LIÇÃO Nº 11 – MARIA, MÃE DE JESUS, UMA SERVA HUMILDE
Maria, mãe de Jesus homem, é humilde serva do Senhor.
INTRODUÇÃO
– Na sequência do estudo de personagens bíblicas que nos ensinam sobre o caráter do cristão, estudaremos Maria, a mãe de Jesus.
– Maria, mãe de Jesus homem, é humilde serva do Senhor.
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I – MARIA, A MÃE DE JESUS
– A primeira menção explícita a Maria, no texto sagrado, está em Mt.1:16, quando é dito que dela nasceu Jesus, que se chama o Cristo, ou seja, o evangelista, preocupado como está em mostrar aos judeus que Jesus era o Messias (é este o propósito do evangelho segundo Mateus), logo de pronto nos mostra Maria como sendo a virgem que seria o instrumento pelo qual viria ao mundo o Messias como predito em Is.7:14.
– Maria é apresentada aqui, em primeiro lugar, como mulher de José. José é seu marido, o herdeiro presuntivo da coroa de Davi e, por isso, o filho de Maria, legalmente filho de José, cumpre outra profecia messiânica, qual seja, o de ser integrante da casa de Davi com direito a reinar sobre Israel.
Nesta apresentação, portanto, nota-se, claramente, que é dada uma ênfase ao aspecto biológico da maternidade de Maria, circunscrevendo-se a esta dimensão a sua participação no plano divino para a salvação, assim como José tem uma participação jurídica neste nascimento.
– Ao narrar como se deu o nascimento de Jesus, Mateus volta a reafirmar o cumprimento da profecia bíblica, mostrando que Maria concebeu do Espírito Santo antes que se tivesse ajuntado com José.
A circunstância é reafirmada no sonho que José teve, em que o anjo diz que o que está gerado no ventre de Maria é do Espírito Santo (Mt.1:20).
Verificamos, portanto, que é o que está gerado, o ser que se encontrava no ventre de Maria que era do Espírito Santo, que era divino, o Deus conosco (e aqui temos a terceira e última vez em que aparece o nome “Emanuel” na Bíblia – Mt.1:23). O que havia de miraculoso, de divino, de sobrenatural, portanto, era o ser que estava nas entranhas de Maria, não a própria Maria.
A narrativa, portanto, mantém a mesma coerência do texto profético – divino e acima do humano é o ser que se encontrava no ventre de Maria, não a própria Maria.
– Neste ponto, interessante vermos como se dá a narrativa de Lucas, o outro evangelista que aborda o tema, evangelista este que não é judeu (é o único não israelita a escrever um livro da Bíblia) e que, além disto, é médico (Cl.4:14).
– Lucas introduz Maria na narrativa do evangelho do mesmo modo que Mateus, ou seja, como sendo a mulher de José, que pertencia à casa de Davi, ainda virgem (Lc.1:27).
Como produto da sua meticulosa pesquisa para a escrita do evangelho (Lc.1:1-4), Lucas é mais minucioso que Mateus, relatando-nos a própria concepção do Cristo em Maria, o que foi anunciado pelo anjo Gabriel.
– O anjo saudou Maria, chamando-a de “agraciada”, ou seja, “favorecida”, “beneficiária da graça divina”, considerando-a “bendita entre as mulheres” (Lc.1:28).
Nesta saudação do anjo, encontramos algumas informações importantes a respeito da posição de Maria, além das fornecidas por Mateus e Lucas, a saber:
a) Maria é considerada como tendo sido beneficiada pela graça de Deus – o fato de Maria ser chamada de “agraciada”, mostra-nos, com clareza, que Maria é um ser humano como qualquer outro, porque “graça” é “favor imerecido”. Maria recebia um benefício, mas não o merecia por natureza, tudo era resultado da graça de Deus.
b) Maria foi considerada “bendita entre as mulheres” – Maria era uma mulher, nem mais nem menos que as outras mulheres, mas, pelo benefício que recebia, imerecido, passava a ser bendita entre as mulheres, ou seja, não deixava de ser uma mulher tanto quanto as demais, mas que havia sido escolhida para ser o instrumento pelo qual o Messias viria ao mundo e isto era uma bênção singular ante as demais mulheres de todos os tempos.
– Ante esta saudação do anjo, a Bíblia nos diz que Maria ficou “turbada”, sem saber o que se queria dizer com aquela saudação (Lc.1:29).
Este fato mostra, claramente, que Maria não tinha a menor ideia da missão que lhe estava sendo destinada, a comprovar que se tratava de um ser humano como qualquer outro, sem conhecimento do futuro ou dos propósitos divinos.
O anjo, então, revela a ela o plano divino para a concepção do Messias no ventre de Maria.
Nesta revelação, são explicitadas algumas considerações que são fundamentais para entendermos a posição de Maria em todo este processo. Vejamo-las (Lc.1:31,32):
a) “em teu ventre conceberás” – aqui o anjo confirma a profecia de Is.7:14. O ventre de Maria é apenas o local da concepção, é apenas um instrumento passivo.
b) “darás à luz um filho” – Maria segue sendo o instrumento passivo. Sem ter tido parte na concepção, cumpre-lhe a missão, bela e honrosa missão, de servir de abrigo à criança até o Seu nascimento
c) “e lhe porás o nome de Jesus” – a participação de Maria é tão passiva que não lhe era permitido sequer pôr nome ao filho, o que costumava ocorrer em Israel (cf. Gn.35:18; I Sm.1:20).
d) “Este será grande” – a grandeza não estava na missão importante e singular de Maria, mas no ser que nela seria gerado.
e) “e será chamado Filho do Altíssimo” – a divindade é pertencente Àquele que seria gerado em Maria e tão somente a Ele.
f) “e o Senhor Deus Lhe dará o trono de Davi, Seu pai” – além da questão biológica, atinente a Maria, a criança teria um aspecto jurídico, relativo ao seu “pai” José, algo de que Maria parte alguma tinha.
g) “E reinará eternamente na casa de Jacó e o Seu reino não terá fim” – a realeza era outra característica inerente Àquele que seria gerado no ventre de Maria.
O reino era d’Ele e d’Ele só, de mais ninguém. Aqui o anjo não alude a qualquer “rainha”, como fariam os romanistas futuramente…
– Maria, então, diante desta revelação, indagou como isto se daria, qual seria o processo e o anjo, prontamente, atendeu à solicitação de Maria, até porque, como instrumento passivo desta operação, tinha ela o direito de sabê-lo(Lc.1:35):
a) “Descerá sobre ti o Espírito Santo” – reafirma-se o papel passivo de Maria. A obra seria do Espírito Santo sobre o corpo de Maria.
O Espírito Santo, naturalmente, usaria do corpo de uma pessoa santa, de uma pessoa fiel a Deus, pois Deus não iria habitar em um templo impuro, mas, assim como Deus não habita em templos feitos por mãos dos homens (I Rs.8:27), embora ali Deus Se faça presente (Ex.25:22), e
como estes templos não são perfeitos e indestrutíveis (II Rs.25:9; Dn.9:26), apesar de Deus neles revelar a Sua glória (I Rs.8:10,11), do mesmo modo o corpo de Maria, apesar de ter abrigado o Rei da glória por nove meses, nem por isso era algo sobrenatural ou supra-humano, que não tinha qualquer defeito ou que jamais se desfez.
b) “a virtude do Altíssimo te cobrirá com a Sua sombra” – continua a completa e total passividade de Maria. A virtude, ou seja, o poder não é dela, Maria, mas do Altíssimo, ou seja, de Deus.
Quem opera é Deus e de forma exclusiva. Maria é coberta, é alvo da sombra de Deus, devendo, por isso, descansar, como ensina o salmista (Sl.91:1).
Maria estaria sob a sombra do Altíssimo, por isso não deveria temer, ainda que o cumprimento da vontade do Senhor lhe viesse a trazer a execração pública e o desprezo da sociedade.
c) “pelo que também o Santo, que de ti há de nascer, será chamado Filho de Deus” – aqui o anjo sintetiza o processo pelo qual o Messias viria ao mundo. Maria é, mais esta vez, tomada como mero instrumento nas mãos de Deus.
O Santo nasceria dela, mas é Santo porque é Deus, porque tem origem divina, nada tendo que ver o fato de Maria ser o meio pelo qual Ele entra no mundo. Ele é Santo porque é separado da natureza pecaminosa do homem, natureza presente, sim, em Maria, pois, caso contrário ela não seria “agraciada”, ou seja, imerecidamente favorecida (a falta de merecimento denota a sua natureza pecaminosa).
Pelo fato de ter nascido desta maneira, Jesus seria chamado de “Filho de Deus”, não de filho de Maria.
Não que não fosse filho de Maria biologicamente falando, mas, aqui o anjo está a falar da natureza do Messias, um homem, visto que nascido de mulher, mas que não possuía a natureza pecaminosa de seus ancestrais biológicos.
É, por isso, aliás, que é chamado Ele de “último Adão”, pois, como Adão, não tinha ancestral de natureza igual a sua.
Também é por isso que Maria não é chamada de “segunda Eva”, porque “mãe dos viventes” só houve uma, a Eva que pecara no Éden, e de onde a própria Maria viera.
– Como resultado desta revelação angelical, Maria aceita fazer a vontade de Deus e, nesta sua aceitação, mostra como havia bem compreendido a mensagem de Gabriel.
Na sua resposta ao anjo, Maria mostra porque era “bendita entre as mulheres”, a saber:
a) porque soube a sua posição, a saber, de SERVA – “Eis aqui a serva do Senhor” (Lc.1:38a) – Maria entendeu que sua participação era honrosa, porém passiva, mero instrumento da chegada do Salvador ao mundo.
Sabia que deveria obedecer, que deveria servir. Maria SE denominou de SERVA, mas os mariólatras a chamam indevidamente de “Nossa Senhora”…
b) “cumpra-se em mim segundo a tua palavra” – Maria sabia que, como ser humano, poderia escolher entre fazer a vontade de Deus ou não. Mesmo sabendo os riscos que corria, aceitou fazer a vontade de Deus.
Esta vontade se daria nela, ou seja, Maria admite ser apenas o local da obra divina, nada seria feito por ela, para ela ou com ela. A dimensão de Maria é a dimensão do local – “nela”.
A mesma dimensão dos cristãos, cujos corpos também são templos do Espírito Santo (I Co.6:19).
– O resultado desta atitude de Maria não se fez por demorar. José, ao saber que Maria estava grávida, como vimos, tentou abandoná-la, para não a infamar, ou seja, não sabendo o que se passara, mas demonstrando profundo amor por Maria, quis fugir, para impedir que Maria pudesse ser alvo de uma condenação, já que, por ainda não ter iniciado sua coabitação com José, certamente tinha sido acusada de adultério, já que grávida estava, merecendo, assim, a morte (pena então em desuso) ou, pelo menos, o completo desprezo público.
Deus, porém, cumprindo a Sua promessa feita a Maria, não permitiu que isto ocorresse e José assumiu Maria como sua mulher, o que não a impediu de, antes, ter de se ausentar às pressas da comunidade onde vivia (cf. Lc.1:39).
– Quando foi à casa de Isabel, Maria ali se apresentou como uma mulher grávida como qualquer outra.
A manifestação sobrenatural ocorrida na casa de Isabel teve por causador não Maria, mas a criança que, talvez em forma ainda embrionária, estava em seu ventre.
Quando Maria fez a saudação a Isabel, a criança que estava no ventre de Isabel saltou no seu ventre e Isabel foi cheia do Espírito Santo. Sob a inspiração do Espírito, Isabel chama Maria de “a mãe do meu Senhor” (Lc.1:43).
– Esta expressão de Isabel é uma confirmação da mensagem do anjo Gabriel. Isabel considera Maria como mãe do Senhor, ou seja, seu papel era a de mãe, um papel biológico, circunscrito a esta dimensão, à dimensão terrena.
A voz da saudação de Maria chegara aos ouvidos de Isabel e a criança se alegrara no ventre de Isabel, que, como mãe, também, não tinha tido uma reação senão depois do feto que estava em seu interior.
Fora o Senhor, ainda embrião, que promovera a alegria do já feto João Batista e, em seguida, Isabel, a mãe do feto, seria cheia do Espírito e profetizaria. Isabel não chamou Maria de senhora, mas tão somente de mãe do Senhor. Maria é tida como bendita e bem-aventurada, porque crera na palavra de Deus (Lc.1:42-45).
– Sob este impacto, Maria louvou a Deus, demonstrando ter plena ciência de seu papel.
Observemos as expressões de Maria no seu cântico, o chamado “Magnificat” e vejamos como ela tem um pensamento bem diferente daqueles que a idolatram indevidamente (Lc.1:46-55):
a) “a minha alma engrandece ao Senhor” – Maria demonstra ser uma pessoa humana, dotada não só de corpo, que serve de instrumento para a geração do Messias, mas também de alma, sede da sua personalidade. Esta alma engrandece a Deus, ou seja, reconhece ser pequena, ser inferior à divindade, ser simplesmente humana.
b) “o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador” – Maria mostra que também tem espírito, ou seja, é uma criatura humana, com corpo, alma e espírito.
Este espírito, sede da consciência e da adoração, reconhece Deus como seu Salvador. Ao assim falar, Maria reconhece que é pecadora, que precisa de salvação.
c) “porque atentou na baixeza de Sua serva” – Maria repete o que já dissera ao anjo. Sabe que sua posição é de serva, não de senhora.
d) “pois eis desde agora todas as gerações me chamarão bem-aventurada” – Maria aqui confirma que, por ter sido escolhida para ser a mãe biológica do Messias, recebera uma bênção singular, que seria lembrada por todas as gerações.
Ela é bem-aventurada, assim como bem-aventurados são os discípulos de Jesus, os que creram no Seu nome (Mt.5:1-12).
e) “por que me fez grandes coisas o Poderoso e santo é o Seu nome” – Maria reconhece que quem fez tudo foi Deus, ela é apenas um instrumento do poder divino. Também reconhece que santo é Deus e Ele só.
Não há, portanto, qualquer motivo para que ela seja invocada como Santa Maria…
f) “e a Sua misericórdia é de geração em geração sobre os que O temem” – Maria mostra que Deus é misericordioso e que o único ser a demonstrar misericórdia eterna é o próprio Deus.
Ela própria era alvo desta misericórdia e todos que temessem a Deus, como ela havia temido, alcançariam esta misericórdia. Vemos, assim, que Maria nos ensina a buscar a misericórdia diretamente de Deus, não a ela (Maria)…
g) “Com o Seu braço obrou valorosamente; dissipou os soberbos no pensamento de seus corações” – Maria mostra que a obra da salvação é inteiramente de Deus.
Foi Deus quem fez e proporcionou a salvação ao homem, mostrando que somente a submissão a Ele é capaz de nos fazer ter a salvação.
Não adianta o homem criar outros caminhos, outros modos de salvar, pois a salvação é obra exclusiva de Deus, obra esta que estava em seu ventre, ou seja, Jesus. Por que, então, alguns recorrem a Maria como “medianeira”?
h) “Depôs dos tronos os poderosos e elevou os humildes” – Deus, Ele só, confundiu as coisas que são com as que não são. Trazia o Messias numa família humilde, desfazia os falsos conceitos a respeito do Messias guerreiro e nascido em um palácio.
Também haveria de usar homens simples e sem aparência para promover a pregação do Evangelho, o poder de Deus para salvação de todo aquele que crê.
i) “Encheu de bens os famintos e despediu vazios os ricos. Auxiliou a Israel, Seu servo, recordando-se da Sua misericórdia, (como falou a nossos pais) para com Abraão e sua posteridade, para sempre.” – Maria, sob inspiração do Espírito Santo, mostra que em si se cumpriam as profecias.
O que estava no seu ventre era a posteridade de Abraão, o Messias de Israel. Ele, e não Maria, era o único e suficiente Salvador.
III –MARIA, A MÃE DE JESUS NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA DE JESUS
– Depois de vermos como a Bíblia trata a maternidade de Maria, ou seja, como um instrumento biológico, necessário e honroso, mas que não tem qualquer elemento ativo da parte de Maria na obra espiritual da salvação, é importante vermos os episódios de que Maria tomou parte na vida terrena de Jesus, a fim de podermos observar qual o papel que teve Maria nestas ocasiões.
– Maria foi uma mulher grávida como qualquer outra (Lc.2:5). No tempo certo da gestação, ou seja, nove meses, deu à luz ao menino (Lc.2:6), o que nos mostra, claramente, o papel biológico que estava a desempenhar.
Era o seu filho primogênito (Lc.2:7). Sendo uma mãe como outra qualquer, naturalmente que, com o nascimento de seu filho, deixou de ser virgem e, inclusive, passou a manter relações sexuais com José, que a Bíblia diz não ter tido intimidade com sua mulher até o nascimento de Jesus (Mt.1:25).
Tanto assim é que a Bíblia relata ter tido Jesus irmãos (Mt.13:55,56; Mc.6:3).
– Maria tinha plena consciência a respeito de sua missão, a partir da mensagem angelical, tanto que guardava todas as coisas, conferindo as palavras que lhe haviam sido ditas no seu coração (Lc.2:19).
Maria, pois, limitava-se a conferir o que lhe fora dito, de modo passivo, sabendo que a ela não cabia fazer coisa alguma senão aguardar o cumprimento da Palavra de Deus.
Por que Maria não tomou à frente e falou aos pastores o que sabia? Por que não estimulou e incentivou a fé daqueles homens a quem Deus havia mostrado a obra da salvação?
Porque não lhe competia fazer coisa alguma disso. Tinha tão somente de conferir o que Deus lhe havia revelado e cuidar da sua própria salvação.
– Quando Jesus foi apresentado no templo, no encontro com Simeão, ao segurar a criança nas suas mãos, o homem de Deus louvou a Deus, dizendo ter visto a salvação do Senhor, que era a criança que tomara nos seus braços(Lc.2:28-30).
“A Tua salvação” foi a expressão usada por Simeão, ou seja, Jesus é a salvação de Deus, ninguém mais. Jesus é a “luz para alumiar as nações e para a glória de teu povo Israel.” (Lc.2:32). Qual a referência que fez a Maria em termos de salvação? Nenhuma!
– Mas dirá alguém que, neste episódio, Simeão dirigiu palavras a Maria. Sem dúvida que o fez. Que palavras foram estas?
“Eis que este é posto para queda e elevação de muitos em Israel, e para sinal que é contraditado, (e uma espada traspassará também a tua própria alma), para que se manifestem os pensamentos de muitos corações.” (Lc.2:34,35).
– Antes de expormos o significado da expressão de Simeão, é importante vermos que, antes de dirigir palavras a Maria, a Bíblia nos informa que Simeão abençoou José e Maria, aqui chamada de “sua mãe” (Lc.2:33).
Não é dito que tenha abençoado o menino. Por quê?
Porque o menor é abençoado pelo maior (Hb.7:7). Como sacerdote, abençoou José e Maria, mas não a Jesus, pois Este era maior do que Simeão.
Aqui temos, portanto, uma prova de que Maria não se situava, por ser mãe de Jesus, num patamar acima dos humanos, pois um homem cujo Espírito Santo estava sobre ele (Lc.2:25), abençoou tanto a José quanto a Maria, embora não o tenha feito em relação a Jesus.
– Mas, voltando à afirmação de Simeão, vemos que ele se refere, em primeiro lugar, a Jesus, a quem, provavelmente, devolvia aos braços da mãe.
Disse que Jesus era posto para queda e elevação de muitos em Israel, ou seja, Simeão aqui repetia a profecia messiânica que indicavam que o Cristo iria ser a pedra de tropeço e rocha de escândalo (Is.8:14) e, como prova de que o Cristo seria alvo de rejeição, revelando o que haveria no interior de muitos corações, Maria sofreria um grande golpe, uma profunda tristeza, que é a espada que traspassaria a sua alma.
Simeão, então, diz que a obra salvadora de Cristo, obra espiritual, seria rejeitada em Israel e, como fruto desta rejeição, Maria, como mãe que era, teria um grande sofrimento, o que, efetivamente, se cumpriu, pois Maria foi testemunha ocular da crucifixão do seu próprio filho (Jo.19:25).
– Este sofrimento, esta grande dor profetizada para Maria não é, como defendem alguns, portanto, qualquer participação na obra redentora de Cristo.
Maria sofreria como mãe biológica, como mãe, ela teria uma grande dor ao ver a morte do seu filho. Seu sofrimento seria uma prova de que a obra espiritual de Cristo havia sido rejeitada por Israel.
Jesus tinha vindo para os Seus, mas os Seus não O receberiam (Jo.1:12) e nesta rejeição, Maria, na qualidade de mãe, haveria de ter uma grande dor.
Não se tratava de qualquer sofrimento pela redenção dos homens, como se diz, mas, sim, um sofrimento decorrente da posição, do papel assumido por Maria: o de mãe.
– Tanto é assim que Ana, a profetisa que ali estava, falava a respeito de Jesus a todos quantos esperavam a redenção em Jerusalém (Lc.2:38).
O que Ana, esta, sim, virgem apesar de sua avançada idade, falava a respeito de Maria para os que aguardavam a redenção? Nada!
Ora, se Simeão tivesse falado algo a respeito da participação de Maria na obra redentora, Ana, profetisa, mulher usada por Deus, não haveria de falar a respeito de Maria também?
Entretanto, diz o texto sagrado, Ana só falava d’Ele, de Jesus, porque Ele é o único e suficiente Redentor.
Maria não é, em absoluto, “Corredentora”, como tentaram aprovar no Concílio Vaticano II, sem êxito, mas como ainda hoje, e cada vez mais, defendem muitos romanistas.
– Outro fato registrado nos evangelhos onde há a presença de Maria, depois do nascimento de Jesus, foi a visita dos magos à criança.
Neste episódio, a Bíblia fala-nos que os magos encontraram Jesus junto a sua mãe, o que era perfeitamente natural, visto que Jesus tinha, certamente, menos de dois anos de idade.
Ao ali chegarem, a Bíblia diz que adoraram o menino e Lhe ofertaram presentes (Mt.2:11). Qual a reação que tiveram diante de Maria? Nenhuma.
Prostraram-se diante de Jesus e O adoraram, mas nada fizeram em relação a Maria. Ofertaram presentes a Jesus, mas nada ofertaram a Maria. Maria não recebeu qualquer “veneração especial” por parte dos magos.
– Em seguida, vemos a mãe de Jesus mencionada quando da ida do menino ao Egito.
Em sonho, José foi avisado para fugir para o Egito e a Bíblia diz que tomou o menino e sua mãe e foi para o Egito (Mt.2:13,14).
Por que o anjo se dirigiu a José? Porque ele era o “pai de família”, o responsável pelo menino e por sua mãe.
O menino, ainda indefeso, sem consciência do bem e do mal, o que adquiriria apenas após a morte de Herodes (Mt.2:1) e de Cirênio (Lc.2:2) (Is.7:15,16), necessitava de proteção. Quem deveria fazê-lo? O “pai social”, ou seja, José.
Maria, como se vê, era a mãe biológica, seu papel era o de dar à luz e executar o trabalho materno, nada mais. Pediu José a Maria alguma graça especial, para que fosse atendido por Deus mais rapidamente? Evidentemente que não, pois o papel de Maria neste assunto era nenhum.
– Também verificamos que, quando se deu a mensagem para que o menino voltasse do Egito, a mensagem também foi dada a José, não a Maria (Mt.2:19-21).
A criança já havia adquirido a consciência, pois mortos já eram Herodes e Cirênio, mas nem o anjo se dirigiu a Jesus, nem tampouco a Maria, mas a José, o responsável legal pela família.
Vemos, portanto, que Maria papel algum exercia a não ser o de mãe biológica. É interessante observar que este chamado para retorno a Israel havia sido vaticinado pelo profeta com as seguintes palavras:
“Do Egito chamei o Meu Filho” (cf. Os.11:1; Mt.2:15). Não há qualquer referência do profeta a Maria, nem deveria haver.
– Já na adolescência de Jesus, vemos a primeira demonstração de um Jesus que já tinha consciência de Seu papel no episódio da Sua ida a Jerusalém, quando assumiu a Sua responsabilidade diante de Deus, aos doze anos de idade.
Jesus ficou no templo, tendo Seus pais iniciado a viagem de volta sem perceberem que Jesus não voltara com a caravana que havia ido ao templo.
– Quando retornaram, a Bíblia diz que, durante três dias, José e Maria procuraram o menino, não O localizando.
Isto, de pronto, nos revela que Maria não possuía nenhum dote especial de comunicação com o menino Jesus, nem se encontrava em situação de vantagem em relação a José ou a qualquer outro ser humano.
Era uma mulher como qualquer outra, não estando, pois, acima de qualquer homem, apesar de já ser a mãe do Salvador.
– O texto sagrado diz-nos que, assim como havia acontecido quando ouviram as palavras de Simeão, ao verem Jesus expondo a Palavra perante os doutores, tanto José quanto Maria se maravilharam (Lc.2:48), a provar, uma vez mais, que Maria não tinha a mínima noção a respeito do conhecimento de Jesus a respeito das coisas de Deus.
Maria foi apanhada de surpresa tanto quanto os doutores ou José. Por que, então, temos de considerar que Maria seria uma interlocutora privilegiada diante de Deus?
– Maria, como mãe que era, imediatamente, demonstrando toda a sensibilidade feminina de uma mãe aflita, dirigiu-se a Jesus, dizendo: ‘Filho, por que fizeste assim para conosco? eis que teu pai e eu ansiosos te procurávamos’ (Lc.2:48).
– Maria fazia o seu papel de mãe, na aflição não aguentara sequer estar em particular com o seu filho para lhe dar a devida advertência.
Se, como mãe, poderia e tinha o direito de fazê-lo, imiscuía-se, nesta sua repreensão, com um trabalho de Jesus enquanto Filho de Deus.
Sua repreensão não se jungira ao fato de ter ficado em Jerusalém sem avisar os pais, mas penetrara na questão de Jesus ter ido ao templo, ter ido discutir com os doutores.
Maria, então, que, até aquele instante, nada falara, apenas guardara em seu coração o que havia sido dito a respeito da missão de Jesus na Terra, entendia ter o direito de circunscrever limites a este ministério, de alguma maneira, diante de seu papel biológico e social, ter algum papel na obra redentora do Messias.
Qual foi a resposta de Jesus a este gesto ativo, o primeiro assumido por Maria desde o anúncio do nascimento do Messias?
– “Por que é que Me procuráveis? Não sabeis que Me convém tratar dos negócios de Meu Pai” (Lc.2:49). Jesus, de imediato, traça um limite na atuação dos Seus “pais”.
Em momento algum, Jesus Se mostra rebelde para com Seus “pais”, pois isto seria pecar e Jesus jamais pecou, tanto que lhes era sujeito (Lc.2:51).
Não lhes retira o direito de ir ao Seu encontro, de Lhe repreender. Mas, percebamos a pergunta do Senhor: “por que é que Me procuráveis?”.
Jesus indaga do motivo da repreensão, da causa da aflição e mostra claramente que os “negócios do Seu Pai”, ou seja, a questão da salvação, não era da conta nem de José, nem de Maria.
O próprio Jesus dá conta de que Maria participação alguma poderia ter no processo da salvação.
IV – MARIA, MÃE DE JESUS NO MINISTÉRIO TERRENO DE JESUS
– O ministério público de Jesus Cristo começou quando o Senhor Se dirigiu até João Batista para ser batizado.
Naquele instante, o Pai, desde os céus, testificou que Jesus era o Seu Filho, bem como o Espírito Santo, na forma de pomba, desceu sobre Ele.
No dia seguinte, o próprio João declarou que Jesus era o Cordeiro de Deus que tiraria o pecado do mundo. Neste episódio, notamos a total ausência de Maria, a demonstrar, claramente, que o processo da salvação não tinha participação alguma da mãe biológica do Senhor.
– Logo em seguida, porém, vemos Jesus acompanhando Sua mãe num evento social.
Em Caná da Galileia, havia um casamento e Jesus acompanhou a Sua mãe. No casamento, faltou vinho e, então, Maria chamou Jesus e Lhe disse a respeito do problema existente.
A resposta de Jesus foi a seguinte: “Mulher, que tenho Eu contigo? Ainda não é chegada a Minha hora” (Jo.2:4).
– Quem vê este gesto de Jesus chega a se surpreender, pois parece haver uma rudeza da parte do Senhor, logo Ele que é manso e humilde de coração (Mt.11:29).
Entretanto, quando bem analisamos o episódio, observamos que a cena é de fundamental importância para que não sejamos iludidos pela mentira da mariolatria.
Não fosse esta resposta do Senhor e, certamente, estaríamos enganados, como milhões de pessoas que se dizem cristãs, estão na atualidade.
– Jesus estava no primeiro evento social com Sua mãe desde quando se iniciara o Seu ministério público.
Maria, sabedora da missão de Cristo, que tudo conferia no seu coração, entendera, certamente, que chegara o instante da exaltação do Messias, da redenção de Israel.
Mais uma vez, cerca de 18 anos depois do episódio do templo em Jerusalém, tenta ter uma participação na obra redentora.
Compreende-se seu gesto: é mãe e mãe do Salvador. Humanamente, não consegue se controlar e passa a querer ver a materialização de todas as promessas messiânicas.
Está entusiasmada com as notícias recebidas e com o início do ministério de seu filho. Todavia, sua participação já se tinha dado: fora o abrigo do embrião e do feto, a educadora do menino, adolescente e jovem. Agora, nada mais restava senão ser uma das pessoas salvas por Jesus.
– No entanto, Maria, como todo judeu, ansiava por ver sinais (Mt.12:38; Mc.8:12; Lc.23:8; I Co.1:22) e achava ter uma posição privilegiada em relação aos demais, pois, afinal de contas, era a mãe do Senhor.
Contudo, ao se dirigir a Jesus e fazer, em nome dos responsáveis, pela festa, um pedido, recebeu dura resposta do Senhor: ‘Mulher, que tenho eu contigo? Ainda não é chegada a Minha hora”.
Esta resposta de Jesus desfaz todo e qualquer argumento de que podemos obter coisas de Deus pedindo através de Maria.
No relacionamento espiritual, Jesus nem sequer chamou Maria de mãe. Tratou-a como “mulher”. Por quê?
Porque, no campo espiritual, enquanto Redentor da humanidade, enquanto único Mediador entre Deus e os homens (cf. I Tm.2:5), Maria não é mãe, mas, sim, uma mulher, mulher porque foi o instrumento para a vinda do Salvador ao mundo, nada mais do que isto.
– Ante esta resposta, Maria não teve qualquer dúvida, pôs-se no seu devido lugar, dirigiu-se aos serventes e disse: “Fazei tudo quanto Ele vos disser” (Jo.2:5).
Maria saiu de cena e Jesus passou a tratar diretamente com os serviçais e, depois, com o mestre-sala.
João, o discípulo que registrou estas palavras e que passou a cuidar de Maria depois da morte do Senhor, portanto, pessoa muito íntima da mãe de Jesus, não titubeou ao dizer, ao término deste relato:
“Jesus principiou assim os Seus sinais em Caná da Galiléia e manifestou a Sua glória e os Seus discípulos creram nEle” (Jo.2:11).
Qual é o papel de Maria no episódio? Nenhum! Não é dito que os sinais se fizeram graças à intercessão de Maria, nem que, por Maria, o problema teve uma solução mais rápida do que se o assunto tivesse ficado nas mãos de Jesus.
Nada disso é dito, porque nada disso aconteceu. Pelo contrário, a Bíblia nos diz que, não muito depois destes dias, Jesus deixou a companhia de Sua mãe, iniciando, de forma solitária, o Seu ministério (cf. Jo.2:12).
– A propósito, o episódio do primeiro milagre de Cristo traz-nos o único mandamento de Maria, ao qual devemos, como servos de Deus, crer: “Fazei tudo quanto Jesus vos disser”.
E uma das coisas que Jesus nos manda fazer é esta: “e a vida eterna é esta: que conheçam a Ti só por único Deus verdadeiro e a Jesus Cristo, a Quem enviaste” (Jo.17:3).
Devemos, pois conhecer a Deus e a Jesus Cristo, que por Ele foi enviado. Onde está Maria?
Não está e, como ela nos mandou fazer o que Jesus nos disser, devemos, pois, desconsiderar totalmente qualquer ideia de intervenção de Maria no nosso relacionamento com Deus.
– Um outro episódio do ministério terreno de Jesus nos mostra, com clareza, que a participação de Maria neste ministério é nenhuma, pois a obra havia sido dada exclusivamente a Jesus pelo Pai para a fazer (Jo.17:4).
Certa feita, enquanto Jesus ensinava os Seus discípulos, chegou Maria e os irmãos de Jesus para Lhe falar (Mt.12:47; Mc.3:31; Lc.8:19).
Jesus não interrompeu o que fazia para atender aos Seus familiares, mas disse que Sua mãe e Seus irmãos eram aqueles que fizessem a vontade do Seu Pai (Mt.12:48-50).
Nesta Sua atitude, uma vez mais, o Senhor Jesus mostra que papel algum exercia Sua mãe no tocante ao Seu ministério.
Havia um contacto direto entre o Pai e o Filho, contacto este que se transferia para todo aquele que cresse em Jesus, fazendo, assim, a vontade do Pai.
Maria, uma vez mais, por sua sensibilidade feminina, era freada pelo Senhor e posta em seu devido lugar.
– Neste episódio, fica também claro que Jesus estava sozinho no exercício do Seu ministério.
Sua mãe e Seus irmãos chegaram para falar-Lhe e, segundo nos conta Lucas, nem sequer conseguiram Se aproximar do Senhor, por causa da multidão (Lc.8:19).
Isto nos mostra o distanciamento que havia entre Jesus e Sua mãe no tocante à obra espiritual. Durante o ministério de Cristo, havia dois grupos que O acompanhavam: os discípulos e a multidão.
Entretanto, Maria nem sequer pertencia à multidão, fazia parte do imenso grupo de pessoas que se mantinham distantes do “profeta da Galileia”.
Como dizer que uma pessoa assim distante seja uma interlocutora privilegiada da Cristandade? Que seja a “Mãe da Igreja”, como declarou o Papa Paulo VI em 21 de novembro de 1964, em pleno Concílio Vaticano II?
– Aliás, se bem compreendermos este episódio, onde nos parece, mais uma vez, que Jesus é rude para com a Sua própria mãe, veremos que, por detrás da iniciativa de Maria e dos irmãos de Cristo, havia uma tentativa de embaraço ao ministério de Cristo.
Com efeito, segundo a narrativa que nos dá Marcos a respeito desta passagem, os familiares de Cristo tinham o intento de prender a Jesus, achando que estava fora de Si (Mc.2:21).
Vemos, portanto, que Maria e os irmãos de Cristo não compreendiam sequer o ministério do Senhor.
Este gesto de Maria, aliás, revela que, por incrível que pudesse parecer, apesar de todas as promessas recebidas, ela havia se deixado levar pela incredulidade dos irmãos do Senhor (Jo.7:5).
Não há, portanto, diante deste quadro, dizer que Maria é co-participante da obra da redenção.
Muito ao contrário, era uma pessoa que precisaria ter uma experiência profunda com o próprio Jesus para poder se converter e ser alvo da graça salvadora de Deus.
OBS: “…No vs.31 deste mesmo capítulo de Marcos, há menção aos irmãos e à mãe de Jesus e presumimos que os mesmos estejam aqui em foco.
Poderiam ter trazido também alguns primos, para subjugar qualquer resistência oferecida por Jesus.
O autor sagrado busca dizer que a ‘oposição’ a Jesus tornou-se tão grande que até Sua família imediata se pôs do lado conctrário, embora, sem dúvida, devido a um interesse equivocado no Seu bem-estar.…” (CHAMPLIN, R.N. O Novo Testamento interpretado versículo por versículo, com. Mc.3:21, v.1, p.682).
– Esta circunstância se daria quando da crucifixão de Jesus. Depois de todo um período em que Maria se mantém completamente distante de Cristo, vamos reencontrá-la ao pé da cruz, vendo a morte do seu filho, circunstância que,
longe de trazer qualquer participação de Maria na redenção da humanidade, como querem fazer crer os romanistas, é apenas o cumprimento da palavra profética de Simeão como também a oportunidade para a salvação de Maria, que havia se deixado levar pela incredulidade dos seus outros filhos.
– João diz-nos que Maria estava junto à cruz (Jo.19:25), sofrendo a dor materna pela perda de um filho.
Este sofrimento é mais uma demonstração do papel de mãe biológica que Maria havia aceito da parte de Deus.
Toda mãe sofre, tem uma verdadeira espada traspassada em sua alma quando vê a execução de um filho seu, ainda mais quando tem consciência de que se tratava de uma injustiça.
Sentindo desamparada, quiçá contemplando, naquela imagem trágica e cruel, a própria incredulidade, Maria tem uma experiência com Jesus.
– Jesus, embora fosse o Filho de Deus, embora ali estivesse cumprindo a obra que só a Ele, com exclusividade, cabia cumprir, não deixara de ser o filho biológico de Maria.
Mas teria de deixar de sê-lo, pois estava às vésperas da morte e, então, não mais seria filho de Maria, visto que, mesmo ressuscitando como homem, em corpo glorioso, não haveria mais, na dimensão eterna, qualquer relacionamento familiar, pois não há família no sentido humano na eternidade, como ensinara Cristo aos saduceus (Mc.12:25).
Assim, como era o primogênito de Maria e de José e como Seus irmãos não tivessem responsabilidade nem amor para cuidar da Sua mãe (tanto que a haviam deixado só num momento tão difícil como o que ela vivia), cumprindo o Seu papel de filho biológico, dirigiu-Se a João, o único discípulo que havia se mantido ao Seu lado até aquele instante e profere uma frase que também desmente cabalmente as pretensões dos mariólatras:
“Ora, Jesus, vendo ali Sua mãe e que o discípulo a quem Ele amava estava presente, disse à Sua mãe: Mulher, eis aí o teu filho.
Depois, disse ao discípulo: Eis aí tua mãe. E, desde aquela hora, o discípulo a recebeu em sua casa.” (Jo.19:26,27)
– Nestas palavras de Cristo, vemos nitidamente que a relação existente entre Jesus e Maria era uma relação familiar, biológica, circunscrita à vida terrena, sem qualquer repercussão espiritual nem tampouco com qualquer extensão para a Igreja.
Maria estava sofrendo como mãe e Jesus, como filho, tinha de prover o sustento e o futuro de Sua mãe, pois estava à morte e Maria lhe sobreviveria.
Por isso, tratou de arrumar-lhe um filho, o discípulo João, que, desde então, passou a cuidar de Maria. Nada mais claro: Maria era mãe de Jesus e deixaria de sê-lo a partir da morte de Cristo.
João passou a ser o filho de Maria, tendo se desincumbido deste mister até a morte de Maria. Maria não estava destinada a ser mãe da Igreja, nem muito menos uma intercessora dos cristãos. Seu papel havia chegado ao fim.
– Depois deste episódio, só encontramos Maria uma vez mais nas Escrituras. Está ela, com seus outros filhos, no cenáculo, em Jerusalém (At.1:14), cumprindo a ordem de Jesus para que ficassem em Jerusalém até que do alto fossem revestidos de poder (Lc.24:49).
Este episódio, também muito explorado pelos mariólatras, para demonstrar que a Igreja vivia “sob a proteção de Maria” e que “a própria descida do Espírito Santo se deveu à intercessão de Maria” (algo que é muito ressaltado, na atualidade, pelos católicos carismáticos, cujas reuniões por ocasião da festa de Pentecostes têm o elucidativo nome de “cenáculo de Maria” ou “cenáculo com Maria”), traz-nos importantes lições. Vejamo-las:
a) Em At.1:14, Lucas, sempre muito minudente e rigoroso em seus escritos, ao relatar quem eram as pessoas presentes no cenáculo, elenca, em primeiro lugar, os discípulos, depois cita as mulheres, ou seja, aquelas mulheres que haviam sido testemunhas da ressurreição de Jesus e, depois, acrescenta Maria e os irmãos de Jesus.
Esta seqüência reflete, claramente, que Maria e os irmãos de Jesus eram novos crentes, ou seja, novos integrantes da comunidade cristã.
Isto se explica claramente porque foi só por ocasião da morte e ressurreição de Jesus que eles se integraram ao grupo de discípulos.
Maria, certamente, após a experiência com o Senhor na cruz, tendo passado a ser cuidada por João, o mais fiel dos apóstolos; os irmãos de Cristo, depois da experiência sobrenatural que Tiago, o mais velho dos irmãos de Jesus, teve com o Senhor ressuscitado (cf. I Co.15:7).
O Senhor mostra ter cuidado da salvação da Sua família antes de subir aos céus. Maria, portanto, está longe de ser o centro das atenções no cenáculo.
b) O texto sagrado diz-nos que todos oravam e permaneciam em oração, cumprindo, assim, a ordem de Jesus.
Maria estava, portanto, orando, assim como os demais discípulos. A oração era feita, certamente, a Deus em nome de Jesus (Mt.18:20; Jo.14:13,14,26; 15:16; 16:23,24,26) para que houvesse o revestimento de poder.
Ninguém pedia a Maria, mas pedia ao Pai em nome de Jesus. Temos, pois, uma prova cristalina de que nada deve ser pedido a Maria.
Os discípulos, com Maria presente, em carne e osso, pediam ao Pai em nome de Jesus, como a própria Maria o fazia!
c) Ainda durante este período de oração, os discípulos resolveram escolher um discípulo substituto para ocupar o lugar de Judas Iscariotes.
A narrativa diz-nos que recorreram inclusive às sortes para decidir isto, mas não fizeram qualquer pedido a Maria, que ali estava presente. Por que o fizeram?
Porque Maria papel algum tinha no que concerne à Igreja e sua organização.
Ademais, para ser apóstolo, o requisito era o de terem convivido com o Senhor durante todo o tempo do Seu ministério, algo que Maria nem sequer preenchia.
O grupo mais importante da igreja, portanto, era o grupo dos apóstolos, aqueles que haviam sido mencionados, como vimos no item “a” supra, em primeiro lugar, porque haviam sido conviventes de Jesus em Seu ministério.
Maria não foi sequer consultada, não tinha credenciais para tanto.
Que diferença entre esta posição bíblica de Maria e a que criaram para ela na mariolatria!
d) No dia de Pentecostes, Maria, que estava entre os quase cento e vinte crentes no cenáculo, foi batizada com o Espírito Santo (At.2:4), o que demonstra que também ela tinha necessidade do revestimento do poder, tanto quanto os apóstolos.
Não ocupava posição alguma de privilégio em relação aos demais crentes e era uma testemunha de Cristo (At.1:8).
Como tal foi que passou os demais dias de vida sobre a Terra, não havendo, a partir de então, qualquer outro registro inspirado a seu respeito, o que nos leva a concluir que teve o mesmo destino dos demais que ali estavam servindo a Deus, ou seja, o de ter servido ao Senhor com fidelidade até o fim (Mt.24:13),
aguardando, agora, como os demais, a ressurreição dos que dormiram no Senhor no dia do arrebatamento da Igreja, quando, então, a Igreja se reunirá para estar para sempre com o Senhor (I Ts.4:14-17).
V- LIÇÕES QUE NOS DÁ MARIA COMO HUMILDE SERVA DO SENHOR
– Vimos, em todas as passagens que as Escrituras mencionam, que Maria não é a “Corredentora”, nem tampouco a “Mãe de Deus”, como afirmam os mariólatras.
Mas isto não quer dizer que Maria não possa ser uma personagem bíblica que muito nos ensina a respeito do caráter do cristão.
– Com efeito, Maria sempre se apresentou como a “humilde serva do Senhor” e ela o foi sem sombra de dúvida.
Aceitar engravidar, sem ter conhecido varão, para fazer a vontade do Senhor é assumir uma posição de risco de vida em prol de sua fé em Deus.
– Maria não titubeou em aceitar este verdadeiro “opróbrio” diante dos homens, porquanto como estava desposada com José, a gravidez valeria como adultério e, certamente, corria ela o risco de ser apedrejada por conta disto, o que não ocorreu porque José aceitou recebê-la como mulher.
Assim que se deu por grávida, Maria não teve outra atitude senão de apressar-se e fugir para a casa de Isabel, que também estava grávida (Lc.1:39), somente retornando três meses depois, quando pôde ser acolhida por José.
– Estamos, como Maria, dispostos a colocar em risco nossa reputação e nossa vida para que a obra de Deus se realize, para que a vontade de Deus se cumpra em nós?
Por ser “serva do Senhor”, Maria aceitou isto e assim devem fazer todos os servos de Deus, que não estão aqui para agradar aos homens, mas, sim, a Deus (Gl.1:10).
– Maria, diz-nos o texto sagrado, ao longo da trajetória de seu filho Jesus Cristo, sempre “guardou as coisas no seu coração” (Lc.2:19,51).
Foram vários os episódios que envolveram Maria que a poderiam ter abalado em sua fé e que fugiam à lógica humana: como admitir que seu filho era o Messias, se nasceu Ele numa manjedoura?
Como admitir que Jesus é o Messias, se teve Maria de conviver numa condição humilde durante todo o tempo, morando em uma cidade extremamente simples e insignificante como Nazaré e, desde cedo, tendo a Jesus como arrimo de família, já que, certamente, José morreu quando o Senhor Jesus ainda era adolescente, tanto que era Ele conhecido em Nazaré como o carpinteiro, filho do carpinteiro (Mc.6:3)?
– O fato é que Maria guardava tudo o que ocorria em seu coração, demonstrando, assim, ter uma fé em Deus que não se deixava abalar apesar das circunstâncias extremamente adversas que enfrentou ao longo de sua vida.
– As palavras utilizadas para “guardar” em ambos os versículos de Lucas significam “entesourar”, “guardar com segurança”, a indicar que Maria, embora por vezes não entendesse o que estava a se passar, acolhia os acontecimentos à luz do que lhe fora revelado, a fim de que, no futuro, pudesse entender ou compreender o que se passava.
– Esta deve ser, também, a atitude do cristão. Não podemos nunca achar que a Palavra de Deus não tem validade, de que houve um “equívoco” da parte do Senhor e, diante dos acontecimentos que parecem desmentir o que está escrito ou o que nos foi revelado, devemos tão somente “guardar no coração”, “entesourar” o que aconteceu e procurar fazer uma conferência com o que foi dito, confiando plenamente que o que foi dito por Deus há de ocorrer.
– Um verdadeiro “servo” não questiona nem põe em dúvida o que recebeu de seu Senhor, mas, tão somente, assume a sua limitação e “guarda no coração” o que viu e observou, aguardando que, no tempo certo, no tempo de Deus, tudo há de ser esclarecido e, mais importante do que isto, cumprido conforme dito pelo Senhor. Não nos esqueçamos das palavras ditas pelo profeta Isaías:
“Ai daquele que contende com o seu Criador, caco entre outros cacos de barro! Porventura, dirá o barro ao que o formou: Que fazes? Ou a tua obra: Não tens mãos?” (Is.45:9).
– Maria deve ser, neste aspecto, tomada como exemplo de todo cristão. Ela soube esperar o cumprimento das promessas divinas, mesmo quando tudo parecia acontecer ao contrário e não se decepcionou, como ninguém se decepcionará com Deus, que é fiel (I Co.1:9; 10:13; I Ts.5:24; II Tm.2:11; Hb.10:23) e vela pela Sua Palavra para a cumprir (Jr.1:12), até porque fiel também é a Palavra (II Tm.2:11; Tt.3:8)cumprimento que não se dá do nosso modo ou de acordo com a nossa lógica.
– O Senhor, sabendo desta confiança de Maria, sempre procurou, ao lado dos fatos totalmente adversos às promessas messiânicas e ao que havia sido anunciado a Maria quando ela aceitou a condição de mãe humana do Salvador, sempre manter acesa esta chama de confiança.
– Assim que, ao mesmo tempo em que o menino nasce em uma manjedoura, algo totalmente inusitado para o que ocuparia o trono de Davi e cujo reino não teria fim (Cf. Lc.1:32,33), é providenciado que Maria ouça o testemunho dos pastores de Belém a respeito dos coros celestiais que vieram anunciar o nascimento de Jesus (Lc.2:16,17).
– De igual modo, quando vai ao templo para apresentar seu sacrifício de purificação e apresentar o menino, tendo de apresentar a oferta dos mais pobres (Lc.2:24; Lv.12:21,6,8), o que também não correspondia ao imaginário do rei de Israel, tem o encontro com Simeão e Ana, que reforçam o caráter messiânico de Jesus.
– Também, quando do episódio do encontro de Jesus com os doutores, quando Ele é apresentado para assumir a sua responsabilidade diante da lei no templo, Maria ouve declarações do próprio Jesus que dão conta de Sua messianidade e de Sua condição como o Santo, o Filho de Deus (Cf. Lc.2:35).
– É por isso que, nas bodas de Caná da Galileia, ela, ao saber do problema da falta de vinho, traz o caso a Jesus, pois sabia que Ele era o Santo, o Filho de Deus, ainda que não compreendesse a forma da missão salvífica, pois, como qualquer judeu, tinha o imaginário do grande conquistador, daquele que haveria de libertar o povo de Israel do jugo romano e se manifestar com toda pompa e poder com ostentação e não na humildade.
– Tendo em vista que Jesus havia sido batizado no Jordão por João e iniciara o Seu ministério público, angariando os primeiros discípulos, entendeu Maria que era chegado o momento da revelação de Cristo a todo Israel, no que não estava enganada, ainda que tal revelação não se daria da forma por ela imaginada.
– Tanto assim é que Jesus faz questão de dizer a Maria que ainda não era chegada a Sua hora, numa clara demonstração de que o perfil esperado por Maria não se realizaria nesta etapa da missão salvífica de Cristo, em que Ele veio como o Servo do Senhor e não como Rei de Israel, o que somente ocorrerá ao término da Grande Tribulação, na batalha do Armagedom, quando o Senhor, obtida a conversão de Israel, instalar o Seu reino milenial.
– Jesus faz o Seu primeiro milagre, mas, em seguida, o imaginário de Maria desmorona-se, visto que o Senhor começa a ter uma trajetória totalmente contrária ao que sua mãe esperava.
– Exatamente porque Jesus inicia o Seu ministério de forma totalmente oposta ao imaginário judaico, Maria acaba sendo convencida pelos seus outros filhos de que Jesus estava louco e, deste modo, consente em prendê-l’O, indo ao encontro d”ele para tomar esta atitude.
Chega até onde Jesus está e O chama, mas Jesus não foi ao seu encontro, dizendo que sua mãe e irmãos eram aqueles que faziam a vontade do Pai (Mc.12:46-50; Mc.3:31-35; Lc.8:19-21).
– Esta desilusão de Maria, que demonstra não ser ela “imaculada” nem “perfeita”, fez com que Maria se ausentasse do ministério terreno de Jesus a partir de então, somente tornando a aparecer no relato bíblico quando da crucifixão, quando, então, se cumpre a profecia de Simeão.
– Ao pé da cruz, Maria experimenta o amor filial de Jesus, que a deixa aos cuidados de João (Jo.19:26,27) e pôde, então, crer que realmente Ele era o Filho de Deus, diante dos acontecimentos que ali se deram, em especial as “sete palavras da cruz”, a manifestação da natureza e a própria declaração do centurião de que Jesus era verdadeiramente o Filho de Deus (Mt.27:54; Mc.15:39).
– Maria, ali, pôde crer e, após a ressurreição, com a aparição de Jesus a Tiago, Seu irmão (I Co.15:7) e a consequente conversão de Seus irmãos, juntamente com toda a família passar a seguir o Evangelho, inclusive recebendo o revestimento de poder no dia de Pentecostes (At.1:14).
– Somente quem guardara todas as coisas em seu coração, diante daquela dantesca cena do Calvário poderia enxergar o cumprimento das promessas messiânicas e da revelação que havia recebido da parte do anjo Gabriel quando da anunciação do nascimento de Cristo.
Sem a nefasta influência dos seus filhos, Maria pôde, novamente, contemplar tudo com os olhos da fé e compreender o plano salvífico e o papel que era desempenhado por Aquele que havia Se utilizado de seu ventre para vir ao mundo.
– Guardar as coisas que Jesus nos tem mandado é um imperativo que o Senhor nos deixou, é a missão que a Igreja tem de exercer ao longo de sua peregrinação aqui na Terra (Mc.28:20).
E Maria é um exemplo vívido desta atitude, que jamais pode ser por nós desconsiderada.
Nisto, e apenas nisto, Maria deve ser seguida por todos nós, pois é precisamente este o “mandamento de Maria”: “Fazei tudo quanto Ele vos disser”.
Ev. Caramuru Afonso Francisco