugar, o lugar de servo, não admitindo seu caráter transformado qualquer questionamento da ordem divina. Será que temos este mesmo caráter, ou estamos questionando a Deus e a Seus métodos ?

Cuidado, um dia alguém muito próximo ao Mestre questionou-o sobre Seus propósitos e, neste questionamento, Jesus disse exatamente quem estava operando através da boca do “zeloso” discípulo ! (Mt.16:22,23).

c) O TEU FILHO, O TEU ÚNICO FILHO, ISAQUE, A QUEM AMAS – Deus é onisciente e revelou ao patriarca exatamente o que Isaque significava para si.

Isaque era o único filho que convivia com o patriarca, era o herdeiro de todos os bens materiais e espirituais do patriarca, era alguém, efetivamente, amado pelo patriarca.

 Deus, assim se expressando, demonstrava ter plena consciência do trauma espiritual-sentimental-emocional-psicológico que representava esta atitude de sacrifício para o patriarca, mas O reconhecendo, demonstrava que nada disso poderia impedir o cumprimento da ordem divina.

Deus conhece a nossa estrutura, sabe que somos pó (Sl.103:13,14), não é um Deus distante, mas um Deus que, inclusive, participou das nossas próprias aflições, quando a pessoa de Seu Filho encarnou, para que pudesse ser pleno em nosso auxílio (cf. Hb.2:9-18).

Daí porque não podermos jamais deixar de considerar, em nossas lutas e aflições, que Deus, de antemão, já sabe o que sentiríamos, o que estamos padecendo, tendo total condição de nos consolar e confortar(II Co.1:3-7), pois Ele é compassivo, ou seja, sente exatamente o que estamos sentindo. Eis a razão pela qual a Palavra diz-nos que jamais seremos tentados acima do que podemos suportar ( I Co.10:13).

Deus reconhecia que Abraão depositara todas as suas esperanças e todo o seu amor em Isaque e que isto tornaria absolutamente incompreensível a obediência à ordem divina, por isso mesmo Deus afirma ter pleno conhecimento disto e, assim fazendo, não deixa qualquer margem para que o patriarca pudesse sequer questionar ou pedir um tempo para cumprir a ordem emanada do Senhor.

d) Vai-te à terra de Moriá e OFERECE-O ali EM HOLOCAUSTO sobre uma das montanhas, que Eu te direi – A ordem de Deus é clarevidente.

Abraão deveria, a exemplo dos idólatras que com ele conviviam, fazer um sacrifício humano, o sacrifício de seu único filho, matando-o e o queimando a Deus, na terra de Moriá, numa montanha que seria indicada por Deus.

 Aqui a ordem de Deus apresenta algumas similitudes com a experiência do patriarca com Deus, como também algumas novidades. Senão vejamos:

1º ) Deus quer um sacrifício e Abraão já sabia, desde o início de sua jornada de fé, que os sacrifícios agradavam a Deus, daí porque o altar ser uma constante em sua vida com o Senhor.

Entretanto, se o sacrifício era uma constante, o mesmo não se poderia dizer a respeito do sacrifício humano. Esta atitude, tão comum aos idólatras, era algo que jamais lhe fora requerido antes.

 Deus não estava Se contradizendo, porque jamais lhe proibira tal prática, mas, até então, nunca havia exigido uma coisa destas. Às vezes, o nosso costume acaba gerando normas entre nós, servos de Deus, normas às quais, até involuntariamente, acabamos impondo ao Senhor.

Tenhamos cuidado pois Ele é o Senhor e não tem compromisso com nossos costumes. Deus exige o sacrifício humano, algo que jamais pedira a Abraão antes, mas não podemos dizer que Deus teria Se contradito aqui com esta exigência.

Somente, mais tarde, com a lei, seria proibido, terminantemente, o sacrifício humano (Lv.18:21; 20:1-5), algo que sempre desagradou sobremaneira ao Senhor (II Rs.23:10; Jr.32:35; At.7:43).

2º ) Deus mandou que o patriarca partisse para a terra de Moriá, pois lhe mostraria lá qual o monte em que deveria fazer o sacrifício. Assim como Deus havia, anteriormente, dito para Abraão deixar a casa de seu pai para uma terra que ele lhe mostraria, também aqui iria indicar o local.

 Entretanto, se Abraão já estava acostumado a que Deus lhe indicasse o lugar, isto jamais havia se dado antes com relação a construção de um altar.

 Até aquele momento, Abraão sempre edificara altar onde tinha querido, segundo a sua vontade, mas, agora, o altar deveria ser construído no local que Deus lhe haveria de mostrar.

Quanto mais tempo passamos na presença de Deus, a tendência será a de, cada vez mais, passarmos a ser dependentes do Senhor e não o contrário.

A tendência humana do servo de Deus é achar que já conhece o Senhor e querer alargar o espaço da sua vontade e do seu querer no serviço a Deus, no cotidiano de nossas vidas.

A situação é totalmente outra. Devemos, sempre, ir num sacrifício de nossa vontade, numa anulação cada vez mais intensa de nosso querer.

Os grandes homens da Bíblia apresentam-se como pessoas sem vontade própria, totalmente submissas ao Senhor, a começar do exemplo de todos, Jesus, que anulou até mesmo Seu instinto de sobrevivência no Getsêmane.

Devemos nos lembrar das elucidativas palavras que Jesus disse a Pedro (Jo.21:18,19), muito bem aprendidas pelo apóstolo (II Pe.1:10-21), ou, então, da forte expressão de Paulo, segundo o qual, ele nem sequer mais vivia, mas era Cristo quem vivia nele (Gl.2:20).

 Isto tem sido uma realidade em nossas vidas? Por fim, naquele local, no monte Moriá, onde, mais tarde, seria construído o templo de Jerusalém, Abraão só fez um único sacrifício, como que a indicar que o sacrifício prefigurado seria único e suficiente para a redenção da humanidade.

– O patriarca, prontamente, obedeceu a Deus, embora mantivesse em segredo o propósito de sua viagem até a terra de Moriá.

 Tomou dois de seus moços, Isaque e partiu em direção a terra de Moriá, tendo, antes, fendido lenha para o holocausto. Notamos aqui o caráter resoluto de Abraão em atender à ordem do Senhor, mas, também, sua prudência em não alardear o que estava a fazer. Esta prudência tem faltado a muitos servos do Senhor na atualidade.

A recomendação do Senhor é que sejamos simples como as pombas, mas prudentes como a serpente. A ordem dada por Deus era incompreensível ao próprio patriarca, cuja estatura espiritual permitia tal prova por parte do Senhor, pois já era, como vimos no ensinamento de Maimônides, a décima prova sofrida pelo patriarca.

Entretanto, naturalmente, se o próprio Abraão não a compreendia, como poderia alardeá-la, senão para inviabilizar o seu cumprimento ? Por isso, nada disse a pessoa alguma.

Jesus, em momentos cruciais de Seu ministério, também foi reservado e, não raro, solitário (cf. Mt.14:13;17:1;20:17; Mc.9:2; Lc.9:10).

 Devemos valorizar nossa intimidade com o Senhor, pois se, na intimidade, não há segredos entre nós e Deus, há entre o que temos acertado com o Senhor e os demais. Jesus, mesmo, recomendou este comportamento quando O buscarmos em oração (Mt.6:6).

Foram três dias de jornada, em que Abraão mantinha-se silente para com os dois moços e seu filho a respeito do propósito daquela viagem. Só ao terceiro dia, Abraão viu o local, ainda de longe, ou seja, Deus lhe mostrou qual era o local em que se deveria fazer o sacrifício.

Assim que mostrado o lugar, Abraão estreita ainda mais a situação, mandando que os dois moços aguardassem ali, juntamente com o jumento que fora albardado, enquanto ele e Isaque iriam até o lugar indicado por Deus (Gn.22:4,5).

 Aqui encontramos a expressão que denotava a confiança excelente do patriarca: ” eu e o moço iremos até ali e, havendo adorado, tornaremos para vós.” Tratava-se de uma profunda confiança a do patriarca.

 Como tornar com Isaque se ele seria sacrificado a Deus em holocausto, ou seja, após matá-lo, Abraão teria de queimá-lo em oferta ao Senhor ?

Assim Abraão falou não porque tivesse uma mera esperança, mas, diz-nos o escritor aos Hebreus, porque ” pela fé ofereceu Abraão a Isaque, quando foi provado; sim, aquele que recebera as promessas ofereceu o seu unigênito.

Sendo-lhe dito: em Isaque será chamada a tua descendência, considerou que Deus era poderoso para até dos mortos o ressuscitar…” (Hb.11:17,18). As circunstâncias eram totalmente adversas:

Deus, que prometera e dera o filho ao patriarca, era o mesmo que o queria em holocausto, mas Deus é imutável, não é homem para que minta, nem filho do homem para que Se arrependa e, portanto, de algum modo, não sabido, não revelado, Isaque tornaria a viver, teria de dar continuidade à descendência, conforme Deus havia prometido.

Querido(a) irmão(ã), seu Isaque foi levado para o altar ? Seu Isaque foi até já sacrificado, sem que o anjo interviesse antes que o cutelo fosse lançado ao pescoço do seu prometido ?

Onde está a sua fé para confiar e crer que Deus é poderoso para até dos mortos ressuscitar o seu Isaque ?

As promessas de Deus não falham. Como diz o cantor sacro: “De Deus mui firmes são as promessas, falhando tudo, não falharão. Se das estrelas, o brilho cessa, mas as promessas brilharão” ! (refrão do hino 459 da Harpa Cristã).

– Durante estes três dias, certamente, Abraão deve ter procurado entender a ordem divina, que contrariava toda a lógica humana e tudo o que Abraão havia aprendido de Deus até ali.

Este confronto entre a lógica humana e a lógica divina, aliás, foi o principal ponto que o estudioso judeu Richard S. Ellis enfatizou em seu artigo ” Human Logic, God’s Logic, and the Akedah”(A lógica humana, a lógica de Deus e a Akedah”) (math.umass.edu/~rsellis/akedah.html) , onde afirma que o episódio é um “pesadelo que lança sua sombra através de toda a história judaica”(tradução nossa), cujo entendimento é possível se o focalizarmos como “o choque entre a lógica humana e a lógica de Deus”(tradução nossa), como “o confronto destes dois modos de lógica”(tradução nossa).

Diz o estudioso que “Abraão, a ponto de subir ao Monte Moriá, foi suspenso entre a lógica humana e a lógica de Deus, onde todas as contradições são resolvidas(…).(tradução nossa)”. O texto silencia-nos a respeito do que se passou entre Abraão e Deus, mas, como afirma Ellis, “…o silêncio do texto convida-nos, enfurece-nos, força-nos a confrontar a realidade de nossa falta de poder e de nossa própria morte, força-nos a vir às mãos com a questão-chave: quando a tragédia surpreende, como um dia deve ocorrer, irei eu buscar refúgio na lógica humana ou abrir-me-ei para a infinita luz desconcertante de Deus ?” (tradução nossa).

– Outra lição importante que tiramos é de que Abraão e Isaque assumiram pessoalmente a responsabilidade pelo ato de adoração.

Não eram, como muitos crentes de nossos dias, “crentes de carona”, que vivem às custas da espiritualidade e santificação dos outros. Abraão e Isaque tomaram todo o material necessário para o sacrifício e partiram rumo a Moriá.

 Abraão levava o fogo e o cutelo na sua mão e Isaque, mais jovem e vigoroso, a lenha do holocausto.

 Diz o texto que ambos foram juntos, a demonstrar, portanto, unidade, ainda que houvesse diversidade de funções, de tarefas, diante das peculiaridades de cada um.

O texto mostra-nos, também, que Isaque tinha uma idade suficiente que permitia que ele levasse sobre seus ombros a lenha do holocausto, não era, portanto, uma criança inocente, sem consciência, de tenra idade.

Alguns eruditos judeus chegam a dizer que Isaque tinha cerca de 37 anos de idade. Na igreja, devemos agir do mesmo modo. Para que haja uma perfeita adoração, é mister que cada um cumpra o seu papel, que cada um faça o seu esforço, segundo a sua aptidão e capacidade.

 Lamentavelmente, se fôssemos depender de muitos crentes, hoje em dia, a lenha, o fogo ou o cutelo ficariam ao pé do monte…

– Outro ponto importante para nossa meditação é que Abraão trouxe todo o material para o sacrifício de sua casa, não tomou coisa alguma estranha ao seu lar, ao seu domicílio.

 Não havia fogo estranho, não havia cutelo improvisado ou adquirido de terceiros, não havia lenha de outros lugares, nem mesmo da vegetação do local indicado por Deus. Tudo foi trazido de casa, tudo havia tido sua elaboração, sua confecção e sua preparação segundo os costumes e as regras estabelecidas pelo patriarca na sua comunhão e vida íntima com Deus.

Será que nosso culto tem sido o aprendido junto aos nossos pais na fé, será que tem sido o resultado de uma vida íntima e de comunhão com Deus, segundo os marcos estabelecidos pela Palavra de Deus, ou temos cedido às inovações, às novidades, ao fogo de procedência desconhecida e ignorada ?

Deus não aceita coisas estranhas na adoração ao Seu nome. Lembremo-nos dos filhos de Arão ! (Lv.10:1-11).

– Ao silêncio de Abraão correspondia igual silêncio da parte de seu filho, Isaque. Chamado por seu pai, sem hesitação, obedeceu e iniciou a viagem. Não sabia para onde ia, mas seu pai lho indicou.

Sem hesitar, também, toma a lenha do holocausto sobre seus ombros e começa a caminhar em direção a Moriá. Entretanto, como era alguém dotado de plena consciência e ensinado por seu pai na adoração a Deus, logo percebeu que faltava um elemento para o sacrifício, ou seja, a vítima.

Por isso, perguntou a seu pai onde estava ela e Abraão, uma vez mais, demonstra o seu interior, ao dizer que Deus iria prover a vítima. É desta expressão do patriarca que advém o conceito da “Divina Providência”, ou seja, “o cuidado de Deus sobre todas as Suas obras”(Sl.145:9) (cf. R.N. CHAMPLIN. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia, v.5, p.487).

– Após a declaração do patriarca, Isaque prosseguiu o seu caminho, demonstrando satisfação com a resposta recebida de seu pai, bem assim, também ter a mesma confiança e a mesma fé de Abraão.

 O texto expressa esta comunhão de propósitos e de valores ao afirma que “caminharam ambos juntos” (Gn.22:8, parte final).

Assim, não apenas em Abraão vemos uma demonstração de fé e submissão, mas também em Isaque, que foi obediente, visto que poderia, ante a sua idade e condição física, facilmente fugir do papel de vítima do sacrifício, ainda mais quando seu pai, aparentemente, havia mentido, já que omitira que a vítima do sacrifício era o próprio Isaque.

 Todavia, Isaque deixou-se amarrar e ser colocado no altar, sem resistir, numa perfeita tipificação do que Jesus faria pela humanidade milênios depois (Jo.10:17,18).

– Abraão estava determinado a obedecer a Deus. Edificou o altar, pôs em ordem a lenha e amarrou a vítima, que era seu próprio filho Isaque e iria desferir-lhe o golpe fatal quando foi interrompido por Deus, que determinou que o patriarca não matasse seu filho, pois havia provado que Deus estava acima de todas as coisas na sua vida e que nem o único filho lhe fora negado.

– É interessante observar que Abraão responde a Deus da mesma forma com que atendeu ao chamado do Senhor quando recebeu a notícia de que deveria sacrificar seu filho.

A resposta de Abraão, em ambas as oportunidades, foi “eis-me aqui”, expressão bíblica que indica, sempre, disposição para fazer a vontade de Deus. Assim respondeu o profeta Isaías ao chamado do Senhor após a sua indispensável purificação (Is.6:8), assim era o teor da oração de Jesus quando entrou neste mundo (Hb.10:7,9).

Estamos à disposição do Senhor? Temos respondido ao Seu chamado com um “eis-me aqui”? Nas duas oportunidades, Abraão estava em circunstâncias bem distintas: estava calmo, feliz, tranqüilo e realizado quando Deus lhe chama para pedir o sacrifício de seu filho Isaque.

Assim, respondeu com um “eis-me aqui”. Na segunda vez, estava extremamente aflito, psicologicamente abalado, pois estava contemplando a face de seu filho, atônito, prestes a ser morto, estava a ponto de matar o próprio filho, mas, ao ouvir a voz do Senhor, responde com o mesmo “eis-me aqui”.

Era um homem de fé e, como tal, as circunstâncias não o abalam, pois é como o monte de Sião (Sl.125:1). Será que temos confiado no Senhor, ou somos facilmente abalados pelos ventos, pelas ondas, como foi o apóstolo Pedro ? Será que o Senhor tem Se virado para nós e dito que somos homens (ou mulheres) de pouca fé ? (Mt.14:31).

– Deus recompensou a fé de Abraão, poupando-lhe o filho. Abraão vê um cordeiro que está preso no mato pelos seus chifres, oferecendo-o em lugar de seu filho Isaque. Era a oferta da gratidão e do reconhecimento da soberania de Deus e de que vale a pena sermos obedientes ao Senhor.

 Assim como Abraão predissera, ele e seu filho adoravam a Deus e depois tornariam para o encontro dos dois moços que aguardavam ao pé do monte.

O patriarca dá ao monte o nome de “O Senhor proverá” e, realmente, ali, naquele monte, Deus, posteriormente, propiciava, no sacrifício anual, os pecados de Israel, como figura do sacrifício vicário de Cristo, sacrifício este que, neste episódio, foi divisado pelo patriarca, como nos dá conta o próprio Jesus (Jo.8:56).

 Percebe-se, aqui, portanto, que, por ter feito o que Deus lhe mandara sem questionar, Abraão ganhava uma grande recompensa: a de conhecer e ver o plano de Deus para a redenção da humanidade por seu intermédio.

 Crer em Deus, mesmo sem entender, foi o caminho para que o patriarca tudo pudesse ver e entender.

– Após o sacrifício, Deus manda outra mensagem, através do anjo, ao patriarca, renovando as promessas nas quais Abraão havia confiado e pelas quais havia caminhado até ali na sua vida espiritual.

 O significado deste episódio ficou tão indelevelmente marcado na vida do povo de Israel que, na passagem do Ano Novo Judaico (o Rosh Hashannah), todos os anos, é esta a leitura bíblica que se faz, como que em um reconhecimento de que a perpetuidade do povo judeu dá-se porque Abraão não negou seu único filho a Deus, dá-se como retribuição de Deus à fidelidade de Abraão.

– Depois desta riquíssima experiência com Deus, o patriarca ainda se encarrega de arrumar uma mulher para Isaque que fosse de sua parentela (Gn.24), depois da morte de Sara e se casa novamente, desta feita com Cetura (Gn.25), não antes de ter dado todo o patrimônio a Isaque.

Vemos, pois, que o patriarca prosseguiu a sua vida, mesmo depois do cumprimento da promessa de Deus, mas tomando as devidas providências para que a seqüência de sua vida não viesse a ser obstáculo ao cumprimento da vontade do Senhor.

– Esta preocupação deve existir em todos aqueles que servem a Deus. Mesmo na velhice, quando já se cumpriu o propósito de Deus, devemos viver de tal maneira a não permitirmos que tudo aquilo que fizemos para Deus possa vir a ser desfeito pelos nossos desatinos.

Abraão quis se casar novamente, era seu direito, mas não poderia pôr em risco a vida de Isaque e o propósito divino para tanto. Aprendamos com Abraão a não desfazermos aquilo que tenhamos feito, em o nosso tempo, para o Senhor.

– Com 175 anos de idade, Abraão morreu (Gn.25:7), vindo a ser recolhido pelo Senhor e a ganhar uma figura de destaque e proeminência no mundo do além, onde, como nos diz o Senhor Jesus, na história do rico e Lázaro, tem uma posição singular no chamado “seio de Abraão” (Lc.16:19-31), de onde aguarda a ressurreição para se reunir com a Igreja nos ares naquele dia que está tão próximo (cfr. Mt.8:11). Estaremos lá?

VI – MELQUISEDEQUE ABENÇOA ABRAÃO

– Passamos, após esta biografia de Abraão, a tratar, ainda que sucintamente, dada a já extensão desta lição, a considerar o episódio ocorrido entre Melquisedeque e Abrão, relatado em Gn.14:18-24, perícope (isto é, parte do texto bíblico que tem um sentido completo) que trata dos acontecimentos ocorridos após a vitória militar de Abrão sobre o rei Anrafel, de Sinar, e seus aliados.

– Abrão havia ido livrar seu sobrinho Ló que, a exemplo de todos os moradores de Sodoma, Gomorra, Admá e Zeboim, haviam sido levados cativos por Anrafel (que muitos entendem ter sido o famoso rei Hamurábi) e seus aliados.

– Tendo vencido a batalha, o rei de Sodoma, Bera (Cf.Gn.14:2), veio ao encontro do patriarca e de seus aliados, uma vez que, na batalha, havia fugido juntamente com o rei de Gomorra (Cf. Gn.14:10).

– Bera não foi o único a ir se encontrar com Abrão. Também o fez Melquisedeque, rei de Salém (Gn.14:18), rei que não se envolvera com o conflito armado, mas que, diz o texto sagrado, era sacerdote do Deus Altíssimo, a revelar, portanto, que, a exemplo de Abrão, também cria na existência de um Deus único.

– Melquisedeque parece ter chegado primeiro e trouxe para Abrão pão e vinho, tendo abençoado ao patriarca, chamando-o de “Abrão do Deus Altíssimo, o Possuidor dos céus e da terra”, como também louvado ao Senhor pela vitória militar, reconhecendo que fora o Senhor quem entregara os inimigos nas mãos de Abrão e seus aliados.

O nome “Melquisedeque” significa “rei de justiça” (Cf. Hb.7:2) e a cidade de onde era rei é “Salém”, que significa “paz”.

Temos aqui, portanto, um rei que representa “justiça e paz”, precisamente aquilo que deveria ser trazido pela “semente da mulher” prometida no Éden, porquanto só há justiça quando se observa a Palavra de Deus e “paz”, no sentido hebraico, significa “completude”, “comunhão”.

Melquisedeque, era um rei e sacerdote, vai até Abrão e lhe traz pão e vinho, ou seja, quer com ele comer e beber e isto, pelo que se observa na cultura oriental, notadamente na cultura israelita, implica em querer estabelecer comunhão com Abrão.

O rei vem até Abrão para com ele estabelecer comunhão, compartilhar com o patriarca a fé no mesmo e único Deus.

Como se isto fosse pouco, Melquisedeque ainda abençoa Abrão, na qualidade de sacerdote deste único Deus, e, como diz o escritor aos hebreus, ao abençoar Abrão, põe-se num patamar superior ao patriarca (Hb.7:7), gesto que foi aceito pelo “pai da fé”, que reconheceu tal superioridade.

– Melquisedeque não se limitou a abençoar Abrão, mas, também, louva a Deus pela vitória alcançada pelo patriarca, reconhecendo, assim, que tudo aquilo havia ocorrido pela intervenção do Senhor, mostrando, portanto, que este único Deus não só é transcendente, superior a tudo o que foi criado (Possuidor dos céus e da terra), como também imanente, um Deus que intervém na criação para fazer justiça.

– Abrão submete-se, deste modo, a este sacerdócio superior, de uma pessoa que exsurge nas Escrituras como que “do nada”, mas que era sacerdote do Deus Altíssimo, sendo abençoado por este sacerdócio e tanto reconhecendo a sua legitimidade que lhe dá o dízimo de tudo quanto tinha. Abrão, aliás, neste ponto, cresce ainda mais na fé, ao reconhecer a soberania de Deus sobre o seu patrimônio, desprendendo-se dele.

– Este episódio seria de grande valia no entendimento do plano de Deus para a salvação, como nos mostra o escritor aos hebreus, que, através dele, nos traria o sentido do que o salmista afirmou quando disse que o Messias seria sacerdote “segundo a ordem de Melquisedeque” (Sl.110:4), mostrando a superioridade do sacerdócio de Cristo com relação ao sacerdócio levítico (Hb.7), a superioridade da graça em relação à lei mosaica.

– Abrão mostra, neste episódio, estar em plena comunhão com o Senhor, tanto que, ao mesmo tempo que aceita ser abençoado por Melquisedeque e lhe dá o dízimo de tudo, recusa a oferta de Bera, nada tomando dos sodomitas como despojo pela sua vitória militar (Gn.14:21-24).

– Abrão mostra que quem vive pela fé é desprendido das coisas materiais, dá prioridade às coisas espirituais e põe o material a serviço do espiritual.

Neste episódio, Abrão nos mostra que somente serem justos se vivermos pela fé e que a fé exige que tenhamos comunhão com Deus, por meio do sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque e que tal comunhão nos abençoa e nos permite manter separados do mundo e de tudo que ele possa vir a oferecer.

Temos vivido assim?

Caramuru Afonso Francisco

Site: http://www.portalebd.org.br/index.php/adultos/14-adultos-liccoes/667-licao-11-melquisedeque-abencoa-abraao-i

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