LIÇÃO Nº 4 – LIDANDO DE FORMA CORRETA COM O DINHEIRO
O dinheiro é um excelente servo, mas um péssimo senhor.
INTRODUÇÃO
– Na sequência do estudo do livro de Provérbios, estudaremos hoje o que a sabedoria divina nos ensina a respeito de nosso lidar com o dinheiro.
– O dinheiro é um excelente servo, mas um péssimo senhor.
I – OS PRINCÍPIOS BÍBLICOS QUE REGEM O RELACIONAMENTO DO HOMEM COM OS BENS MATERIAIS
– Na sequência do estudo do livro de Provérbios, estudaremos hoje o que este “livro de sabedoria” nos ensina a respeito de como devemos lidar com o dinheiro, em outras palavras, qual deve ser o relacionamento do ser humano com os bens materiais.
– Uma vez mais ficamos admirados com as Escrituras Sagradas, pois quem nos escreve a este respeito é ninguém mais, ninguém menos que a pessoa que Deus deu grandes riquezas, qual seja, o rei Salomão (I Rs.3:13), a quem ninguém sobrepujou em riqueza durante os seus dias.
– É oportuno considerar, de pronto, que toda a riqueza que teve Salomão somente lhe veio porque ele mesmo considerou que as riquezas eram coisas secundárias para um ser humano. Ao apresentar seu pedido a Deus, Salomão não quis riquezas, mas, sim, sabedoria e, é por ter pedido sabedoria com prioridade, que o Senhor lhe deu também riquezas e glória (I Rs.3:11-13), o que já nos mostra que a posse de bens materiais não é tão importante nem tão prioritária quanto a sabedoria, que o próprio Salomão diz ser algo mais excelente do que ouro, prata ou pedras preciosas (Pv.3:13-15).
– Antes, porém, de vermos o que o livro de Provérbios nos fala a respeito das riquezas, dissertaremos, ainda que sucintamente, sobre quais são os princípios bíblicos atinentes ao relacionamento dos homens com os bens materiais.
– Para que possamos entender o que a Bíblia diz a respeito da conduta do ser humano frente aos bens materiais, é imperioso verificarmos a própria declaração primeira da revelação de Deus ao homem. Em Gn.1:1, a Bíblia deixa claro que Deus criou os céus e a terra, o que repete em Gn.1:31-2:3. Assim, tanto no início quanto no término do relato da criação, a Palavra não deixa qualquer dúvida de que Deus é o Senhor do Universo, ou seja, o dono de tudo.
– Assim, não deve causar espanto a declaração do salmista (Sl.24:1), segundo a qual “Do Senhor é a terra e a sua plenitude, o mundo e aqueles que nele habitam”. Com efeito, por ter criado o mundo e tudo o que nele há, Deus é o legítimo dono de todas as coisas.
– Se isto é assim, o homem é apenas um administrador da criação. Com efeito, ao criar o homem e a mulher, Deus concedeu a eles o domínio sobre toda a criação (Gn.1:26,28), domínio este que não representa senhorio, mas uma autoridade, uma autorização para administrar a criação terrena (observemos que no mandato dado ao ser humano por Deus não se incluem as criações celestiais. É por isso que o salmista afirma que o homem foi feito pouco menor do que os anjos – Sl.8:5).
– Partindo deste pressuposto, não pode o homem achar-se dono de coisa alguma sobre esta terra e deveria comportar-se desta maneira, ou seja, plenamente consciente de que é apenas um administrador daquilo que Deus lhe deu. É exatamente esta a consciência do cristão, a de que é apenas um mordomo, um despenseiro de Deus ( I Co.4:1,2; Tt.1:7; I Pe.4:10).
– Assim, se temos a capacidade, dada por Deus, de sujeitarmos à nossa vontade os bens existentes na natureza (e bem, aqui, é tudo o que pode suprir as nossas necessidades e nos trazer alguma utilidade) e isto é o princípio da propriedade (por isso o jurista alemão Windscheid conceituava propriedade como a sujeição absoluta de algo à vontade de uma pessoa), ao mesmo tempo devemos observar que a propriedade não é um fim em si mesma, mas tem a função de, por meio desta sujeição, tornarmo-nos um instrumento da vontade divina.
– É, por isso, que a propriedade deve ser considerada como um direito natural, um direito inerente à pessoa humana, devendo ser respeitada e garantida, não tendo cabimento nem qualquer respaldo bíblico qualquer iniciativa que tenda a suprimi-la dos indivíduos, mesmo se o fizer em nome de uma suposta igualdade social (como o fizeram os comunistas marxista-leninistas no século XX), por ser algo contrário à ordem estabelecida por Deus ao gênero humano, mas, ao mesmo tempo, não se pode conceber uma propriedade que não tenha por objetivo a realização da vontade divina na humanidade.
ssim, tão contrário à Bíblia como a supressão da propriedade privada é a sua exacerbação, a busca desenfreada pelo acúmulo de riquezas e de posses em detrimento do próximo e da sociedade. OBS: “…O capitalismo, como princípio básico, sem os seus abusos, concorda com os ideais do cristianismo. O conceito de propriedade privada era uma das vigas mestras do judaísmo.
– Cada família contava com a sua propriedade particular, protegidas pelas leis da herança.
O ideal era e continua sendo que cada homem tenha a sua própria vinha e a sua própria figueira ( I Rs.4:25; Mq.4:4). Porém, é deveras instrutivo ver como a legislação mosaica também defendia os direitos dos pobres. De acordo com o cristianismo, o conceito de propriedade privada não somente é exposto como normal, mas, igualmente, como meio de proteger o indivíduo de medidas ditatoriais do Estado(…)O Novo Testamento, naturalmente, combate os típicos abusos do capitalismo, como a desconsideração pelos direitos do indivíduo e a escravização dos mais pobres pelos ricos, mediante medidas econômicas.
…)Adam Smith, que tinha um ponto de vista otimista da natureza humana, supunha que, – finalmente, surgiria do mercado livre uma espécie de harmonia automática, visto que o homem seria essencialmente bom em sua natureza, a qual controlaria os seus interesses pessoais. Mas o cristianismo ensina que isso só começa a ser curado com a conversão espiritual. Esse preceito, pois, volta-se tanto contra os abusos do capitalismo como contra o ateísmo do comunismo, sistema este que supõe que o mundo é governado por princípios econômicos, e não por princípios espirituais.” (CHAMPLIN, R.N.. Dicionário de Bíblia, Teologia e Filosofia, v.1, p.646).
– Assim, ao mesmo tempo em que a Palavra de Deus garante a cada ser humano a possibilidade de sujeitar bens de acordo com a sua vontade e de deles usufruir para a satisfação de suas necessidades, também estabelece que o objetivo do homem e da mulher não deve ser o acúmulo de riquezas para si ou a sua exaltação por causa dos bens que tenha a seu dispor, mas que tudo isto seja um instrumento para que a glória de Deus se manifeste na administração destes bens que lhe forem confiados por Deus, o único e verdadeiro dono de todas as coisas.
– Entretanto, o homem sem Deus e, consequentemente, sem uma dimensão da eternidade, tem sua vista obscurecida pelas coisas temporais e passageiras e, portanto, acaba se deixando dominar pela avareza, pelo desejo de acumulação de riquezas, que é uma insensatez total, como deixou bem claro Jesus na parábola do rico insensato (Lc.12:13-21), “porque a vida de qualquer não consiste na abundância do que possui”(Lc.12:15).
– Lamentavelmente, não são poucos os que acabam se perdendo na caminhada para o céu por causa dos bens materiais e por causa do dinheiro. A Bíblia revela que a ganância pelas coisas, que a avareza tem sido um obstáculo para muitos alcançarem a salvação, como nos casos do mancebo de qualidade (Mt.19:22; Lc.18:23), de Judas Iscariotes (Lc.22:3-6; Jo.12:4-6), de Ananias e Safira (At.5:1-5,8-10), de Simão, o mago (At.8:18- 23) e de muitos outros, como afirmou Paulo em sua carta a Timóteo (I Tm.6:9,10).
– O dinheiro não é um mal em si. A riqueza é uma bênção de Deus, tanto que Deus a concedeu a Salomão (I Rs.3:13), mas, e aqui está um caso típico, não podemos pôr nas riquezas o nosso coração (Mt.6:19-21). Devemos, sempre, buscar servir a Deus e Lhe agradar. Esta deve ser a intenção do cristão. Se Deus nos conceder a riqueza, que nós a usemos para agradar a Deus. Se nos der a pobreza, que nós a usemos para agradar a Deus. O importante é que não façamos dos bens materiais o objetivo e a intenção de nossas vidas. Quem passa a viver em função dos bens materiais, quem passa a pôr o seu coração nos tesouros desta vida, passa a ser um avarento, um ganancioso e, como tal, será um idólatra (Cl.3:5) e, assim, estará fora do reino dos céus (Ap.22:15).
– A Bíblia nos mostra que a aquisição de bens materiais é uma necessidade para o homem depois da sua queda, pois deverá, do seu trabalho, obter o seu sustento (Gn.3:19), consoante já vimos na lição anterior. Deste modo, a obtenção dos meios necessários para a nossa sobrevivência deve vir do trabalho. É por isso que Paulo, numa afirmação dura, mas que é a verdade nua e crua, disse que “se alguém não quiser trabalhar, não coma também” (II Ts.3:10), máxima que foi, inclusive, incorporada em várias Constituições de países comunistas no século XX, mas que traduz um princípio bíblico.
– Como a busca pelos bens materiais deve ser com vistas à satisfação de Deus e não a uma incessante corrida pelo prazer, pelo luxo e pela autossuficiência, temos que há uma clara distinção entre a ética cristã e a ética do capitalismo. O capitalismo é um sistema econômico em que se busca, sempre, o máximo lucro com o menor custo, com o aumento incessante da produção e do consumo. Dentro da lógica do capitalismo, é preciso sempre produzir cada vez mais, com o maior lucro e com a redução crescente dos custos. A ética cristã, entretanto, é bem diversa: não há que se buscar o máximo lucro, mas, bem ao contrário, deve-se buscar o suficiente para se ter uma vida digna, uma vida sossegada, mas sem a “febre do ouro” que tem dominado o mundo de hoje. Diz o sábio Agur que devemos, sempre, buscar a “porção acostumada de cada dia” (Pv.30:8,9).
– Não se está aqui afirmando que o cristão não deve procurar uma melhoria de vida, um melhor emprego, capacitar-se para obter melhores posições, ou seja, em absoluto se nega ao servo de Deus a busca de melhores oportunidades, um progresso maior, até porque o filho de Deus não é cauda, mas cabeça (Dt.28:13), mas se está afirmando, isto sim, que não devemos colocar como alvos únicos e exclusivos de nossas vidas uma prosperidade material, como objetivo as benesses desta vida (Pv.27:24). Nunca nos esqueçamos que, se cremos em Cristo só para esta vida, seremos os mais miseráveis de todos os homens! (I Co.15:19).
– Quando o homem tenta progredir na vida material tendo consciência de que existe uma dimensão eterna, de que é mero administrador do que Deus lhe confiou, ele jamais se comporta de forma nociva ao seu semelhante, jamais busca usar de todos os métodos, lícitos ou não, visando à acumulação de riquezas, pois tem pleno conhecimento de que nu saiu do ventre de sua mãe e de que nu terminará a sua existência (Jó 1:21; I Tm.6:7). Como dizem as Escrituras, aqueles que se envolvem na ilusão das riquezas, trazem para si somente males e problemas, já nesta vida, que dirá quando se encontrar com o reto e supremo Juiz de toda a terra (Pv.28:22; I Tm.6:9; Hb.9:27).
– Dentro desta perspectiva, o cristão deve, consciente de que o que tem amealhado de bens materiais, é para ser um instrumento de satisfação da vontade divina, administrar o seu patrimônio de forma a obter este agrado de Deus, fazendo-o conforme a Sua Palavra.
II – O CARÁTER SECUNDÁRIO E INSTRUMENTAL DAS RIQUEZAS
– O livro de Provérbios fala, pela vez primeira, da questão atinente ao relacionamento do homem com os bens materiais no capítulo 3, em meio aos “conselhos paternais” que introduzem o livro, precisamente em Pv.3:9,10, texto já estudado na lição anterior.
– Nesta vez primeira em que trata do tema, o proverbista já mostra que os bens materiais que tenhamos sobre a face da Terra tem um caráter instrumental, pois devem servir de meio para que honremos ao Senhor: “Honra ao Senhor com a tua fazenda, com as primícias de toda a tua renda e se encherão os teus celeiros abundantemente, e trasbordarão de mosto os teus lagares” (Pv.3:9,10).
– Nesta afirmação do proverbista, vemos, com absoluta clareza, que a posse de bens materiais por parte do homem tem um propósito divino, qual seja, o de que, através de nosso patrimônio, o Senhor seja honrado, o Senhor seja glorificado, que as nossas riquezas sirvam para que o nome de Deus seja exaltado, para a realização de boas obras (cfr. Mt.5:16).
– Não é de se admirar, portanto, que, ao longo dos séculos, a tradição judaica tenha entendido que a posse de bens faz do homem um devedor em relação a Deus: “…quando Deus havia dado a riqueza aos abastados, não as havia entregue em caráter definitivo, nem como recompensa por suas ações ou qualquer mérito especial. Era somente para que a retivessem em custódia para os pobres! Os ricos seriam, assim, meros agentes fiscais de Deus, por assim dizer, em favor dos pobres! Estender a tzedakah [caridade, observação nossa] aos pobres ‘com todo o coração’ tinha, portanto, a significação intrínseca de um ato de ‘virtude’. Daí ter-se desenvolvido o axioma que, se os ricos fossem realmente honestos e tementes a Deus, distribuiriam prazerosamente a riqueza que retinham em custódia de Deus, entre os inúmeros credores de Deus — os pobres, os doentes, os desamparados, os necessitados etc.…” (AUSUBEL, Nathan. Caridade. In: A JUDAICA, v.5, p.114) (destaques originais).
– A vez primeira em que Salomão fala de riquezas, fala para nos lembrar que ela existe para que o nome do Senhor seja honrado, seja exaltado, ou seja, embora o Senhor tenha nos dado legitimamente o direito de propriedade, de amealhar bens para que eles se sujeitem à nossa vontade, jamais estes bens poderão ser utilizados para o engrandecimento do nosso ego, para nossa vaidade, mas, sim, para que Deus seja honrado através da utilização destes bens.
– Mas, depois de ter dito que a nossa fazenda deve honrar ao Senhor, Salomão mostra-nos que as riquezas ocupam um valor absolutamente secundário em nossas vidas, pois “bem-aventurado o homem que acha sabedoria, e o homem que adquire conhecimento; porque melhor é a sua mercadoria do que a mercadoria de prata, e a sua renda do que o ouro mais fino. Mais preciosa é do que os rubins, e tudo o que podes desejar não se pode comparar a ela” (Pv.3:13,14).
– Salomão transmite aqui o que havia aprendido pessoalmente com o Senhor, ou seja, de que a sabedoria é muito mais valiosa do que quaisquer riquezas e, lembremos, isto é dito por alguém que, em seu tempo, era o homem mais rico sobre a face da Terra. OBS: Um dito do Alcorão repete essa mesma ideia: “E não são vossas riquezas nem vossos filhos que nos aproximarão de Nós, bem perto de Nós; mas quem crê e faz o bem, esses terão o dobro da recompensa, pelo que fizeram e estarão em segurança nas câmaras etéreas (34:37)” (Trad. Helmi Nasr).
– Além de serem um instrumento pelo qual o nome de Deus deve ser glorificado, a posse de bens materiais não deve ser desejada como algo prioritário, mas, antes, devemos buscar a sabedoria, pois só quem acha a sabedoria alcança a bem-aventurança, ou seja, um estado sublime de felicidade.
– Esta afirmação de Salomão é repetida no dito popular segundo o qual “o dinheiro não traz felicidade” ou, ainda, “o dinheiro não compra felicidade”, máxima que tem sido deixada de lado nos dias de materialismo e consumismo desenfreado em que vivemos, onde, inclusive, uma propaganda de cartão de crédito ficou famosa ao dizer que o dinheiro não compra certas coisas, mas que, para todas as outras, existiria o referido cartão.
– Trata-se, porém, de uma realidade que o mundo materialista de hoje tenta esconder, mas não consegue. Quantos bilionários e milionários, apesar de tantas riquezas, não vivem uma vida miserável e infeliz, que os leva às drogas, aos vícios e a tantos desatinos, revelando o vazio existencial em que se encontram? Todas as sua fortunas são incapazes de lhes proporcionar paz e alegria sobre a face da Terra, precisamente porque, como dizia Salomão, a posse de bens materiais é incapaz de trazer a bem-aventurança.
– Ao descrever a sabedoria, em Pv.8, Salomão reforça esta ideia, ao mostrar que a sabedoria é melhor do que os rubins e que tudo que se deseja não se pode comparar a ela (Pv.8:11), precisamente porque é a sabedoria que traz “riquezas e honra, riquezas duráveis e justiça” (Pv.8:18), sendo melhor o seu fruto do que o fruto do ouro, do ouro refinado e as suas novidades melhores do que a prata escolhida (Pv.8:18,19).
– Ao isto afirmar, Salomão mostra que a sabedoria é que permite a aquisição e manutenção de riquezas por parte de alguém e que as consequências advindas da posse da sabedoria são permanentes e duráveis, ao contrário das riquezas materiais, que podem se extinguir e se perder rapidamente, máxime quando não houver sabedoria por parte de seu titular. Por isso, Salomão afirma que, embora haja ouro e abundância de rubins, os lábios do conhecimento são joia preciosa (Pv.20:15).
– Não é por outro motivo que a sabedoria, que é apresentada como uma pessoa no capítulo 8 de Provérbios, faz um apelo para que a aceitemos e à sua correção e não ao ouro, que aceitemos o seu conhecimento mais do que o ouro fino escolhido (Pv.8:19). Temos aqui um chamamento divino à nossa consciência para que tenhamos como prioritária a sabedoria, o conhecimento de Deus, a intimidade com o Senhor e não a busca de bens materiais.
– Estas afirmações de Salomão fazem-nos lembrar os ensinos do Senhor Jesus no sermão do monte, quando somos admoestados a ajuntar tesouros nos céus, que são permanentes e insuscetíveis de roubo ou deterioração, ao contrário dos tesouros terrenos, que podem ser consumidos por ladrões, pela traça e pela ferrugem (Mt.6:19,20).
– Quando observamos grandes nomes da sociedade que, da mesma forma que enriqueceram rapidamente, também perderam tudo quanto tinham, por não terem tido sabedoria para preservar os ganhos auferidos, percebemos como a Palavra de Deus é a verdade!
– Quem tem a sabedoria herda “bens permanentes”, “enchem os seus tesouros” (Pv.8:21), pois, ao andarem pelo caminho da justiça (Pv.8:20), alcançam a vida eterna em Cristo Jesus, adquirindo riquezas muito maiores e muito mais excelentes do que a posse de bens materiais nesta Terra passageira e fugaz. “Quanto melhor é adquirir a sabedoria do que o ouro! E quanto mais excelente, adquirir a prudência do que a prata!” (Pv.16:16). Será que temos tido esta mentalidade?
– Salomão, já na sua velhice, quando escreveu o livro de Eclesiastes, chegou à conclusão de que o amontoamento de prata, ouro e joias, bem como o desfrute de tudo isto não passou de vaidade e aflição de espírito (Ec.2:8-11).
– Diante de tamanhas afirmações por parte de quem teve tantas riquezas, por que nos submetermos à “corrida do ouro” que tem caracterizado o mundo em que vivemos? Pensemos nisto! OBS: No Alcorão, inclusive, é dito que os egípcios foram cheios de riquezas nos dias de Moisés, exatamente para que fossem feitos cegos espiritualmente e, assim, devidamente punidos por Deus. Eis o versículo: “E Moisés disse: ‘Senhor nosso’. Por certo concedestes a Faraó e a seus dignitários ornamentos e riquezas na vida terrena — Senhor nosso! — para que se descaminhem de Teu caminho, Senhor nosso! Apaga-lhes as riquezas e endurece-lhes os corações; então, não crerão até virem o doloroso castigo” (10:88) (Trad. Helmi Nasr).
III – A QUESTÃO DA FIANÇA
– Depois de ter mostrado o caráter secundário e instrumental das riquezas para a vida humana, Salomão, ainda dentro dos chamados “conselhos paternais”, trata de outro tema relacionado com os bens materiais, a saber, a questão da fiança, que desenvolve, pela vez primeira, em Pv.6:1-5.
– Aqui, na décima segunda vez que se utiliza a expressão “filho meu” no livro de Provérbios, o proverbista aconselha o “seu filho” que deveria se livrar da condição de fiador do seu companheiro, devendo importuná-lo até que o libertasse do compromisso, não sossegando enquanto não se livrar da obrigação assumida.
– A fiança é um compromisso em que alguém se põe como garantidor pessoal do pagamento da obrigação de outrem, ou seja, caso o devedor não cumpra a sua obrigação, o fiador deverá cumpri-la pessoalmente.
– Nos dias de Salomão, a situação do fiador, que até hoje é extremamente incômoda, era ainda pior, pois, sabemos todos, naquele tempo, caso o devedor não pudesse cumprir a sua obrigação, poderia ser, inclusive, reduzido à escravidão para pagar o seu débito. Ora, o fiador assumia a mesma condição do devedor e, portanto, caso o devedor não pagasse a dívida e não fosse possível reduzi-lo à escravidão, ou esta redução à escravidão fosse insuficiente para a satisfação do débito, o fiador também poderia ser escravizado.
– O que Salomão está a nos ensinar aqui é a superioridade da pessoa aos bens, porquanto não se pode vincular uma pessoa à vontade de outra, não se deve ligar a sua honradez e seu caráter em função de outra pessoa, correndo o risco de, pela inadimplência do outro, comprometer seu nome e sua própria posição na sociedade.
– É falta de sabedoria pôr a sua pessoa, o seu nome, a sua dignidade em função da vontade de um terceiro, ainda que ele seja “seu companheiro”, ou seja, pessoa que desfruta da sua convivência, que “come o pão” juntamente consigo.
– Quando nos tornamos fiadores de alguém, vinculamos o nosso destino, o nosso patrimônio a esta pessoa, o que não é razoável, visto que somos todos iguais e independentes uns dos outros. Que adianta sermos zelosos com a administração de nossos bens e de nossa vida se deixamos tudo à mercê de uma outra pessoa?
– Em nossos dias, a fiança continua sendo um péssimo negócio. O fiador vincula-se à dívida de um terceiro e, caso este terceiro não cumpra suas obrigações, o fiador sofrerá grandemente por causa do descumprimento da obrigação. No Brasil, inclusive, um dos poucos casos em que o imóvel residencial do devedor responde pela dívida é o caso do fiador de contrato de locação.
– Os bens materiais valem menos que o ser humano, segundo a ética bíblica, sendo a ordenação ética instituída pelo próprio Deus. Ser fiador de alguém é pôr-se abaixo dos interesses patrimoniais, é se colocar abaixo dos bens materiais e é esta a razão pela qual Salomão manda que jamais entremos numa situação quetal, pois isto representa o próprio aviltamento da pessoa humana, uma inversão da hierarquia de valores instituída pelo próprio Deus. Não é à toa que o proverbista afirma que “quando alguém fica por fiador do estranho, toma-lhe tu a sua roupa e penhora-o pela estranha” (Pv.27:13).
– Salomão compara aquele que dá fiança a alguém como um animal que se põe nas mãos do caçador ou uma ave que fica à mercê do passarinheiro (Pv.6:5). É uma atitude completamente louca, pois pomos nossa honradez à mercê de terceiros. Por isso, Salomão nos afirma que “o homem falto de entendimento dá a mão, ficando por fiador do seu companheiro” (Pv.17:18).
– Quando as Escrituras Sagradas falam em fiança, não devemos nos ater apenas à figura contratual assim denominada no direito, mas a toda e qualquer forma de garantia de dívida de terceiros, como o aval e a figura popularmente conhecida como “empréstimo de nome”, muito comum em nosso país que vive basicamente de crédito.
– Em todos estes casos, vinculamos nosso patrimônio, nossa dignidade, nosso nome em favor de uma terceira pessoa, o que se constitui em verdadeira loucura, em medida desaconselhada pela Palavra de Deus, que é a verdade (Jo.17:17). Existem outras formas de se ajudar alguém quando esta estiver necessitada, como a própria doação de recursos para o pagamento de uma prestação ou de uma dívida, sem que se precise recorrer a esta garantia pessoal, que jamais deve ser feita por um servo de Deus. Afinal de contas, como diz o próprio Salomão: “Mais digno de ser escolhido é o bom nome do que as muitas riquezas; e a graça é melhor do que a riqueza e o ouro” (Pv.22:1).
– Por isso, não podemos outra conclusão senão aquela a que chegou o sábio rei de Israel: “Decerto sofrerá severamente aquele que fica por fiador do estranho, mas o que aborrece a fiança estará seguro” (Pv.11:15).
IV – A QUESTÃO DA GANÂNCIA
– Mas, ao discorrer sobre o relacionamento do homem com os bens materiais, o proverbista também nos fala a respeito da ganância, ou seja, do desejo incontrolável de aquisição de bens materiais, mesmo que, para tanto, se venha a praticar a impiedade, o que não é correto, mesmo que se tenha de agir desonestamente.
– Já vimos supra que a ganância nada mais é que dar prioridade aos bens materiais, buscar, a todo o custo, amealhar riquezas, ter amor ao dinheiro, que é a raiz de toda a espécie de males (I Tm.6:10). Trata-se, à evidência, de um comportamento de quem não serve a Deus, pois não se pode servir a Deus e às riquezas simultaneamente (Mt.6:24).
– Esta ganância, este desejo incontrolável por bens materiais, esta verdadeira adoração ao dinheiro apresenta- se de diversas formas, todas elas combatidas e condenadas pelo proverbista, que, logo no limiar da segunda parte do livro, que apresenta a coletânea de provérbios de Salomão coligidos ainda em seu tempo, afirma que “os tesouros da impiedade nada aproveitam, mas a justiça livra da morte” (Pv.10:2), a nos mostrar, com absoluta clarividência, que a posse de bens materiais não pode jamais ser prioridade em nossas vidas, pois, assim agindo, caminharemos para a perdição eterna, algo que riqueza alguma do mundo pode evitar, até porque uma alma vale mais do que o mundo inteiro (Sl.49:6-8).
– Assim, correr atrás do dinheiro a qualquer custo é atitude típica de quem não serve a Deus e que está procedendo de modo a se tornar um candidato à perdição eterna. Trata-se de uma conduta muito comum em nossos dias, onde prevalece o materialismo e o consumismo desenfreado. Por isso, o proverbista é claro ao afirmar que “aquele que confia nas suas riquezas cairá, mas os justos reverdecerão como a rama” (Pv.11:28), a nos mostrar que quem confia nas riquezas não é justo e não terá muito futuro pela frente.
– Salomão, por isso mesmo, condena a avareza, que as Escrituras consideram como sendo uma forma de idolatria (Cl.3:5), já que o avarento tem como deus o dinheiro. Diz o proverbista que “o príncipe falto de inteligência também multiplica as opressões, mas o que aborrece a avareza prolongará os seus dias” (Pv.28:16), o que, pelo paralelismo hebraico, nos mostra que o avarento é levado a oprimir o seu próximo, mas, ao fazer isto, estará tão somente diminuindo a sua qualidade de vida sobre a face da Terra, ao passo que o que aborrecer a avareza estará tendo longura de dias, não somente em quantidade, mas também em qualidade (quantos agiotas não acabam sendo mortos por seus devedores…).
– Uma das formas de se tentar obter riquezas indevidamente é a usura, ou seja, a cobrança excessiva de juros. É bom observarmos que quem empresta um determinado capital para alguém tem direito a uma remuneração, não sendo isto ilícito ou moralmente reprovável.
– O que a Bíblia Sagrada condena é a usura, ou seja, a cobrança excessiva de juros, a obtenção de valores que tornam o que foi emprestado uma pequena parcela do que é indevidamente apropriado daquele que empresta.
– Aquele que toma dinheiro emprestado, como afirma o próprio Salomão, é servo daquele que empresta (Pv.22:7), de modo que a usura representa uma conduta opressora, de quem, se aproveitando da situação de vantagem que tem por ter emprestado algum dinheiro, faz com que o que tomou emprestado seja explorado, aviltado, indevidamente dominado, relegado a uma posição indigna de quem é imagem e semelhança de Deus.
– Davi já deixara claro, antes mesmo do seu filho proverbista, que uma das características do servo de Deus, daquele que habitará nos céus, é não emprestar dinheiro com usura (Sl.15:5). Assim, temos a convicção de que agiotas não entrarão no reino dos céus, ainda que digam que são crentes…
– Quando se tem a caracterização da usura? Em nosso direito, a usura é considerada quando se tem juros acima de um quinto do valor corrente ou justo da prestação feita ou prometida (art.4º, “b” da lei 1.521/1951, a chamada “lei da economia popular”), sendo este um patamar razoável, até porque com base bíblica, que também estipula em um quinto o valor adicional de uma reparação (Lv.27:13,15; Nm.5:7).
– Sabemos hoje, notadamente em nosso país, que é o “paraíso dos juros”, que tais patamares não são observados. As taxas de juros são altíssimas, representando um aviltamento de toda a população, que somente pode consumir através do crédito, o que gera uma interminável concentração de renda, que explica, em parte, porque a desigualdade social tem aumentado em todo o mundo.
– Por causa disso mesmo, devem os servos do Senhor evitar fazer compras a prazo, pois estarão se pondo voluntariamente sob esta opressão e, menos ainda, ceder à tentação da usura e querer também tirar vantagem dos mais necessitados, emprestando a juros elevados, dedicando-se à agiotagem.
– Salomão é bem claro ao afirmar que “o que aumenta a sua fazenda com usura e onzena ajunta-a para o que se compadece do pobre” (Pv.28:8), indicando que Deus não Se agrada com o aumento do patrimônio à custa da opressão dos mais necessitados, de modo que, mais cedo ou mais tarde, o Senhor encarregar-Se-á de transferir todo este aumento patrimonial obtido de forma imoral e ilícita para os que necessitam. Muitas vezes, não entendemos porque alguém, que estava tão bem financeiramente, de uma hora para outra, tem uma derrocada. É a mão do Senhor fazendo justiça…
– É bom lembrarmos que a usura não se circunscreve apenas a empréstimos em dinheiro. Às vezes, esta desproporção se dá também com relação a outros bens ou até mesmo a favores não redutíveis a moeda. Na lei de Moisés, já se impedia que se fizesse “usura de dinheiro’, “usura de comida” ou “usura de qualquer coisa” (Dt.23:19). Quantas vezes não queremos exigir um sacrifício da parte de alguém por conta de um favor que fizemos a esta mesma pessoa e que é evidentemente desproporcional ao que fizemos? Pensemos nisto!
– Outra maneira de ganância que é condenada pelo proverbista é aquela que advém da obtenção de riquezas mediante o engano. Diz Salomão: “trabalhar por ajuntar tesouro com língua falsa é uma vaidade, e aqueles que a isso são impelidos buscam a morte” (Pv.21:6). Condena-se, assim, a utilização de artifícios e ardis que enganam as pessoas a fim de se obter vantagem econômica, o que caracteriza, em nosso direito, a conhecida prática do estelionato, do engano para se obter vantagem econômico-financeira.
– A mentira tem como pai o inimigo de nossas almas (Jo.8:44) e toda vez que nos utilizamos dela para obter vantagem econômica, estaremos nos imiscuindo com o pecado, cujo salário é a morte (Rm.6:23).
– Quantos que, na atualidade, não têm se valido de mentiras, de meias verdades (que são mentiras inteiras…) para poder vender produtos e fornecer serviços, para terem vantagens econômicas indevidas? Tal não pode ser o procedimento de um genuíno e autêntico servo de Deus.
– Dentro deste aspecto de engano, alcança relevância no livro de Provérbios o que hoje denominaríamos de infrações contra o consumidor, o que encontramos, no texto bíblico, como sendo “balança enganosa”, ou seja, a atitude do fornecedor de alterar indevidamente a medida do que é adquirido para se obter vantagem.
– “Balança enganosa é abominação para o Senhor, mas o peso justo é o seu prazer” (Pv.11:1), “duas espécies de peso são abomináveis ao Senhor, e balanças enganosas não são boas” (Pv.20:23), “Duas espécies de peso e duas espécies de medida são abominação para o Senhor, tanto uma coisa como outra” (Pv.20:10). Com estes três provérbios, fica bem claro que, para Deus, é coisa abominável, algo muito grave procurar tirar vantagem daquele que adquire um produto mediante a alteração dos instrumentos de medição, a fim de que se tenha uma vantagem econômica mediante este ardil, mediante este engano. Que Deus nos guarde, amados irmãos!
– Outra forma de ganância que é condenada no livro de Provérbios é o suborno ou peita, ou seja, um pagamento que é feito para que se faça algo ilegal, imoral. Trata-se de uma atitude em que se põe o bem material (o dinheiro a ser recebido) acima de outros valores, mais uma demonstração de que se ama o dinheiro e não o próximo ou a Deus.
– Nos dias em que vivemos, a corrupção está alastrada, havendo, mesmo, a situação já apontada por Ruy Barbosa, de que se chega a ter vergonha de ser honesto, em especial em nosso país, onde a impunidade reforça ainda mais a corrupção.
– Davi, também no já mencionado Sl.15:5, faz questão de dizer que somente ingressará nas mansões celestiais aquele que não aceita peitas (ou seja, subornos) contra o inocente, a nos demonstrar que a compactuação com a corrupção, a sua prática ou o consentimento com ela representa uma ação que nos pode levar à perdição eterna.
– É muito triste vermos hoje em dia diversos que cristãos se dizem ser praticarem atos de corrupção, achando que não estão a fazer nada demais, como, por exemplo, o pagamento de um “cafezinho” para que não ser multado pelo guarda ou, mesmo, para algum outro fiscal para não ser autuado em alguma outra espécie de infração. Já houve, mesmo, “parlamentar evangélico” que chegou a fazer uma oração em agradecimento ao recebimento de uma “propina”. A que ponto chegamos!
– O proverbista, porém, é bem claro ao afirmar que “o rei com juízo sustém a terra, mas o amigo de subornos a transtorna” (Pv.29:4), a indicar que uma sociedade baseada na corrupção está fadada à desintegração, ao desmoronamento, pois se gerará um ambiente de desordem, de desconfiança e de insegurança tais que a própria convivência ficará sensivelmente abalada e impossibilitada a médio e longo prazos. Não é exatamente isto que estamos verificar no mundo em que vivemos?
– Nunca aceitemos subornos ou peitas, pois quem o oferece é sempre um ímpio. É o que nos diz Salomão: “o ímpio tira o presente do seio para perverter as veredas da justiça” (Pv.17:23). Quem oferece suborno é sempre uma pessoa ímpia, que está a mostrar, por este fruto, a sua impiedade e quem o aceita, certamente estará proporcionando a realização de uma injustiça, o que, também, o configura como um ímpio, como alguém que não tem o amor de Deus, pois o amor não folga com a injustiça, mas, com a verdade (I Co.13:6). OBS: O Alcorão também afirma que o que usa das riquezas com más intenções é o ímpio, cujo objetivo é desviar o justo. Veja-se esta versículo do livro sagrado dos muçulmanos: “Eis que os incrédulos malversam as suas riquezas para desviarem (os fiéis) da senda de Deus. Porém, malversá- las-ão completamente e isso será a causa de sua atribulação; então, serão vencidos. Os incrédulos são congregados no inferno (8:36)” (Trad. Samir El Hayek).
– Salomão, no livro de Eclesiastes, mostra outro grande mal causado pelo suborno, que é o de corromper o coração daquele que o aceita (Ec.7:7), corrupção esta que causará a perdição eterna, que não pode ser compensada por eventual “alargamento de caminhos” neste mundo ou eventual ida à presença dos grandes segundo os conceitos mundanos (cfr. Pv.18:16), pois toda vantagem nesta vida é passageira e fugaz.
– E reside aqui a grande tentação do suborno, pois, como diz o proverbista, “o suborno é talismã para quem o dá; para qualquer lado que se volte tem sucesso” (Pv.17:8 – Bíblia de Jerusalém-BJ). Aparentemente, quem dá o suborno passa a ter uma vida bem sucedida sobre a face da Terra, leva vantagem e isto o induz a sempre proceder dessa maneira para atingir os seus objetivos, como se algo mágico (daí ser considerado um “talismã”) lhe abre todas as portas. Contudo, isto é enganoso, porque, não só a justiça divina lhe sobrevirá, como, ainda, por causa desta prática, se todas as portas aqui lhe são abertas, a do céu estará para sempre fechada para ele. Fujamos disto, amados irmãos!
– Salomão ainda afirma que “o presente secreto aplaca a ira; suborno em sigilo, o furor violento” (Pv.21:14), a indicar, ainda, que a prática do suborno, notadamente quando de forma sigilosa, faz com que, de início, a ira, a ação de uma autoridade, um mal que se achava iminente, deixe de acontecer, dando uma enganosa sensação de alívio, de livramento. Contudo, tudo isto é enganoso, pois uma vida construída em cima do suborno jamais trará verdadeira paz, até porque “na casa do justo há um grande tesouro, mas nos frutos do ímpio há perturbação” (Pv.15:6), “melhor é o pouco com o temor do SENHOR do que um grande tesouro onde há inquietação (Pv.15:16). A suposta vantagem imediata representará sempre uma insegurança, uma inquietação que perdurará para sempre. Não vale a pena trocar a paz com Deus e a segurança da vida eterna por uma momentânea e transitória sensação de alívio.
V – A PORÇÃO ACOSTUMADA DE AGUR
– O livro de Provérbios encerra a análise de nosso relacionamento com os bens materiais trazendo-nos a lição de Agur, o sábio responsável pela redação do que é o capítulo 30 do livro de Provérbios (Pv.30:1).
– Agur, reconhecendo a soberania do Senhor sobre todas as coisas e sua pequenez (Pv.30:2-6), faz um pedido a Deus que deve ser o nosso pedido a todo instante enquanto peregrinarmos sobre a face da Terra, a saber: “não me dês nem a pobreza nem a riqueza; mantém-me do pão da minha porção acostumada; para que, porventura, de farto te não negue e diga: Quem é o Senhor? Ou que, empobrecendo, venha a furtar e lance mão do nome de Deus” (Pv.30:8b,9).
– Vemos aqui toda a sabedoria de Agur que, sabendo da necessidade que têm os homens de terem bens materiais para sobreviver sobre a face da Terra, mas também sabendo do caráter secundário e instrumental que eles possuem, procurou se dirigir ao Senhor a fim de lhe dar uma vida equilibrada quanto a este aspecto durante a sua existência terrena.
– Agur, em primeiro lugar, sabia que deveria se dirigir a Deus para que tivesse um bom comportamento com relação a este tema. Tudo que devemos decidir em nossa vida terrena somente será bem decidido se recorrermos a Deus, que, aliás, nos dá a sabedoria (Pv.2:6), que nada mais é que a capacidade de tomar decisões corretas.
– Um dos principais problemas que temos tido em nossos dias é o de deixar Deus de lado nas questões que envolvem problemas materiais, como se Deus não se importasse com este assunto. Ele bem sabe das nossas necessidades (Mt.6:32) e, por isso, é quem pode nos ajudar a lidar com tais negócios.
– Muitos somente procuram o Senhor para assuntos espirituais ou quando a situação material se encontra periclitante, mas Agur nos observa que somos todos brutos, sem entendimento (Pv.30:2) e que, por isso, precisamos ter a devida orientação do Senhor, pois toda palavra de Deus é pura, escudo para os que confiam n’Ele (Pv.30:5).
– Depois de ter recorrido a Quem realmente sabe das coisas e poderia lhe orientar, Agur, confiando no Senhor, faz dois pedidos: que fosse afastado da vaidade e da palavra mentirosa e que não lhe fosse dado nem a pobreza, nem a riqueza, mas tão somente a porção acostumada de pão (Pv.30:8).
– Ao pedir ao Senhor que se lhe afastasse a vaidade e a palavra mentirosa, Agur, de pronto, pedia que fosse liberto tanto da ganância, quanto da mentira, o que, como vimos supra, representam duas grandes tentações para que nos tornemos escravos dos bens materiais e, por causa do dinheiro, acabemos perdendo a salvação.
– Quando nos afastamos da vaidade, ou seja, da corrida atrás de uma glória vazia e das vantagens oferecidas por este mundo, não nos envolvemos com tudo aquilo que faz com que as pessoas almejem a posse de bens materiais como prioridade, o que as fazem cometer toda a sorte de desatino e de loucura. Não nos deixamos iludir pelos “vãos esplendores” deste mundo e, assim, damos o devido valor à eternidade e nos pautamos de forma a chegarmos até o final em comunhão com Deus.
– Quando nos afastamos da palavra mentirosa, não compactuamos com a corrupção, com o suborno, nem nos envolvemos em ardis e artifícios para termos vantagens econômico-financeiras em detrimento do próximo, fugindo, assim, de situação de juízo diante de Deus, ainda que com vantagens aparentes perante a sociedade.
– Mas, além deste pedido, Agur também pediu ao Senhor que não lhe fosse dada nem a pobreza, nem a riqueza. Agur não queria ser pobre, ou seja, ter recursos insuficientes para a sua própria sobrevivência, pois, se isto acontecesse, certamente acabaria, por causa da fome e do instinto de sobrevivência, por furtar, o que se constitui em pecado. A extrema necessidade é uma tentação sempre presente que nos pode levar à perdição eterna.
– No entanto, Agur também não queria ser rico, pois a posse de bens materiais pode trazer um sentimento de orgulho e de soberba que faz com que o homem ache que não necessite de Deus e, deste modo, também estará sujeito à perdição eterna. Não é por outro motivo que o Senhor Jesus disse que é difícil um rico alcançar a salvação (Mt.19:23; Mc.10:24).
– Quem é farto de bens materiais é facilmente iludido e se acha uma pessoa que não necessita de Deus, que tudo pode comprar, que tudo pode fazer. Tal sentimento de autossuficiência o afasta do Senhor e, sem Deus, jamais alcançaremos a vida eterna.
– Este pedido de Agur foi ensinado pelo próprio Senhor Jesus, pois um dos pedidos da oração dominical é precisamente o de se pedir o pão nosso de cada dia (Mt.6:11), a nos indicar que devemos sempre desejar o necessário, o suficiente para a nossa sobrevivência sobre a face da Terra, não se deixando envolver pelo consumismo, pelo luxo ou pelo supérfluo.
– Somente quem tem a sabedoria divina tem condições de se contentar com o que se tem e não se deixar envolver pelo desejo incontrolado de aquisição. O apóstolo Paulo aprendeu a se contentar com o que tinha (Fp.4:11), numa clara demonstração de que este tipo de contentamento é adquirido, é algo que provém da parte de Deus, é fruto de uma instrução (Fp.4:12).
– Por isso, o mesmo Paulo ensinou a Timóteo que devemos nos contentar quando tivermos o sustento e com que nos cobrirmos, pois é manifesto que nada trouxemos a este mundo e que nada levaremos dele (I Tm.6:7,8), residindo aí o grande ganho da vida de alguém, a piedade com contentamento (I Tm.6:6).
– Somente tendo comunhão com Deus e aprendendo d’Ele a cada dia, poderemos nos comportar desta maneira, bem agindo com relação ao bens materiais, sobrevivendo dignamente sobre a face da Terra e não permitindo que este aspecto de nossas vidas nos leve a perder a salvação. Pensemos nisto!
Ev. Dr. Caramuru Afonso Francisco
Site: http://www.portalebd.org.br/files/4T2013_L4_caramuru.pdf