LIÇÃO Nº 2 – DEUS, O PRIMEIRO EVANGELISTA
Deus foi o primeiro a pregar o Evangelho ao homem.
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INTRODUÇÃO
– A salvação do homem por Cristo Jesus era um mistério que só foi plenamente revelado com a encarnação do Verbo.
– O primeiro a pregar o evangelho ao homem foi o próprio Deus no Éden.
I – O PROTOEVANGELHO
– Na continuidade do estudo sobre o desafio da evangelização, estaremos a observar que a pregação do Evangelho teve início com o próprio Deus, daí porque, como dissemos na lição anterior, ser uma tarefa que o homem, por si só, não pode exercer, a menos que tenha a direção, orientação, cooperação e companhia do próprio Senhor, já que se trata de uma tarefa que era inicialmente divina.
– Vimos, na lição anterior, que a salvação da humanidade já havia sido prevista por Deus desde a fundação do mundo.
Dentro de Sua presciência, de Sua onisciência, antes mesmo de criar todas as coisas, o Senhor já sabia que o homem haveria de pecar e que necessitaria ser salvo, para voltar a ter comunhão com Deus.
– Já na eternidade passada, antes mesmo que todas as coisas fossem criadas, o Senhor já sabia que deveria salvar o homem que haveria de criar e que esta salvação se daria por intermédio de Cristo Jesus, o Filho, a segunda pessoa da Triunidade Divina.
– É este o ensino de várias passagens bíblicas, a começar por Ef.1:4, quando o apóstolo Paulo diz que fomos eleitos em Cristo antes da fundação do mundo para que fôssemos santos e irrepreensíveis diante d’Ele em caridade.
Isto mostra claramente que, antes mesmo da criação, Deus já havia escolhido o ser humano para ser salvo na pessoa de Jesus.
– Pedro, também, em I Pe.1:18-20, fala-nos que Deus já sabia que Jesus seria o Cordeiro imaculado e incontaminado, ainda antes da fundação do mundo e que resgataria o homem da sua vã maneira de viver, por intermédio do derramamento do Seu sangue em prol da humanidade.
– João, na revelação que teve do próprio Cristo, também nos informa que Jesus foi morto desde a fundação do mundo (Ap.13:8), mais uma nos indicando que a salvação na pessoa do Senhor Jesus já era do pleno conhecimento de Deus mesmo antes da criação.
– Por isso, quando o homem pecou no Éden, Deus não foi tomado de surpresa. Não se tratava de fazer um “plano B” para resolver o problema surgido com a queda do primeiro casal, pois tudo já estava previsto pelo Senhor que tão somente, no instante mesmo do juízo lançado sobre o primeiro casal, tornou conhecido este Seu plano para a humanidade.
– Este anúncio da salvação foi feito quando o Senhor Se dirigiu à serpente e afirmou que seria posta inimizade entre ela e a mulher, pois a semente da mulher feriria a cabeça da serpente e esta lhe feriria o calcanhar (Gn.3:15).
– Este é o primeiro anúncio das boas novas da salvação, o primeiro anúncio do Evangelho ao homem, o que é denominado de “protoevangelho” (o primeiro evangelho).
Vemos, portanto, que a evangelização tem origem em Deus, é uma tarefa inicialmente divina e, como tal, é algo que está além da condição humana, motivo por que jamais poderá ser exercido por qualquer ser humano se não tiver a direção, orientação e a cooperação do próprio Deus.
– Neste primeiro anúncio do Evangelho, tendo sido feito pelo próprio Deus, pode nos dar importantíssimas lições a respeito de como devemos evangelizar.
– A primeira circunstância que nos chama a atenção é de que Deus fala a respeito desta salvação.
Não escolheu interlocutores, Ele próprio anunciou a notícia da salvação. O Evangelho é a própria Palavra de Deus e, por isso mesmo, em sendo uma revelação de Deus ao homem, de modo que não há como evangelizar sem se ter como base a Bíblia Sagrada, que é a Palavra de Deus, a verdade (Jo.17:17).
– A segunda circunstância é que Deus, ao fazer o anúncio da boa notícia da salvação para a humanidade, não está Se dirigindo ao primeiro casal, mas, sim, à serpente, ou seja, Satanás, que havia sido o responsável pela tentação que levara o primeiro casal à queda.
– Por que Deus Se dirigiu ao diabo e não ao primeiro casal, já que, afinal de contas, se tratava de uma boa nova para a humanidade e não para o inimigo de nossas almas, que não tem qualquer chance de salvação?
– Por primeiro, porque se tratava de mostrar ao diabo que a queda do homem não havia sido uma vitória para o diabo, como ele pensara, mas, sim, algo que se encontrava devidamente previsto por Deus e que não alteraria em coisa alguma o plano de Deus para com o homem, para estabelecer a comunhão entre Deus e a humanidade, humanidade que teria uma posição ainda mais excelente que a que o querubim ungido, agora caído, havia tido nos céus.
– O anúncio do Evangelho, portanto, mostra-nos, num primeiro instante, que Deus é soberano e que nenhum dos Seus pensamentos pode ser impedido (Cf. Jó 42:2). O Evangelho é uma manifestação da soberania divina, de Seu senhorio.
– Verificamos, portanto, que o anúncio do Evangelho é, como vimos na lição anterior, é a pregação do reino de Deus, de Sua soberania, de Sua majestade.
O Evangelho permite-nos participar deste reino não como inimigo, como era o caso da serpente, que sofria esta soberania na forma de ira e de castigo, mas, sim, como amigo, como alguém que é convidado a desfrutar deste reino na companhia do Rei.
– Por segundo, Deus, ao anunciar ao diabo o Seu plano de redenção da humanidade, mostra-nos que o amor de Deus é superior a todo e qualquer mal, seja das hostes espirituais da maldade, seja do próprio pecado na humanidade, de modo que nada pode superar este amor e o Evangelho é a demonstração deste amor, algo em que podemos crer, confiar.
Não é à toa que o Senhor Jesus, ao pregar o Evangelho do reino de Deus, convidou todos a crer no Evangelho (Mc.1:15).
– O apóstolo Paulo afirmou que nada nos poderá separar do amor de Deus que está em Cristo Jesus, nosso Senhor (Rm.8:39) e esta evidência já se demonstrara no “protoevangelho”, pois, ao dizer para o próprio inimigo que a semente da mulher iria ferir a cabeça da serpente, Deus está a revelar que nada poderia impedir o homem de voltar a ter comunhão com seu Criador.
O Evangelho é algo em que se pode confiar, pois é garantido pelo próprio Deus.
– A terceira circunstância que verificamos no “protoevangelho” é a de que Deus disse que haveria uma inimizade entre o diabo e a humanidade, ou seja, a humanidade voltaria a ter comunhão com Deus, Satanás tornaria a ser o adversário do homem.
O Evangelho é a notícia de que haveria separação entre o homem e o maligno, haverá comunhão com Deus.
– Isto nos mostra, claramente, que o anúncio do Evangelho implica em necessária divulgação da separação entre o homem e o maligno, entre o homem e o pecado, um anúncio de que é necessário ter santidade, ou seja, separação do pecado. O Evangelho impõe que o homem se torne inimigo do mal e do pecado.
– A quarta circunstância que verificamos no “protoevangelho” é de que a salvação se dá pela “semente da mulher”, que outro não é senão o Senhor Jesus.
É a semente da mulher que proporciona a salvação da humanidade, não há nenhum outro Salvador (At.4:12).
– Quando o apóstolo Paulo afirma, em Gl.4:4, que Jesus nasceu de mulher está a confirmar esta promessa feita por Deus ao primeiro casal.
Jesus veio ao mundo, nascido de mulher, como a semente da mulher, tendo ocupado o ventre e Maria, gerado por obra e graça do Espírito Santo, para ser o Salvador do mundo.
– A salvação viria pela semente da mulher, por alguém que Se faria homem, nascendo da mulher, mas que não deveria coisa alguma à mulher para realizar a Sua missão salvífica.
Quem esmagaria a cabeça da serpente seria a semente da mulher, quem seria ferido no calcanhar seria a semente da mulher.
– A salvação teria de ser feita por intermédio de um ser humano e o ser humano teria de nascer da mulher, mas a mulher que seria o veículo da vinda do Salvador seria tão pecadora quanto Eva, “a mãe de todos os viventes”.
Por isso, não há fundamento algum para entender que Maria tenha sido “corredentora”, que necessariamente tenha de ter uma “imaculada conceição”, pois o Evangelho é o anúncio da semente da mulher, a quem cabe com exclusividade a salvação.
– O Evangelho, portanto, é a pregação a respeito da semente da mulher, é o anúncio de Jesus Cristo como único e suficiente Senhor e Salvador da humanidade.
– A quinta circunstância que se nota no “protoevangelho” é a de que a semente da mulher esmagaria a cabeça da serpente, ou seja, o Evangelho é a mensagem da vitória sobre o maligno, da vitória sobre o pecado, algo a ser realizado pela semente da mulher e que repercutiria em favor da humanidade.
– O apóstolo Paulo confirma esta circunstância quando, no final da carta aos Romanos, afirma que “o Deus de paz esmagará em breve Satanás debaixo dos vossos pés” (Rm.16:20).
A vitória sobre o inimigo é um dos elementos das boas novas da salvação, vitória esta que se deve única e exclusivamente ao “Deus de paz”, ao “Príncipe da paz”, a Cristo Jesus, a semente da mulher que esmagaria a cabeça da serpente.
– O Evangelho é a pregação da vitória de Cristo sobre o mal, o reconhecimento da impotência do homem para vencer o maligno e a sua necessária dependência de crer na obra salvífica de Cristo, obra esta que ainda não se encontra totalmente terminada, não em termos de salvação, pois a salvação está completa, a missão foi integralmente cumprida na cruz do Calvário, mas que significará a total erradicação do mal no futuro, quando o diabo e suas hostes espirituais serão definitivamente lançados no lago de fogo e enxofre, preparado para eles mesmos (Mt.25:41).
– O Evangelho, portanto, ao mesmo tempo em que traz a notícia da nossa necessária separação do mal e de que o maligno “está com os seus dias contados”, também nos mostra a extrema necessidade que temos de nos manter em Cristo para podermos vencer definitivamente o maligno, algo que ainda é futuro.
Bem se vê, portanto, que o Evangelho é totalmente diverso do triunfalismo que tantos têm pregado na atualidade.
– A sexta circunstância que se nota no “protoevangelho” é a de que a semente da mulher teria seu calcanhar ferido, ou seja, a salvação exigiria o pagamento de um preço, impunha um sofrimento por parte da semente da mulher.
O Evangelho não esconde a necessidade da satisfação da justiça divina para que se obtivesse a salvação da humanidade, pagamento a ser feito pela própria semente da mulher.
– O ferimento do calcanhar fala-nos do sacrifício de Cristo, Cristo que já fora morto desde a fundação do mundo, como já analisamos supra.
O sacrifício vicário de Cristo é uma verdade indissociável do Evangelho e não se pode jamais omitir na evangelização o pagamento dos pecados por Cristo. Não é possível um Evangelho sem cruz.
– A sétima circunstância é a de que o anúncio da salvação foi uma resposta divina à afirmação da mulher que tinha sido enganada pela serpente e comido do fruto proibido, afirmação que se seguiu à do homem que havia culpado a mulher.
O Evangelho é a resposta divina à queda do homem, é a demonstração de que Deus não ficou indiferente a este fracasso espiritual.
– O Evangelho é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê (Rm.1:16), a solução para o problema do pecado, é algo divino que nos é entregue pelo amor de Deus para que possamos superar este obstáculo que, para o homem é intransponível.
II – A PERMANÊNCIA DO EVANGELISMO DIVINO AO LONGO DA HISTÓRIA
– É importante observar que, depois de ter anunciado a boa notícia da salvação, Deus não deixou de punir o primeiro casal, com as maldições decorrentes do fato de terem pecado, mas, como uma demonstração do Seu divino amor, impediu que o primeiro casal tomasse do fruto da árvore da vida e ficasse irreversivelmente no pecado (Gn.3:22-24), lançando-o fora do Éden, a fim de lhes dar uma oportunidade de salvação, uma oportunidade de arrependimento.
– O Evangelho é o anúncio desta nova chance, desta nova oportunidade ao gênero humano. Mas, e isto é assaz relevante, ao ser lançado fora do Éden, foi determinado ao homem que lavrasse a terra de que fora tomado (Gn.3:23), precisamente o mesmo trabalho que lhe havia sido dado no Éden (Gn.2:15).
Isto nos revela que não era pelo que fizesse que o homem adquiriria a salvação, mas, sim, pela sua fé na promessa feita pelo Senhor, tendo o primeiro casal realmente crido no Evangelho, tanto que Eva festejou o nascimento de Caim, externando, assim, a esperança de que fosse este seu filho a semente da mulher (Gn.4:1).
– Vemos que o Evangelho, portanto, exige a fé em Jesus Cristo como instrumento a fazer com que alcancemos a salvação. Não é pelo que fazemos que alcançaremos a salvação, mas por crermos no Salvador.
Como afirmou Jacó Armínio: “…Por dizer ‘faça isto e viverás’ (Rm.10:5), mas o Evangelho dizer: ‘Se creres, serás salvo’.
Essa diferença se encontra não só no postulado, do qual a primeira é chamada de ‘a lei das obras’, e o Evangelho de ‘a lei da fé’ (Rm.3:27), mas também na promessa: para os quais a vida eterna foi prometida, porém, pelo Evangelho, foi concedida a partir da morte e da ignomínia, e pela lei como felicidade natural (II Tm.1:10).
Além disso, a remissão dos pecados é anunciada no Evangelho, como preparação para a vida eterna; contudo não é mencionada na lei [adâmica], porque essa remissão não era necessária para alguém que não era pecador, nem este anúncio [então] teria sido útil a ele, embora ele pudesse se tornar um pecador mais tarde.…” (DEBATE XIII – Sobre a comparação da lei e do Evangelho. In: As Obras de Armínio, v.1, p.485).
– Deus, como o primeiro evangelista, não só anunciou a boa nova da salvação por intermédio da semente da mulher, como também criou condições para que o homem pudesse crer neste Evangelho.
Demonstrou sua misericórdia e amor não só na divulgação do Seu plano, mas nas próprias atitudes que criou para que o homem pudesse crer na Sua promessa.
Não é por outro motivo que Deus demonstra Seu amor e graça em ações para que o homem possa crer na mensagem da salvação.
É o que se costuma chamar de “graça comum”. Como disse o Senhor Jesus, Deus faz que Seu sol se levante sobre maus e bons, e a chuva sobre justos e injustos (Mt.5:45).
– Deste modo, na continuidade deste anúncio iniciado pelo próprio Deus, nós, também, como evangelistas, como anunciadores das boas novas da salvação, precisamos demonstrar este amor de Deus em nossas próprias vidas, temos de ser provas vivas deste amor que proclamamos e não é por outro motivo que o Senhor exige que sejamos Suas testemunhas tanto em Jerusalém, quanto Judeia e Samaria e até os confins da terra (At.1:8).
– O nosso testemunho, portanto, é elemento indispensável para que haja êxito na tarefa da evangelização. Jesus pregou o Evangelho, mas, antes de mais nada, deu exemplo de uma conduta absolutamente agradável ao Senhor, a fim de que Sua mensagem pudesse ter autoridade diante dos destinatários da boa nova (Mt.7:28,29).
– Mas Deus não Se limitou a evangelizar no Éden. Diante de Caim, também, vemos o Senhor anunciando a boa nova da salvação, pois, quando este descaiu seu semblante e se irou fortemente, o Senhor, agindo através da consciência, concitou Caim a se arrepender, a fazer bem, pois, então, haveria aceitação para ele, assim como tinha havido com Abel lembrando, ainda, que o pecado jazia à porta e poderia dominá-lo se assim não fizesse (Gn.4:7).
– Temos aqui mais um anúncio da benevolência divina, da vontade de Deus de salvar o homem, de mantê-lo livre do pecado, mensagem esta que se repetiu mesmo depois do assassinato de Abel, pois, por pelo menos duas outras oportunidades, Deus deu a oportunidade a Caim para que se arrependesse, seja perguntando-lhe onde estava o seu irmão Abel (e permitindo a oportunidade de confissão do pecado), como no gesto de lhe impor um sinal que impediu que fosse ele assassinado (dando oportunidade a que se arrependesse até a sua morte física).
– Na geração antediluviana, também vemos o Senhor agindo com vistas a dar a boa nova da salvação aos homens.
O Senhor levantou Enoque para anunciar o juízo divino (Cf. Jd.14,15), anúncio que não se deveu apenas à mensagem deste primeiro profeta, mas ao próprio fato de seu filho Metuselá ser a própria demonstração desta oportunidade de salvação, já que seu nome significava “quando morrer, isto virá”, tendo sido ele o homem que mais tempo viveu sobre a face da Terra (982 anos – Gn.5:26), morrendo exatamente no ano do dilúvio.
– Como se isto fosse pouco, o Senhor também levantou a Noé, que foi o pregoeiro da justiça (II Pe.2:5), que, durante cem anos, anunciou o juízo, repisando a mensagem de seu bisavô Enoque, em mais uma oportunidade que se dava à humanidade para que se arrependesse.
– O Evangelho é esta mensagem da benevolência divina, a chance que se dá para que o homem escape da ira divina.
O fato de a geração antediluviana não ter crido nesta mensagem e de ter sofrido a manifestação desta ira foi algo que, inclusive, foi particularmente declarado quando o Senhor Jesus desceu à mansão dos mortos, onde pregou a todos os mortos, em especial a estes impenitentes, consumando assim o fato de serem eles a principal figura do que ocorrerá com tantos quantos não crerem no Evangelho (I Pe.3:19,20; II Pe.2:5).
– O Evangelho, portanto, é esta manifestação da benignidade divina mas é, também, a grande prova que se terá da impenitência e da justiça divina a todos quantos nele não crerem.
Por isso, o próprio Jesus disse que será a Sua Palavra, o Evangelho que julgará os homens impenitentes no juízo final 9Jo.12:48).
– Após o dilúvio, o Evangelho continuou a ser pregado. Deus, em Seu pacto com Noé, mais uma vez traz uma boa nova ao homem.
Prometeu não mais destruir o homem com um dilúvio e concitou o homem a voltar a cumprir o propósito divino para a humanidade, inclusive deixando aos homens a administração da justiça, exatamente para que Deus não viesse a aplicá-la fazendo da mesma forma que havia realizado como ocorrera com o dilúvio.
– Lamentavelmente, o homem não seguiu aos ditames divinos e a geração pós-diluviana acabou rejeitando a Deus que, para não destruir o homem, tão somente desfez a comunidade única existente no vale do Sinar, espalhando as nações por toda a Terra, e iniciando a formação de um novo povo, no qual nasceria o Salvador.
– Neste plano de formar esta nova nação, Deus, novamente, vai anunciar o Evangelho, prometendo trazer a bênção para todas as famílias da Terra, promessa que faz a Abrão, que foi chamado para dar início a esta nova nação e que as Escrituras chamam de evangelho, como vemos em Gl.3:8, quando, no instante mesmo em que se iniciava a formação da nação de Israel, da propriedade peculiar de Deus dentre os povos , foi anunciado que a salvação alcançaria todos os gentios.
– Mais uma vez vemos que o Evangelho, tendo início no próprio Deus, abarca a todos os homens, é uma mensagem a todos os seres humanos, sem qualquer distinção, devendo ser apropriada pela fé em Cristo, aqui indicado como sendo a “posteridade de Abraão” (Gl.3:16).
– Deus, aqui, não só revela outros dados importantes a respeito do Salvador, indicando que seria Ele filho de Abraão, daí porque se dizer que “a salvação vem dos judeus” (Cf. Jo.4:22), mas que a salvação seria para todos os homens.
Abraão creu nesta mensagem, tudo deixou para ir para uma terra que ainda lhe seria mostrada, e, por isso, ao contrário da geração antediluviana e da comunidade única pós-diluviana, demonstrou que a apropriação do Evangelho, a fé no Salvador, traz a bênção, não a ira divina (Gl.3:9).
– Esta promessa divina foi renovada a Isaque e a Jacó, tendo sido reiterada, quando o povo já estava formado no Egito, a Moisés, a quem anunciou a libertação do povo do Egito e a sua condução à Terra Prometida, pois era Ele o Deus de Abraão, Isaque e Jacó (Ex.3:6), inclusive mencionando o Seu nome a Moisés, “Eu sou o que sou”, para confirmar que Sua promessa era imutável e que seria cumprida independentemente de qualquer oposição.
– Entretanto, Israel respondeu a esta mensagem, confirmada sobejamente com sinais e maravilhas, com incredulidade (Hb.3:19) e, como consequência disto, o Evangelho teve de dar lugar à lei, pois o povo de Israel não estava preparado para receber a promessa divina, tendo preferido se manter distante de Deus, não ter com Ele intimidade, não permitindo que a lei fosse escrita em seus corações.
– Deus, então, dentro de Seu compromisso para salvar o homem e demonstrando Seu grande amor, entregou a lei a Israel, lei que conduziria para Cristo (Gl.3:24).
– Ao longo da vigência da lei, o Senhor usou dos profetas para conclamar o povo ao arrependimento, a começar do próprio Moisés, que concitou o povo israelita a “circuncidar seu coração” (Dt.10:16), falando, assim, através dos profetas, antes de falar através do Filho (Cf. Hb.1:1).
– O último dos profetas da lei, João Batista, seria o mais incisivo de todos eles, conclamando o povo ao arrependimento, dizendo que não poderiam se fiar no fato de serem filhos de Abraão, mas tendo de admitir que eram pecadores e que deveriam se arrepender para escaparem da ira divina (Mt.3:7-12), cumprindo, assim, o papel de deixar o povo disposto a receber o Messias (Lc.1:15-17).
III – A PREGAÇÃO DO EVANGELHO PELO FILHO
– Mas, depois dos profetas, o próprio Cristo Jesus haveria, também, de pregar o Evangelho. Assim que João é preso, findando o seu ministério, o Senhor Jesus começa a pregar o Evangelho do reino de Deus (Mc.1:14,15).
– Se, enquanto promessa de redenção, Deus tomou a iniciativa de pregar o Evangelho, será o mesmo Deus, agora na pessoa do Filho, que daria início à pregação do Evangelho quando da sua manifestação ao mundo.
O Pai, quando do batismo de Jesus, anuncia que ali estava o Filho, que O agradava, para, sob a plenitude do Espírito Santo, dar início à pregação das boas novas da salvação. O Pai, que havia falado através dos profetas, agora falava através do Filho.
– Aquilo que os anjos haviam anunciado no dia do nascimento de Jesus se tornava realidade (Lc.2:10-14): o Salvador manifestava-Se a todos os homens, a começar pelos judeus, trazendo a boa vontade de Deus para a humanidade.
– Chegara a “plenitude dos tempos” e o Senhor Jesus dava início à evangelização revelada, manifestada, não apenas prometida, como ocorrera até então, mostrando que a graça de Deus aparecera para trazer salvação a todos os homens (Tt.2:11).
– A mensagem pregada por Jesus e sintetizada por Marcos bem elucida o que é o Evangelho: O tempo está cumprido e o reino de Deus está próximo. Arrependei-vos e crede no Evangelho.
– Jesus veio para nos dizer que o tempo do cumprimento da promessa da redenção havia chegado e que, portanto, só nos restava crer nela e reconhecer que tudo o que precisava ser feito para nossa salvação já foi realizado, bastando apenas que tenhamos fé no Salvador.
– Jesus veio nos dizer que o reino de Deus está próximo, ou seja, que podemos deixar de ser inimigos de Deus para voltarmos a ter comunhão com Ele, vendo e entrando neste reino, através do novo nascimento e do nascimento da água e do Espírito (Jo.3:3,5).
– Jesus veio nos dizer que, para crermos no Evangelho, para termos a salvação, faz-se necessário que nos arrependamos de nossos pecados, que mudemos de vida, que abandonemos a vã maneira de viver que recebemos, por tradição, de nossos pais e passemos a viver em conformidade com a vontade de Deus, renunciando a nós mesmos e passando a obedecer ao Senhor.
– Jesus veio nos dizer que, após nos arrependermos, termos de crer no Evangelho, ou seja, na Sua Palavra, passando a ter as Escrituras como nossa única regra de fé e prática, não mais vivendo, mas deixando que Cristo viva em nós (Gl.2:20).
– Esta mensagem pregada pelo Senhor Jesus, confirmada com sinais e maravilhas, atestada por um testemunho inigualável, que dava autoridade à Sua mensagem, é o Evangelho, o Evangelho que devemos continuar a pregar, com o mesmo conteúdo, com as mesmas características.
– Verdade é que, tendo nascido entre os judeus, o Senhor tinha de pregar, primeiramente, às ovelhas perdidas da casa de Israel (Mt.15:24), que, entretanto, O rejeitaram (Jo.1:11), abrindo-se, então, a oportunidade para que os gentios fossem alcançados, algo, aliás, que já estava profetizado (Is. 49:6).
– Jesus comportou-Se como o enviado do Pai e, ao evangelizar, assim Se portou, sendo, exatamente, o que exige de cada um de nós, já que nos enviou do mesmo modo (Jo.20:21).
– O evangelista é, portanto, alguém que é enviado e que, portanto, como afirma o apóstolo Paulo, não passa de um embaixador (II Co.5:20), de um representante do Senhor.
Deste modo, mesmo na dispensação da graça, vemos que o Senhor Jesus continua sendo o exímio evangelista, pois, como embaixadores que somos da Sua parte, somos apenas os porta-vozes do chamado divino ao arrependimento.
É Cristo quem roga por nós quando anunciamos o Evangelho.
– Deus, assim, não é o primeiro evangelista tão somente porque o primeiro anúncio do Evangelho se deu através do próprio Senhor no Éden, mas, também, porque é d’Ele que vem a mensagem da salvação ao homem, ainda que ela seja verbalizada, atualmente, pela Igreja.
Somos tão somente “enviados” por Cristo, embaixadores da parte de Cristo, de sorte que é o próprio Deus que conclama ao arrependimento, que leva a mensagem de salvação a todos os homens.
– Por isso, o Senhor Jesus, mais de uma vez, disse que quem cria n’Ele, cria n’Aquele que o enviara (Mt.10:40; Mc.9:37; Lc.9:48; 10:16; Jo.5:23; 12:44,45; 13:20).
– Na qualidade de “enviado do Pai”, Jesus mostrou que o objetivo de Sua missão era a salvação e não, de condenação (Jo.3:17), a nos mostrar que, como evangelistas, não devemos ser condenadores, mas, sim,
porta-vozes da mensagem da salvação. O Evangelho é uma boa nova de salvação, não um instrumento para condenarmos as pessoas que nos ouvem, como, lamentavelmente, muitos estão a fazer.
– Na qualidade de “enviado do Pai”, o Senhor falou as palavras de Deus porque o Espírito não Lhe foi dado por medida (Jo.3:34) e, portanto, nós, como continuadores de Sua obra, devemos pautar a evangelização na Palavra de Deus, na Bíblia Sagrada, sabendo que o Senhor não nos deu o Espírito por medida, tanto que O derramou no dia de Pentecostes, precisamente para que sejamos Suas testemunhas até os confins da Terra.
Por isso, o Evangelho tem de ser acompanhado da demonstração de Espírito e de poder, como fez o apóstolo Paulo (I Co.2:4).
– Na qualidade de “enviado do Pai”, o Senhor Jesus tinha como meta fazer a vontade do Pai, realizando a Sua obra (Jo.4:34; 6:38) e isto era tão essencial que fazer a vontade do Pai foi tratado pelo Senhor como sendo a Sua comida.
Nós, como continuadores de Sua evangelização, temos de também fazer a vontade de Deus, ter a evangelização como a própria essência de nossas vidas espirituais.
Uma característica indispensável de um servo do Senhor é o desejo ardente de ganhar almas para Cristo, como o diz o próprio Salomão, ao afirmar que o que ganha almas sábio é (Pv.11:30).
– Como afirmou o saudoso missionário Orlando Boyer (1893-1978): “…Se fossem desvendados os teus olhos, neste momento, para contemplar a eternidade, e se te fosse revelado que tens de passar para lá, neste ano não desejarias depositar aos pés do Salvador algum presente como prova de teu amor?
Pode haver um presente tão precioso ou aceitável ao Mestre, como uma alma ganha para Ele, durante um ano? As palavras dos maiores, na história da Igreja de Cristo, revelam como o coração os abrasava com este desejo…” (Esforça-te para ganhar almas, p.8).
– Este, aliás, é o desejo do próprio Deus, que não quer que ninguém se perca (Jo.6:39; I Tm.2:4).
O Evangelho, portanto, revela a boa vontade de Deus para com todos os homens, de forma que nós, como “enviados de Cristo”, devemos sempre deixar claro que Deus quer salvar a todos e que ama a todos, de forma que, na evangelização, jamais podemos assumir um caráter discriminatório e exclusivista.
– Na qualidade de “enviado do Pai”, o Senhor Jesus disse que a obra de Deus é crer n’Aquele que foi enviado (Jo.6:29), mais uma vez apresentando que a pregação do Evangelho é a pregação de Jesus Cristo como Senhor e Salvador da humanidade, é o anúncio da necessidade da fé em Cristo como condição para a salvação.
– Na qualidade de “enviado do Pai”, o Senhor Jesus proclamou a ressurreição e a vida eterna como promessas a quem cresse no Salvador (Jo.6:40).
Nós, como continuadores da evangelização efetuada no ministério terreno de Jesus, devemos também pregar a respeito das promessas que ainda não se cumpriram, referentes à vida eterna, à convivência para sempre com o Senhor na glória eterna.
– Na qualidade de “enviado do Pai”, o Senhor Jesus proclamou que aquele que cresse no Evangelho deveria Se alimentar do Salvador e viver por Ele (Jo.6:57).
O Evangelho não só fala da necessidade de crer em Cristo para a salvação, mas, também, da necessidade de haver uma contínua alimentação, uma vida por Cristo até o instante da glorificação. Assim, a mensagem da santificação, da perseverança na separação do pecado é indispensável à proclamação do Evangelho. Não se trata apenas de se arrepender, mas de manter uma vida de nova mentalidade.
– Na qualidade de “enviado do Pai”, o Senhor Jesus buscou sempre a glorificação do Pai (Jo.7:18; 17:4).
O Evangelho jamais busca a glória de quem evangeliza, mas, sim, d’Aquele que o enviou. Nós, como continuadores da obra terrena de Cristo, devemos, pois, glorificar o nome do Senhor, o que se dá através da prática de boas obras, de uma vida que seja harmoniosa com a nossa pregação (Mt.5:16).
– Por isso mesmo, o apóstolo Pedro disse que devemos antes nos santificar a Cristo em nossos corações para só então responder, com mansidão e temor, a razão da esperança que há em nós (I Pe.3:15).
Precisamos ter uma vida condizente com a Palavra de Deus, com o Evangelho para podermos proclamá-lo aos outros.
– Na qualidade de “enviado do Pai”, o Senhor Jesus era do Pai (Jo.7:29), ou seja, pertencia ao Pai, pois, se assim não fosse, jamais poderia levar a Sua mensagem aos outros.
O Evangelho só pode ser proclamado por quem já é de Cristo Jesus, quem foi alvo da salvação, quem já se arrependeu de seus pecados, quem desfruta da intimidade com o Senhor, daí porque o Senhor Jesus ter dito que conhecia o Pai, entendendo-se que “conhecimento” aqui tem o sentido hebraico, ou seja, do de ter intimidade, de ter comunhão com alguém.
– Precisamos ter comunhão e intimidade com o Senhor para podermos evangelizar, sem o que teremos apenas um discurso religioso, como era o dos escribas e fariseus, visando tão somente angariar prosélitos, ou seja, simpatizantes de algumas ideias, sem qualquer consequência de salvação, como, aliás, ocorria com os missionários judeus mencionados pelo Senhor.
Um comportamento deste naipe somente fará com que angariemos filhos do inferno por duas vezes (Mt.23:15).
– Quantos casos não temos visto como estes na atualidade! Pessoas que buscam prosélitos, ou seja, pessoas que adiram a uma religião, a uma doutrina, sem que tenham se arrependido de seus pecados. O “enviado do Pai” não visava a buscar prosélitos, mas, sim, agradar tão somente ao Pai e, por agradar-Lhe, sempre gozava da Sua companhia (Jo.8:29).
– Nós, como evangelistas, de igual forma, temos de nos esforçar para sempre agradar ao Senhor e, com esta atitude, teremos sempre a Sua companhia, indispensável para podermos cumprir a tarefa da evangelização.
– Na qualidade de “enviado do Pai”, o Senhor Jesus, por ter intimidade com o Pai, dava ouvido ao Pai, falando tão somente aquilo que lhe havia sido mandado falar (Jo.8:26; 12:49), pois o Evangelho não é apenas uma ordem de pregar, mas também de pregar o que foi mandado dizer, um conteúdo que não pode jamais ser alterado pelo evangelista.
Jesus pregava o que Lhe fora mandado pregar pelo Pai. De igual modo, somente podemos pregar o que foi mandado dizer, ou seja, o que está escrito, o que está nas Escrituras.
– Na qualidade de “enviado do Pai”, o Senhor Jesus sempre foi obediente, reconhecendo a Sua condição de servo em relação aO que O enviou (Jo.13:16).
Como evangelistas, portanto, temos de ser servos, reconhecer que somos submissos ao Senhor, devendo, pois, não somente jamais cessar de pregar, por ser uma ordem divina, como também de fazê-lo do modo determinado pelo próprio Deus.
Paulo bem sabia disso ao dizer que ai dele se não cumprisse com sua obrigação de pregar o Evangelho (I Co.9:16).
– Neste passo, citando mais uma vez o missionário Orlando Boyer: “…POR QUE DEVEMOS GANHAR ALMAS? 1. Porque Cristo o quer. ‘Ide por todo o mudo e pregai o Evangelho a toda a criatura’ (Mc.16:15).
Pode o crente lavado no precioso sangue do Calvário recusar-se a este pedido? Só queremos receber ou estamos também prontos a dar?
Abrimos os nossos corações para as maravilhas de João 3.16, e fechamo-lo às responsabilidades em 1 João 3.16?…” (op.cit., p.21).
– Como não poderia deixar de ser, o Senhor Jesus é nosso exemplo de evangelista, daquele que nos mostrou como se deve evangelizar, assim que a graça de Deus Se manifestou n’Ele mesmo.
– Alguém poderá dizer: mas Cristo não pregou o Evangelho do reino de Deus? Como, então, devemos seguir o seu comportamento, já que estamos a pregar o Evangelho da graça de Deus?
– Jesus pregou o Evangelho do reino de Deus porque nasceu sob a lei, pois tinha de cumpri-la, mas o Seu evangelho não é diverso do Evangelho da graça de Deus, pois não há “outro evangelho”.
Este evangelho da graça de Deus apenas traz a revelação de que a salvação é para todos e não apenas para os israelitas, este mistério que se mantivera até a manifestação do próprio Cristo e a conclusão de Sua obra salvífica no Calvário, algo, aliás, que já havia sido dito a Abraão antes mesmo da formação do povo de Israel, conforme já vimos.
– Retirada esta diferenciação, vemos que não há como deixar de procedermos senão conforme o exemplo dado pelo Senhor Jesus, a confirmar que Deus é o primeiro evangelista e, como tal, o modelo a ser seguido.
– Por fim, cumpre-nos observar que a Terceira Pessoa da Triunidade Divina, o Espírito Santo, prossegue a própria atitude das outras duas Pessoas.
É Ele quem convence o mundo do pecado, da justiça e do juízo (Jo.16:8), quem faz lembrar tudo quanto o Senhor Jesus disse (Jo.14:26), tendo, ainda, o papel de glorificar o Filho (Jo.16:14), bem como de anunciar tudo quanto é de Cristo (Jo.16:14,15), sendo, pois, Aquele que prossegue a evangelização feita pelo Senhor Jesus, habitando na Igreja, que deve, assim, sob o domínio do Santo Espírito, prosseguir o ministério terreno de Cristo, que foi, também, feito sob a ação do Espírito Santo (Lc.4:1,14).
– Por ser o primeiro evangelista, Deus, em todas as três pessoas, mostra-nos quão sublime é a evangelização e com quão grande seriedade deve este assunto ser tratado por todos nós.
Ev. Dr. Caramuru Afonso Francisco
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