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LIÇÃO Nº 12 – A FAMÍLIA E A IGREJA

Família e igreja são duas instituições criadas por Deus, com propósitos específicos, mas que devem ser alcançados conjuntamente.

INTRODUÇÃO   

– A família foi a primeira instituição criada por Deus para os homens, pois, sem ela, não poderia haver o cumprimento de todas as tarefas atribuídas ao homem pelo Senhor. Antes da queda, era a única instituição necessária para que houvesse a plenitude de vida ao homem. Entretanto, depois da queda, diante da necessidade da salvação do homem, Deus iniciou o Seu plano, existente desde antes da fundação do mundo (Ap.13:8), para o resgate do homem, plano este que contemplava um grande mistério: a Igreja, que seria uma nova instituição, destinada a reunir, novamente, os homens com Deus (Ef.3:9,10).

– Ora, ambas as instituições foram criadas por Deus e cada uma tem um propósito diverso: a família busca conceder os meios para que o homem cumpra o seu papel nesta terra; a Igreja é uma reunião dos salvos para pregar o evangelho, atingir a perfeição espiritual e perseverar até o fim, a fim de alcançar a glorificação do corpo. Deste modo, vemos que a família e a Igreja têm objetivos distintos, mas que se interdependem, pois não pode um salvo cumprir sua tarefa na Igreja sem fazê-lo dentro de sua família.

I – JESUS E A FAMÍLIA  

– Quando falamos em família e Igreja, devemos observar que a Igreja é uma instituição que, embora planejada por Deus desde antes da fundação do mundo, somente foi criada e estabelecida nesta nossa atual dispensação, a dispensação da graça (Ef.3:1-11). Assim, ao falarmos da relação entre família e igreja, iremos nos circunscrever a este período da história da humanidade, pois é este o objeto desta lição. Entretanto, não devemos menosprezar o tratamento dispensado à família nas outras dispensações, mesmo que a título introdutório e elucidativo. OBS: Denominamos dispensação a um período da história da humanidade em que Deus Se relacionou com o homem de um determinado modo.

Os teólogos costumam identificar sete dispensações, a saber: inocência (da criação até a queda do primeiro casal), consciência (da queda do primeiro casal até o dilúvio), governo humano (do dilúvio até a torre de Babel), patriarcal (da chamada de Abrão até a entrega da lei no Sinai), da lei (da entrega da lei no Sinai até a morte e ressurreição de Jesus), da graça (da morte e ressurreição de Jesus até o arrebatamento da Igreja) e o milênio (o reino milenial de Cristo, que se dará após a guerra do Armagedom até a destruição final dos rebeldes e o juízo do trono branco, quando se encerra a história, iniciando-se o Estado Eterno, com novo céu e nova terra).

– Na dispensação da inocência, Deus criou a família a fim de que o homem pudesse cumprir a sua mordomia, ou seja, dominar os demais seres na Terra e se reproduzir, povoando a Terra (Gn.1:26-28). Vemos, assim, que a família foi criada antes do pecado e que, apesar dele, subsiste como uma necessidade para a vida na Terra.

– Na dispensação da consciência, a família foi mantida por Deus. Embora atingida pelo pecado, a ponto de passar a haver um desequilíbrio no relacionamento entre homens e mulheres, de a mulher ter aumentada sua dor no momento do parto, bem como de a sobrevivência passar a ser uma luta, o fato é que, nestas penalidades aplicadas por Deus ao homem, está implícita a continuidade da vida familiar, tanto que, logo no capítulo 4 do livro de Gênesis, vemos a primeira família organizada fora do Éden, ainda que vitimada pelas funestas consequências do pecado. Mesmo quando esta dispensação termina com a destruição de toda a humanidade pelo dilúvio, verificamos o zelo e o cuidado de Deus para com a família, pois é uma família inteira que é preservada das águas do dilúvio – a família de Noé (Gn.7:1).

– Na dispensação do governo humano, vemos, mais uma vez, a preservação da instituição familiar, porquanto ela se inicia com a família de Noé se encarregando de repovoar toda a terra (Gn.9:19). Mesmo após o juízo de Babel, que pôs fim a esta dispensação, podemos observar que, embora tenha sido destruída a comunidade política única então existente, a família foi preservada, pois a dispersão dos homens respeitou os laços familiares mais próximos, como se pode depreender da narrativa de Gn.10.

– Na dispensação patriarcal, vemos Deus chamando homens, com suas respectivas famílias, para a construção de um povo todo especial que Lhe servisse de propriedade peculiar e de testemunho perante as demais nações. Abrão foi chamado, mas, embora tivesse de sair do meio de sua parentela (que é a chamada “família extensa”), deveria levar consigo a sua mulher, Sarai, ou seja, o chamado alcançava não só o patriarca, como também a sua  “família nuclear” (da qual não fazia parte Ló). Assim ocorreu com todos os patriarcas, cujas famílias, aliás, foram construídas segundo o desígnio divino, diante do cuidado observado desde Abrão para que não houvesse mistura na sua descendência.

– Na dispensação da lei, Deus, já tendo formado um povo que era Sua propriedade peculiar, fez estritas observações a respeito da família, estabelecendo regras para que a família fosse devida formada com base na lei divina (Dt.6:6-9), que não houvesse envolvimento das famílias israelitas com os estrangeiros (Dt.7:2-6. Ed.9,10), aliás, nem mesmo com elementos de outras tribos do próprio povo de Israel (Nm.36:6-9), bem como que houvesse pureza sexual e moralidade nas relações familiares (Ex.20:14,17; Lv.18:19-30).

– Não seria, portanto, diferente com relação à dispensação da graça, que é a nossa atual dispensação, onde a família tem lugar de destaque, como veremos nesta lição. Mas, para que possamos saber como deve ser a relação entre família e igreja, indispensável que observemos como tratou o assunto o nosso exemplo (I Pe.2:21), a cabeça da igreja que, simultaneamente, é o salvador do corpo (Ef.5:23).

– Jesus, ao ser enviado à Terra, veio como alguém “nascido de mulher” (Gl.4:4), expressão que significa que nasceu como todos os demais homens, o que inclui o fato de ter nascido dentro de uma família.

– Com efeito, ao vermos o histórico envolvendo a concepção de Jesus, veremos que Maria já se encontrava desposada com José (Mt.1:18), ou seja, já havia o compromisso de casamento entre Maria e José, compromisso este que era irrevogável e não poderia ser alterado, tanto que José, embora ainda não coabitasse com Maria, já era chamado de seu marido (Mt.1:19). Observamos, portanto, que Deus fez questão de que, apesar de a concepção de Jesus ser sobrenatural e prescindir de uma relação sexual entre um homem e uma mulher, Jesus nascesse num lar legitimamente constituído pelo casamento, conforme os padrões morais e éticos vigentes naquele tempo na sociedade judia.

– Por que Deus trabalhou assim? Exatamente, para demonstrar que a família é uma instituição que deve ser preservada e respeitada pela Igreja. A cabeça da Igreja, que não necessitava surgir de uma família, submeteu- se a isto, para nos dar o exemplo. A igreja, sendo o corpo de Cristo, também deve preservar a família, viver de forma a não maculá-la, nem desestabilizá-la. OBS: Devemos perceber que, ao longo da história, muitos se levantaram contra a instituição familiar, defendendo a sua abolição como forma de o homem obter justiça e paz nesta Terra, algo que é totalmente contrário à vontade divina. “…Todas as sociedades dependem principalmente da família para a socialização das crianças na transição para se tornarem adultos que possam atuar com êxito. Pensadores, de Platão a Huxley [1932, 1958] especularam a respeito de outras disposições, e dezenas de experimentos em criação comunitária da criança foram tentados e abandonados.

Depois da Revolução Russa, a União Soviética experimento criar crianças em instituições, esperando liberar as mães para o trabalho e, também, a fim de criar as crianças de modo mais “científico”. Mas a Rússia não chegou a implantar amplamente a ideia, logo a abandonou e, depois, fez tudo quanto foi possível para fortalecer a família [Alt e Alt, 1959]. Na atual União Soviética [o livro foi escrito em 1976, observação nossa], a escola e a família cooperam muito a fim de socializarem as crianças para a conformidade, a obediência e o altruísmo [Bronfenbrenner, 1970].…” (Paul B. HORTON e Chester L. HUNT. Sociologia, p.171). Nos dias hodiernos, não tem sido diferente, pois há uma sutil tendência dos governos na atualidade a transferir a formação das pessoas da família para o Estado.

– Em seguida ao Seu nascimento, Jesus sempre se manteve em Sua família, de forma obediente e sujeita (Lc.2:51), tanto que, segundo as tradições judaicas, somente com a idade de doze anos, foi ao templo de Jerusalém, onde assumiu a responsabilidade de cumprir a lei por si só, independentemente de Seus (supostos) pais. Aliás, é nesta oportunidade que Jesus Se encontra com os doutores e, após três dias de busca, ao ser encontrado por José e Maria, mostra a divergência de propósitos entre igreja e família, ao dizer que Lhe cabia tratar dos negócios de Seu Pai (Lc.2:49), o que, entretanto, como já dissemos, não significava ter aberto dos Seus deveres familiares, o que fez, inclusive, quando estava na cruz do Calvário (Jo.19:26,27).

– No Seu ministério, Jesus jamais agiu contra a família. Seus milagres e ensinos sempre se coadunam e se harmonizam com a vida familiar. Vemos Jesus fazendo Seu primeiro milagre numa festa de casamento (Jo.2:1-12); curando a sogra de Pedro (Mt.8:14-17); atendendo a súplicas de pais e mães para libertação ou cura de seus filhos (Mt.15:22; 17:14,15; Mc.5:23); aconselhando a prática da evangelização nas casas e das famílias das pessoas por Ele beneficiadas (Mt.10:12,13; Mc.5:19); defendendo a família monogâmica e sexualmente pura (Mt.19:3-9); ressuscitando um filho (Lc.7:11)  e um irmão (Jo.11:1-45), ambos arrimos de família; cuidando do destino de Sua mãe quando estava prestes a morrer e, mesmo após Sua morte e ressurreição, providenciando a salvação de Seus irmãos, até então incrédulos (I Co.15:7 c.c. Jo.7:5 e At.1:14). Uma vida ministerial de preservação, incentivo e salvação da família.

II – A FAMÍLIA NA IGREJA PRIMITIVA 

– Este cuidado de Jesus com a família prosseguiu com a igreja primitiva, ou seja, a igreja dos tempos apostólicos, conforme nos registram nas Escrituras, o que, também, deve nos servir de exemplo nos nossos dias, porquanto a igreja tal como surgiu naquela época deve ser a mesma na atualidade, pois, se somos o Corpo de Cristo (I Co.12:27), assim como o Senhor, devemos ser os mesmos ontem, hoje e eternamente (Hb.13:8).

– Logo no sermão proferido na igreja recém-inaugurada, no dia de Pentecostes, Pedro, ao evocar um texto bíblico que confirmava a autenticidade da experiência pentecostal, traz à baila um texto do profeta Joel, que mostra que a dispensação do Espírito estaria umbilicalmente relacionada com a estrutura familiar, ou seja, a Igreja jamais poderia subsistir senão como um conjunto de famílias. O derramamento do Espírito se daria dentro de uma estrutura familiar, porquanto haveria profecias de filhos e filhas, visões de mancebos e sonhos de idosos, ou seja, a atuação do Espírito Santo é descrita dentro de um ambiente em que a Igreja é um conjunto de famílias (Jl.2:28; At.2:17).

– A igreja primitiva cuidava das famílias, procurando ajudá-las e suprir-lhe as necessidades, como nos dá conta o episódio que acabou dando origem ao diaconato (At.6:1,2), onde, apesar das murmurações existentes, o texto nos comprova que havia um cuidado, ainda que não equânime, junto às viúvas, ou seja, às famílias mais necessitadas.

– Quando a igreja se iniciou entre os gentios, na casa de Cornélio, houve um início com respeito à estrutura familiar deste centurião romano, que chamou para ouvir a Palavra que seria pregada por Pedro, a todos os seus familiares e amigos mais íntimos (At.10:24), providência que foi do agrado do Senhor, que a todos batizou com o Espírito Santo (At.10:44). Mesmo com a superação da quase intransponível barreira cultural, uma necessidade no plano de Deus para o homem através da Igreja, a instituição familiar foi preservada e enaltecida.

– No ministério de Paulo, vemos, sempre, o cuidado que o apóstolo tinha em aliar a evangelização à preservação da instituição familiar. Embora isto esteja implícito desde a sua primeira viagem missionária, é na narrativa da segunda viagem missionária que temos, explicitamente, este cuidado do apóstolo. Em Filipos, primeira igreja local estabelecida por Paulo nesta segunda viagem, vemos tal cuidado tanto na conversão de Lídia (At.16:15), quanto na do carcereiro (At.16:31,32). Não bastasse isso, vemos vários ensinos de Paulo em suas epístolas a respeito da família, como, por exemplo, nas cartas enviadas aos coríntios, aos efésios e a Timóteo.

– Além de Paulo, outros crentes são mencionados no Novo Testamento de forma a demonstrar uma perfeita harmonia que havia entre os seus ministérios e a sua vida familiar. Timóteo é apresentado como um obreiro cuja formação se devia, fundamentalmente, à vida familiar que tivera (II Tm.1:5; 3:14,15). Priscila e Áquila são sempre mencionados conjuntamente nas Escrituras, numa prova de que o ministério era resultado de uma vida conjugal estável e dedicada ao Senhor (At.18:2,18,26; Rm.16:13; I Co.16:19; II Tm.4:19), sem falar na menção que sempre se faz de igrejas estabelecidas em casas, onde havia  verdadeiros altares ao Senhor (At.5:42; Rm.16:5; I Co.16:19; Cl.4:15).

– Percebemos, portanto, que, na igreja primitiva, a família era respeitada, valorizada e servia de poderoso instrumento de evangelização. Devemos entender, porém, que jamais houve a confusão entre família e igreja. O fato de ambas as instituições promoverem o bem-estar do homem não significa que a igreja tenha vindo substituir a instituição familiar.

– A família, como instituição criada por Deus, não poderia ser suprimida pela igreja. Deus criou a família para que propiciasse os meios necessários para que o homem cumprisse o seu papel aqui na Terra e a igreja tem outra finalidade: a pregação do Evangelho e o desenvolvimento espiritual do salvo com vistas a que habitemos um novo céu e uma nova terra.

– Naturalmente que, por serem ambas instituições criadas por Deus, família e igreja não podem se contrapor, não podem competir, não podem atrapalhar-se mutuamente e que, sob a direção do Espírito Santo, como vemos na igreja primitiva, haja uma perfeita harmonia, uma confluência de esforços, uma ajuda mútua, mas jamais teremos confusão de atribuições ou a supressão de uma pela outra. Igreja e família não são concorrentes, mas também não se confundem.

– Jesus deixou isto bem claro em diversas oportunidades em Seu ministério. Ainda na adolescência, fez questão de deixar claro aos Seus (supostos) pais que a Sua vida ministerial não poderia ser absorvida pela Sua vida familiar (Lc.2:49), algo que, depois, foi repetido durante o Seu ministério terreno (Lc.8:19-21).

– Mesmo na cruz, como já dissemos neste estudo, Jesus bem separou as Suas responsabilidades familiares das Suas responsabilidades como o Salvador do mundo, cuidando de cada coisa a seu devido tempo. Assim, ao entregar Sua mãe aos cuidados de João, dirigiu-se a Maria e a João, enquanto que, ao lançar o perdão sobre a turba que O crucificava, ao cumprir as Escrituras, tomando o vinagre e fel, bem como ao dar a Sua obra como consumada e entregar Seu espírito ao Pai, pronunciou em brados, para que todos O ouvissem, pois eram palavras e gestos relativos à humanidade como um todo. Até mesmo para alcançar a salvação de Sua família, revelou-Se de forma especial e não explicitada na Bíblia a Seu irmão mais velho, Tiago (I Co.15:7).

– Além de ter, pessoalmente, dado o exemplo a respeito da distinção entre família e igreja, Jesus, também, deixou ensinos sobre este tema. Dentro deste contexto, entendemos, perfeitamente, as afirmações de Jesus segundo as quais aquele que não deixar sua família, não pode servir a Deus (Mt.10:35-38).

– Esta passagem, que é tão mal interpretada por alguns, Jesus não está desconsiderando a família, o que seria um contrassenso absoluto, já que, como vimos, todo Seu ministério foi de incentivo, estímulo e de proteção à família, mas, sim, está Jesus nos indicando que a vida familiar não pode anular a vida da igreja, não pode absorver a vida eclesiástica.

– Na igreja, no servir a Jesus, devemos pôr Deus em primeiro lugar, não podemos deixar que as relações familiares venham a ser o parâmetro das atitudes da Igreja. Se, na igreja, passarmos a agir em função das nossas relações familiares, perderemos o alvo da vida eclesiástica.

– A igreja tem como missão a salvação das almas e o aperfeiçoamento espiritual dos crentes e, muitas vezes, para atingirmos este objetivo, teremos de deixar de lado, teremos de desconsiderar laços familiares, relacionamentos de família. Quem ama mais estes laços e relacionamentos do que as almas perdidas e necessitadas de salvação ou aperfeiçoamento, não é digno do Senhor. É, por isso, com preocupação que temos observado a influência desmedida de relações familiares nas igrejas locais, a trazer grande prejuízo para a obra do Senhor, como, aliás, ocorreu na vida dos juízes Eli e Samuel.

– Da mesma forma que a família não pode interferir na igreja, a igreja não pode interferir na família. Lembremos, uma vez mais, de que Jesus, antes de cumprir o que faltava das profecias a Seu respeito e de dar o brado final, consumando a Sua obra, preocupou-Se em amparar a Sua mãe e de que, antes de subir aos céus, preocupou-Se em salvar os Seus irmãos carnais. Assim, ao contrário do que muita gente pensa, Jesus, a quem incumbia salvar toda a humanidade, colocou, em primeiro lugar, Deus em Sua vida; depois, não a Sua missão, mas, sim, a Sua família carnal, depois a Sua missão. Se Ele é nosso exemplo, devemos, também, colocar a família, abaixo de Deus, como a nossa prioridade segunda da vida e, só depois, a igreja local.

– A família existe antes da igreja, foi institucionalizada antes e, portanto, na ordem de prioridades do crente, deve estar antes da igreja local. Um dos grandes equívocos dos nossos dias está em se tentar desvirtuar esta ordem, que é bíblica, estabelecendo uma inexistente proeminência da igreja sobre a família, a começar dos obreiros, daqueles a quem é cometido o governo da igreja. Com relação a estes, a Bíblia não deixa margem a qualquer dúvida: só pode ser obreiro quem administra bem a sua casa, só pode governar bem a casa de Deus, quem, antes, governa bem a sua própria casa (I Tm.3:4,5).

– Nos dias da igreja primitiva, onde os templos eram raríssimos e as igrejas locais se reuniam em casas (At.5:42), como poderia ter havido o crescimento da obra de Deus, como poderia o mundo de então ser evangelizado se não se desse prioridade às relações familiares ?  – O progresso da igreja, nos dias apostólicos, somente foi possível porque os crentes daqueles dias puseram a família na ordem de suas prioridades antes mesmo da igreja local, até porque, no ambiente de contínua perseguição e dispersão daqueles dias (At.8:1; Ap.2:10), as igrejas locais eram instáveis e, se não tivessem sólida estrutura familiar, jamais poderiam ter suportado a pressão das autoridades romanas. A propósito, nas catacumbas de Roma, as inscrições revelam ter havido uma intensa vida familiar entre os crentes, o que tem sido considerado um dos principais fatores para a sobrevivência da igreja nos três primeiros séculos da era cristã na então capital do mundo.

III – A FAMÍLIA COOPERANDO COM A IGREJA  

– Conforme temos visto, família e igreja são instituições que não se confundem, que não podem ser absorvidas uma pela outra, mas que se interdependem, isto é, que devem existir ao mesmo tempo, cooperando uma com a outra. Assim ocorreu no ministério de Jesus Cristo e na igreja primitiva, assim deve ocorrer entre nós.

– A família pré-existe à igreja como instituição, como também já vimos neste estudo. Deste modo, toda e qualquer igreja local será constituída de famílias, famílias que, nem sempre, estarão totalmente integradas na igreja local, já que, em mais uma demonstração de que família e igreja não se confundem, Jesus, de modo realista, afirmou que, por causa do Evangelho, haverá, em alguns lares, dissensão, pois a salvação é individual e, embora seja objetivo e propósito do Senhor a salvação de todos os integrantes do grupo familiar, isto, às vezes, não acontecerá (Mt.10:34-36; Lc.12:49,51-53). De qualquer forma, a igreja sempre será constituída de famílias e deverá levar em consideração esta estrutura familiar o seu dia-a-dia, no cumprimento da sua missão.

– Sendo pré-existente à igreja e não se desfazendo como grupo social, mesmo quando totalmente integrada à igreja, a família exerce um papel primordial para a vida da igreja local. É impossível que surja alguma igreja sem família, daí porque ser fundamental que a família colabore e coopere para a igreja, inclusive porque, sem a família, a igreja simplesmente não existirá.

– É neste passo, portanto, que devemos repudiar, com veemência, práticas religiosas que têm como finalidade a exclusão do integrante do grupo social religioso do seu convívio familiar. Alguns têm defendido esta prática com base numa distorcida interpretação da passagem de Lc.14:26, segundo a qual, a vida cristã estaria em contradição com a vida familiar, o que, entretanto, não é verdade. O texto nada mais fala senão que devemos dar prioridade a Deus sobre todas as coisas, mas jamais diz que a condição para que alguém sirva a Jesus é a de abandonar a sua família, tanto que o texto fala em aborrecer familiares e a si mesmo. Seguindo o raciocínio destas pessoas, então, para se servir a Jesus, era preciso se suicidar ou odiar a si mesmo? Claro que não! Por isso, não podemos concordar com estas práticas e atitudes que, lamentavelmente, às vezes, não mal interpretadas no meio do povo de Deus, trazendo enormes dissabores e comprometendo muitos ministérios.

OBS:  Não é coincidência que os grupos religiosos que mais propiciam esta exclusão do meio familiar sejam, precisamente, os adeptos do reverendo Moon e os mórmons, estes para a realização da “missão” a que são incentivados e estimulados os adolescentes ao término da adolescência e aqueles, de forma radical, com abandono puro e simples da família atual, grupos estes que, como vimos na lição 1, têm conceitos deturpados a respeito do papel da família. Já os espíritas kardecistas superdimensionam o papel da família para subjugá-la à vontade dos “espíritos familiares”, escravizando a família aos demônios, que é a verdadeira identidade destes “espíritos”.

– A igreja, como vimos, nasceu em famílias, famílias estas que sempre foram respeitadas e mantidas tanto por Jesus como pelos Seus discípulos, na continuidade do trabalho do Mestre. A igreja, após a morte de Jesus, passou a se reunir numa casa, o cenáculo, onde, aliás, como um conjunto de famílias, receberam o batismo com o Espírito Santo (At.1:14; 2:1,4) e passaram a gozar de uma vida de adoração contínua na presença do Senhor (At.42-47; 5:42).

– A família, portanto, simplesmente por existir, já está contribuindo para o êxito da igreja local, já que sua existência permite que haja igrejas locais. Sem a família, a igreja, simplesmente, não existirá e não poderá cumprir o seu papel. Eis um dos mais importantes motivos para que o diabo tente destruir as famílias, pois, em as destruindo, estará atingindo, de modo fatal, as igrejas locais.

– Ouvimos, certa feita, com tristeza o testemunho de um grande líder das Assembleias de Deus que visitou uma igreja local em uma determinada cidade dos Estados Unidos. Ali chegando, o líder percebeu que a igreja era formada tão somente por pessoas idosas, não havendo qualquer jovem. Ao término da reunião, em conversa com o dirigente daquela igreja, perguntou-lhe sobre a juventude daquela comunidade e, aos prantos, o pastor daquela igreja disse ao convidado brasileiro que toda a juventude daquela igreja estava no mundo, todos haviam se afastado da igreja e aquela igreja local estava fadada a desaparecer em poucos anos, realidade, aliás, que pudemos vislumbrar, no funeral de uma estimada e querida irmã, que pertencia a uma comunidade estrangeira na capital paulista, cuja igreja, simplesmente, desapareceu, já que não houve continuidade na adoração a Deus por parte das gerações seguintes dos imigrantes.

– A primeira forma de a família cooperar com a igreja local é sendo, efetivamente, um altar para a operação do Senhor. Deus quer que cada família seja uma igreja, isto é, que, em cada família da igreja local, exista uma atmosfera de adoração a Deus.

– A família precisa ter uma vida espiritual, cada um dos integrantes da família deve compartilhar de momentos de oração, de meditação na Palavra de Deus, de manifestação do poder do Senhor. Se a família for um altar na presença de Deus, todos os integrantes irão, desde o seu lar, levar uma brasa acesa para as reuniões e atividades da igreja local e a reunião de brasas acesas produzirá, inevitavelmente, um incêndio espiritual de grandes proporções.

– Se cada crente, já em sua casa, tiver o fervor do Espírito, não há como impedir uma operação, uma demonstração de poder e de Espírito nas reuniões e atividades da igreja local. Na igreja primitiva, as igrejas já estavam em casa, ou seja, ali mesmo, nas casas, Deus já estava presente e Se fazia manifestar pelo Seu Espírito. Muito da fraqueza e vulnerabilidade das igrejas dos nossos dias está, precisamente, no fato de que as famílias, os lares que compõem a igreja local, serem lugares totalmente secularizados, ou seja, os lares dos crentes tornaram-se um ambiente mundano, um lugar profano, um recinto onde não se sente nem se invoca a presença de Deus.

OBS: “…O terceiro desafio que a família enfrenta hoje, na minha visão, é a questão do secularismo. Esse tem sido um desafio que a família tem enfrentado. O secularismo afasta o homem de Deus. O secularismo transmite a mensagem de que não precisamos de Deus. É preciso que as famílias cultivem os valores espirituais no lar. Temos cometido o pecado de associar o ‘espiritual’ somente aos ambientes eclesiásticos.

A família deixou de ser um lugar de adoração, de ensino religioso, de transmissão das verdades do evangelho, de evangelização e ação missionária. Precisamos, como famílias, cultivar a fé em nossos lares. Para fundamentar essa premissa, com certeza o livro de Deuteronômio é o mais apropriado. Além dos conceitos encontrados em Deuteronômio, podemos ter outros belos exemplos de famílias bíblicas que não se descuidaram dessa área.…” (Gilson BIFANO. A família e os desafios de um novo tempo. http://www.clickfamilia.org.br/familia/index_lista_resultado.asp?ID=620 Acesso em 09 mar.2004).

– É interessante notar que, no princípio da história da humanidade, a adoração a Deus é vinculada à vida em família. Diz-nos a Escritura que, quando nasceu Enos, o primeiro filho de Sete, começou-se a invocar o nome do Senhor (Gn.4:26), afirmação que nos leva a crer que a invocação a Deus foi resultado da formação de uma nova família nuclear, agora abençoada com um filho.

– É necessário que nossa família seja um verdadeiro “lar”. “Lar” é uma palavra latina cujo significado primeiro é o de um local, nas antigas residências romanas, em que se procedia à adoração dos antepassados familiares. Normalmente, como nos ensina o historiador francês Foustel de Coulanges em seu livro “A Cidade Antiga”, havia um compartimento nas casas romanas onde somente poderiam entrar os membros da família, onde eram cultuados os antepassados familiares, os chamados “deuses lares”. Normalmente, havia um altar em honra a estas divindades e um fogo que nunca se apagava, onde se realizava tal adoração.

– Vê-se, portanto, que a ideia do “lar” está vinculada a ideia de uma ligação espiritual entre os membros de uma mesma família, ou seja, o lar é a própria unidade espiritual dos integrantes de uma família. Para os romanos, a família possuía, sobretudo, um vínculo sobrenatural entre os seus membros, tendo sido os próprios juristas romanos que tornaram célebre a famosa definição de casamento, atribuída a Modestino, segundo a qual o casamento estabelece a “união divina e humana que gera uma vida em comum entre um homem e uma mulher”, definição que foi parcialmente acolhida pelo nosso novo Código Civil no seu artigo 1511.

– Deste modo, a primeira cooperação que a família pode dar à igreja é a de ser um lar onde o fogo do Espírito Santo nunca se apague, o de ser um altar dedicado a Deus. É por isso que Josué podia dizer que, ainda que os demais israelitas escolhessem servir a outros deuses, sua casa continuaria servindo ao Senhor (Js.24:15) e porque a igreja não sucumbiu quando ocorreu a primeira grande perseguição, que procurou isolar os apóstolos do restante dos crentes. A força da igreja não pode estar na sua liderança, no seu governo, mas em cada família que a compõe.

– A segunda forma de cooperação da família com a igreja local é o bom testemunho. Naturalmente, se há uma vida de adoração entre os integrantes da família, se todos servem a Deus, oram e meditam na Sua Palavra, teremos, inevitavelmente, a  manifestação do fruto do Espírito na vida desta família. A família dará um bom testemunho, praticará boas obras que farão com que os homens glorifiquem a Deus (Mt.5:16). A importância do testemunho é tanta que a Bíblia Sagrada diz que o testemunho do crente entre os seus familiares que não são crentes é fundamental para a salvação dos demais integrantes da família (I Co.7:16; I Pe.3:1).

– Se um integrante da família tem este poder e autoridade, que dizer de uma família inteira? A família de Filipe era uma referência na igreja de Cesareia (At.21:8,9), com certeza, a fonte de autoridade de seu ministério ali, como, via de regra, deve ser a família de todo obreiro (I Tm.3:4,5).

– A terceira forma de cooperação da família com a igreja local é a educação doutrinário-religiosa dos integrantes da família, mais precisamente, dos filhos pelos pais ou, então, dos integrantes crentes mais antigos em relação aos novos convertidos. Já vimos na lição 1 que uma das principais funções da família é a educação, ou seja, a socialização, a transmissão das regras e o ensino do modo de vida em sociedade.

– A família deve, também, transmitir a Palavra de Deus às crianças e aos jovens e adultos neoconversos, de modo a incutir-lhes a vontade de Deus através das Sagradas Escrituras. Esta é uma atividade que é, precipuamente, da família, que não poderá ser, em absoluto, substituída por qualquer departamento ou segmento da igreja local. Como já vimos na lição 8, a igreja apenas complementa esta educação, seja através das reuniões de ensino, seja por meio de um segmento de discipulado e integração, seja, ainda, através da Escola Bíblica Dominical.

– Muito da fraqueza e vulnerabilidade da igreja de nossos dias está no fato de que as famílias têm delegado a educação cristã para a igreja local, que não tem estrutura nem condições de substituir o papel familiar, pois o ensino das Escrituras exige um companheirismo, uma comunidade de vida que só se tem no ambiente familiar. Por isso, aliás, Moisés, ao instruir o povo de Israel, disse que o ensino da Palavra deve se dar em todas as ocasiões, desde o levantar até o deitar, dentro das portas da casa, ou seja, num clima de intimidade (Dt.6:6-9).

– A quarta forma de cooperação da família com a igreja local é a sua presença regular nas reuniões e atividades da igreja. Sem que a família participe das atividades e reuniões da igreja local, não há como a igreja, que é formada de famílias, poder cumprir o seu propósito de evangelização e de aperfeiçoamento espiritual dos crentes. É preciso que a família participe ativamente de todas as reuniões e atividades da igreja local. É verdade que, muitas vezes, as reuniões da igreja são direcionadas para esta ou aquela faixa etária, mas, neste ponto, é preciso que a liderança da igreja saiba ser equilibrada no tocante a tais reuniões e elabore um planejamento que impeça que haja uma concorrência entre a vida familiar e a vida da igreja local.

– O pastor batista Gilson Bifano chegou, mesmo, a defender a ideia de que a igreja local deva fechar suas portas um dia por semana, caso se perceba que a programação de atividades impeça que as famílias da igreja se reúnam um dia, completas, em seus lares, para o culto doméstico ou qualquer outra atividade. A departamentalização excessiva das igrejas e a formação de verdadeiros guetos nas igrejas locais não é um fenômeno que contribua para que as famílias possam participar das atividades da igreja, reunidas, de forma que algo que tem de ser repensado.

– Hoje temos cultos da mocidade, quando os cultos deveriam ser com a mocidade; cultos dos adolescentes, quando os cultos deveriam ser com os adolescentes; culto das irmãs, ou dos varões, quando deveriam ser cultos com as irmãs ou com os varões. Um bom modelo a ser seguido é, precisamente, o da Escola Bíblica Dominical, onde, apesar do respeito às especificidades de cada faixa etária e de gênero, as famílias não são repartidas nem desunidas na igreja local.

– A quinta forma de cooperação da família com a igreja local é a contribuição financeira. A igreja, como sabemos, enquanto organização, é uma pessoa jurídica e, como tal, depende de recursos materiais para a sua subsistência. Como ensina conhecido líder das Assembleias de Deus no Brasil, “Deus é o dono da prata e do ouro, prata e ouro que colocou no bolso dos crentes”. Por isso, é indispensável que, na organização do orçamento familiar, as famílias participantes da igreja local não se esqueçam de providenciar recursos para a igreja, seja através do dízimo, seja através de contribuições voluntárias, seja, ainda, através de uma verba que permita a ajuda aos necessitados, muitas vezes, outras famílias que, em extremas dificuldades, precisarão do apoio econômico-financeiro da igreja local. Aliás, é desta contribuição que dependerá a própria realização de uma das tarefas da igreja local, que é a assistência social aos necessitados.

– A sexta forma de cooperação da família com a igreja local está na abertura de espaço do lar para a evangelização. As famílias devem abrir suas portas para que a igreja efetue seu trabalho de evangelização e de discipulado e integração dos novos convertidos. Na medida do possível e dentro das possibilidades de cada casa, devem os familiares colaborar com o trabalho de evangelização da igreja local, disponibilizando seus lares para a realização de cultos de pregação da Palavra de Deus, como também para a realização de reuniões de oração e de estudo da Palavra de Deus, sempre sob a supervisão e coordenação da liderança da igreja.

– Muitas vezes, em virtude das dificuldades trazidas pelo trabalho de cada um, pela própria distância de certas áreas do templo da igreja local ou outras dificuldades, torna-se impossível a frequência de determinado segmento da igreja a algumas reuniões da igreja local. As famílias devem estar sensíveis a isto e se colocar à disposição para suprimento destas deficiências, visando, sempre, o crescimento da igreja local, tanto na quantidade, quanto na qualidade.

– A sétima forma de cooperação da família com a igreja local está na hospitalidade. As famílias devem abrir suas portas para hospedar visitantes e convidados de outras comunidades quando da realização de grandes reuniões e festividades na igreja local. Sabemos que os dias são trabalhosos e, mormente nas grandes cidades, impregnadas de violência e criminalidade, a prática da hospitalidade tem exigido um critério cada vez mais rigoroso e, não raro, passa a ser algo totalmente inexistente no nosso meio. Entretanto, cabe às famílias, com prudência, promover esta atividade, que muito contribuirá para o bem-estar dos domésticos da fé e para a própria qualidade do trabalho que estará se desenvolvendo.

IV – A IGREJA COOPERANDO COM A FAMÍLIA  

– Mas não é apenas a família que tem de cooperar com a igreja, mas esta também tem de cooperar com a família, até porque, sem igreja, a família existirá, mas jamais o contrário será visto. A igreja que não cuida da família, como vimos supra, está fadada ao desaparecimento.

– A primeira forma de cooperação da igreja com a família é a consideração da sua estrutura familiar. Jamais a igreja local poderá tomar qualquer atitude, qualquer medida sem levar em conta o que isto representará para as famílias de que se compõe. A liderança da igreja deve sempre, em seu planejamento, ter como fator relevante de toda e qualquer medida a ser tomada qual o efeito, qual a repercussão que se terá na vida familiar de cada membro esta, ou aquela, providência.

– Não pode a liderança levar em conta os laços e relacionamentos familiares, desprezando a Palavra de Deus, mas nunca poderá ser negligente a ponto de não avaliar quais as consequências que se lançarão sobre as famílias uma certa ação. Paulo, nas saudações de suas epístolas, sempre menciona famílias e casas, a indicar que sempre levava em conta este aspecto no seu ministério.

– A segunda forma de cooperação da igreja com a família é a oração. A igreja local é formada por justos e a Bíblia nos ensina que a oração do justo pode muito em seus efeitos (Tg.5:16). Faz-se necessário que a igreja local ore continuamente pelas famílias, peça a Deus discernimento para a solução dos problemas familiares bem como identifique os dardos inflamados que o inimigo tem lançado sobre as famílias da igreja local.

– Orar pelas famílias não é apenas fazer uma oração que faça menção a isto nas reuniões, nem mesmo dedicar algum dia especial para que se façam orações em prol das famílias, mas é, sobretudo, estimular e incentivar que as famílias orem em casa e no templo, juntas. A igreja deve, sempre, despertar nos crentes um desejo e um hábito de oração, pois, sem a oração familiar, não há como a família subsistir e famílias que não oram forma uma igreja que não ora. OBS: Por sua biblicidade, reproduzimos aqui o pensamento do Papa João Paulo II a respeito da necessidade da oração familiar como base para uma igreja firme e sólida na sua missão:”…a vida de oração, (…) o diálogo orante com o Pai através de Jesus Cristo no Espírito Santo.

A oração familiar tem suas próprias características. É uma oração feita em comum, marido e mulher juntos, pais e filhos juntos. A comunhão na oração é, ao mesmo tempo, fruto e exigência daquela comunhão(…) ‘ Em verdade vos digo: onde dois ou três estiverem reunidos no meu nome, eu estarei no meio deles’. Essa oração tem como conteúdo original a ‘ mesma vida de família, que em todas as suas diferentes circunstâncias é interpretada como vocação de Deus e atua como resposta filial ao Seu apelo: alegrias e dores, esperanças e tristezas, nascimentos e aniversários de núpcias dos pais, partidas, afastamentos e retornos, escolhas importantes e decisivas, a morte de entes queridos etc., marcam a intervenção do amor de Deus na história da família, assim como devem marcar o momento favorável para a ação de graças, para a súplica, para a entrega confiante da família ao Pai comum que está nos céus. Além disso, a dignidade e a responsabilidade da família cristã como Igreja doméstica podem ser vividas somente com a ajuda incessante de Deus, que infalivelmente será concedida, se for implorada com humildade e confiança na oração.…” (JOÃO PAULO II. Meditações e orações, p.453).

– A terceira forma de cooperação da igreja com a família é o aconselhamento. A igreja local deve ter pessoas preparadas para aconselhar os integrantes das famílias, pessoas idôneas, dotadas de conhecimento e graça de Deus, que sejam referências para promoção de aconselhamento a casais, em suas dificuldades conjugais; a pais e filhos, nos problemas oriundos do conflito de gerações; aos jovens, no tocante a namoro e noivado. A liderança da igreja deve estar bem assessorada por homens e mulheres de Deus que possam servir de conselheiros a estas pessoas, pois, como nos ensina Salomão, na multidão dos conselheiros, tanto há segurança quanto os projetos se confirmarão (Pv.11:14; 15:22). Lamentavelmente, nos nossos dias, temos muitos mexeriqueiros, mas pouquíssimos conselheiros.

– É fundamental que o professor de Escola Bíblica Dominical, com o conhecimento que tem da Palavra de Deus (ou que deveria ter…), seja um daqueles que assuma esta posição. É inegável que o principal conselheiro deve ser o dirigente da igreja local, mas, também, é preciso que haja outros que o estejam auxiliando, até porque a Bíblia fala em multidão de conselheiros, a indicar que esta tarefa deve ser exercida por várias pessoas e não só uma. É preciso que, nos diversos departamentos da igreja, haja pessoas abalizadas para promover aconselhamentos familiares. O aconselhamento envolve não só um conselho pedido e esporádico, mas um acompanhamento de perto, bem como uma contínua oração de intercessão.

– A quarta forma de cooperação da igreja com a família é a visita. Dissemos que cada família deve ser um altar dedicado ao Senhor, deve ser o início da igreja, pois, como ensina um grande líder das Assembleias de Deus, a igreja não começa na porta do templo, mas na casa de cada um de nós. Se a família é uma extensão da igreja local, não pode ficar à mercê da igreja, deve ser, constantemente, visitada pela igreja local, a fim de que sejam aumentados os laços da família com a igreja, bem como se crie um efetivo comprometimento da família com a obra de Deus.

– Notadamente as famílias necessitadas e as que estão sob acompanhamento devem ser alvo de visitas por parte da liderança da igreja local, a fim de que o trabalho que está sendo realizado seja verificado “in loco”. Naturalmente que tais visitas não devem ser pretextos para invasão de privacidade e desrespeito à intimidade, algo que jamais a igreja poderá fazer, porquanto isto seria uma total desconsideração da estrutura familiar, mas é preciso que haja este acompanhamento e esta verdadeira demonstração de amor.

– Infelizmente, as visitas têm sido cada vez mais raras no nosso meio, o que tem contribuído para o enfraquecimento espiritual das igrejas locais, pois, sem qualquer demonstração de afeto e de cuidado, a tendência das famílias é se distanciarem cada vez mais das igrejas locais. Quando surgem movimentos como o G-12, devemos tributar muito de seu sucesso e encanto, precisamente pelo fato de que tais movimentos resgatam a afetividade, a proximidade entre família e igreja, algo que a liderança das igrejas locais, ultimamente, tem negligenciado e deixado de lado. Na igreja primitiva, havia uma comunhão tão intensa entre lares e igreja local, que Lucas colocou a atividade da igreja em pé de igualdade, dizendo que o anúncio do Evangelho e o ensino da Palavra de Deus se davam tanto no templo, quanto nas casas (At.5:42).

– O relacionamento na igreja local deve ser afetuoso, uma verdadeira extensão de nosso lar. É este o ambiente que deve imperar nas igrejas locais, pois é o ambiente da igreja primitiva, que é o modelo bíblico para as nossas igrejas (At.2:44). Nos dias de consumismo e materialismo que vivemos, esta passagem bíblica é vista apenas do ponto-de-vista material, havendo, mesmo, quem tenha defendido que havia um comunismo nos primórdios da igreja cristã, mas muito mais importante do que uma comunidade material, o que devemos observar na igreja primitiva de Jerusalém era um ambiente de fraternidade, de amizade, de intimidade emocional e psicológica.

– Nossas igrejas locais (principalmente as grandes congregações) estão longe desta realidade, o que tem sido uma grande oportunidade que se tem dado para o fracasso dos relacionamentos e para o prejuízo da própria obra de Deus. Nos dias de competição acirrada que vivemos, de desumanização de todos os relacionamentos, em que os homens, já movidos pelo espírito do anticristo, tornam-se cada vez mais mercadorias (Ap.18:11,13), é triste contemplarmos a frieza dos relacionamentos interpessoais nas igrejas locais.

– Muitos crentes, hoje em dia, têm mais intimidade com os colegas de trabalho, com os vizinhos, do que com seus irmãos na fé. Faz-se preciso que combatamos este estado de coisas, pois não podemos andar segundo o curso do mundo (Ef.2:2), mas, sim, segundo a direção do Espírito de Deus, cuja atuação é, exatamente, no sentido contrário ao que estamos vendo hoje em dia. OBS: “…Alguns Pastores erram por deixarem de ser evangelistas, achando que evangelizar de casa em casa, de cidade em cidade, ensinando individualmente ou fazer campanas para multidões não é mais necessário. Tais Pastores preferem pagar alguém que faça a função de conquistar almas ou deixar a Igreja local perecer por falta de crescimento. Ocupam-se os mesmos em administrar o patrimônio da Igreja e se esquecem do principal: a oração, a Palavra e o objetivo primeiro da Igreja: almas para Cristo(…). O verdadeiro evangelista ocupa-se em que as pessoas conheçam o Evangelho de Jesus Cristo. Este trabalho pode ser feito de porta em porta, falando individualmente com pessoas, numa reunião social ou familiar, através dos meios de comunicação etc.(…). O evangelismo não pode estar preso dentro das quatro paredes do templo, embora ali também podemos ganhar os que congregam que ainda não alcançaram o novo nascimento. Podemos ganhar almas dentro da igreja, mas o campo é o mundo.(…). Deixo aqui o testemunho que obtivemos no campo da Assembleia de Deus na região de Sorocaba, São Paulo.

Formamos um grupo de Pastores e Evangelistas, consagramo-nos em oração e meditação da Palavra de Deus, em um lugar à parte. Fazíamos isso todas as manhãs; à tarde, saíamos de casa em casa em diversas cidades e distritos da região, convidando pessoas para ouvirem o Evangelho na reunião da noite, mas, ao mesmo tempo, durante as visitas, já evangelizávamos, orávamos pelos enfermos, levávamos alimentos, roupas e calçados e fazíamos aconselhamentos.

Grande foi o número de ovelhas desgarradas que voltaram para o convívio da irmandade da Igreja, e pessoas que nunca haviam ouvido falar do Evangelho aceitaram a salvação do Senhor. Ao fim de dois meses, já havíamos passado mais de quarenta lugares e, como resultado, mil quinhentas e oitenta e cinco almas aceitaram a Jesus como Salvador, e dezenas de pessoas foram curadas e muitas foram batizadas com o Espírito Santo. Esse trabalho evangelístico recebeu o nome de CARAVANA DO AMOR; fazíamos a obra evangelística e assistência social.…” (SILVA, Osmar José da. Reflexões filosóficas de eternidade a eternidade, v.6, p.115-20).

– A quinta forma de cooperação da igreja com a família é o ensino do modelo bíblico de família. A igreja local deve, periodicamente, promover o ensino doutrinário a respeito da família, promovendo reuniões que orientem e instruam os crentes como deve ser a vida familiar. Este estudo do modelo bíblico da família deve ser feito tanto sob o aspecto dito problemático, ou seja, diante de problemas que surjam no seio da igreja local e que requerem um ensino tópico e imediato (algo a ser feito nos cultos de ensinamento); seja sob o aspecto dito temático, ou seja, mediante reuniões específicas e com certa periodicidade, a fim de que trazer informações que devem ser sempre repisadas e mostradas a todos os membros da igreja local, se possível, de forma separada por faixa etária, gênero e estado civil e, posteriormente, em conjunto, reuniões como os “seminários da família”, “encontros de casais”, palestras em congressos de jovens e/ou de adolescentes etc.

– Deve haver, também, um espaço na EBD para que estes assuntos sejam tratados, quando se verificar uma carência neste sentido, o que deverá ser observado tanto pelo professor quanto pelo superintendente da EBD. Por fim, e neste ponto nossa denominação tem deixado muito a desejar, é mister que se faça um acompanhamento todo especial junto aos jovens que estão namorando e entre os noivos, ministrando-lhe ensinamentos específicos a respeito do casamento e da vida conjugal antes que venham receber as bênçãos da igreja por ocasião do matrimônio.

– A experiência católico-romana dos “cursilhos” é uma atividade que deve ser inserida em nosso cotidiano, dentro daquilo que nos ensinou o apóstolo Paulo: “examinai tudo e retende o bem” (I Ts.5:21). Aliás, já há algumas Assembleias de Deus que assim têm agido, o que merece nossa congratulação.

– A sexta forma de cooperação da igreja com a família é a preservação da sua intimidade. É imperioso, fundamental que os assuntos e temas familiares sejam tratados com sigilo, com respeito à intimidade de seus integrantes, sem exposição, constrangimento ou vexame perante a igreja local e perante a sociedade como um todo. Neste ponto, devemos lembrar que, nos lares romanos, somente os membros da família tinham acesso, ou seja, é preciso que delimitemos, em nossas famílias, um terreno para a nossa intimidade.

– Jesus, mesmo, quando nos falou da oração, disse que deveria haver um espaço para uma intimidade nossa com Deus, um “aposento em secreto” onde desfrutássemos de um momento a sós com Deus, algo que não somente ensinou, mas também praticou (Lc.22:39-41). Esta intimidade, portanto, se foi respeitada e delimitada por Nosso Senhor e Salvador, jamais deve ser ultrapassada pela igreja local, que deve cuidar para que, sempre, os umbrais das portas das famílias não sejam devassados pela curiosidade pública.

– Certa feita, lemos uma entrevista de uma filha de pastor que estava extremamente ressentida com a igreja, precisamente porque, segundo ela, tratam a família do dirigente da igreja local não como um exemplo, mas como uma vitrine que deve estar à exposição contínua dos membros. Sem dúvida alguma, este tem sido o comportamento de muitos nas igrejas locais, com os quais não podemos concordar.

– A sétima forma de cooperação da igreja com a família é a criação de um espaço, de condições para que o dirigente da igreja local tenha uma vida familiar sadia e exemplar. Nos Estados Unidos, é comum que os dirigentes de igreja tenham um dia semanal de folga, um dia que se dediquem a suas famílias, um dia em que não exercem qualquer atividade na igreja local. Sabemos que, se algum dirigente de igreja no Brasil, isto pleitear, será, inevitavelmente, tachado de mercenário, de profissional, de mau obreiro e, certamente, se insistir em sua ideia, acabará sendo afastado da liderança, o que é assaz lamentável.

– Um dos requisitos para se galgar o ministério é, precisamente, o de bem governar a sua casa, algo que não deve haver apenas para que alguém seja consagrado ou separado ao ministério, mas algo que deve permanecer durante o ministério, pois daí advém a própria autoridade ministerial do obreiro. Lamentavelmente, a nossa cultura tem sufocado os princípios bíblicos e o obreiro, assoberbado de atividades e tarefas, acaba não tendo tempo de cuidar de sua família, que, carente e necessitada, acaba redundando em fracassos espirituais de seus componentes, pois o dirigente de igreja é tão humano quanto os demais membros da igreja local.

– Eis o motivo pelo qual muitos obreiros têm sua autoridade moral extremamente reduzida, já que seus filhos estão no mundo e, não raro, seus casamentos são meros relacionamentos de fachada, quando não se desfazem publicamente. É preciso que a igreja local coopere com a vida familiar do obreiro, permitindo que ele seja um sacerdote em seu lar e que haja espaço na sua agenda para ele se dedicar a seu cônjuge, a seus filhos e a seus pais.

 Ev. Dr. Caramuru Afonso Francisco  

Fonte: http://www.portalebd.org.br/files/2T2013_L12_caramuru.pdf

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