LIÇÃO Nº 8 – A SUPREMA ASPIRAÇÃO DO CRENTE
O cristão almeja morar no céu.
INTRODUÇÃO
– Na sequência do estudos a respeito da carta de Paulo aos filipenses, estudaremos hoje a continuidade do capítulo terceiro, onde o apóstolo revela que sua aspiração é morar no céu.
– Nos dias em que vivemos, muitos dos que cristãos se dizem ser não têm mais esta aspiração do apóstolo Paulo, preferindo as coisas desta vida.
I – O ALVO DO APÓSTOLO PAULO: A RESSURREIÇÃO DOS MORTOS
– Prosseguindo o estudo da carta de Paulo aos filipenses, mais precisamente o estudo de seu capítulo terceiro, depois de ter dado aos crentes de Filipos uma série de conselhos extremamente atuais concernentes ao critério de vida que deve nortear todo aquele que se diz servo de Cristo Jesus, o apóstolo passa a “abrir seu coração” aos filipenses, revelando qual era o seu objetivo de vida, a sua razão de viver.
– Depois de ter dito que a justiça que vem pela fé é a que deve ser buscada por todos os servos de Cristo Jesus, pois é a justiça que vem de Deus, mostrando-nos, com isso, uma vez mais o ensino que já deixara claro na epístola aos romanos, de que a justificação do crente vem pela fé, que é um dom de Deus (Ef.2:8), Paulo mostra aos filipenses que esta justiça leva-nos a sofrer injustiças neste mundo, visto que devemos participar das aflições de Cristo, para que sejamos capazes de participar da Sua glória (Rm.8:17).
– A justificação que vem pela fé é absolutamente necessária para termos o início de uma vida cristã, mas Paulo deixa claro que é insuficiente para que venhamos a ter uma vida cristã autêntica e genuína.
– Quando cremos em Jesus Cristo como único e suficiente Senhor e Salvador, ingressamos no corpo de Cristo, isto é, na Sua Igreja, daí porque o apóstolo ter dito que a justiça que vem pela fé nos faz “achados n’Ele” (Fp.3:9).
– No entanto, uma vez “achado n’Ele”, faz-se mister “conhecê-l’O e à virtude da Sua ressurreição”, ou seja, é necessário que o cristão, uma vez achado em Jesus, pertencente à Sua Igreja, desenvolva uma intimidade com o Senhor Jesus, pois é isto que significa “conhecimento” no sentido hebraico do termo, ou seja, que se aproxime cada vez mais do Senhor, buscando uma vida de santificação, para que possa saber sempre qual é a vontade divina para a sua vida.
– Ora, neste conhecimento de Cristo, que envolve uma comunhão cada vez mais intensa com o Senhor e Salvador, o cristão também experimentará o poder de Deus, pois também conhecerá “a virtude da ressurreição de Cristo”, ou seja, experimentará que a salvação é real e traz inúmeras bênçãos, inclusive o desfrute do poder de Deus para nos livrar do mal e nos fazer conformes à imagem e semelhança de Deus, por intermédio do Senhor Jesus, de Seu sacrifício vicário.
– Esta binomia entre comunhão com Cristo e a manifestação do poder de Deus através de nossas vidas como prova da ressurreição de Jesus, ou seja, da aceitação do sacrifício vicário de Cristo na cruz do Calvário que propicia uma real transformação do ser humano, sua libertação do pecado e sua vida para Cristo e para Deus desde o momento da salvação, tem sido negligenciada por muitos nos dias em que vivemos.
– Muitos não usufruem desta salvação em Cristo Jesus. Pensam que se trata de um mero assentimento a uma série de verdades bíblicas, que se trata mesmo de um “exercício de inteligência”, não revelando terem, efetivamente, recebido a justiça pela fé que vem de Deus.
– Ser cristão é crer que Jesus conquistou a nossa salvação, o perdão dos nossos pecados e que, por isso, devemos, doravante, fazermos a Sua vontade, mesmo que isto nos venha a trazer sofrimentos, incompreensões e perseguições, pois a cada dia nos aproximamos mais de Cristo e passamos a fazer a Sua vontade, de tal maneira que desfrutaremos do exercício do poder de Deus em nossas vidas, sendo realmente transformados e agentes transformadores daqueles que estão à nossa volta.
– Experimentar a “virtude da ressurreição” é ter experiências do poder libertador de Cristo para o homem perdido, o que envolve, inclusive, a realização de milagres, sinais e maravilhas. Foi isto mesmo que o Senhor Jesus disse aos discípulos pouco antes da ascensão ao afirmar que sinais seguiriam aqueles que cressem n’Ele (Mc.16:17,18).
– A presença destes sinais é a demonstração de que os cristãos têm acesso ao “conhecimento da virtude da ressurreição de Cristo”, ressurreição esta que é a razão de ser da nossa fé no Senhor Jesus (I Co.15:17).
– Esta experiência, conforme vimos na lição anterior, não nos isenta, e diríamos mesmo, leva-nos a uma vida de perseguição, pois o mundo nos aborrece (Jo.15:18), precisamente porque, em tendo comunhão com o Senhor e sendo instrumentos do Seu poder, vamos em sentido contrário ao que mundo ama e propala (Ef.2:1-5).
– É esta nova vida que recebemos em Cristo que faz com que tenhamos “nascido de novo” (Jo.3:3), que sejamos “novas criaturas” (II Co.17; Gl.6:15), morrendo para o mundo e vivendo para Deus (Rm.6:4,8).
– Como temos de imitar a Cristo, temos de seguir as Suas pisadas (I Pe.2:21) e, assim como Ele morreu para chegar à glória, também devemos morrer para também usufruirmos da Sua glória (Rm.6:8), tendo de nos considerarmos como mortos para o pecado mas vivos para Deus em Cristo Jesus nosso Senhor (Rm.6:11).
– Esta realidade espiritual que Paulo relata aqui aos filipenses e que já havia mandado para os romanos, é algo que precisa ser aprendido por todos os cristãos. A vida cristã é uma vida para Deus em Cristo Jesus e, portanto, temos de morrer para o mundo, sem o que não seremos verdadeiros servos do Senhor Jesus.
– O Senhor Jesus já dissera isto a Nicodemos, quando disse que ninguém pode ver o reino de Deus se não nascer de novo e que não entrará no reino de Deus se não nascer da água e do espírito (Jo.3:3,5). Este nascimento é do Espírito, que nos traz a fé pela qual somos justificados (Jo.3:6), sendo o demais apenas um “nascimento da carne”, ou seja, uma religiosidade que em nada difere daquela que é trazida pela justiça que vem da lei.
– Este novo nascimento, esta nova vida é indispensável para que alcancemos a salvação e o apóstolo faz questão de lembrar os filipenses que não há sentido algum na vida cristã que não seja uma vida para Deus em Cristo Jesus, uma vida em que se tenha morrido para o mundo, uma vida em que o pecado não mais reine em nosso corpo mortal, em que não obedeçamos mais às concupiscências pecaminosas (Rm.6:12).
– Não é assim, entretanto, que estão a viver muitos dos que cristãos se dizem ser, que entendem que podem servir a Jesus Cristo vivendo da mesma maneira que viviam antes da sua suposta “conversão”, antes de serem “impactados” emocionalmente com alguma mensagem, pregação ou, mesmo, com o ambiente vivenciado em alguma reunião dos “crentes”.
– Paulo é claríssimo ao mostrar que não se pode viver para Deus em Cristo Jesus sem que se abandone o pecado, sem que se rejeite o “curso deste mundo” (Ef.2:2). Tudo o que caracterizava nossa vida de desobediência a Deus e à Sua Palavra deve ser abandonado, se é que, realmente, queremos ter comunhão com Cristo e experimentar da “virtude da Sua ressurreição”.
– Cristo morreu, foi crucificado por nós e nós devemos, também, morrer para o mundo, crucificar o “velho homem”, para que o corpo do pecado seja desfeito em nós, para que não mais sirvamos ao pecado (Rm.6:6).
– Assim, nossos corpos não podem mais ser instrumentos de iniquidade, mas devemos nos apresentar a Deus como vivos dentre mortos e os nossos membros a Deus como instrumentos de justiça (Rm.6:13).
– Bem se vê, portanto, que os que defendem que “Deus quer somente o coração”, que desprezam toda e qualquer atitude que venhamos a fazer com o nosso corpo, pois a comunhão com Deus seria “espiritual”, não têm qualquer razão, sendo apenas enganadores e pessoas que procuram justificar a sua religiosidade vazia e sem qualquer sentido.
– Quem tem comunhão com Cristo, morre para o pecado e o pecado, portanto, não mais tem domínio sobre o seu ser e, por conseguinte, o corpo não pode ser utilizado como “instrumento de iniquidade”, mas, sim, como “instrumento de justiça” para Deus. Através do corpo, glorificamos a Deus, como o próprio Cristo glorificou ao Pai ao Se entregar por nós no madeiro.
– Não é por outro motivo que o apóstolo diz que “somos feitos conforme à morte de Cristo” (Fp.3:10). Ao morrermos para o mundo, entramos em “novidade de vida” (Rm.6:4), ou seja, deixamos de existir no mundo sem Deus e sem salvação, não mais nos fazemos presentes no serviço ao pecado, tendo uma nova conduta, um novo comportamento.
– Assim como Cristo, ao morrer, não mais foi visto pelos ímpios e pecadores, embora deixasse Seu túmulo vazio como testemunho da Sua ressurreição, o que levou, inclusive, os principais dos sacerdotes a subornarem os soldados romanos que encarregados estavam da guarda do sepulcro (Mt.28:11-15), assim também o cristão não é mais visto pelo mundo espiritual que está no maligno, visto que não mais participa do reino das trevas, de onde foi tirado por Jesus (I Pe.2:9).
– Esta ressurreição com Cristo, que faz com que tenhamos novidade de vida, não é, porém, o alvo, o objetivo, a aspiração do cristão. É antes a própria vida cristã, que tem início precisamente por esta morte para o mundo e este viver para Deus em Cristo Jesus, que é o novo nascimento.
– Como nascimento, temos que esta ressurreição com Cristo faz com que tenhamos uma nova vida, é, portanto, o início da vida cristã, não sendo o seu término.
– É o que Paulo mostra aos filipenses: seu alvo não era esta ressurreição com Cristo, pois ela já era uma realidade na sua vida desde o instante em que se encontrara com Jesus no caminho de Damasco. Seu alvo, entretanto, era outro, a saber: a “ressurreição dos mortos” (Fp.3:11).
– Vemos aqui qual deve ser o foco do cristão: não apenas desfrutar da ressurreição com Cristo, que é o inicio da vida cristã e, por conseguinte, pensar nas coisas que são de cima (Cl.3:1-3), não mais vivendo para o mundo e para o pecado, mas única e exclusivamente para Deus, mas, também, ter como meta a ser alcançada a “ressurreição dos mortos”, ou seja, como o apóstolo falará aos colossenses, em outra “epístola da prisão”, “manifestarmos com Cristo em glória” (Cl.3:4).
– O objetivo do cristão jamais pode ser o de receber tão somente benefícios da parte de Deus nesta vida, pois, se assim o fizer, será o mais miserável de todos os homens sobre a face da Terra (I Co.15:19), mas, sim, alcançar a “ressurreição dos mortos”, ou seja, a glorificação, que é o último estágio do processo da salvação, o instante em que receberemos um corpo glorificado e passaremos a viver para sempre com o Senhor na dimensão eterna.
– Jesus veio nos salvar e a salvação representa recebermos a “vida eterna” (Jo.3:16), vida esta que se inicia com o novo nascimento, com a nossa morte para o mundo e a nossa “ressurreição com Cristo”, mas que não se limita a isto. Como dizia um saudoso irmão de quem tivemos o privilégio de ser amigos, “somos crentes para irmos para o céu”.
– Vemos, portanto, como estamos em um baixíssimo nível espiritual entre os que cristãos se dizem ser em nossos dias. Se já tem sido difícil termos cristãos que estejam a viver esta realidade da “novidade de vida” de que acabamos de falar, ainda é mais difícil ainda encontrar quem esteja, como o apóstolo Paulo, a desejar a “ressurreição dos mortos”, ou seja, a glorificação, a passagem para a dimensão eterna no instante em que Jesus vier arrebatar a Sua Igreja.
– Paulo recebera a revelação de que não morreria naquele instante, de que seria absolvido por César no julgamento que estava a enfrentar, uma vez que os filipenses não estavam ainda preparados para enfrentar a partida do apóstolo para a dimensão eterna, mas o apóstolo tinha absoluta consciência de que iria morrer algum dia.
– Esta circunstância, já estudamos em lições anteriores, era até almejada pelo apóstolo, que sabia que a morte física, para o cristão é algo bem melhor do que a vida terrena (Fp.1:23), precisamente porque o apóstolo tinha uma esperança de que, no dia de Cristo (Fp.1:10), alcançaria a plenitude de sua salvação, que é a glorificação.
– Sabendo que iria morrer, o apóstolo tinha como alvo a “ressurreição dos mortos”, o que o apóstolo João denominará, na revelação que Jesus lhe deu, de “primeira ressurreição”, ou seja, aqueles que, tendo crido em Cristo e se mantido fiéis até a sua morte física, serão ressuscitados pelo Senhor para com Ele conviverem eternamente.
– Muitos dos que cristãos se dizem ser, entretanto, têm verdadeira “paúra da morte”, tem medo de morrer, precisamente porque não possuem a convicção da salvação, não têm uma vida de comunhão com Cristo e, por isso mesmo, não têm o Espírito Santo dizendo em seu coração que eles são filhos de Deus (Rm.8:16), não tendo, assim, qualquer perspectiva de uma vida futura, eterna, gloriosa, bem melhor do que a que vivemos aqui.
– Nosso alvo, nossa meta deve ser a de ter uma vida santa aqui na Terra, de intensa e cada vez maior comunhão com o Senhor, para que, no momento de passarmos para a eternidade, ou, então, se estivermos vivos no dia do arrebatamento da Igreja, podermos atingir a glorificação, que é o fim de todo aquele que é ressuscitado com Cristo.
– Assim como Jesus sofreu, padeceu e morreu por nós e, ao terceiro dia, ressuscitou, subindo após aos céus para ter a Sua glorificação (Sl.24:7,8), também os Seus imitadores, após terem sofrido e padecido por amor a Cristo neste mundo, também serão levados aos céus pelo seu Senhor e Salvador, alcançando igual glorificação (Sl.24:9,10).
– Era nesta perspectiva que o próprio Senhor Jesus viveu sobre a face da Terra, como nos dá conta o escritor aos hebreus (Hb.12:2), perspectiva esta que temos de levar em consideração para também nos fortalecermos em nossa fé e atingirmos o fim de nossa fé, que é a salvação das almas (Hb.12:3; I Pe.1:9).
– O cristão é alguém que, tendo recebido a revelação da luz do Evangelho de Cristo (II Co.4:4), tem direção, sabe muito bem para onde está indo e o que precisa fazer para alcançar o seu objetivo. Sabe perfeitamente que está a trilhar um caminho apertado, cuja porta é estreita, mas que o conduz para a vida, para a salvação, salvação esta que termina na glorificação.
– Não é por outro motivo, portanto, que mensagens como a santificação e o arrebatamento da Igreja devem ser assuntos constantes e sempre presentes na Igreja, se é que estamos, realmente, caminhando pelo caminho apertado, após termos entrado pela porta estreita.
– A santificação lembra-nos da necessidade de nos mantermos “em novidade de vida”, do compromisso que assumimos de morrermos para o pecado e de vivermos para Deus em Jesus Cristo. Afinal de contas, sem a santificação, ninguém verá o Senhor (Hb.12:14).
– Já a lembrança do arrebatamento da Igreja e, mais do que lembrança, o seu desejo ardente (I Co.16:22; Ap.22:17), permite-nos a conscientização de que a santificação tem um alvo bem determinado, qual seja, a nossa glorificação, a ser alcançada no dia de Cristo, quando o Senhor vier buscar a Sua Igreja, ocasião em que atingiremos a plenitude de nossa salvação.
– Era este o ardor que caracterizava a igreja primitiva e que a põe como modelo que devemos seguir. Os cristãos dos dias apostólicos viviam em santidade, não se misturavam com os demais (At.5:13), assim como desejavam ardentemente a volta do Senhor Jesus (I Ts.1:10).
– Tem sido este o alvo de nossa existência perante esta peregrinação terrena? Estamos como o apóstolo, vivendo para alcançar a “ressurreição dos mortos”? Ou pensamos em Cristo somente para esta vida, estamos atrás apenas dos benefícios do Evangelho para a nossa passagem por este mundo? Pensemos nisto!
II – A CONSCIÊNCIA DE PAULO A RESPEITO DA NECESSIDADE DE UMA VIDA CONTÍNUA DE COMUNHÃO COM DEUS NESTA TERRA
– O apóstolo Paulo fala aos filipenses que seu alvo era a “ressurreição dos mortos”, ou seja, a glorificação, esta era a sua meta nesta sua vida sobre a face da Terra e, como tal, também deveria ser o objetivo de todos os cristãos, a começar da igreja em Filipos.
– No entanto, o apóstolo, em mais um gesto de humildade, diz aos filipenses que, embora fosse esta a sua meta, ela ainda não havia sido alcançada. Diz o apóstolo dos gentios: “…não que já a tenha alcançado, ou que seja perfeito…” (Fp.3:12).
– Vemos aqui como o apóstolo faz questão de mostrar que, embora fosse dotado pelo Senhor de um dom ministerial especial, que era o de apóstolo (Ef.4:11), constituindo-se em um pilar de todo o edifício da Igreja (Ef.2:20), nem por isso era um “crente superior” aos demais.
– Paulo mostra, com absoluta clareza, que a sua autoridade apostólica não o colocava num nível superior aos dos demais crentes. Seu apostolado não era um “passaporte para o céu”, mas, sim, apenas um encargo a mais, que o fazia como um verdadeiro “despenseiro dos mistérios de Deus”, como um dos maiores servidores de todo o povo de Deus (I Co.4:1,9).
– Este sentimento deveria ser repartido por todos quantos estão em proeminência no povo de Deus em nossos dias, pessoas, aliás, que, indevidamente, chegam mesmo a se intitular “apóstolos”, “patriarcas” ou outros títulos mais exóticos (já há notícia de “querubins”, “príncipes de Deus” e outras aberrações), querendo indicar, com isso, uma superioridade, uma posição hierárquica de superioridade em relação aos demais cristãos, inclusive com alguns poderes de “cobertura espiritual” ou “autoridade espiritual” que os torna mediadores entre Cristo e o restante da Igreja.
– O apóstolo Paulo, de forma cristalina, mostra que todas estas pretensões destes falsos profetas e ensinadores, em nossos dias, não passa de vaidade pessoal e, o que é mais grave, de pura heresia, porquanto não detêm os líderes uma posição de superioridade em relação aos seus liderados na Igreja.
– Bem pelo contrário, a liderança, que existe, sim, no seio da Igreja, que é organizada de forma a ter um governo, é sobretudo não uma posição de mando, mas, sim, de serviço, pois, na Igreja, ao contrário do que ocorre no mundo, os maiores servem aos menores (Mc.9:35; 10:43-45).
– Paulo, apesar de sua situação de apóstolo e de fundador da igreja em Filipos, não aceitou ser considerado como “perfeito”. Disse que precisava alcançar a “ressurreição dos mortos” e, para isto, tinha de se esforçar para se santificar, para que fosse achado digno de atingir a glorificação. Seu papel como apóstolo não o credenciava, de antemão, a esta glorificação, devendo se esforçar para atingir isto, assim como qualquer outro cristão.
– Isto é importante porque temos a tendência a achar que os ministros, as pessoas que têm proeminência no povo de Deus são mais “santas” e mais “perfeitas” que as demais, aliás, isto é até algo que pode ser entendido pelos próprios ministros e pessoas dotadas de funções de proeminência no povo de Deus, pensamento este altamente perigoso e que é um indício de queda e perdição.
– Cada um tem sua vocação e esta vocação é absoluta necessária para o crescimento espiritual do corpo de Cristo, mas tal vocação não dispensa qualquer dos cristãos a um esforço individual para a santificação e para a preparação para o dia de Cristo. Deus não faz acepção de pessoas (Dt.10:17; At.10:34) e, desta maneira, também o apóstolo Paulo precisava se empenhar para alcançar a “ressurreição dos mortos”, pois não era “perfeito”.
– Esta declaração do apóstolo mostra-nos, também, que não podemos exigir “perfeição” de quem quer que seja. Temos já dito, por algumas oportunidades, que o inimigo de nossas almas tem buscado pôr nos olhos dos cristãos os “´óculos da perfeição”, através dos quais percebemos as imperfeições em todas as pessoas, inclusive as que são salvas em Cristo Jesus, o que nos leva a desanimar em nossa jornada da fé.
– Não existe pessoa perfeita, não há igreja local perfeita. Todos nós necessitamos de aperfeiçoamento, pois somos imperfeitos, tanto que, para isso, o Senhor Jesus instituiu os dons ministeriais na Igreja, precisamente para que os santos fossem aperfeiçoados (Ef.4:11,12).
– Por isso, quando vemos que o apóstolo Paulo, já quase no ocaso do seu ministério, confessa aos crentes filipenses que não era “perfeito”, dá-nos uma importante lição, a fim de que todos nós jamais exijamos a perfeição de quem quer que seja, tão somente a santidade e o empenho pela santificação.
– Embora não fosse perfeito, o apóstolo buscava alcançar “aquilo para o que também fui preso por Cristo Jesus” (Fp.3:12 “in fine”). Paulo não era perfeito, mas espera alcançar a perfeição, vivia em constante esforço para que cumprisse o propósito de Cristo para sua vida, para que fizesse a vontade do Senhor.
– A vida cristã é precisamente este esforço para agradar a Deus, para fazer aquilo que o Senhor tem desejado para as nossas vidas enquanto estivermos sobre a face da Terra. O apóstolo sabia que não era perfeito, mas que deveria se aperfeiçoar a todo o momento, vivendo na Igreja, a fim de que, pelo convívio com os demais servos do Senhor, pudesse chegar em santidade no dia de Cristo ou, mais precisamente, no dia em que fosse recolhido deste mundo, em condições de poder aguardar a “ressurreição dos mortos”, o seu alvo, a sua meta.
– Ele estava “preso por Cristo Jesus”, ou seja, ele bem sabia que as dificuldades que ele vivia estavam no absoluto controle do Senhor, pois ele havia se comprometido a fazer a vontade de Deus e, por isso mesmo, se encontrava preso em Roma para que os desígnios divinos concernentes à evangelização de Roma e até a projeta evangelização da Espanha se cumprissem, dentro do ministério que havia proposto ao apóstolo e sido aceito por Ele desde a sua conversão (At.9:15,16).
– Era esta a visão celestial que havia “aprisionado” o apóstolo Paulo (At.26:19), mais do que qualquer determinação do governo romano. O apóstolo se dizia “preso por Cristo Jesus”, estava a fazer única e exclusivamente a vontade do Senhor, vivia para Ele e em função d’Ele.
– Temos tido consciência de que nos encontramos “presos por Cristo Jesus” a partir do momento em que iniciamos nossa carreira rumo ao céu pela salvação em Seu nome? Temos a consciência de que não mais podemos viver para nós, mas, sim, para o Senhor Jesus?
– É realmente muito triste observarmos que muitos não têm a mínima noção de que a vida cristã comporta esta renúncia ao ego e a completa manutenção de nossas vidas nas mãos de Deus para fazer-Lhe a vontade. Paulo não estava preso por uma ordem de César, mas, sim, por Cristo Jesus!
– Vivemos dias de intenso individualismo, em que as pessoas querem fazer o que querem, sem ter que dar satisfação a quem quer que seja, muito menos ao Senhor. Confundem a graça com uma liberdade que seria uma autonomia, ou seja, o exercício da vontade própria.
– A salvação em Cristo Jesus não nos permite fazer o que bem entendermos, não nos isenta de fazer a vontade do Senhor. A proposta da autonomia, da autossuficiência não é, em absoluto, a proposta do Evangelho, mas, sim, a velha proposta satânica dada a Eva de “ser igual a Deus” (Gn.3:5).
– Jesus não nos escraviza, tanto que permite que qualquer que não queria seguir Seus princípios, a qualquer instante saia de Sua presença (Jo.6:66,67), mas quem estiver disposto a seguir-Lhe deve fazer a Sua vontade, deve Se submeter ao Seu senhorio, pois está preso por Ele.
– Paulo tinha absoluta convicção de que não havia ainda alcançado o estágio da perfeição. Sua franqueza é uma lição que os líderes devem aprender. Não podemos acalentar mistificações e tentar produzir uma imagem de que o líder é um “super-homem”, um “supercrente” e que, por isso, é “infalível”, mesmo em assuntos doutrinários.
– Existe, infelizmente, em nosso meio, a tendência de os líderes de apresentarem como “ungidos de Deus” e, como tal, insuscetíveis de questionamento, com indevido respaldo em passagens bíblicas como Sl.105:15, texto, porém, que não está a se referir apenas aos ministros, aos líderes, mas, sim, a todo o povo de Deus, pois, afinal de contas, todos nós fomos ungidos pelo Espírito Santo no instante em que cremos em Jesus como Senhor e Salvador (Jo.14:15).
– Esta mentalidade é completamente antibíblica e o apóstolo Paulo nos vem mostrar, com sua declaração, que não tem cabimento algum. Muitos ministros estão a invocar uma “infalibilidade” que é muito mais extensa que o próprio dogma romanista da infalibilidade papal, pois, pelo menos, entre os católicos romanos, tal infalibilidade se restringe ao Papa e, mesmo assim, apenas em assunto de fé, algo muito menos amplo do que o que certos “ditadores” estão a invocar para si em nossas igrejas locais.
– Paulo, mesmo diante da autoridade apostólica e da sua condição de fundador da igreja em Filipos, não arrogou para si algo que não possuía, ou seja, a perfeição, a infalibilidade, dizendo claramente que não havia atingido ainda a perfeição, embora se esforçasse por fazê-lo, dentro da linha estatuída pelo próprio Jesus, que quer o aperfeiçoamento dos santos e que eles cheguem à estatura completa de Cristo, a varão perfeito (Ef.4:13).
– Temos aqui, também, o repúdio a outro tipo de comportamento que muitos também apresentam. Sob a desculpa de que não são perfeitos, acomodam-se a uma vida pecaminosa, achando que têm de ser “aceitos” e “acolhidos” no seio da Igreja do jeito que são, já que “ninguém é perfeito”.
– Lembramos que perfeição não tem a ver com santidade. O apóstolo Paulo, embora não fosse perfeito, era santo, vivia separado do pecado, havia morrido para o pecado, já que “ressuscitado com Cristo”. Assim, viver uma vida pecaminosa não é ser “imperfeito”, é ser “ímpio”, é ser um “falso crente”.
– Por isso, o apóstolo Paulo disse que uma coisa fazia e é que se esquecendo das coisas que para trás ficam e avançava para as que estavam diante dele, prosseguia para o alvo, para o prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus (Ef.4:12).
– Paulo não era perfeito, mas buscava a perfeição e, para tanto, não voltava à “vida velha”, não mais compactuava com as atitudes pecaminosas que o haviam caracterizado no passado, inclusive como perseguidor da Igreja.
– Buscar a perfeição significa abandonar o pecado, viver uma vida de contínua santificação, de sorte que não tem qualquer cabimento este argumento daqueles que, em nome da imperfeição, querem conviver com o pecado e, ainda mais, serem admitidos no seio da Igreja.
– Mas a expressão do apóstolo também encerra um outro ensinamento, qual seja, o de que a vida cristã exige atualidade, que não podemos viver do passado, de que de nada serve ou adiante uma “ficha corrida” de dedicação ao Senhor. Temos de ser santos e buscar a perfeição “hoje”, pois o que passou, passou.
– Não são poucos os que querem ter uma vida cristão voltada para o “ontem”, para os dias em que eram exemplares servos do Senhor Jesus, achando que a glorificação se conquista como a aposentadoria, ou seja, por “tempo de serviço”, por tempo de contribuição”. Nada mais inexato, porém.
– O tempo do serviço a Deus, da vida para Deus em Jesus Cristo é “hoje” (Hb.4:7). A cada dia, em cada “hoje” devemos fazer a vontade de Deus, ter consciência de nossa vocação, buscarmos a santificação e esperarmos a glorificação.
– Disto o apóstolo João deixou-nos bem conscientes, quando, na revelação que Cristo lhe deu, fez questão de enfatizar que devemos nos santificar e fazer justiça “ainda” (Ap.22:11), expressão que denota a absoluta e indispensável necessidade que temos de, a cada instante, prosseguirmos em nossa caminhada rumo à perfeição.
– Deus não é injusto para não levar em conta tudo o que fizermos para Ele ao longo de nossa vida(Hb.6:10), mas isto não significa que devamos entender que a salvação se obterá por esta “folha de serviços prestados”, pois a salvação não é pelas obras e, sim, pela fé, fé que precisa ser não fingida (I Tm.1:5) e que, por isso mesmo, é atual e presente. Necessitamos mostrar o mesmo cuidado até o fim, para completa certeza da esperança (Hb.6:11).
– Deus é galardoador dos que O buscam (Hb.11:6) e, portanto, precisamos continuamente buscar a presença de Deus e fazer-Lhe a vontade, até o fim, pois é somente no fim que encontraremos a glorificação, se permanecermos fiéis ao Senhor, comprometidos com o Seu chamado e a Sua vontade.
– Apesar de tudo que já havia feito pelo Senhor Jesus, Paulo demonstrava aos filipenses de que não se poderia viver do passado, de que isto nada garantia a sua salvação, mas, sim, que o mesmo esforço que havia começado a exercer no encontro com o Senhor Jesus no caminho de Damasco deveria ser mantido até o final, pois o alvo era a “ressurreição dos mortos” e, para tanto, havia a necessidade de “dormir no Senhor”.
– Temos tido esta mesma disposição, esta mesma expectativa? Ou já temos negligenciado, passando a rememorar os velhos tempos, em que servíamos a Deus com qualidade e abnegação, sem medir esforços, sem desânimo, sem desculpas que hoje são as características para a nossa mediocridade espiritual.
– O escritor aos hebreus fala àqueles crentes que precisavam ser cuidadosos até o fim e que não deveriam negligenciar em sua jornada espiritual, mas que deviam imitar os que, pela fé e paciência, herdaram as promessas (Hb.6:12). Temos imitados estes homens e mulheres de Deus que estão a aguardar a “ressurreição dos mortos”? Pensemos nisto!
– Paulo prosseguia sua jornada, pois tinha um alvo que estava a perseguir, a “ressurreição dos mortos”. Quando viesse isto a acontecer, o apóstolo tinha certeza alcançaria “o prêmio pela soberana vocação de Deus em Cristo Jesus”.
– A esperança de Paulo, como também na vimos em lições anteriores, era decorrente da convicção de sua chamada, da consciência de sua vocação. Ele havia sido chamado para evangelizar (I Co.1:17) e estava cumprindo este ministério que o Senhor lhe havia dado à risca, mesmo que com imensas dificuldades e percalços. O importante, porém, era que era fiel ao chamado do Senhor e isto lhe deixava com uma “consciência sem ofensa” (At.24:16).
– Como ele estava a cumprir o que o Senhor Jesus determinara, não tinha porque não ter esperança de que chegaria até a “ressurreição dos mortos” e receberia do Senhor o galardão pela obra que estava a empreender. Suportava tudo pelo gozo que lhe estava proposto, assim como o Senhor a quem imitava (Hb.12:2; I Co.11:1).
– Não estamos buscando prêmios terrenos nem reconhecimentos de A ou de B, mas temos fé de que Deus existe e é galardoador dos que O buscam e, por isso, a exemplo do apóstolo, devemos buscar incessantemente a Deus para sabermos qual é a Sua vontade, cumprindo-a integralmente, a despeito de tudo que venhamos a sofrer ou padecer.
– Precisamos glorificar ao Senhor neste mundo, consumando a obra que Ele nos deu a fazer (Jo.17:4), para que também sejamos por Ele glorificados não só quando do arrebatamento da Igreja, mas, também, na entrega do galardão que está com Ele quando do Tribunal de Cristo (Ap.22:12).
– Era esta a esperança do apóstolo, que queria que também fosse vivida por todos os servos do Senhor, em especial os crentes de Filipos, vivência esta, entretanto, que exigia da parte dos cristãos a justiça que vem pela fé, pois só quem tem fé é capaz de entender que Deus é galardoador dos que O buscam (Hb.11:6).
– A busca pelo galardão, portanto, nada tem de ganância ou de mesquinhez, visto que somente quem vive fazendo justiça e em santificação dá o devido valor às coisas espirituais e entende que o galardão que está com o Senhor é muito melhor do que qualquer benesse ou vantagem que se possa alcançar nesta vida.
– A suprema aspiração do crente, portanto, é ver coroada uma vida de obediência ao Senhor, de abandono do pecado, de santificação e de cumprimento da vontade do Senhor na glorificação, ou seja, na plenitude da salvação, para que, então, possa ser como Cristo homem já é, para ter condições de viver plenamente com o Senhor, de desfrutar na integralidade aquilo que apenas usufruímos em parte enquanto estamos nesta vida terrena e, mesmo, no Paraíso no aguardo da ressurreição.
– Era também este o desejo do apóstolo João, que afirma que, embora já sejamos filhos de Deus, ainda não foi manifestado o que havemos de ser, mas que seremos semelhantes a Ele, quando Ele Se manifestar e, por isso mesmo, por termos esta esperança, purificamo-nos a nós mesmos, como também Ele é puro (I Jo.3:2,3).
– O alvo do cristão é a glorificação, glorificação que, conforme já visto, exige a comunicação nas aflições de Cristo e na Sua obediência até o fim. É este o norte? É esta a nossa esperança? Que Deus nos ajude a ter esta mesma aspiração dos crentes fiéis. Amém!
Ev. Dr. Caramuru Afonso
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