O capítulo 17 de Juízes nos apresenta o relato a respeito de um levita, ou seja, um homem da tribo de Levi. Essa tribo de Israel foi separada por Deus para o serviço sagrado. Seus homens eram vocacionados para o ministério. O texto nos fala de um levita que estava em busca de comodidade. Por isso, saiu do lugar escolhido por Deus para o exercício do seu ministério. Seu lugar era Judá, mas estava perambulando em Efraim. A prioridade daquele homem era apenas o seu próprio interesse. Por esse motivo, caiu em um laço maligno e passou a ser sacerdote de falsos deuses. Deixou o santuário de Deus e passou a servir no santuário de Mica, um herege.
Dessa passagem extraímos algumas advertências:
Nesse tempo não havia rei em Israel. Faltava liderança para a nação e cada um fazia o que bem lhe parecia (Jz.17.6; 21.25). A lei de Moisés estava em vigor, mas isso não bastava. Faltava uma autoridade para estabelecer e cobrar a observância da lei. A lei determinava as funções levíticas, como se pode ver em Números, capítulos 3, 4 e 8. Os levitas eram auxiliares dos sacerdotes. Eram responsáveis, principalmente, pelo cuidado e transporte dos utensílios sagrados. Precisavam montar e desmontar o tabernáculo em sua constante viagem pelo deserto.
Aquele levita não queria carregar o peso da arca, do altar e dos utensílios do culto. O serviço sagrado não se resume às tarefas prazerosas e fáceis. Existe a parte da oração persistente, do jejum, da renúncia, do esforço a favor do próximo. Isso pode ser pesado para quem não está pronto para o serviço.
Às vezes Deus nos coloca em lugares ou situações desagradáveis. Podemos citar os exemplos de Daniel no exílio ou da serva israelita de Naamã. É nesses lugares que Deus nos usa ou nos fala. Quando Jacó teve uma pedra por travesseiro, teve também uma visão de anjos. Foi dentro da fornalha que Sadraque, Mesaque e Abdenego viram o Filho de Deus.
Quando sentimos o peso da obra ou o calor do fogo, somos tentados a buscar um lugar mais tranquilo e confortável. É nessa hora que corremos o risco de sair da posição onde Deus nos colocou. O servo de Deus não deve ter como objetivo um salário melhor na casa de Deus, ou uma posição de honra ou o respeito e reconhecimento humano. Podemos até ter tudo isso, mas este não deve ser o nosso alvo. Nossa missão é promover o Reino de Deus e não o nosso próprio reino. Nosso dever é levar a palavra e o poder de Deus, mesmo que isso nos custe muito caro e não nos traga benefícios pessoais.
A busca do conforto é uma prioridade do homem moderno. Para isso contribuem a tecnologia, a engenharia, a mecânica, a indústria em geral, etc. Das cavernas até a casa atual, o ser humano caminhou em busca da comodidade. Trabalhamos pela sobrevivência, pela segurança e... pelo conforto. Precisamos, porém, lembrar que conforto não é sinônimo de felicidade. Não pretendo definir felicidade, mas creio que ela está mais relacionada à satisfação depois do esforço, depois do trabalho.
Estamos, todos os dias, sendo alvo de milhares de anúncios comerciais que pretendem identificar em nossas vidas algum incômodo que poderá ser eliminado através da aquisição deste ou daquele produto. Desenvolve-se assim a idéia de que não podemos conviver com nada que nos desagrade ou diminua nosso bem-estar. Essa mentalidade pode ser nociva quando levada para dentro da igreja ou do relacionamento familiar, criando uma expectativa hedonista, egocêntrica e imediatista.
Em princípio, a busca do conforto não é errada. Mas precisamos ver se, em função disso, não estamos pisando em valores fundamentais.
Existe até mesmo a busca da comodidade doutrinária (II Tm.4.3). Por exemplo, se o líder é muito enfático sobre o tema da santidade, alguns podem querer outro lugar, onde não sejam incomodados pela verdade.
Quando surge o desconforto podemos tomar diversas atitudes legítimas para melhorar a situação. Porém, muitas vezes preferimos fugir. Foi o que fez aquele levita. Partiu em busca da comodidade. Hoje em dia é muito comum mudar de partido político, mudar de igreja, mudar de marido, mudar de esposa, etc. Tudo está se tornando descartável. É uma terrível constatação. As pessoas são usadas e trocadas, como se fossem produtos comerciais. Não temos condição de julgar o motivo de ninguém, mas cada um deve julgar seus próprios motivos. Será que, em muitos casos, as pessoas não estão buscando a comodidade a qualquer custo?
Jesus não vivia muito confortavelmente. Ele disse: "As aves do céu têm ninhos e as raposas têm os seus covís, mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça." Preferimos ser uma ave no ninho, uma raposa no covil, ou um servo de Deus no lugar onde ele nos colocou? O lugar mais desconfortável que poderia haver foi a CRUZ, mas Jesus não fugiu. Ele não viveu em busca da comodidade, mas buscou fazer a vontade do Pai, sendo obediente até a morte.
Se queremos reinar com Cristo, precisamos sofrer com ele. Mesmo sabendo que os díscipulos teriam aflições, Jesus não rogou ao Pai que os tirasse do mundo, mas que os livrasse do maligno.
Quando fugimos do desconforto deixamos de desenvolver resistência. Quem não carrega peso não desenvolve seus músculos. Precisamos aprender a suportar alguns pesos (Lm.3.27-28). Não o peso do pecado, mas o peso dos desafios da vida, do trabalho e da renúncia aos prazeres ilícitos. O comodismo é irmão da preguiça e parente próximo da desonestidade. Quem não aprende a se esforçar pode acabar roubando. E a infância é o período mais adequado para se aprender o valor da conquista através do esforço. Excesso de comodismo para as crianças pode deixá-las mal acostumadas. É evidente que não estamos fomentando o trabalho ou a exploração infantil. Contudo, os filhos podem fazer algumas tarefas e aplicar algum esforço, evitando assim, o caráter comodista de quem espera tudo pronto e rápido
A cruz é o primeiro presente que o cristão ganha quando começa a seguir o Senhor Jesus. Em nosso caminho existem muitas bênção, mas há também sofrimento, disciplina, esforço e provação. Paulo comparou a vida cristã a uma corrida olímpica. Como queremos vencer sem lutar? Aquele que está assistindo de camarote não ganhará nenhum troféu.
Jesus suportou a afronta e recebeu a recompensa do Pai. Assim será conosco. Não vamos abandonar nosso posto. Não vamos procurar o comodismo oferecido pelos ídolos. Vamos permanecer onde Deus nos colocou, ainda que estejamos entre espinhos e escorpiões. O dia chegará quando seremos resgatados deste mundo para um lar eterno. Tendo combatido o bom combate e guardado a fé, receberemos o galardão e a coroa da vida.
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Anísio Renato de Andrade – Bacharel em Teologia.
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