LIÇÃO Nº 10 – DÁDIVA, PRIVILÉGIOS E RESPONSABILIDADES NA NOVA ALIANÇA
A nova aliança em Cristo Jesus traz-nos privilégios e responsabilidades.
INTRODUÇÃO
– Na sequência do estudo da carta aos Hebreus, analisaremos o capítulo 10.
– A nova aliança em Cristo Jesus traz-nos privilégios e responsabilidades.
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I – A CONCLUSÃO DA SUPERIORIDADE DO SACRIFÍCIO E SACERDÓCIO DE CRISTO FRENTE À LEI – A DÁDIVA DA NOVA ALIANÇA
– Na sequência do estudo da Carta aos Hebreus, analisaremos o capítulo 10, que, na verdade, possui duas partes: uma que é a conclusão do argumento relativo à supremacia do sacrifício e do sacerdócio de Cristo em relação ao sacerdócio levítico a partir das ordenanças do culto divino e outra que nos falam das consequências deste argumento,
demonstrando os privilégios e responsabilidades do novo pacto, do novo testamento estabelecido por Jesus, que termina com mais uma exortação aos crentes judeus para que não trilhassem o caminho da apostasia espiritual, cujo perigo é novamente lembrado pelo escritor.
– O autor aos hebreus, após mostrar que o novo testamento implantado pelo Senhor Jesus é superior, visto que se tratou de um único sacrifício, que realmente tirou o pecado do mundo, feito pelo próprio sangue de Nosso Senhor e que teve sua apresentação no santuário celestial, volta a afirmar a seus leitores que a lei é apenas a “sombra dos bens futuros”, não a imagem exata das coisas e, por isso mesmo, os sacrifícios que continuamente se oferecem a cada ano podem aperfeiçoar os que a eles se chegam (Hb.10:1).
OBS: “…Alguém já fez uma definição curiosa no tocante à função da Lei até que Cristo viesse, dizendo:
• O pecado deforma;
• A filosofia reforma;
• A religião conforma;
• A Lei informa;
• Cristo transforma.…” (SILVA, Severino Pedro da. Hebreus: as coisas grandes e novas que Deus preparou para você, p.178).
– Esta afirmação do autor aos hebreus, que, lembremos, é fruto de entendimento dado pelo Espírito Santo (Hb.9:8), o único que pode discernir as coisas de Deus (I Co.2:9-11).
Temos aqui, liás, uma demonstração explícita das Escrituras que corrobora plenamente a chamada teologia dispensacionalista, bem como confirma toda a tipologia dela adveniente, a desmentir cabalmente aqueles que veem esta linha interpretativa, adotada pelas Assembleias de Deus, como uma “inovação” ou “invenção” do século XIX.
– A lei, com suas cerimônias e ordenanças, apenas prefigurava, de modo pedagógico mostrava, através de elementos visíveis e perceptíveis, o que estava por vir, ou seja, a salvação na pessoa de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.
A lei veio por Moisés para servir de remédio, de paliativo até que a “posteridade de Abraão” viesse realizar o cumprimento cabal das promessas feitas a Abraão, a de fazer benditas todas as famílias da terra (Gl.3:16,22-29).
– Devemos, portanto, compreender todas as ordenanças da lei como sendo uma figura, um tipo da graça vinda com Cristo, interpretando, assim, tipologicamente tudo quanto foi ordenado na antiga aliança, pois tudo que lá há apontada para Cristo.
O autor aos hebreus é enfático: “a lei não é a imagem exata das coisas”, mas Cristo, a “expressão imagem de Deus”, a plena realização de tudo quanto estava prescrito na lei, até porque são as Escrituras que testificam de Jesus (Jo.5:39).
OBS: “…O autor emprestou esta metáfora da arte pictórica. Porque, uma sombra, aqui, significa algo distinto do que em Colossenses 2.17; ali o apóstolo descreve as cerimônias antigas, as quais não possuíam a substância sólida do que representavam.
Agora ele diz que elas assemelhavam a rascunhos imprecisos, os quais prefiguram a pintura perfeita.
Pois antes de introduzir as cores vivas com seu pincel, o artista costuma traçar um rascunho com lápis, delineando assim a imagem que tem em mente.
Essa representação indistinta é denominada pelos gregos de σκιαγραφία, o que em latim você pode chamar de sombra [umbratilem].
Os gregos tinham também a ε’ικών, a plena semelhança. Daí também “eiconia”, imagens [imagines] em latim, a qual representa a verdadeira aparência de pessoas, de animais ou de lugares.…” (CALVINO, João. Comentário de Hebreus. Trad. de Válter Graciano Martins, pp.241-2).
– Não faz, pois, o mínimo sentido a “onda judaizante” que tem invadido muitos segmentos ditos evangélicos em nossos dias.
São cada vez mais numerosos os grupos que passam a adotar práticas judaicas, como a celebração de festas (Páscoa, Festa das Semanas, Festa dos Tabernáculos), a adoção de utensílios peculiares ao culto do tempo da lei (candelabro, arca da aliança, vestimentas sacerdotais e até sacrifícios, se se falar na reconstrução de templos de Salomão), o que nada mais é que a mesma atitude que os crentes judeus estavam tentados a fazer e que eram advertidos para que não o fizessem, que, aliás, era o tema desta carta:
o retorno ao judaísmo, pois isto seria um retrocesso espiritual que poderia até trazer uma irreversível perda da salvação.
– Todas as ordenanças do culto divino constantes da lei eram incapazes de trazer o aperfeiçoamento dos homens, pois não havia a menor possibilidade de elas resolverem a problemática do pecado, tanto que os sacrifícios tinham de ser continuamente oferecidos, sem que isto pudesse retirar o pecado de quem quer que seja.
Muito pelo contrário, os pecados eram apenas cobertos e as pessoas continuavam conscientes de seus pecados e da sua não retirada.
Tudo quanto tais práticas faziam era trazer a exclamação tão bem exposta pelo apóstolo Paulo na carta aos romanos: “Miserável homem que sou! Quem me livrará do corpo desta morte?” (Rm.7:24)
– “…O escritor sagrado, aqui neste texto, mostra-nos que os sacrifícios que eram oferecidos a cada dia na antiga aliança, mesmo que cobrissem o pecado, não tinham a eficácia e o valor do sacrifício expiatório de Cristo.
A repetição de sacrifícios mostra-nos que os adoradores não tinham a consciência de que os seus pecados tinham sido expiados definitivamente.
Porém, aqueles que creem em Cristo e confessam os seus pecados, levados por um arrependimento produzido em seus corações pelo Espírito Santo, alcançam de Deus o perdão — sentindo-o como alívio da alma na própria consciência.
Assim, os seus corações não mais os condenam e eles passam a ter confiança em Deus, conforme é declarado pelo apóstolo João:
“Amados, se o nosso coração nos não condena, temos confiança para com Deus; e qualquer coisa que lhe pedirmos, dele a receberemos, porque guardamos os seus mandamentos e fazemos o que é agradável à sua vista” (I Jo 3.21,22).…” (SILVA, Severino Pedro da. Hebreus: as coisas grandes e novas que Deus preparou para você, pp.180-1).
– O autor aos hebreus diz que, na lei, os sacrifícios faziam comemoração dos pecados. Há, aqui, um verdadeiro contraste com o que ocorre entre os salvos em Cristo Jesus.
Como bem afirma o saudoso pastor Severino Pedro da Silva: “…A Lei sempre lembrava o pecado, porém Cristo sempre lembra o perdão dos pecados.
É a primeira lembrança que vem à mente daquele que com Cristo se encontra. “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (Jo 1.29).
A cada ano em Israel havia a comemoração dos pecados no Dia da Expiação, quando o sumo sacerdote fazia expiação por si mesmo e pelo pecado do povo.
Assim, a Lei assumia um aspecto negativo, segundo o qual é vista como agente condenatório, que revela ao homem o seu pecado e o seu subsequente julgamento (Rm 7.7). Isto não acontece na condição revelada no Evangelho da graça de Deus.
Ele não só perdoa o pecado, mas ainda justifica o homem do seu pecado, dizendo: ‘E jamais me lembrarei de seus pecados e de suas iniquidades’ (Hb 10.17). Esta grande declaração de Deus proferida pelo profeta Jeremias nos traz o consolo e a confiança nas promessas de Deus a respeito do nosso perdão.…” (op.cit., p.181).
– Esta ideia de comemoração dos pecados persiste ainda hoje entre os judeus. Com efeito, o “dia da expiação” ou “dia do perdão”, conhecido como “Iom Kipur”, ainda hoje é uma data observada pelos judeus de todo o mundo.
Nele, há um recitativo congregacional de Confissão dos Pecados. “…Incessantemente, com efeito quase hipnótico, a longa litania [ladainha, observação nossa] da Confissão enunciada no Dia de Expiação faz o inventário de cinquenta e seis categorias de pecado.
À medida que o fiel recita cada uma delas, ele bate em seu peito na alta do coração com punho direito fechado, em contrição simbólica e repete a fórmula da confissão: ‘Al chet…’ ‘Pelo pecado que cometemos diante de Ti por…’.
E por todos esses erros enumerados, ele implora, em conjunto, com toda a congregação: ‘… Ó Deus do Perdão, perdoai-nos, absolvei-nos, dai-nos a nossa redenção!’…” (AUSUBEL, Nathan. Iom Kipur. In: A JUDAICA, v.5, p.383).
– Bem diferente é o que vemos na celebração da ceia do Senhor, em que o que comemoramos é a morte de Cristo Jesus, morte esta que trouxe o perdão dos nossos pecados, lembramos a nossa redenção,
que é tão somente ansiada pelos judeus, lembramos que Cristo morreu por nós, já nos salvou e que aparecerá segunda vez, sem pecado, para nos trazer a redenção do corpo, visto que já estamos com nosso homem interior remido, livre do pecado e da natureza pecaminosa. Aleluia!
– “…O autor está falando principalmente do sacrifício anual mencionado em Levítico 17, ainda que todo o assunto esteja incluso aqui sob uma só espécie.
Ele argumenta assim: Onde não há mais consciência de pecado, também não há necessidade de sacrifício.
Todavia, sob a lei, o oferecimento do mesmo sacrifício era continuamente reiterado. Portanto, Deus não estava satisfeito, a culpa não estava ainda removida e as consciências não se achavam apaziguadas.
Do contrário, os sacrifícios não teriam chegado ao fim. Deve-se observar cuidadosamente que o autor imprime o mesmo nome aos sacrifícios, os quais tinham um propósito similar.
Eram lembrados mais em relação ã instituição de Deus do que aos diferentes animais. Só esse fato seria suficiente para refutar as cavilações dos papistas, mediante as quais parecem encontrar um modo engenhoso de defender seu absurdo em relação ao sacrifício da missa.
Quando são confrontados com a objeção de que a reiteração de um sacrifício é supérflua, visto ser eterna a eficácia daquele que Cristo ofereceu uma vez por todas, imediatamente se justificam dizendo que na missa não se efetua nenhum sacrifício diferente, senão que é aquele mesmo. Essa é sua resposta; mas, o que diz o apóstolo?
Diz que o sacrifício oferecido segunda vez, ainda que seja o mesmo, não tem eficácia, nem é capaz de produzir a expiação.
Embora os papistas bradem mil vezes dizendo que o sacrifício que Cristo ofereceu uma vez por todas, na cruz, e aquele que eles oferecem hoje não são diferentes, e sim um só e o mesmo, ainda manterei, extraindo dos próprios lábios do apóstolo que, se o sacrifício de Cristo foi suficiente para satisfazer a Deus, não só os sacrifícios anteriores chegaram ao fim, mas também se torna impossível sua reiteração. Daqui se torna evidente que o oferecimento de Cristo na missa é um sacrilégio…” (CALVINO, João. op.cit., pp.2423).
– O autor aos hebreus, então, faz uso do Sl.40, onde há uma verdadeira profecia a respeito da oração feita pelo Senhor Jesus assim que deixa a Sua glória, para encarnar a fim de nos salvar.
A preparação de um corpo para Cristo é a evidência da incapacidade dos sacrifícios e ofertas da lei para tirar os pecados da humanidade. Era necessário que o próprio Jesus Se oferecesse como vítima para que o derramamento de sangue operasse a remissão dos pecados (Hb.10:5,6).
OBS: “…Foi bastante pertinente a aplicação dessa parte do Salmo 40 a Jesus, o que sumaria perfeitamente sua vida e sua obra. Ninguém pode entendê-lo sem perceber que sua devoção à vontade de Deus era a sua própria alma.
Até mesmo como um menino de doze anos de idade, ao ser questionado por seus pais, que por três dias o procuravam, Ele disse: ‘Não sabíeis que me convém tratar dos negócios de meu Pai?’ (Lc 2.49) Ele enfrentou as tentações que sofreu no deserto, uma após a outra, afirmando sua total aderência à vontade divina.
“A minha comida [aquilo que satisfaz a minha fome] consiste em fazer a vontade daquele que me enviou e realizar a sua obra” (Jo 4.34). Cristo teve uma atitude extraordinária. O que quer que dissesse, onde quer que tenha ido, movimentava-se com calma, confiança e força.
Tudo quanto havia n’Ele participava de suas palavras e de seus feitos, e o segredo era sua completa devoção aos propósitos do Pai.
Até mesmo no último conflito, no jardim do Getsêmani e na cruz, quando parece ter sido assolado por dúvidas, de uma coisa Ele nunca duvidou: que a vontade de Deus era boa e que a seguiria até o fim.…” (SILVA, Severino Pedro da. op.cit., pp.184-5).
– Jesus veio ao mundo para realizar um sacrifício que, realmente, agradasse a Deus, que satisfizesse a ira divina, e, para tanto, seria necessário que alguém santo, inocente, imaculado não só oferecesse tal sacrifício, mas se fizesse o próprio sacrifício, a própria vítima, para que, com a vida ganhasse vida para os homens. Somente o “ferimento do calcanhar” (Gn.3:15) teria condições de restabelecer a amizade entre Deus e o homem.
– A vontade de Deus era a substituição do primeiro testamento pelo segundo, até porque a lei somente fora dada a Israel em virtude de o povo não ter crido em Deus e não O ter amado, ficando sem condições de se apropriar da promessa feita a Abraão.
No entanto, Jesus satisfez estas exigências e, por nós, morreu na cruz para que pudéssemos nos tornar “descendência de Abraão” no sentido pleno da palavra, ou seja, aqueles que realmente creram no Senhor e tiveram, por isso mesmo, seus pecados perdoados e foram justificados pela fé em Jesus.
– A oferta do corpo de Jesus, feita uma única vez, nos santificou e, sem pecado, pôde nos fazer um com Deus (Jo.17:21).
Deste modo, diz o autor aos hebreus, Jesus, vencendo o pecado e o tirando do mundo, pôde se assentar à destra de Deus, depois de ter Se oferecido num sacrifício perfeito, daqui em diante apenas esperando que os Seus inimigos sejam postos por escabelo de Seus pés (Hb.10:10-13).
– Temos, então, a prova cabal de que o sacrifício de Cristo efetivamente nos santificou, pois Ele venceu a morte, ressuscitou e subiu aos céus e agora o Espírito Santo nos testifica que somos filhos de Deus (Hb.10:15; Rm.8:16), num novo concerto, segundo o qual não há mais comemoração dos pecados, mas, sim, esquecimento da parte de Deus a respeito deles, pois de nossas iniquidades o Senhor não Se lembra mais (Hb.10:16,17) e o autor aos hebreus, ao falar disto, mais uma vez faz uso da profecia de Jeremias a respeito do novo concerto (Hb.10:16-18; Jr.31:30-33).
OBS:- “…A passagem é citada de Jeremias 31.31, em cujo concerto Deus promete: 1. Que Ele vai derramar o seu Espírito sobre o seu povo, para lhes dar sabedoria, vontade e poder para obedecerem à sua Palavra.
Ele vai colocar a sua lei no coração deles, e escrevê-la na sua mente (v. 16).
Isso vai tornar a tarefa deles clara, fácil e agradável. 2. De seus pecados e iniquidades já não vai lembrar (v. 17), o que em si vai somente mostrar as riquezas da graça divina e a suficiência do sacrifício de Cristo, que não precisa ser repetido (v. 18).
Pois não haverá mais lembrança do pecado dos verdadeiros crentes, seja para envergonhá-los agora, seja para condená-los após esta vida. Isso era muito mais do que o sacerdócio e os sacrifícios levíticos podiam realizar.…” (HENRY, Matthew. Comentário bíblico – Novo Testamento: Atos a Apocalipse. Trad. de Luís Aron et alii, p.794).
– Diante disto, o autor aos hebreus diz que devemos ter ousadia para entrar no santuário, que aqui é o “lugar santíssimo”, pelo novo e vivo caminho que o Senhor Jesus nos consagrou, isto é, pela Sua carne, pois temos um “grande sacerdote sobre a casa de Deus” (Hb.10:19-21).
– Tem-se aqui uma dádiva: o Senhor Jesus Cristo. Jesus nos foi dado por Deus, Ele é a graça de Deus que trouxe salvação para todos os homens (Tt.2:11) e, com Cristo, podemos, agora, ter pleno acesso ao trono da graça (Hb.4:16), voltamos a ter pleno acesso a Deus.
Jesus foi feito sabedoria, justiça, santificação e redenção para nós e, em contrapartida, fomos por Ele comprados, passamos a ser d’Ele (I Co.1:30). Como diz o pastor, poeta sacro e primeiro comentarista das Lições Bíblicas, Samuel Nyström (1891-1960):
“Jesus, sou teu, e Tu és meu; me guiarás para o céu; com graça e paz me satisfaz, Cristo, meu Mestre veraz” (refrão do hino 87 da Harpa Cristã).
– Com esta dádiva, este dom de Deus para nós, só resta ter “ousadia”, que é a palavra grega “parrhesia” (παρρησία), cujo significado é de “toda sinceridade, franqueza, certeza, franca confiança”.
Não temos o que temer, temos pleno acesso à “Majestade”, ao Ser Supremo e, por isso mesmo, nada pode nos abalar neste cotidiano de lutas e adversidades que passamos durante a nossa peregrinação terrena. Somos de Jesus Cristo, fomos comprados por bom preço (I Co.6:20; 7:23).
OBS: “…Só se tem ousadia quando se tem confiança em alguém ou em alguma coisa. E nossa ousadia, conforme descreve o autor sagrado, advém do merecimento que nos é concedido “pelo sangue de Jesus”.
Das sete bem-aventuranças contidas no Apocalipse (1.3; 14.13; 16.15; 19.9; 20.6; 22.7,14), a última é dedicada para garantir o direito “[àqueles] que lavam as suas vestiduras no sangue do Cordeiro, para que tenham direito à árvore da vida e possam entrar na cidade pelas portas”.
Esta cidade santa é de fato um verdadeiro santuário, visto que “o Senhor Deus Todo-poderoso e o Cordeiro” é o seu templo. Nela entrarão aqueles que foram lavados no sangue do Cordeiro divinal! Isto sim nos dá ousadia — e devemos colocá-la em prática!
Pois através desta confiança que temos no sangue de Jesus passamos a ter ousadia, não apenas para entrar no santuário e nos dirigirmos a Ele, como também para pregar e, acima de tudo, buscar a santificação.…” (SILVA, Severino Pedro da. op.cit., pp.192-3).
II – OS PRIVILÉGIOS E RESPONSABILIDADES DA NOVA ALIANÇA
– O comentarista bíblico Matthew Henry entende que, em Hb.10:18, encerra-se a parte doutrinária da epístola aos hebreus, “in verbis”: “…E agora concluímos a parte doutrinária da epístola, em que
encontramos muitas coisas obscuras e de difícil compreensão, o que devemos atribuir à fraqueza e à lentidão da nossa própria mente.
O apóstolo agora prossegue para aplicar essa grande doutrina, com o propósito de influenciar as emoções deles e dirigir a sua prática, colocando diante deles as dignidades e responsabilidades do estado do evangelho.…” (op.cit., p.794).
– Depois de ter mostrado aos crentes judeus que estavam tentados, diante das dificuldades vividas no período imediatamente anterior à primeira guerra entre judeus e romanos, a voltar ao judaísmo, de que isto seria um retrocesso inigualável,
vez que Jesus Cristo é melhor que Moisés, Arão, Josué e que o sacerdócio de Cristo é superior ao sacerdócio levítico, por meio de interpretações retiradas das próprias Escrituras hebraicas, o autor aos hebreus passa a dizer que conduta deve ter aquele que foi salvo na pessoa de Cristo Jesus.
– Por primeiro, o autor fala dos privilégios que têm aqueles que tiveram seus pecados perdoados pelo sangue de Cristo, como também foram nele santificados.
Ao contrário dos que vivem sob a lei, que não podem ser aperfeiçoados pelos sacrifícios de animais, pois sempre há o véu separando o homem de Deus, aquele que crê em Jesus, por ter tido a remoção dos seus pecados, pode, sim, penetrar no lugar santíssimo, pois o Senhor Jesus abriu um novo e vivo caminho pela Sua carne.
OBS: “…Os privilégios são:
1. Ousadia para entrar no Santo dos Santos. Eles têm acesso a Deus, luz para conduzi-los, liberdade de espírito e de fala para se conformarem à orientação; eles têm direito ao privilégio e facilidade de acesso a ele, assistência para usá-lo e desenvolvê-lo e segurança de aceitação e vantagens.
Eles podem entrar na presença graciosa de Deus nos seus santos oráculos, ordenanças, providências e concerto, e assim na comunhão com Deus, em que recebem mensagens dele, até que estejam preparados para entrar na sua gloriosa presença no céu.
2. Um sumo sacerdote sobre a casa de Deus, que é esse bendito Jesus, que reina sobre a igreja militante, e cada membro dela na terra, e sobre a igreja triunfante no céu.
Deus está disposto a habitar com os homens na terra, e tê-los habitando com Ele no céu; mas homens caídos não podem habitar com Deus sem um sumo sacerdote, que é o Mediador da reconciliação aqui e do gozo depois.…” (HENRY, Matthew. op.cit., p.784).
– Este acesso a Deus, porém, traz-nos uma grande responsabilidade, pois temos de nos chegar ao Senhor com verdadeiro coração, em inteira certeza de fé, tendo os corações purificados da má consciência e o corpo lavado com água limpa (Hb.10:22).
– “…Os sacerdotes levíticos, quando das abluções batismais, tinham de ser totalmente imersos e purificados, a fim de poderem servir em seu ofício (Ex 29.21; Lv 8.30).
Arão e seus filhos passaram rigorosamente por esta espécie de purificação. ‘Moisés fez chegar a Arão e a seus filhos, e os lavou com água’ (Lv 8.6).
Isso era símbolo da purificação moral, da purificação da alma e de todos os seus vícios, excessos e pecados.
Os cristãos também reconhecem que além do batismo cristão, eles têm sido ‘… santificados pela oblação do corpo de Jesus Cristo, feita uma vez’ (Hb 10.10).
Em suma, cada crente então procura andar em santidade de vida, ‘… renunciando à impiedade e às concupiscências mundanas’ (Tt 2.12) e dedicando-se inteiramente ao serviço do Mestre.
Cada cristão deve ser um vaso santificado para uso santo do Senhor, para que por meio da santificação possa ouvir de Seus lábios as solenes palavras:
‘… este é para mim um vaso escolhido para levar o meu nome diante dos gentios, e dos reis, e dos filhos de Israel’ (At 9.15).…” (SILVA, Severino Pedro da. op.cit., p. 195).
– Precisamos chegar a Deus com verdadeiro coração, o que exige, de nós, uma atitude de santificação contínua. Ter um verdadeiro coração nada mais é que estar em comunhão com o Senhor, de nos esforçarmos para não termos uma vida de pecados e sempre seguirmos a direção do Espírito Santo. “…Este coração veraz, sincero ou reto, isento de vício e poluição, foi simbolizado pela lavagem no final do versículo.
Sem lavagem, não se permitia que os sacerdotes ministrassem, e eram ameaçados com morte [Ex 30.19-21]; e quando algum deles tocava algo imundo, não lhe era permitido comer as coisas santas até que se lavasse [cf. 12.6]. Lavar 0 corpo era algo mui importante, visto que simbolizava a lavagem interior do coração, única forma de sermos verdadeiros, ou sinceros…” (CALVINO, João. op.cit., p.257, nota 10).
– Mas, além do coração verdadeiro, ou seja, isento de pecados, devemos, também, estar “em inteira certeza de fé”, pois, sem fé é impossível agradar a Deus (Hb.11:6). De nada adianta querermos nos aproximar de Deus se não confiarmos n’Ele.
A incredulidade, já dissera o autor aos hebreus, foi o fator que impediu a geração do êxodo de entrar na Terra Prometida (Hb.3:19) e não podemos agora também repetir esta atitude, sob pena de perdermos a salvação. Temos de confiar em Jesus e nos apresentar diante de Deus deste modo.
– Temos os corações purificados da má consciência e o corpo lavado com água limpa, ou seja, “nascemos da água e do Espírito” (Jo.3:5), pois, como diz item 6 do Cremos da Declaração de Fé das Assembleias de Deus (CGADB):
“[Cremos] na necessidade absoluta do novo nascimento pela graça de Deus mediante a fé em Jesus Cristo e pelo poder atuante do Espírito Santo e da Palavra de Deus para tornar o homem aceito no Reino dos Céus”.
– O apóstolo Paulo tinha esta convicção, pois se apresentou, perante o Sinédrio, dizendo ter uma boa consciência (At.23:1) e, perante o presidente Félix, dizendo ter uma consciência sem ofensa tanto para com Deus para com os homens (At.24:16).
É esta a grande diferença entre o salvo e o perdido: o salvo tem consciência boa e sem ofensa, pois teve seus pecados removidos pelo Senhor Jesus. Aleluia!
– Temos, portanto, a responsabilidade de vivermos em contínua santificação para que tenhamos pleno acesso ao trono da graça, para que mantenhamos a comunhão com o Senhor. Como dirá o próprio autor aos hebreus mais adiante em seu tratado: “sem a santificação ninguém verá o Senhor” (Hb.12:14).
OBS: “…Ele ensina que não só a fé é necessária para a salvação, mas também a conduta e a vida justa, e uma consciência que não se censura com qualquer iniquidade.
Na ausência deste conjunto de disposições, não podemos receber em plenitude as coisas sagradas, porque são santas em si mesmas, as coisas sagradas são especialmente para os santos.
Nenhum leigo entra aqui; Israel nos purificou de corpo, nós de consciência. Uma pitada sagrada ainda é permitida para nós, a da virtude. “Tendo também o corpo lavado na água purificadora “.
Ele fala aqui de um banho que não limpa o corpo, mas a alma. – “O autor das nossas promessas é fiel”. Mas para que promessas ele deve ser fiel? É que temos que sair daqui, para entrar em um reino.
Para o resto, não procure com curiosidade a palavra divina, não exija os motivos. Nossas santas verdades requerem a simplicidade da fé.…” (CRISÓSTOMO, João. Sobre Hebreus. Homilia 19. n.1900. Cit. Hb.10:19-25. Disponível em: http://www.clerus.org/bibliaclerusonline/pt/index.htm Acesso em 30 nov. 2017) (tradução Google de texto em francês).
– Esta atitude de santificação faz com que retenhamos firme a confissão da nossa esperança. Mais uma vez, o autor vai enfatizar a necessidade de retermos a esperança, de ficarmos a esperar o Senhor Jesus. Sem esta esperança, não há como nos mantermos puros (I Jo.3:2,3).
OBS: “…- “retenhamos firme a confissão da nossa esperança”. Ele coloca a questão da esperança; Exorta a manter a esperança firme e acrescenta o porquê. É para saber que, através da fé de Cristo, nos é dada a esperança de saúde e entrada eternas no céu (I Pe.1).
Por isso, diz: “retenhamos”, mas não diz “a esperança” mas “a confissão da nossa esperança”, então, não é suficiente levá-la ao coração, se um acorde não soar na boca (Rm.10); e confessá-lo, não apenas em palavras, mas em ação, contra aqueles de quem na Carta a Tito dizem que “professam conhecer Deus, mas O negam com obras”.
Deixe essa confissão ser feita por obras que dirigem para o objetivo de seus desejos (Apocalipse 3).…” (AQUINO, Tomás de. Comentário da Epístola aos Hebreus. Trad. de J.L.M. n.38. Cit. Hb.10:19-25. Disponível em: http://www.clerus.org/bibliaclerusonline/pt/index.htm Acesso em 30 nov. 2017) (tradução Google adaptada por nós de texto em espanhol).
– Não é sem motivo que, nos dias da apostasia espiritual em que vivemos, justamente duas tenham sido as mensagens que desapareceram de muitos púlpitos: a santificação e o arrebatamento da Igreja.
Ambas as mensagens estão interligadas, pois somente espera Jesus quem está zelando pela sua santificação.
A razão de ser da manutenção de uma vida de santificação é o arrebatamento da Igreja, a esperança de habitarmos na cidade celestial.
Quem não tem esta esperança não vê motivo algum para se manter em santidade, prefere desfrutar das delícias enganosas e passageiras deste mundo e, por isso mesmo, vive pecaminosamente.
– Esta atitude de santificação faz com que haja uma correspondente ação em relação ao próximo, ou seja, a “consideração de uns aos outros”.
Não há como se viver em comunhão com Deus sem que se tenha uma atitude de consideração em relação ao próximo, de reconhecimento do outro como imagem e semelhança de Deus, daquilo que os juristas costumam denominar de “dignidade da pessoa humana”.
– “…O fruto da consideração somente terá lugar em nossas vidas se existir humildade em nossos corações. A recomendação de Paulo aos romanos e aos filipenses deixa isso bem claro:
‘Amai-vos cordialmente uns aos outros com amor fraternal, preferindo-vos em honra uns aos outros’ (Rm 12.10). E depois ele fala novamente aos filipenses: ‘Nada façais por contenda ou por vanglória, mas por humildade; cada um considere os outros superiores a si mesmo’ (Fp 2.3).…” (SILVA, Severino Pedro da. op.cit., p.196).
– Quem está em comunhão com Deus é participante da natureza divina (II Pe.1:4) e, portanto, ama o ser humano assim como o Senhor.
A santidade estimula a prática do amor e das boas obras (Hb.10:24). Não se pode considerar que alguém seja santo se não ama o próximo nem pratica boas obras.
OBS: “…- “e consideremo-nos uns aos outros”. Ele coloca a questão da caridade, após o que remove o oposto dela e explica o motivo de ambos pela congruência do tempo. Quanto ao primeiro, é saber que, embora a caridade tenha como objetivo principal a união com Deus é revelada pela caridade do próximo; “Aquele que não ama a seu irmão que vê, como pode amar a Deus, a quem não vê?” (I Jo.4:20).
Então, amar o seu próximo pertence à caridade. É por isso que diz: “Vamos nos considerar uns aos outros”, isto é, no que diz respeito ao próximo, de modo a fazê-lo com muito cuidado, já que “a cada um Deus enviou o amor ao próximo” (Eclo.17:12).…” (AQUINO, Tomás de Aquino. op.cit. end.cit.).
– Esta consideração de uns pelos outros, esta prática do amor e das boas obras se demonstra por uma outra atitude: a de não deixarmos a nossa congregação, mas, sim, a de nos admoestarmos uns aos outros, quanto mais se vê que vai se aproximando o dia da redenção do nosso corpo (Hb.10:25).
– Temos aqui uma passagem que, claramente, mostra como é antibíblica a atitude dos “desigrejados”, que abandonam as suas congregações, as suas igrejas locais.
A vida cristã exige que estejamos participando de uma “congregação”, de uma igreja local, para ali podermos nos admoestar uns aos outros, ou seja, nos estimularmos à prática do amor ao próximo, à prática das boas obras, crescendo espiritualmente, pois, se a salvação é individual, não no é a santificação, que exige a participação de todos nós, pois somos membros em particular do corpo de Cristo e, como tal, dependemos uns dos outros (I Co.12:12,27).
– A existência de “desigrejados” e o seu crescimento numérico nos últimos tempos é mais uma demonstração da apostasia espiritual em que nos encontramos.
Ao vermos isto, num claro sinal de que Jesus está às portas, de que mui brevemente teremos o arrebatamento da Igreja, impõe-se uma atitude de manutenção nossa na igreja local, para que,
através da mútua admoestação, ou seja, do estímulo à prática do amor e das boas obras, bem como da santificação, que é o fator que nos leva a tais atitudes, venhamos a reter a esperança e alcançarmos a glorificação, o estágio último do processo da nossa salvação.
– “…Alguns destes cristãos hebreus tinham se voltado para o judaísmo, deixando assim a sua própria congregação.
Outros haviam se desviado totalmente, voltando-se para o mundo. E não satisfeitos, começaram a ridiculizar o Filho de Deus, expondo Sua obra redentora ao vitupério, conforme fica subentendido nos versículos que se seguem.
Parece-nos que tal fracasso em suas vidas foi desencadeado por um lento processo, começando pela ‘negligência’ (5.11).
O isolamento da igreja e da comunidade traz prejuízo tanto para o cristão como para a igreja, que fica privada da presença de um de seus filhos. Evidentemente, é importante que não deixemos a congregação a que pertencemos, seja ela grande ou pequena, rica ou pobre, próxima ou distante. Ali foi o lugar escolhido por Deus para que glorifiquemos o seu nome e exerçamos nossas pequenas ou grandes atividades (cf. Dt 12.5-7).…” (SILVA, Severino Pedro da. op.cit., p.197).
III – O PERIGO DO PECADO VOLUNTÁRIO
– Para finalizar esta análise da conduta que se espera do salvo em Cristo Jesus, o escritor aos hebreus volta a alertar contra o perigo da apostasia, fazendo aqui uma alusão ao pecado voluntário, retomando o que consta na lei, mais precisamente em Nm.15:30,31 onde se diz que a alma que fizer alguma coisa à mão levantada, seria extirpada do meio do povo, uma vez que teria desprezado a palavra do Senhor e anulado o seu mandamento.
– “À mão levantada” é a palavra hebraica “yadh” (יד), cujo significado é “mão aberta”, que significa “arrogantemente”., “de maneira deliberada” (como está na Versão King James Atualizada).
A lei de Moisés diz que, quando houvesse tal pecado, não adiantava fazer-se sacrifício, pois este não cobriria tal pecado.
– Logo após a menção deste mandamento, é narrada a morte por apedrejamento de um homem que fora catar gravetos no dia de sábado, que serve de ilustração deste tipo de pecado, porquanto, apanhado em tal ato, o próprio Deus manda mata-lo por apedrejamento, numa clara demonstração de que se tratara de um pecado que não tinha perdão.
– Embora a tradição judaica veja neste gesto do catador de gravetos um autossacrifício para que os israelitas percebessem que, mesmo tendo sido decretado de que não entrariam na Terra Prometida, não estavam eles isentos de cumprir a lei, parece-nos mais razoável entender que, ante a afirmação divina de que o povo não entraria na Terra Prometida,
tenha este catador deliberadamente desprezado a Palavra de Deus, arrogantemente decidido transgredir os mandamentos, desprezando-os e, em virtude disto, agiu de forma a não ter como obter perdão.
OBS: Eis o que diz o Talmude a respeito:
“…As intenções do catador de gravetos eram em nome dos céus. Pois quando foi decretado que o povo não entraria na Terra, devido ao pecado dos espiões (Nm.14:21), eles pensaram que não mais tinham a obrigação de cumprir mistvot.
Assim, esta pessoa resolveu transgredir o Shabat, a fim de que o povo o visse sendo punido com a morte por sua transgressão, de onde eles aprenderiam que as mistvot [mandamentos, observação nossa] ainda eram obrigatórias (Baba Batra 119b).…” (MILLER, Chaim (org.)(adapt.). O Livro de Números com comentários de Rashi, Targum Onkelos, Haftarot e comentários compilados de textos rabínicos clássicos e das obras do Rebe de Lubavitch, p.124).
– Se, segundo a lei, cuja inferioridade acabara de ser cabalmente demonstrada pelo autor aos hebreus, não tolerava a prática do “pecado voluntário”, dizendo que não restava mais sacrifícios a serem feitos por ele, como se poderia pensar que o desprezo da nova aliança teria resultado menos danoso?
– O deliberado desprezo do sacrifício de Cristo Jesus somente poderia dar uma expectação horrível de juízo e ardor de fogo que há de devorar os adversários.
Assim como aquele catador de gravetos, por ter transgredido a lei de Moisés, morreu sem misericórdia, e, de igual modo, assim morre todo aquele que transgredir qualquer dos mandamentos da lei pela boca de duas ou três testemunhas, como se espera que alguém venha a escapar se deliberadamente desprezar a salvação na pessoa de Cristo Jesus?
– A decisão de abandonar Cristo Jesus, de modo deliberado, como alguns crentes judeus estavam cogitando tomar, importaria em uma condenação que seria irreversível, pois, se numa aliança inferior,
não se podiam cobrir pecados de quem voluntariamente transgredisse a lei, como admitir que alguém que pisasse o Filho de Deus e tivesse por profano o sangue do novo testamento, pudesse ter alguma chance de salvação?
– Temos aqui, uma vez, através da figura do “pecado voluntário”, aquilo que o Senhor Jesus denomina de “blasfêmia contra o Espírito Santo”(Mt.12:31; Mc.3:28-30; Lc.12:10), pois se teria um verdadeiro “agravo ao Espírito Santo”, que, afinal de contas, foi quem nos convenceu do pecado, da justiça e do juízo (Jo.16:8,9).
O autor aos hebreus é claro ao dizer que agir desta maneira é “fazer agravo ao Espírito da graça” (Hb.10:29).
– “…O Dr. F. W. Grant observa que este ato de pecar ‘voluntariamente’ representa mais que um fruto da ignorância, sendo uma aberta oposição a Deus e a tudo que é divino.
Não se trata de uma fraqueza da alma, mas de uma atitude obstinada do espírito. Deve ser esta a razão por que “não resta mais sacrifício pelos pecados” para tais transgressores, visto que voluntariamente se entregaram à prática da iniquidade (cf. SI 109.17).…” (SILVA, Severino Pedro da. op.cit., p.198).
– “…Ele realça quão severa é aquela vingança de Deus que aguarda todos aqueles que apostatam da graça de Cristo, uma vez que se privam de sua única salvação; é como se eles se entregassem à sua própria destruição…” (CALVINO, João. op.cit., p.264).
– O pecado voluntário é a assunção deliberada de uma inimizade contra Deus. É se fazer adversário do Senhor, razão pela qual surge esta “expectação horrível de juízo e ardor de fogo”, pois este fogo há de, precisamente, devorar os adversários.
– “…Os pecadores, mencionados pelo apóstolo, não são os que de alguma forma caem; são, antes, aqueles que abandonam a Igreja e se separam de Cristo. Ele não está tratando, aqui, desse ou daquele gênero de pecado, mas está simplesmente expondo pelo nome aqueles que renunciam deliberadamente a comunhão da Igreja.
Não há muita diferença entre apostasia individual e uma deserção universal desse tipo pela qual apostatamos irrevogavelmente da graça de Cristo. Visto que tal coisa não pode suceder senão a alguém que já foi iluminado, ele diz:
‘Se pecarmos deliberadamente, depois de termos recebido o pleno conhecimento da verdade’, como se estivesse dizendo: ‘Se alguém consciente e voluntariamente despreza a graça que uma vez recebeu.’…” (CALVINO, João. op.cit., pp.264-5).
– No entanto, o autor aos hebreus não acusa os crentes judeus de já terem apostatado da fé, mas mostra quão perigoso seria retornar às práticas judaicas, lembrando, porém, os seus leitores que eles tinham uma “ficha corrida” de fidelidade ao Senhor Jesus, tendo suportado todas as perseguições implacáveis por parte dos judeus e até mesmo dos romanos.
Eles haviam sido feito “espetáculo com vitupérios e tribulações”, sendo certo que não haviam abandonado aqueles que tinham sido presos por causa da fé em Cristo Jesus, bem como haviam sofrido o confisco de seus bens (Hb.10:32-34).
– O autor aqui põe em prática o que estava a ensinar, num belíssimo exemplo a ser seguido por todos os mestres na casa do Senhor.
Ele não apenas advertiu os crentes judeus do risco da apostasia, mas os animou, os admoestou a manter a conduta até então tomada, qual seja, a de sofrer todas as aflições por causa da sua fé em Cristo Jesus.
– Nos dias hodiernos, estamos também com esta mesma atitude dos crentes judeus que é elogiada pelo escritor? Temos suportado as aflições e as perseguições? Temos sido solidários com o sofrimento de nossos irmãos por causa da fé em Cristo? Pensemos nisto!
– Por isso, os crentes judeus não deveriam rejeitar a confiança em Deus que tinham demonstrado até aquele momento, sabendo que a manutenção desta confiança lhes traria grande avultado galardão. Sim, o Nosso Senhor e Salvador tem conSigo o galardão para dar a cada um segundo as suas obras quando da Sua vinda (Ap.22:12).
– Para tanto, precisamos ter paciência, ou seja, capacidade de suportar as contrariedades, adversidades e perseguições, sempre fazendo a vontade do Senhor, pois só assim alcançaremos a glorificação e teremos o cabal cumprimento da promessa que Deus fez ao homem desde o dia mesmo da queda, de restabelecer, e de uma forma eterna, a comunhão e amizade entre Ele e o homem.
– Para tanto, não podemos recuar, não podemos voltar ao mundo nem a uma religiosidade vazia, baseada não em Cristo mas no homem ou nas suas “invenções” (Ec.7:29). Não podemos ser daqueles “que se retiram para a perdição, mas daqueles que creem para a conservação da alma” (Hb.10:39).
– O autor aos hebreus resume esta conduta que esperava dos destinatários da carta com a afirmação de que “o justo viverá da fé e se ele recuar a minha alma não tem prazer nele” (Hb.10:38,39), lembrando que, para os judeus, a expressão “o justo viverá da fé”, mencionada pelo profeta Habacuque, é o resumo de todos os 613 mandamentos da lei e a própria essência da vida cristã, consoante Rm.1:16,17, o suprassumo do Evangelho, da vida de salvação em Cristo Jesus.
OBS: “…Rabi Simlai explicava: Seiscentos e treze mandamentos foram ditos a Moisés. Trezentas e sessenta proibições de acordo com os dias do ano solar.
E duzentos e quarenta e oito mandamentos positivos de acordo com os membros de uma pessoa. Rav Hamnuya disse: qual é o significado do versículo (Dt.33:4):”Moisés nos ordenou uma lei (“Torah”) como herança? “Torah” tem o valor numérico de seiscentos e onze. “Eu sou…” e “Não terás…” foram diretamente do Todo Poderoso.
Davi veio e os estabeleceu em onze, como está escrito (Sl.15:1): “Um Salmo de Davi. Quem, SENHOR, habitará no teu tabernáculo? Quem há de morar no teu santo monte?
O que vive com integridade, e pratica a justiça, e, de coração, fala a verdade; o que não difama com sua língua, não faz mal ao próximo, nem lança injúria contra o seu vizinho; o que, a seus olhos, tem por desprezível ao réprobo, mas honra aos que temem ao Senhor; o que jura com dano próprio e não se retrata; o que não empresta o seu dinheiro com usura, nem aceita suborno contra o inocente.
Quem deste modo procede não será jamais abalado.”
(…) Isaías veio e os estabeleceu em seis, como está escrito (Is.33:15):
“O que anda em justiça e fala o que é reto; o que despreza o ganho de opressão; o que, com um gesto de mãos, recusa aceitar suborno; o que tapa os ouvidos, para não ouvir falar de homicídios, e fecha os olhos, para não ver o mal”
(…) Miqueias veio e os estabeleceu em três, como está escrito (Mq.6:8): Ele te declarou, ó homem, o que é bom; e que é o que o Senhor pede de ti, senão que pratiques a justiça, e ames a beneficência, e andes humildemente com o teu Deus?”
(…) Isaías retornou e os estabeleceu em dois (Is.56:1); “Assim diz o Senhor: Mantende o juízo e fazei justiça, porque a minha salvação está prestes a vir, e a minha justiça, prestes a manifestar-se.” Amós veio e o estabeleceu em apenas um (Am.5:4): “Pois assim diz o Senhor à casa de Israel: Buscai-me e vivei.” Rav Nachmann bar Yatshak desafiou isto: talvez isto signifique buscar a Torá inteira?
Em vez disso, Habacuque veio e o estabeleceu em apenas um, dizendo:”O justo pela sua fé viverá”…” Disponível em: http://www.sefaria.org/Makkot.24a.29?lang=bi&with=all&lang2=en Acesso em 15 abr. 2017. (tradução nossa de texto em inglês).
– Não há como se alcançar a salvação sem a fé e é isto que o autor aos hebreus irá demonstrar aos crentes judeus, com a famosa “galeria dos heróis da fé”, que haveremos de estudar na próxima lição.
Ev. Caramuru Afonso Francisco
Fonte: portalebd.org.br