APÊNDICE Nº 3 – GEAZI – O FRACASSO DE UM MINISTÉRIO NO COMBATE Á APOSTASIA
Geazi é o exemplo do que pode levar um ministério ao fracasso em dias de apostasia espiritual.
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Texto áureo: “Porém ele lhe disse: Porventura não foi contigo o meu coração, quando aquele homem voltou de sobre o seu carro, a encontrar-te? Era isto ocasião para tomares prata, e para tomares vestidos, e olivais, e vinhas, e ovelhas, e bois, e servos, e servas? Portanto a lepra de Naamã se pegará a ti e à tua semente para sempre. Então saiu de diante dele leproso, branco como a neve.” (II Rs.5:26,27)
INTRODUÇÃO
– Em complemento ao estudo deste trimestre, faremos um estudo a respeito de Geazi, o moço do profeta Eliseu, que, apesar de ter posição privilegiada entre os filhos dos profetas, teve seu ministério fracassado.
– Geazi é um exemplo que a Bíblia nos deixa do que não devemos fazer se quisermos ser vitoriosos nestes dias de apostasia espiritual.
I – GEAZI, O MOÇO DO PROFETA ELISEU
– Como complemento do estudo da biografia e dos ministérios dos profetas Elias e Eliseu, entendemos ser oportuno fazermos um estudo, ainda que sucinto, a respeito de uma personagem secundária deste período, mas que muito tem a nos ensinar, a do moço do profeta Eliseu, Geazi.
– O estudo da vida e do fracasso espiritual de Geazi (ao menos no que respeito a termos de ministério), é um poderoso alerta dos perigos que correm aqueles que, em dias de apostasia espiritual, como os que estamos a viver, decidirem ingressar no batalhão do Senhor.
Geazi fica como um contraexemplo, algo a ser evitado, para que possamos ter êxito nesta empreitada contra o mal.
– Era costume dos profetas terem um moço, ou seja, alguém que estivesse próximo a ele para o auxiliar no seu dia-a-dia, um servo próximo. A Bíblia nos relata que Elias tinha o seu moço, que, inclusive, deixou em Berseba, antes que fosse para o deserto pedir a morte (I Rs.19:3).
– Após a sua experiência no monte Horebe, Elias vai ter como moço a Eliseu, que, começando como moço do profeta (cfr. II Rs.3:11), viria a ser seu sucessor.
– Seguindo este costume, Eliseu também escolhe um moço, chamado Geazi (II Rs.4:12), nome cujo significado é “vale da visão”, embora alguns entendam que o significado seja “diminuidor” ou “negador”.
Geazi é mencionado nominalmente por doze vezes nas Escrituras (II Rs.4:12,14,25,27,29,31; 5:20,21,25; 8:4,5), a indicar que se tratava de um servo especial de Eliseu, não sendo, pois, despropositado considerar que Geazi estava sendo preparado pelo profeta para um papel especial dentre os filhos dos profetas, quiçá seu sucessor, já que Eliseu aprendera com Elias que o ofício profético teria de ter continuidade.
– Geazi acompanhava Eliseu em todos os lugares onde o profeta ia, no seu encargo de cuidar dos filhos dos profetas, sabendo, pois, perfeitamente o que significava ser um “santo homem de Deus”, como reconhecera a sunamita, a ponto de esta ter conseguido que seu marido edificasse um pequeno quarto junto ao muro onde o profeta pudesse se hospedar quando passava por Suném.
– É, precisamente, neste quarto que estava Eliseu quando Geazi é mencionado pela vez primeira na Bíblia Sagrada. Eliseu, profundamente agradecido pelo bem que aquela sunamita lhe fazia com a cessão daquele aposento, mostrando ser uma pessoa extremamente compassiva, quis retribuir-lhe o bem recebido.
– Mandou, então, que Geazi chamasse aquela mulher. Quando ela chegou, o profeta perguntou-lhe do que precisava, pois estava disposto a interceder em favor dela diante do rei ou do chefe do exército.
A sunamita, porém, disse que habitava no meio do seu povo, ou seja, de nada necessitava, como que declinando do benefício que lhe era oferecido pelo profeta (II Rs.4:12,13).
– Esta posição da sunamita é uma preciosa lição para todos nós. Aquela mulher era temente a Deus, tanto que identificara em Eliseu um “santo homem de Deus”. Tinha prazer em ajudar o servo do Senhor de forma incondicional, sem segundas intenções, com pureza de propósito. Mesmo quando lhe foi oferecida alguma vantagem, declinou da oportunidade.
– Nós, também, como servos do Senhor, temos de fazer o bem a todos, notadamente aos domésticos da fé (Gl.6:10), de forma desinteressada e incondicional, sabendo que Deus, na Sua infinita graça e soberania, fará com que colhamos aquilo que tenhamos semeado.
– Eliseu ficou inconformado com aquela atitude da sunamita, querendo fazer-lhe bem. Perguntou, então, a Geazi o que se podia fazer por aquela mulher.
O moço, então, fazendo jus ao seu nome, isto é, “vale da visão”, mostrou ao profeta que a sunamita não tinha filhos, o que, para a sociedade israelita, naquele tempo, era um vitupério, uma verdadeira maldição, sendo o seu marido já velho, o que era um prenúncio de que a sunamita tinha grandes chances de, com a morte do marido, ficar irremediavelmente desamparada (II Rs.4:14).
– O profeta, então, acolhendo a sugestão de seu moço, mandou chamar novamente a mulher e lhe disse que ela teria um filho. A sunamita não acreditou na profecia, mas o fato é que ela concebeu e, realmente, teve um filho (II Rs.4:15-17).
– Neste episódio, vemos que Geazi estava cumprindo bem o seu papel de moço do profeta. Estava a aprender com Eliseu a ter compaixão das pessoas, a querer o bem do próximo, tanto que bem identificou o que aquela sunamita precisava, tendo sido o canal usado pelo Senhor para que aquela mulher fosse recompensada pelo seu cuidado com o servo do Senhor.
Geazi era aqui um instrumento de bênção, alguém que tinha bem compreendido a natureza do ofício profético e o ministério que estava sendo exercido por Eliseu, cujo nome significava “Deus é salvação”.
– Quando estamos a exercer uma função de auxiliar de alguém que está à frente do rebanho do Senhor (cfr. Rm.12:28 – dom assistencial de socorro), temos de ter este mesmo comportamento de Geazi.
Estar prontos a complementar a visão daquele que está à frente, estar prontos a somar e a acrescentar na chamada daquele a quem estamos a ajudar.
Não há como andarmos junto com alguém se não estivermos de acordo com ele (Am.3:3). Por isso, a todos quantos são chamados para ajudar, auxiliar, é imperioso que tenham sempre a conduta de acrescer no ministério daquele que é auxiliado.
– Geazi mostrava assim que era um “homem de visão”, um homem que estava a seguir os passos de Eliseu, que entendia que o ministério de seu senhor era um ministério de exercício de compaixão, de benefício ao próximo.
Com o milagre da conceição e nascimento do filho da sunamita, também pudera ver com seus próprios olhos que valia a pena servir ao Senhor desinteressadamente.
II – GEAZI E A EXPERIÊNCIA DO BORDÃO DE ELISEU
– Os anos se passaram e Geazi continuava a servir a Eliseu. Quando o filho da sunamita já era crescido, um dia o menino adoeceu, com uma forte dor de cabeça e, em virtude disto, veio a falecer. Sua mãe, então, diante daquela situação, pôs o menino na cama que havia no quarto do profeta Eliseu e foi até o monte Carmelo, onde estava o profeta, a fim de contar-lhe toda a história (II Rs.4:18-25).
– Quando Eliseu viu de longe que a sunamita se aproximava, mandou que Geazi fosse ao seu encontro e lhe perguntasse a respeito dela, do seu marido e do seu filho.
Geazi prontamente obedeceu à ordem do profeta e lhe fez estas perguntas. A sunamita, repetindo o que dissera a seu marido, simplesmente disse a Geazi que tudo estava bem e, ao chegar até aonde o profeta estava, agarrou-se aos pés do profeta (II Rs.4:26).
– Geazi, então, ao ver aquela cena, quis retirar a sunamita dos pés de Eliseu. Demonstrava, com este comportamento, ter zelo pela reputação do profeta, visto que não era apropriado que uma mulher casada ficasse aos pés do profeta, ainda mais que tudo estava bem, segundo dissera a mulher.
Não bastasse isso, um gesto como tal poderia dar a conotação de que o profeta estava a aceitar algum tipo de devoção ou adoração, o que também não era apropriado para um homem cuja vida era manter viva a adoração a Deus no meio do Seu povo (II Rs.4:27).
– Geazi mostrava ter progredido em seu aprendizado com Eliseu. Se já demonstrara ter compaixão, estar no “mesmo espírito” do seu senhor, agora, também, revelava ter o mesmo zelo pelas coisas do Senhor, zelo que já havia caracterizado o ministério de Elias e que se notava também no ministério de Eliseu.
– No entanto, quando tentava retirar a sunamita dos pés de Eliseu, o profeta interveio, dizendo a Geazi que a deixasse ali, pois, na verdade, o profeta disse saber que a sunamita estava com sua alma triste de amargura, mas o Senhor havia encoberto ao profeta qual o motivo daquela amargura (II Rs.4:27).
– A sunamita, então, diante daquelas palavras do profeta, abriu o seu coração e disse que não havia pedido um filho para o profeta e, agora, seu filho morrera.
Eliseu, então, diante daquela notícia, mandou que Geazi cingisse os seus lombos, tomasse o bordão do profeta, fosse até Suném e pusesse o bordão sobre o rosto do menino, a ninguém saudando pelo caminho. A sunamita, entretanto, diante daquela palavra do profeta, disse que não deixaria o profeta, tendo, então, Geazi partido sozinho para Suném (II Rs.4:28-30).
OBS: O bordão era “ um cajado grosso ou vara, por vezes arqueada na parte superior, us. como apoio para tornar mais seguro o andar” (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa). A Bíblia de Jerusalém traduz a palavra hebraica como “bastão”.
– Eliseu, ao descobrir que o menino morrera, quis passar a responsabilidade a Geazi. A sunamita havia dito que nada havia pedido e, agora, estava a sofrer por causa da morte do filho.
Eliseu entendeu que era Geazi o responsável por toda aquela situação, pois fora ele quem sugerira a dádiva do filho como retribuição pelo benefício que aquela mulher lhe dava e, por causa disso, mandou que o moço fosse até onde estava o menino e, com o bordão do profeta, providenciasse a realização do milagre.
– Eliseu, porém, estava equivocado. Embora Geazi tivesse feito a sugestão, o fato é que o homem de Deus era ele, Eliseu, e não, Geazi. Geazi ainda era um moço, um servo especial, mas que ainda não estava preparado para assumir a função de profeta. A palavra profética tinha sido de Eliseu, era, pois, sua a responsabilidade.
– A sunamita bem compreendia isto. Sabia que o “santo homem de Deus” era Eliseu e não, Geazi. Sabia que quem havia profetizado para que se lhe desse o filho era Eliseu, não, Geazi. Por isso, mesmo diante da ordem do profeta, manteve-se no monte Carmelo, enquanto que Geazi, sozinho, foi para Suném.
– Temos de ter muito cuidado quando temos auxiliares. Há encargos que não podem ser delegados a eles. Eles estão para somar e acrescer o nosso ministério, mas não podem nos substituir naquilo que temos de fazer. Eliseu jamais havia substituído Elias em qualquer das atividades do profeta, não poderia que seu moço o fizesse.
– Quando assim agimos, não só ocasionamos problemas para o nosso ministério, como também expomos os nossos auxiliares a situações desconcertantes, que podem, inclusive, causar-lhes muitos males espirituais.
Não é, aliás, por outro motivo que o apóstolo Paulo recomenda que não sejam constituídos ministros na casa do Senhor os neófitos, ou seja, aqueles que não têm a devida maturidade, para que não lhes advenha a soberba e venham, por causa disto, virem a cair na condenação do diabo (I Tm.3:6).
– Geazi, efetivamente, ensoberbeceu-se com aquela proposta de Eliseu. Apesar de a sunamita ter dito que não sairia da companhia do profeta, bem indicando que era ele o homem de Deus e não o seu moço, Geazi como que teve “diminuída a sua visão” e viu que, de posse do bordão do profeta, poderia, sim, tornar à vida o menino, algo que somente Elias havia feito até então.
– Geazi enxergou-se como “um homem de Deus”, alguém cujo zelo era suficiente para operar aquele grande milagre. Afinal de contas, não fora o profeta quem o mandara para lá? Afinal de contas, não fora ele quem sugerira ao profeta que o benefício a ser dado à sunamita seria um filho?
– Geazi assumiu uma condição que não possuía, fez-se substituto do profeta. Não ficou sequer impressionado com o gesto da sunamita que não lhe fez companhia.
Achou-se suficiente para, sozinho, realizar o milagre, esquecido que Eliseu não tinha feito qualquer milagre até a trasladação de Elias. O gesto de Eliseu causara a soberba que viria a fazer com que Geazi caísse na condenação do diabo.
– Alguém pode dizer que o erro era de Eliseu e que Geazi estava apenas a cumprir ordens. No entanto, devemos lembrar algo que é muito comum no meio militar: ordens absurdas não podem ser cumpridas.
Geazi bem sabia da irrazoabilidade da ordem dada pelo profeta, pois a própria sunamita, que não era do círculo dos profetas, bem compreendeu que não se poderia delegar tal tarefa ao moço do profeta.
Ora, se até a sunamita entendia que não procedia o comportamento do profeta, por que Geazi, um “homem de visão”, não haveria de também entender assim? Entretanto, o “ego” falou mais alto e Geazi assumiu uma posição que não era devida, compartilhando, assim, com o profeta do equívoco.
– Mas não é só! Geazi, certamente, tendo andado todos aqueles anos com Eliseu, bem sabia da história do primeiro milagre realizado pelo profeta, qual seja, a abertura do rio Jordão, quando Eliseu tivera a experiência de que não era a capa de Elias quem abrira o rio, mas, sim, o Deus de Elias.
Quando Eliseu manda que Geazi leve o seu bordão para pôr no rosto do menino, estava como que a negar a primeira lição que aprendera no seu ministério, a de dar valor a objetos em vez de valorizar o Senhor.
– Geazi deveria, portanto, ter objetado o profeta, ter mostrado que o bordão, assim como a capa de Elias, não seria capaz de fazer qualquer milagre, mas sim, o Deus de Eliseu e, para tanto, era o homem de Deus que deveria ir até onde estava o menino. A sunamita bem percebera isso, mas o “ego” de Geazi foi maior.
– Geazi foi confiando que o bordão do profeta Eliseu era suficiente para a realização de milagres e, portanto, após este grande sinal, ter-se-ia uma grande oportunidade para que o moço passasse a fazer “carreira solo”, a assumir uma posição de profeta, independentemente de Eliseu.
– Como ensinava o saudoso pastor Walter Marques de Melo (1933-2012), Geazi entendeu que, de possa daquele bordão, poderia “fazer miséria”, “deitar e rolar”, iniciar um ministério próprio e frutífero.
Quantos não agem deste modo em nossos dias? Quantos não procuram se desvencilhar, o mais rápido possível, de seus orientadores, de seus “pais na fé”, para, com base em estratégias por eles desenvolvidas, passar a ser independentes e “donos de seus próprios ministérios”?
Tomemos cuidado, amados irmãos, pois um tal comportamento é sinal evidente e eloquente de uma derrocada ministerial.
– Geazi seguiu todas as instruções. A ninguém saudou pelo caminho, foi até Suném e lá pôs o bordão do profeta no rosto do menino e, para sua decepção, nada aconteceu.
Diz o texto sagrado que não havia “nem voz nem sentido” no menino. Geazi, então, decepcionado, retornou para o Carmelo, onde se encontrou com o profeta e com a mãe do menino, trazendo o triste aviso: “o menino não despertou” (II Rs.4:31).
– Eliseu, então, foi até a casa da sunamita e, após intensa oração, realizou o milagre, tendo o menino ressuscitado. Chamou, então, Geazi e mandou que este chamasse a sunamita, o que foi feito, tendo então Eliseu entregado o menino à sua mãe e partido de volta para o Carmelo.
– As coisas, então, estas postas nos seus devidos lugares. Eliseu foi até a casa da sunamita, e, como homem de Deus, após intensa oração, efetuou o milagre.
A Geazi, como moço do profeta, coube apenas chamar a mãe para que o profeta entregasse o menino e, logo em seguida, a exemplo do que fizera Elias, sem qualquer trombetear, sem qualquer alarde, voltasse para o Carmelo, a cuidar dos filhos dos profetas.
– Muitos são os que, nos dias em que vivemos, têm repetido os erros de Eliseu e de Geazi. Deixam de fazer o que têm de fazer na obra de Deus, delegando a terceiros, ainda não devidamente preparados, as suas tarefas.
Além do mais, têm também criado “bordões” em que seus auxiliares procuram basear a sua confiança, não raras vezes usando destes subterfúgios para eles próprios assumirem funções para os quais não foram chamados por Deus.
– Quantos amuletos temos visto surgirem no dito meio evangélico. Quantos auxiliares que, indevidamente lançados para ficar à frente de certas áreas, confiantes em amuletos, têm perturbado a fé de muitos, gerado confusão.
Que sejamos como a sunamita, saibamos quem são os verdadeiramente chamados por Deus e jamais deixemos que nossa fé em Cristo seja transferida a amuletos e “bordões de profeta”!
– Desta feita, Geazi não se comportou bem, teve “diminuída” a sua visão. Será que teria aprendido a lição?
III – GEAZI E A LEPRA DE NAAMÃ
– Geazi seguiu servindo a Eliseu. Eliseu havia aprendido a lição e visto o erro que cometera, mas parece que Geazi, a partir de então, ficara desiludido com a sua posição de moço do profeta.
– Não se conformara em ser apenas o moço do profeta e passou a ter, em seu coração, um desejo de obter alguma vantagem, pois não queria manter-se apenas como servo de Eliseu, seguindo de uma a outra escola de profeta, sendo apenas um servo, esquecido de que Eliseu assim tinha sido por alguns anos.
– Este desejo que brotou no coração de Geazi irá se manifestar no episódio da cura da lepra de Naamã, o comandante do exército da Síria que foi até Israel a fim de ser curado, atendendo à sugestão daquela israelita que, como presa de guerra, passara a servir ao general sírio.
– Ao saber que o rei de Israel se desesperara ao ler a carta do rei sírio em que se pedia que Naamã fosse curado da sua lepra, o profeta Eliseu mandou um mensageiro até o general, mandando-o lavar sete vezes no Jordão para obter a cura (II Rs.5:8-10).
– Ora, Naamã tinha ido até a casa de Eliseu e ali parado com toda a sua comitiva, trazendo dez talentos de prata (ou seja, 350 kg de prata, algo que, em 17 de janeiro de 2013, equivalia a R$ 723.491,56), seis mil siclos de ouro (72.000 g de ouro, algo que, em 17 de janeiro de 2013, equivalia a R$ 7.974.497,74) e dez mudas de vestidos (II Rs.5:5).
Geazi a tudo viu, pois estava sempre com Eliseu. O texto não nos permite dizer que foi Geazi o mensageiro que Eliseu mandou a Naamã, e é bem provável que não tivesse sido, já que o texto bíblico sempre nomeia Geazi e a indignação do general sírio em não ter sido recebido pode muito bem ter se dado não só por Eliseu não o ter atendido, mas também por nem sequer seu principal servo tê-lo feito.
– O fato é que Geazi, ao presenciar toda aquela comitiva e o aparente desprezo do homem de Deus, passou a “negar” a sua visão espiritual. Geazi deixou de ter uma “visão espiritual”, para passar a ter uma “visão puramente material”, desejando aqueles bens que tinham sido trazidos por Naamã.
– O general sírio retirou-se indignado, mas, bem aconselhado pelos seus servos, acabou por se banhar no Jordão e obter a cura. Extremamente agradecido, retornou até a casa do profeta, querendo oferecer algo para Eliseu como sinal de sua gratidão. Queria que Eliseu “tomasse uma bênção para si” (II Rs.5:15).
– Eliseu, entretanto, como era um homem de Deus, recusou “tomar uma bênção para si”, ratificando que era um homem em comunhão com o Senhor e que, portanto, não poderia senão agir como um servo de Deus, que dá de graça o que de graça recebeu (Mt.10:8).
– Naamã insistiu com Eliseu, mas, vendo a irredutibilidade do profeta, desistiu de seu intento e foi mandado em paz pelo profeta para a sua terra (II Rs.5:19).
– Geazi, que a tudo observara, não se conformou com aquela atitude do profeta. Mais uma vez foi tomado pelo sentimento de independência e pelo desejo de “fazer a vida”, criando uma alternativa para deixar de ser “um simples moço do profeta”.
– Geazi, então, resolveu ir atrás de Naamã e “tomar dele alguma coisa” (II Rs.5:20). Geazi deixara-se tomar pelo “espírito mercenário” que, lamentavelmente, está a dominar muitos corações dos que cristãos se dizem ser na atualidade.
Passara a amar o dinheiro, que é a raiz de toda a espécie de males (I Tm.6:10), ingressando num caminho de desvio da fé. Que tristeza! Alguém que estava sendo preparado para dar continuidade ao combate à apostasia espiritual, agora passava, por causa do dinheiro, a trilhar a mesma vereda da casa de Acabe…
– Hoje em dia não é diferente. Muitos, ao verem que os genuínos homens de Deus recusam ofertas para mercadorizar os seus ministérios, para se tornarem negociantes da fé, não resistem à tentação do vil metal e negam seus princípios e valores, negam a visão espiritual que Deus lhe deu, e correm atrás dos abençoados por Deus para deles “tomar alguma coisa”.
Que Deus nos guarde, amados irmãos!
– Como é triste vermos hoje muitas pessoas atrás das “bênçãos”, ou seja, atrás de vantagens pecuniárias obtidas junto àqueles que, como Naamã, extremamente agradecidos a Deus, são facilmente envolvidos por estes mercenários e acabam por entregar polpudas quantias a eles, achando que, com isso, estão agradando a Deus.
Não deixemos, irmãos, de alertar os incautos para não serem ludibriados por estes verdadeiros estelionatários da fé!
– Geazi iniciou a sua corrida até Naamã, corrida que também o levaria ao abismo, ao fracasso ministerial. Naamã, ao notar a aproximação do moço do profeta, que certamente vira e conhecera quando de seu retorno até a casa de Eliseu, prontamente atendeu ao mercenário.
– Geazi, então, revelando que estava, mesmo, a ser, agora, um “negador” de toda a sua espiritualidade, mente desavergonhadamente ao general, dizendo que Eliseu havia acabado de receber alguns mancebos dos filhos dos profetas da montanha de Efraim e pedia que Naamã desse um talento de prata e duas mudas de vestidos para eles (II Rs.5:20-22).
– A cegueira espiritual dos amantes do dinheiro é tanta que eles se contentam com pouco. São notórios os mercadores da fé que amealham milhões e milhões de reais com suas atividades ilícitas, mas o fato é que há muitos “mercenários de trocados”, que se contentam em tão somente “tomar alguma coisa”.
Eis a que ponto o inimigo de nossas almas joga os que abandonam seus ministérios por causa do vil metal…
– A mentira de Geazi era tanta que, inclusive, dissimulou uma falsa resistência, quando o general quis dar-lhe dois talentos de prata em vez do um talento que havia sido pedido. Naamã mandou que os dois talentos e as duas mudas fossem postas em dois sacos sobre dois de seus moços e que eles a levassem até a casa de Eliseu. Geazi, então, despediu aqueles moços e voltou a servir o profeta.
– Eliseu, então, perguntou a Geazi de onde tinha vindo. Era uma oportunidade que se dava ao moço do profeta para que confessasse o seu pecado e obtivesse o seu perdão.
No entanto, Geazi preferiu mentir ao profeta, mesmo sabendo que ele era um homem de Deus, dizendo que não havia saído para lugar algum. Tinha-se tornado um mentiroso e, como tal, alguém que tinha o diabo como pai (Jo.8:44). Era a negação de toda a sua espiritualidade, era o fim de um ministério.
– Eliseu, então, mostra a Geazi que de tudo sabia, que Deus lhe revelara tudo quanto acontecera, como que fazendo o profeta estar presente quando Naamã descera do carro para atender a Geazi e como ele mentira para obter os talentos de prata e as mudas de vestido, indagando ao moço se era aquela uma ocasião para “tomar alguma coisa” de Naamã (II Rs.5:26).
– Eliseu, então, certamente com dor no coração, deu a sentença para o seu moço. Em razão daquela atitude, do amor do dinheiro, da negação da sua espiritualidade, a lepra de Naamã se lhe pegaria e a toda a sua descendência para sempre e, desde aquele momento, Geazi ficou leproso (II Rs.5:27).
Era o fracasso de um ministério, era o fim da carreira do moço do profeta, que assim tinha toda a sua expectativa frustrada. Não seria nem sucessor de Eliseu nem tampouco desfrutaria do que havia amealhado de Naamã, uma vez que, como leproso, teria de ficar à margem da sociedade.
– A lepra, como sabemos, é uma figura do pecado. Ao se tornar leproso, Geazi apenas revelava aquilo que já estava no íntimo de seu coração, ou seja, que havia deixado de servir a Deus e passado a querer as coisas desta vida, havia se tornado alguém que não tinha mais visão espiritual.
Do mesmo modo, muitos são os que, nos dias de apostasia que vivemos, notadamente por causa do amor do dinheiro, têm se tornado leprosos, têm deixado os caminhos do Senhor e, após algum tempo, revelado toda a sua pecaminosidade, toda a sua apostasia, assim como Geazi passou a ostentar diante de todos os israelitas, que ficaram a saber que o outrora moço do profeta agora não passava de mais um maldito entre o povo de Israel.
Que Deus nos guarde, amados irmãos, de perdermos a visão do reino de Deus, que têm todos os nascidos de novo em Cristo Jesus (Jo.3:3) e nos tornemos homens e mulheres alijados da “congregação dos justos”, verdadeiros leprosos, por causa do amor do dinheiro.
IV – A PROVÁVEL RESTAURAÇÃO ESPIRITUAL DE GEAZI
– Depois de tamanha tragédia, seria natural que Geazi desaparecesse da narrativa bíblica. No entanto, não é o que ocorre. Em II Rs.8, as Escrituras registram que, seguindo conselho de Eliseu, a sunamita com a sua família foi peregrinar por sete anos na terra dos filisteus, para escapar de uma fome de sete anos que o profeta anunciou que haveria em Israel, o que, segundo a Bíblia de ordem cronológica de Edward Reese e Frank Klassen, aconteceu logo após a ressurreição do menino por Eliseu.
– Pois bem, sete anos depois, a sunamita retornou para Israel e verificou que as suas terras e a sua casa haviam sido invadidas por terceiros, de sorte que não teve a sunamita outra alternativa senão recorrer ao rei de Israel, a fim de que fosse restituída de suas propriedades (II Rs.8:3).
– Quando a sunamita chega à presença do rei, o texto sagrado nos informa que o rei estava a conversar precisamente com Geazi. Ora, segundo Edward Reese e Frank Klassen, Geazi deve ter ficado leproso uns quatro anos depois da ressurreição do menino, ou seja, quando do retorno da sunamita a Israel já deveria haver pelo menos uns 3 anos que Geazi estaria leproso.
– Geazi estava a contar ao rei de Israel precisamente o milagre da ressurreição do menino, que tinha sido o milagre mais espetacular que Geazi havia visto enquanto servira a Eliseu e acabou por apontar ao monarca a própria mulher de que estava falando, o que levou o rei a restituir todas as propriedades da sunamita, a mostrar que a morte do menino tinha sido um meio pelo qual o Senhor estava a garantir, no futuro, a própria sobrevivência daquela mulher (II Rs.8:5,6).
– O que intriga a todos é como Geazi estava a conversar com o rei de Israel se era um leproso e, como tal, se encontrava completamente alijado da sociedade israelita, não podendo sequer se aproximar das pessoas, quanto mais estar conversando com o rei no seu palácio.
– Muito se discute a respeito disto. Entendem alguns que Geazi era portador de um tipo de lepra que permitiria a ele participar do convívio social. Afinal de contas, dizem estes estudiosos, Naamã, cuja lepra foi transmitida a Geazi, também foi recebido pelo rei de Israel em Samaria.
– Tal pensamento, entretanto, encontra algumas dificuldades. A primeira é que o fato de Naamã ter sido recebido pelo rei de Israel não pode servir de argumento, pois Naamã era estrangeiro e tinha sido enviado pelo rei da Síria, de modo que se tratava de uma exceção à regra da separação dos leprosos, até porque não era ele israelita.
Além disto, é oportuno observar que Eliseu, homem de Deus e observador da lei, não recebeu Naamã enquanto ele estava leproso, podendo ter sido um dos motivos pelos quais não foi até onde estava o general, tendo apenas mandado um mensageiro.
Quando Naamã voltou curado, o profeta o recebeu, o que seria um indício de que a lepra de Naamã era daquelas que impedia o convívio com os israelitas. Ademais, nas prescrições da lei a respeito da lepra, não havia qualquer distinção entre tipos de lepra.
– Outros entendem que o fato de o rei de Israel estar recebendo o antigo moço do profeta, apesar de ele ser leproso, era mais um fator a indicar que a casa de Acabe não observava em absoluto a lei, transgredindo-a constantemente.
Assim, o fato de Geazi ser um leproso não impediria que fosse ele até o palácio, principalmente quando o rei estava interessado em saber coisas a respeito de Eliseu, Eliseu que teria há pouco tempo profetizado a abundância de víveres em Samaria e que o próprio rei Jorão tinha querido matar.
Estaria, assim, o rei tomando informações a respeito do profeta para poder enfrentá-lo ou saber de seus passos.
– Por fim, entendem outros, entre os quais o pastor Aldery Nelson Rocha (veja no Portal Escola Dominical, o estudo bíblico “A restauração de Geazi”, disponível em: , http://www.portalebd.org.br/principal/estudos-biblicos/item/1067-a-restaura%C3%A7%C3%A3o-de-geazi publicado em 18 fev 2012) que este episódio seria uma evidência bíblica de que Geazi teria sido curado da sua lepra.
– Segundo estes estudiosos, um dos quatro leprosos que teriam ido se entregar aos sírios durante o cerco de Samaria e que descobriram que o exército da Síria tinha se retirado, deixando o acampamento como estava, escapando apenas com a roupa do corpo, era Geazi que, pelo fato de terem ido avisar o povo de Samaria a respeito deste abandono e, assim, proporcionado o fim da fome da cidade, teria sido curado, restaurado, visto que, agora, teria voltado a ter “visão espiritual”, a “visão da compaixão”, teria se arrependido de sua avareza e voltado a pensar no próximo, a ser um instrumento de bênção.
– Se Geazi realmente foi restaurado, o foi em termos de salvação, não de ministério, pois jamais voltou a ser moço do profeta ou um dos filhos dos profetas.
No entanto, em sua conversa com o rei, foi um instrumento para que a sunamita tivesse a restituição de seus bens, a indicar que Geazi, pelo menos, pôde, uma vez mais, ser usado para trazer bem ao próximo, depois de ter fracassado por causa da avareza e do egoísmo.
– Em dias de apostasia espiritual, não deixemos que nossa visão espiritual, que a visão do reino de Deus que tivemos ao nascer de novo venha a ser diminuída com o desejo de fama e de exaltação, nem tampouco que venha a ser perdida pelo amor do dinheiro e pela mentira, para que, a exemplo de Geazi, venhamos a fracassar em nossa jornada espiritual e venhamos a ter uma duvidosa e limitada restauração espiritual.
Que Deus nos guarde!
Ev. Dr. Caramuru Afonso Francisco