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LIÇÃO Nº 9 – ORANDO E JEJUANDO COMO JESUS ENSINOU

INTRODUÇÃO

– Na sequência do estudo do sermão do monte, analisaremos os ensinos do Senhor a respeito da oração e do jejum.

– O discípulo deve Se relacionar com Deus em intimidade.

I – O RELACIONAMENTO DO DISCÍPULO DE JESUS COM DEUS

– Depois de ter mostrado que o discípulo deve se conduzir conforme a verdade, tendo dado como exemplo disto a prática da esmola, que nos mostra, a um só tempo, como devemos agir se amamos a Deus e ao próximo, Jesus irá Se debruçar sobre o relacionamento do Seu discípulo com o Senhor.

– Ainda fazendo um contraste entre a religiosidade farisaica, tida como “exemplar” pelos filhos de Israel nos Seus dias, e o que efetivamente Deus esperava do Seu povo, Cristo vai tratar da oração e do jejum duas práticas que o homem deve ter em relação ao seu Criador.

– Jesus, no bojo de Seu ensino a respeito da vida espiritual, após ter tratado da esmola, passa a falar a respeito da oração, combatendo a oração dos hipócritas, que faziam questão de orar em pé nas sinagogas e nas esquinas das ruas para serem vistos pelos homens e, diante desta exibição, serem tidos como os santos (Mt.6:5).

Era este o comportamento dos fariseus, tanto que a palavra “fariseu”, em aramaico, significa “os separados”, “os santos”. A oração era uma forma de o fariseu se apresentar, seja na sinagoga, seja na sociedade, como um “receptáculo de santidade”, como um “homem santo”.

– Jesus, de pronto, ao mostrar aos discípulos o significado da oração, quis afastar a ideia então existente de que a oração era um “atestado de santidade”, uma “demonstração de superioridade espiritual”. Nos dias hodiernos, não é, infelizmente, diferente o quadro que se encontra nas igrejas locais, onde muitos

“orantes” fazem questão de ostentar esta condição para se apresentarem como “mais santos”, “mais consagrados”. Fujamos deste comportamento, que é considerado pelo Senhor Jesus, que é o mesmo ontem, hoje e eternamente (Hb.13:8), como manifestação de hipocrisia.

– A oração não pode ser feita como “exibição de santidade”. Se orarmos para que os homens nos vejam como “santos”, já teremos recebido nosso galardão diante deste louvor humano, o que é uma completa inutilidade.

Se orar é comunicar-se com Deus, se orar é pedir o favor do Senhor, entrar em contato com Ele, de que serve orar para ser exaltado e enaltecido pelos homens?

Infelizmente, muitos preferem ser considerados pelos homens do que ser justificado por Deus, como nos dá conta o próprio Senhor Jesus na parábola do fariseu e do publicano (Lc.18:9-14).

– Ao contrário do que faziam os fariseus, tidos, na época de Jesus, como os “perfeitos orantes”, o Senhor nos ensinou que devemos orar na intimidade com Deus, sem qualquer exibição pública, entrando no aposento, fechando a porta e orando ao Pai que está em oculto e, ante este segredo, o Pai, que vê secretamente, recompensará o orante (Mt.6:6).

– Jesus não estava dizendo que orar em público era errado e não deveria ser feito, até porque Jesus orava em público (Lc.10:21,22; Jo.11:41,42; 17) e, como não era fariseu, não ensinava algo que não praticava (Mt.7:29; 23:3; At.1:1).

Jesus apenas ensinou os discípulos que a oração era um diálogo com Deus, algo que deveria indicar a intimidade entre o orante e o Senhor, não algo que fosse utilizado como motivo de exibição diante dos homens.

– O ensino de Jesus contrariava, deste modo, tudo quanto os Seus discípulos viam como modelo de santidade e de religiosidade no seu tempo. Isto naturalmente os deixou perplexos, já que o que tinham visto e reconhecido como comportamento de oração havia sido totalmente repudiado pelo Senhor.

– Como se não bastasse isso, o Senhor Jesus, ainda, disse a eles que não deveriam, também, orar mediante

“vãs repetições”, o que era uma característica das orações feitas pelos gentios, nos vários rituais e cerimônias das religiões daquele tempo, em especial as práticas que tinham se originado do hinduísmo e do budismo, com seus conhecidos “mantras”, palavras, sílabas ou poemas religiosos que são repetidos seguidamente com o fim de se obter, através desta repetição, um benefício espiritual (Mt.6:7).

– Esta “vã repetição”, que é feita mediante uma concentração mental, muitas vezes sem qualquer compreensão, visto que, os “mantras”, normalmente, são compostos em “línguas sagradas”, muitas delas “línguas mortas”, que não são mais faladas e que são incompreensíveis aos que as repetem (como é o caso do sânscrito, a língua sagrada do hinduísmo e do budismo),

nada tem que ver com o sentido e significado da oração, que é um diálogo entre Deus e o homem, diálogo que, logicamente, pressupõe a compreensão do que se fala, pois, caso contrário, nem de comunicação se estará a falar.

– Esta “vã repetição” em vez de nos dar a ideia de um relacionamento pessoal entre Deus e o homem, de um encontro entre Deus e o homem, apenas se apresenta como uma “forma de manipulação da Divindade”, como uma “fórmula mágica”, como “o domínio de forças ocultas”, o que é completamente contrário à realidade espiritual da soberania divina e da pequenez do homem (Sl.9:20).

– No entanto, o que se vê, os dias hodiernos, é que os “mantras”, as “vãs repetições” têm se tornado cada vez mais frequentes na religiosidade humana. A Nova Era, que “popularizou” as práticas hinduístas e budistas, fez com que o Ocidente abraçasse, seja mediante a difusão de seitas orientais, seja mediante o esoterismo, o uso de “mantras”, inclusive com “finalidades terapêuticas”, como se vê, v.g., no ioga.

OBS: “…O hinduísmo é um sistema de obras — coisas que a pessoa precisa fazer para atingir o moksha, que é o paraíso hindu.

Ele envolve a prática de yoga, cuja finalidade, contrariamente ao que muitos ouviram falar, jamais foi melhorar a saúde de alguém.

Em vez disso, é um meio de morrer para seu próprio corpo na esperança de se livrar do âmbito físico. Isso supostamente une a pessoa a Brahman, a suprema deidade do hinduísmo.…” (McMAHON, T.A. O engano da salvação pelas obras. Chamada da meia-noite, ago. 2010, ano 41, n.08, p.6).

– As “vãs repetições” também são observadas no judaísmo, todo ele construído sobre a doutrina farisaica, o único grupo religioso a sobreviver após a destruição do templo em Jerusalém em 70.

Papel de realce na vida religiosa judaica é o “Sidur”, o “livro de orações”, “…o livro judaico de orações comuns para todos os dias da semana e para o Sabath (…) uma antologia monumental de orações tanto coletivas quanto individuais, aplicáveis a qualquer necessidade religiosa e a qualquer situação no cilco da vida do judeu…” (AUSUBEL, Nathan. Sidur. In: A JUDAICA, v.6, p.797).

– Também no islamismo, onde as cinco orações diárias seguem um ritual meticuloso, antes, durante e depois das orações, e são feitas em árabe, idioma desconhecido da imensa maioria dos muçulmanos em todo o mundo. Tem-se, pois, aqui também, “vãs repetições”.

OBS: “…É recomendável, após cada oração, fazer a glorificação que Fátima Azzahra (A.S.), filha do Profeta Mohammad (S.A.A.S.) fazia,

ensinada por seu próprio pai e que é a seguinte: 34 vezes “Allahu Akbar”, que significa Deus é o Excelso!. 33 vezes “Al-Hamdu Lelláh”, que significa Louvado seja Deus!. 32 vezes “Sob-hana-llah”, que significa Deus Glorificado!.(…)Itens necessários que devem ser observados antes das Orações

1. Ablução, como nas ilustrações representadas.

2. Pureza do corpo, das roupas e do lugar onde se reza. O(a) devoto(a) deve ser purificado(a) das relações sexuais e a mulher purificada da menstruação, pós-parto e resguardo.

3. Verificar a direção da Kába, que fica em Meca, a Cidade Sagrada. Podemos nos orientar através da bússola dos crentes muçulmanos ou das mesquitas.

4. A mulher, ao rezar, deve estar totalmente coberta. Exceto o rosto e as mãos. Ao homem, é necessário que tenha as partes genitais decentemente cobertas, podendo rezar com suas roupas normais.

5. É importante começar a rezar somente dentro do tempo em que entrou o horário da oração, caso contrário, a reza tornar-se-á inválida.(…)” (AL-KHAZRAJI, Sheikh Taleb Hussein. Trad. de Aídah Rumi. Da orientação do Islam III: a oração no Islam. Disponível em: http://www.mesquitadobras.org.br/arquivos/file/livros/pdf/Texto%20livro%203.pdf Acesso em 13 set. 2010).

– Mas os que cristãos se dizem ser não fogem desta triste realidade. Ao longo dos séculos, as “vãs repetições” foram estritamente observadas pelos segmentos religiosos ditos cristãos, com o surgimento de um sem-número de “orações” e “rezas”,

que contrariam frontalmente o ensino de Jesus, em especial entre católicos (tendo surgido até o “Breviário”, coletânea das orações a serem repetidas diariamente pelos sacerdotes, sem se falar no “Santo Rosário”, criado para honrar Maria), ortodoxos (cujo livro de orações é o “Tipikon” ou “Regulamento”) e anglicanos (“o Livro de Oração Comum”, a principal obra anglicana).

Até mesmo entre os segmentos protestantes e, dentre eles, os pentecostais, esta prática tem, lamentavelmente, se disseminado, como vemos nos ensinos ligados à “teologia da confissão positiva”. Como estamos distantes do que nos ensinou Jesus!

– A oração não é uma “recitação”, uma “repetição de palavras”. A oração, ensina-nos Jesus, é um diálogo que se faz com Deus, indispensável para que nos tornemos cada vez mais íntimos do Senhor, que aumentemos nosso conhecimento de Deus (Os.6:3), santificando-nos (I Tm.4:5) e nos aperfeiçoando no objetivo de nos tornarmos um com Ele (Jo.17:21).

OBS: “…a repetição não suscita a convicção, mas, sim, a alienação. Deus não tem prazer na mente alienada, do contrário não teria nos dado o livre arbítrio. Todavia a iniciação é uma prática comum a qualquer seita ou filosofia baseada no ocultismo.

A primeira coisa a ser feita é a lavagem cerebral, para que a mente lave tudo que pertence ao Criador e, assim, as energias malignas possam entrar nesta vida, cauterizando-a e a tornando um simples objeto de manipulação humana, seja para o bem, seja para o mal.…” (CARVALHO, Ailton Muniz de. Maomé X Cristo: e o outro lado da história, p.97).

– A oração não é feita para que o Senhor saiba o que queremos ou precisamos, pois Ele bem o sabe antes mesmo que nós oremos (Mt.6:8), mas é uma demonstração que fazemos ao Senhor de que confiamos n’Ele, de que reconhecemos Sua soberania e que sabemos que somos integralmente dependentes d’Ele.

– Diante destas novidades apresentadas pelo Senhor Jesus aos Seus discípulos a respeito do real significado da oração e de como ela deveria se dar, um dos discípulos ficou atônito, percebeu que não sabia o que era, na realidade, a oração e como deveria orar e, por isso, como nos indica Lucas, depois de ver o Senhor orando, num certo lugar, pediu-Lhe que o ensinasse a orar (Lc.11:1), até porque João também havia ensinado os seus discípulos a orar.

– Vemos, por primeiro, que este bendito discípulo se sentiu estimulado a pedir a Jesus que lhe ensinasse a orar porque viu Jesus orando. Jesus primeiro praticava, para depois ensinar. Como seria bom se seguíssemos este exemplo. Não será talvez por isso que nossas crianças, adolescentes e jovens não tenham uma vida de oração? Que exemplo tem tido de seus pais em casa?

OBS: “…Não é antes de tudo contemplando seu mestre a orar que o discípulo deseja orar? Pode então aprender a orar que o Mestre da oração. É contemplando e ouvindo o Filho que filhos aprendem a orar ao Pai.”(parágrafo 2601 do Catecismo da Igreja Romana).

– Por segundo, percebemos que este discípulo tinha reverência, tanto que pediu a Jesus que lhe ensinasse a orar depois que Jesus havia acabado de orar.

Pelo que vemos do ensino de Jesus, Ele orava em locais à parte, em secreto com o Pai (Mc.6:46; Lc.10:12; 22:41), de sorte que este discípulo esperou, certamente, aquele instante em que o Senhor deles Se apartou para orar para só então pedir que o Senhor o ensinasse a orar.

– Eis uma outra atitude que não temos visto entre os que cristãos se dizem ser em nossos dias. Não há o mínimo respeito para com os que estão orando, e isto nos templos, que deveriam ser considerados como “casas de oração”.

Os poucos que chegam às igrejas locais e se dispõem a orar são obrigados a interromper suas orações por inoportunos cumprimentos, sem falar nas conversações, toques de instrumentos, correrias de crianças e tantas outras coisas que não edificam e só contribuem para um clima de irreverência no qual o Senhor não estará presente, não Se manifestará. Aprendamos com os discípulos que esperaram Jesus acabar de orar para que Ele os ensinasse a orar.

– Se oração não era exibição nem demonstração de santidade, como faziam os fariseus, nem tampouco as vãs repetições dos gentios, como se deveria orar? É neste contexto, para nos ensinar como se deveria orar de forma agradável a Deus, como se deveria relacionar com o Pai que Jesus nos ensina a “oração dominical”.

– À evidência, então, vemos que não se tratava de uma “reza”, de uma oração pré-estabelecida, a ser repetida pelo orante. Não, não e não, já que Jesus acabara de ensinar que oração não é vã repetição.

Também não se tratava de uma fórmula pela qual o orante demonstraria sua santidade, exibindo-se para os demais, pois oração não era exibição de santidade.

O “Pai Nosso” é tão somente um modelo, um ensino de Jesus em que observamos como se ora, o que deve conter uma oração, como uma oração será aceita pelo Senhor.

– Por terceiro, cabe-nos verificar que o precioso ensino de Jesus que se encontra na “oração dominical” foi o resultado do pedido de apenas um dos discípulos, cuja identidade nos é omitida.

Esta circunstância mostra como a dimensão da oração é, em primeiro lugar, da intimidade de cada servo de Deus com o seu Senhor (o que não significa que não exista a oração coletiva, obviamente), como também que, na oração, temos de nos portar como um “menos do que nada” diante do Senhor de todas as coisas. Temos nos comportado assim em nossas orações?

II – A ORAÇÃO DO SENHOR: JESUS ENSINA-NOS A NOS DIRIGIR AO PAI

– Diante do pedido de um dos discípulos, Jesus ensina-nos a orar, dizendo que, ao fazermos, devemos nos dirigir ao Pai. Com efeito, a oração-modelo começa com “Pai nosso” (ou “Pai”, na versão de Lucas).

– Neste ensino, o Senhor nos mostra, de pronto, a realidade da Trindade, algo que não pode estar ausente daquele que tem acesso a Deus.

Quem nega o Filho, nega o Pai (I Jo.2:22,23) e por aí já vemos que quem nega a triunidade divina não pode, em absoluto, dirigir uma oração a Deus.

– A oração é dirigida ao Pai (Jo.16:23,24), em nome do Filho (Jo.14:13,14; 15:16), na companhia do Espírito Santo(Rm.8:26; Gl.4:6; Jd.20).

Sabemos que Deus é um só, mas, no Seu ensino, o Senhor Jesus bem nos mostra que devemos nos dirigir ao Pai, pois não só Ele assim nos ensinou, como também procedeu.

O Senhor intercede, atualmente, por nós, assentado que está à direita do Pai, mas quando se diz que Ele intercede é precisamente porque a oração é dirigida ao Pai e não ao Filho. Pensemos nisto, nesta realidade que nos foi revelada pelo Senhor, para que não cometamos erros em nossas expressões.

– Mas, e aí temos um primeiro mistério, ao iniciar a oração-modelo com a expressão “Pai nosso” ou “Pai”, temos a constatação de que Deus não ouve a pecadores, mas apenas a Seus filhos.

Se nos dirigimos a Deus como Pai é porque somos Seus filhos e somente seremos Seus filhos se crermos em Jesus (Jo.1:12,13).

A única oração ouvida por Deus de quem ainda não é Seu filho é a confissão dos pecados, acompanhada do pedido de perdão, operada pelo acolhimento da “fé salvadora” (Rm.10:17; Ef.2:8).

– Não há como nos dirigirmos a Deus se Ele não for nosso Pai. Não há como nos dirigirmos a Deus se não confessarmos e pedirmos perdão pelos nossos pecados.

Não há como nos dirigirmos a Deus se não entrarmos pelo novo e vivo caminho que foi aberto pelo sangue de Jesus Cristo (Hb.10:19-23).

– Deus somente será nosso Pai se estivermos em comunhão com Ele. Não há como termos a Deus como Pai se não tivermos recebido o espírito de adoção (Rm.8:15). Não há como termos a Deus como Pai se ainda andamos segundo a carne (Rm.8:6-9).

Muitos dizem que o “céu é de bronze”, que “tudo está fechado para ele”, mas não será porque não se entrou ainda pelo caminho da confissão de pecados? Não será este o motivo porque, em diversas igrejas locais, Deus não Se faz presente? Deus é nosso Pai, irmãos?

– Esta expressão, se de um lado nos mostra quão indispensável é estarmos em comunhão com Deus para orarmos, também nos mostra que, na oração, desfrutamos de uma intimidade inigualável com o Senhor.

Por isso, a oração é uma manifestação da graça divina, pois não permite chegar a Deus com ousadia, pois era impensável que seres humanos pudessem se aproximar do Senhor, ante a sua pecaminosidade.

Entretanto, o Senhor teve misericórdia de nós e nos permite, pelo sangue , que, imerecidamente, nos cheguemos a Ele! Que privilégio!

– Se Deus é nosso Pai, não temos porque temer chegar à Sua presença. Como bem disse Jesus se nossos pais humanos, sendo maus, não dão coisas más a seus filhos (Mt.7:11), como podemos ter receio do que Deus está a nos dar ou a nos falar?

Podemos nos aproximar d’Ele com verdadeiro coração, em inteira certeza de fé, pois o Senhor está pronto a sempre nos dar o melhor, muito além daquilo que pensamos ou pedimos. Afinal de contas, como dizia nossa finada mãe, “Deus é Pai, não, padrasto”.

– Não temos de ter medo quando nos apresentamos a Deus. Não repitamos o equívoco do povo de Israel que, diante da manifestação da glória divina no Sinai, ficou aterrorizado, suplicando que Moisés fosse falar com Deus (Ex.20:18-21).

Não temos o espírito de escravidão para termos medo de Deus, mas o espírito de adoção de filhos (Rm.8:15). Por termos a Deus como Pai, amamo-l’O e, onde há amor, não há medo nem receio, já que não temos pena alguma mais a sofrer ante o perdão de nossos pecados (I Jo.4:18).

– Mas o Senhor também nos ensina que o “Pai nosso” está nos céus (o que somente consta na versão de Mateus). Esta afirmação não é gratuita, mas revela a consciência de que, apesar de ser nosso Pai, de estarmos em comunhão com Ele, Ele é o Senhor, Ele é o Criador, nós, as criaturas, Seus servos. A oração é, sobretudo, o reconhecimento da soberania divina.

– O Pai está nos céus não significa que não esteja pronto a nos ouvir, nem que não esteja conosco no instante em que oramos.

Jesus disse que Ele está em secreto, junto a nós, quando nos entramos no aposento e fechamos a porta. Dizer que o Pai está nos céus, em hipótese alguma, quer dizer que Ele está distante, alheio ou é inacessível.

– Jesus lembra-nos que o Pai está nos céus para nos fazer lembrar que Ele é santo, que Se encontra entronizado com glória, onde é aclamado a todo instante pelos anjos e que, apesar de ser o Deus Altíssimo, estar em Seu trono de glória e de nem os céus dos céus poderem contê-l’O, Ele está disposto a Se inclinar e nos ouvir, nos atender. Entretanto, não podemos nos esquecer de que Ele é Deus e nós, meros homens.

– Temos intimidade e liberdade para com Deus, pois Ele é nosso Pai, mas devemos obedecer-Lhe e reverenciar-Lhe, pois Ele é Deus.

Por isso, não podemos admitir que orações sejam feitas em ambiente de irreverência, de forma displicente, como temos observado em muitos lugares. A oração é um momento solene, pois estamos nos apresentando ao Senhor, ao Criador de todas as coisas, Àquele que está nos céus.

– O Pai está nos céus e, por isso, quando entramos diante da Sua presença, estamos num ambiente de santidade, louvor e adoração. Os serafins, seres angelicais superiores a nós, apresentam-se reverentemente ao Senhor (Is.6:2).

Moisés foi instado a tirar as sandálias de seus pés pois o lugar onde Deus Se manifestou tornou-se terra santa, tendo o grande homem de Deus encoberto Seu rosto em sinal de reverência (Ex.3:5,6). Semelhantemente, isto ocorreu também com Josué (Js.5:13-15).

– Esta consciência tem faltado a muitos que cristãos se dizem ser na atualidade, principalmente os que seguem os falsos ensinamentos da teologia da confissão positiva, que reduz o Senhor a mero serviçal dos crentes, que cria supostas “obrigações” de Deus para com os orantes, como se a oração fosse uma cobrança.

A oração é, antes de mais nada, uma manifestação de nossa humildade diante de Deus, que é o Pai que está nos céus.

– Em seguida, vem o primeiro pedido expresso na “oração dominical”: “santificado seja o Teu nome”, pedido este reproduzido tanto por Mateus quanto por Lucas.

Este pedido pode causar, à primeira vista, uma dificuldade de compreensão pois, como já vimos, Deus é santo e, portanto, não há como desejarmos que o nome de Deus seja santificado, se Ele já é santo.

– Evidentemente que Deus é santo e que não é este o significado expresso pelo Senhor Jesus ao nos ensinar a orar. A noção judaica da “santificação do nome de Deus” ou “Kidush Ha-Shem”, em hebraico, era bem conhecida nos dias de Jesus, pois se desenvolvera ao longo do período intertestamentário.

O “nome de Deus seria santificado” quando o judeu resistisse até a morte, se necessário fosse, para se manter fiel à lei.

Foi para “a santificação do nome de Deus” que muitos judeus morreram durante os terríveis anos em que o rei Antíoco IV tentou converter à força o povo judeu ao politeísmo grego.

– Quando se pede que “seja santificado Teu Nome”, o que estamos a pedir ao Senhor é que nos dê forças para que jamais nos apostatemos da fé, pois o apóstata, segundo o próprio conceito judaico, era “a profanação do Nome de Deus” (em hebraico, “Chilul Ha-Shem”).

– Quando, então, o Senhor Jesus, na oração-modelo, diz que nosso primeiro pedido deva ser “santificado seja Teu nome”, está a nos mostrar que a prioridade que devemos buscar diante de Deus, em nossas orações, é a perseverança, a manutenção da comunhão com o Senhor, a guarda da fé (II Tm.4:7) para que alcancemos o seu fim, que é a salvação das almas (I Pe.1:9).

– Não se trata, portanto, de pedido para que Deus seja santo, pois Deus é santo, mas que a santidade de Deus se reflita em cada de um nós na fidelidade que cada um de nós deve ter em relação ao Senhor.

O pedido é que sejamos filhos de Deus durante toda a nossa existência sobre a face da Terra, reproduzindo a santidade divina em nossas vidas, fazendo com que o nome do Senhor seja glorificado pelos homens (Mt.5:16).

– “Santificado seja o Teu nome” é uma súplica para que não sejamos instrumentos de escândalo, que nossas ações neste mundo não venham a fazer com que as pessoas tropecem espiritualmente e deixem de ser salvos por Cristo Jesus (Mt.18:6-8).

– Este primeiro pedido mostra-nos, também, com absoluta clareza, que as coisas espirituais, as “coisas de cima” (Cl.3:1,2) têm absoluta prioridade em nosso relacionamento com Deus.

Temos de, em primeiro lugar, pedir a Deus que nos faça ser espelhos que reflitam a Sua glória, que permita nos transformarmos, a cada instante, de glória em glória, na mesma imagem, como pelo Espírito do Senhor (II Co.3:18). É este o primeiro intento de nossas orações? Foi assim que Jesus nos ensinou!

– Jesus nos ensinou a isto pedir ao Pai porque Ele próprio Se santificou a Si mesmo (Jo.17:19), resistindo a todas as tentações e jamais pecando (Hb.4:15). Nós, ao contrário d’Ele, não somos impecáveis (I Rs.8:45; II Cr.6:36; Rm.3:23), mas, porque Ele venceu (Jo.16:33), podemos também vencer (Rm.8:37), rogando ao Pai que “santificado seja o Teu nome”.

OBS: “…Em seguida dizemos: Santificado seja o vosso nome, não que desejemos ser Deus santificado por nossas orações, mas que peçamos

ao Senhor seja seu nome santificado em nós. Aliás, por quem seria Deus santificado, ele que santifica? Mas já que disse: Sede santos porque eu sou santo, pedimos e rogamos que nós, santificados pelo batismo perseveremos no que começamos a ser. Cada dia pedimos o mesmo.

A santificação cotidiana é necessária para nós pois, cada dia, falhamos e temos de purificar nossos delitos por assídua santificação.

O Apóstolo descreve qual seja a santificação que, pela condescendência de Deus, nos é dada: Nem fornicadores nem idólatras, adúlteros, nem efeminados, sodomitas, nem ladrões nem fraudulentos, nem ébrios, maldizentes, nem usurpadores alcançarão o reino de Deus.

Na verdade fostes tudo isto, mas fostes lavados, fostes justificados, santificados, em nome do Senhor Jesus Cristo e no Espírito de nosso Deus.

Diz-nos santificados no nome do Senhor Jesus Cristo e no Espírito de nosso Deus. Oramos para que esta santificação permaneça em nós. Se o Senhor e nosso juiz advertiu aquele que curava e vivificara de não mais pecar, para que não lhe adviesse coisa pior, fazemos este pedido por contínuas orações, suplicamos dia e noite a fim de que, por sua proteção, nos seja guardada a santificação vivificante que procede da graça de Deus.…” [CIPRIANO de Cartago. Do tratado
sobre a oração do Senhor. Nn. 18-22: CSEL 3, 280-281 (Séc.III). Disponível em:
http://www.cleofas.com.br/virtual/texto.php?doc=IGREJA&id=igr0525 Acesso em 14 set. 2010).

– Neste pedido de “santificação do nome do Senhor” encontramos um aspecto do processo da salvação em que há uma nítida colaboração entre Deus e o homem: a santificação progressiva.

Deus nos santifica, purificando-nos de nossos pecados, mas a manutenção da santidade em nós depende da ação conjunta do homem e de Deus.

É a ação mais proeminente em que há o compartilhamento entre Deus e o homem e, por isso, não é por acaso que se encontra como primeiro pedido de uma oração o pedido para que o Senhor nos dê forças para que não venhamos a ser reprovados e percamos a fé.

– Após o pedido da “santificação do nome de Deus”, temos o segundo pedido que Jesus nos ensina fazer ao Pai: “venha o Teu reino”.

Observemos, de pronto, que o texto bíblico é diferente daquilo que comumente vemos ser “rezado”: “venha a nós o Teu reino”. Não existe, seja na versão de Mateus, seja na de Lucas, a expressão “a nós”, que foi indevidamente introduzida pela “tradição”.

– O pedido é que “o reino do Pai venha”, i.e., o “reino de Deus venha”. Neste pedido, uma vez mais, estamos a reconhecer a soberania divina, mas mais do que reconhecer que Deus é rei, queremos que este reino se estabeleça, que ele venha.

O primeiro lugar em que o reino deve se estabelecer é em nós mesmos e, por isso, acabou se disseminando o uso da expressão “a nós”, que, entretanto, não pode ser admitida, até porque se o reino de Deus tem de vir para nós, não deve ficar em nós, mas espraiar-se por todo o mundo.

– O Senhor Jesus disse que o reino de Deus já estava entre os judeus (Lc.17:20,21), que havia chegado e passado a ser anunciado desde o término do ministério de João (Lc.16:16) e uma demonstração da chegada deste reino era o fato de Jesus expulsar demônios (Mt.12:28; Lc.11:20).

No entanto, Israel não receberia o reino de Deus, que seria dado a outra nação (Mt.21:43), precisamente àqueles que recebessem e cressem em Jesus (Jo.1:11,12).

– O pedido para que o reino de Deus venha, portanto, outra coisa não é senão pedir que façamos parte desta “nação santa” (I Pe.2:9).

Trata-se do pedido de fazermos parte do povo de Deus, que implica em sermos obedientes ao Senhor (I Pe.2:8,10), em nos tornarmos Seus súditos, Seus servos. Quando pedimos que o reino de Deus venha, estamos nos pondo sob Suas ordens, à Sua disposição.

– Quando pedimos que o reino de Deus venha, estamos pedindo a Deus uma íntima comunhão com Ele. Não queremos apenas que o reino de Deus esteja entre nós, mas que Ele venha, ou seja, que passemos a desfrutar das bênçãos espirituais, que sejamos transportados aos lugares celestiais em Cristo (Ef.1:3), para o Reino do Filho do Seu amor (Cl.1:13).

– Para que o reino de Deus venha, entretanto, algumas coisas são absolutamente necessárias, a saber:

a) não mais podemos estar presos às riquezas, pois o amor às coisas materiais nos impede de entrar no reino de Deus (Mt.19:24; Mc.10:23-25; Lc.18:24);

b) não podemos olhar para trás, ficar presos ou atraídos pelas coisas que praticávamos antes de nossa conversão ou vocação (Lc.9:62; I Co.6:9,10; Gl.5:19-21) ;

c) não podemos recusar o convite do Rei, sob pena de sermos desprezados por Ele, ou seja, jamais deixar de atender às convocações do Senhor (Lc.14:15-24);

d) receber o Reino como uma criança, ou seja, ter a inocência infantil, depois que obteve a purificação dos seus pecados (Lc.18:17);

e) nascer da água e do Espírito, ou seja, conformar seu caráter ao exigido pelas Escrituras e manter uma vida de comunhão com o Espírito Santo (Jo.3:5);

– Quando pedimos, pois, que o reino de Deus venha, assumimos um compromisso diante do Senhor de nos mantermos numa vida de santificação, a fim de que possamos fazer parte deste reino e, assim, podermos nos assentar juntamente com os demais concidadãos dos céus naquele dia em que o Senhor participará, no reino de Deus, da ceia das bodas do Cordeiro (Lc.22:16,18).

– Neste sentido, pois, temos um pedido escatológico também embutido nesta súplica. Devemos, em nossa oração, pedir pela vinda do Senhor, pois é esta a oração feita em conjunto pela Igreja e pelo Espírito Santo (Ap.22:17).

Em suas orações, o crente ouve o Senhor dizer que virá cedo e, diante desta afirmação , deseja ardentemente o Seu retorno (Ap.22:20). Temos demonstrado este anelo em nossas orações? Ou já estamos como muitos, esquecidos do céu e impregnando nossas orações com as coisas desta vida? Tomemos cuidado!

– O terceiro pedido apresentado na oração-modelo é “Seja feita a Tua vontade, assim na terra, como no céu”. Como consequência de o reino de Deus vir, passamos a fazer a vontade do Senhor, pois a Ele nos submetemos.

Tanto assim é que, na versão apresentada em Lucas, a oração-modelo nem sequer tem esta expressão, já que praticamente incluída na questão da vinda do reino.

– Fazer a vontade do Pai torna-nos semelhantes a Cristo, que veio ao mundo para isto (Hb.10:7), pois não buscou a Sua vontade mas a vontade do Pai que O enviara (Jo.5:30). Por isso, o Senhor Jesus nunca falou de Si mesmo, mas somnte aquilo que o Pai lhe mandou dizer e falar (Jo.12:49).

– Quando fazemos a vontade do Pai, tornamo-nos irmão, irmã e mãe (Mt.12:50), como também adquirimos a graça de entrarmos no céu (Mt.7:21), garantida a nossa glorificação no último dia (Jo.6:39).

– Mas, além de fazermos a vontade do Pai, também passamos a desejar fazê-la. No processo de comunhão entre nós e o Senhor, que se estreita a cada instante em nossa vida espiritual, almejamos alcançar a mesma unidade que existe entre as Pessoas divinas, pois é esta a finalidade de nossa vida com Deus sobre a face da Terra (Jo.17:21).

– Neste terceiro pedido, o Senhor Jesus nos ensina que, na oração, devemos sempre almejar nos aproximar do Senhor a cada passo, passando a desejar aquilo que Ele mesmo deseja, a ter uma congruência de vontades.

Bem ao contrário do que ensinam as religiões orientais, em especial o budismo, que vê na oração um processo em que a pessoa se anula diante do “cosmo”, a oração é um encontro entre duas pessoas, o homem e Deus, em que passa a existir um relacionamento que faz com que o homem adira voluntariamente aos desígnios divinos, passe a querer o que Deus quer. Temos consciência disto quando oramos?

– Quão diferente é o ensino de Jesus daquilo que vemos na atualidade, onde as pessoas pensam que orar é impor a sua vontade ao Senhor, como se Deus fosse um serviçal, pronto a satisfazer os caprichos e desejos de quem ora.

Não existe, no ensino de Jesus, coisa alguma a respeito de “determinação”, “palavra de fé” ou algo similar.

Temos a graça de nos apresentar diante de Deus, não merecemos ter acesso à Sua presença, mas o Senhor, pelo Seu infinito amor, permite-nos chegar até o trono divino e, num encontro íntimo e particular, aprender o que Ele quer e ter a oportunidade de desejar que a Sua vontade se faça.

– Observemos, ainda, que o orante deseja, por primeiro, que a vontade de Deus se faça na terra. No céu, a vontade do Senhor não sofre qualquer contestação, pois ali somente habitam os seres celestiais que optaram por servir a Deus, numa decisão irretratável e definitiva, visto que, na dimensão celeste, estamos na eternidade. Devemos querer ser tão fiéis e submissos ao Senhor como são os seres celestiais.

Por isso, o desejo é que, na terra, a começar de nós mesmos, a vontade divina se realize, Tem sido este o sentido de nossa oração, ou somos daqueles que defendem que devemos nos comportar como “revoltados”, “indignados” , “inconformados” diante de Deus para fazê-l’O agir? Tomemos cuidado!

OBS: Causa-nos espanto ver que, aos olhos de alguns líderes supostamente evangélicos, o crente seja uma pessoa indignada que vai à ação, ou seja, uma pessoa que, pouco importa a vontade divina, “forçaria” Deus a tomar alguma atitude ou permitir que a atitude do homem prevaleça.

Recentemente, a presidenta eleita do país, ao tentar sensibilizar os incautos evangélicos (que, infelizmente, contribuíram para a sua trágica e lamentável vitória eleitoral), assim considerou os evangélicos:

“Como nós, evangélicos, ela [Dilma] acredita que tudo se constrói neste mundo é resultado de determinação e fé. Essas são suas palavras: ‘Aprendemos que tornamos impossível em possível apenas quando nossa indignação se transforma em ação…” Que diferença do que Jesus ensinou.

III – A ORAÇÃO DO SENHOR: O SENHOR JESUS NOS ENSINA COMO ORAR PELA NOSSA VIDA SOBRE A FACE DA TERRA

– Depois de três pedidos que dizem respeito ao nosso relacionamento com Deus e à vida espiritual, que tem de ter prioridade entre os homens espirituais, o Senhor Jesus, ciente de que, embora não sejamos do mundo, estamos no mundo (Jo.17:11), mostra-nos o que e como pedir com relação à nossa vida sobre a face da Terra, onde estamos de passagem, como peregrinos (Hb.11:13-16).

– Assim, se devemos buscar primeiro o reino de Deus e a sua justiça (Mt.6:33), as “coisas de cima” (Cl.3:1,2), o Senhor Jesus bem sabe que necessitamos sobreviver sobre a face da Terra, durante o tempo de nossa peregrinação (Mt.6:32), Não devemos, portanto, dar prioridade às coisas materiais, mas nossa oração também tem de se referir à nossa passagem terrena.

Repudiemos, portanto, os falsos ensinadores que já têm aparecido e, num contraponto à odiosa “teologia da prosperidade”, veem apregoando uma igualmente falsa “teologia da indiferença divina com relação às coisas materiais”.

OBS: Já tivemos acesso a um material destes falsos pregadores que dizem abertamente que Jesus não está interessado em abençoar o crente materialmente, nem tampouco intervém seja para dar saúde, seja para dar emprego, seja para dar o sustento material de Seus servos. Isto é mentira!

Jesus ensina-nos que o Senhor está, sim, atento às nossas necessidades materiais e pronto a supri-las.

– O quarto pedido apresentado pelo Senhor Jesus na oração-modelo refere-se, precisamente, a este aspecto de nossa vida: “o pão nosso de cada nos dá hoje” ou, na versão de Lucas, “dá-nos cada dia o nosso pão cotidiano”.

– Neste pedido, o Senhor Jesus nos ensina que o orante tem a consciência de que depende de Deus inclusive para a sua sobrevivência material sobre a face da Terra. É Deus a fonte de nosso sustento, não as nossas habilidades, escolaridade, posição social.

A cada dia é a misericórdia divina que nos permite ganhar o pão, sustentando a nós mesmos e à família. Embora tenhamos de nos esforçar para sobreviver, pois, diante do pecado, o trabalho tornou-se penoso e necessário para que sobrevivamos (Gn.3:17-19), nunca devemos nos esquecer de que o sustento não advém tão somente do suor do nosso rosto, mas da misericórdia divina.

– Este pedido mostra-nos, assim, que tudo provém de Deus e que devemos ser-Lhe gratos por podermos ter o nosso pão à mesa.

Como isto é diferente da mentalidade de nossos dias, que entende que o pão vem seja do esforço ou mérito pessoal de cada um ou, ainda, que é uma dádiva de um “governo voltado para os pobres”.

Na oração-modelo, o Senhor nos ensina que devemos ter a consciência de que o pão nosso de cada dia é uma dádiva de Deus. Temos esta consciência?

– Além disso, o Senhor Jesus mostra-nos, na oração-modelo, que devemos ter a mesma oração de Agur, o sábio dos tempos de Salomão, que pedia a Deus a “porção acostumada”, não querendo nem a pobreza, nem a riqueza (Pv.30:8,9).

Este deve ser o nosso relacionamento com as coisas materiais: ter o absolutamente necessário para que venhamos a ter uma vida digna sobre a face da Terra.

Algo muito diferente da ganância e da febre pelo sucesso, fama e opulência que tem dominado a mente dos homens nestes dias imediatamente anteriores ao arrebatamento da Igreja.

– Jesus não nos ensina a pedir a Deus opulência material, fortuna ou algo similar. Não faz parte de nosso pedido a Deus sermos transformados em milionários ou bilionários.

Temos de pedir a Deus o necessário para nosso sustento. Observemos que o Senhor nos ensina a pedir o “pão nosso”, não o “meu pão”, a indicar que jamais devemos nos esquecer dos necessitados, do próximo. Quão diferente é o ensino de Jesus das orações mercenárias que muitos têm feito na atualidade…

OBS: “Trata-se de ‘nosso’ pão, ‘um’ para ‘muitos’. A pobreza das bem-aventuranças é a virtude da partilha que convoca a comunicar e partilhar os bens materiais e espirituais, não por coação, mas por amor, para que a abundância de uns venha em socorro das necessidades dos outros.” (parágrafo 2833 do Catecismo da Igreja Romana)

– Mas, ainda na dimensão terrena da vida, o Senhor Jesus apresenta um outro pedido a ser feito pelo orante a Deus:

“perdoa as nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores” ou, na versão de Lucas, “e perdoa-nos os nossos pecados, pois também nós perdoamos a qualquer que nos deve”. O

Senhor Jesus traz-nos, neste pedido, a realidade de que recebemos da parte do Senhor aquilo que fazemos ao próximo, a realidade da lei da ceifa (Gl.6:7,8).

– Teremos a oportunidade de estudarmos uma lição a respeito da relação entre oração e perdão, mas, desde já, temos de ter a consciência de que, embora não mereçamos estar diante de Deus, embora a oração seja fruto da Sua infinita graça, a resposta de Deus às nossas orações é feita de acordo com a Sua justiça e, por isso, somente obteremos o perdão de nossas faltas se formos, igualmente, perdoadores daqueles que nos ofendem. Como bem disse o Senhor Jesus, seremos medidos com a medida com que medimos (Mt.7:2)

– A oração traz-nos à mente e ao coração a consciência de que, neste mundo, somos responsáveis uns pelos outros, não vivemos sós e, embora a salvação seja individual, nosso comportamento social, nossa conduta diante do próximo é um elemento indispensável em nosso relacionamento com Deus.

Não somos uma ilha neste mundo, mas temos relacionamentos com os outros, relacionamentos estes que são essenciais para o relacionamento que cada um tem com Deus.

IV – A ORAÇÃO DO SENHOR: O SENHOR JESUS NOS ENSINA A ORAR COM RELAÇÃO A NOSSA LUTA CONTRA O MAL

– A sexta petição constante da oração-modelo fala de um outro enfoque da vida do ser humano sobre a face da Terra, qual seja, a de sua luta contra o mal e o pecado.

Desde os primórdios da humanidade, Deus mostrou ao homem, em Sua fala a Caim, de que deveríamos entender que o pecado jaz à porta e que, se não nos decidirmos por servir ao Senhor, fatalmente seremos dominado pelo mal (Gn.4:7).

– Por isso, ao nos ensinar a orar, Cristo diz que devemos pedir assim: “ e não nos induzas à tentação” ou, na versão de Lucas, “e não nos conduzas à tentação”.

Logo de pronto, surge uma indagação: mas Deus quer que sejamos tentados? Não é a própria Bíblia que nos diz que Deus não pode ser tentado pelo mal e a ninguém tenta (Tg.1:13)?

– A oração de Jesus é um ensino que o Senhor nos dá a respeito da realidade da vida. Deus não deseja que sejamos tentados, mas sabe que, diante da situação espiritual que se encontra a humanidade, seremos, sim, objeto de tentação.

Não é Deus quem nos tenta, mas a tentação é inevitável, visto que o pecado entrou no mundo por causa da desobediência do primeiro casal. O próprio Jesus foi tentado em todas as coisas, posto que nunca tenha pecado (Hb.4:15).

– Se a tentação é inevitável, não adianta orarmos para não sermos tentados. Ante esta realidade, o que Cristo Jesus nos ensina é que devemos pedir a Deus que nos conduza na tentação, que esteja conosco no instante em que sofrermos a tentação.

“…Pedimos ao nosso Pai que não nos “deixe cair” nela. E difícil traduzir, com uma palavra só, a expressão grega “me eisenegkes” (μή εισενέγκης), que significa ‘não permitas entrar em’, ‘não nos deixeis sucumbir à tentação’. ‘Deus não pode ser tentado pelo mal e a ninguém tenta” (Tg 1,13); Ele quer, ao contrário, dela nos livrar.

Nós lhe pedimos que não nos deixe enveredar pelo caminho que conduz ao pecado. Estamos empenhados no combate “entre a carne e o Espírito”. Este pedido implora o Espírito de discernimento e de fortaleza…” (parágrafo 2846 do Catecismo da Igreja Romana).

– Como podemos, pois, perceber, o que Jesus nos ensina a pedir é que, por primeiro, dada a inevitabilidade da tentação, o Senhor esteja conosco neste instante.

Quando Jesus foi tentado, a Bíblia nos mostra que foi conduzido pelo Espírito ao deserto para ser tentado (Mt.4:1), ou seja, durante toda a tentação, o Senhor teve a ajuda do Espírito, que, inclusive, O fez lembrar dos textos das Escrituras com as quais foi Ele vitorioso sobre o diabo.

– Precisamos pedir a Deus que o Espírito Santo esteja conosco e testifique, a cada momento, que somos filhos de Deus e que, ao longo da tentação, sejamos por Ele guiados pois, em assim fazendo, seremos vencedores.

Por isso, é indispensável que tenhamos o devido discernimento do Espírito Santo para sabermos e identificarmos as astutas ciladas do diabo (Ef.6:11), os seus ardis (II Co.2:10,11) em nossa jornada de fé.

– Precisamos discernir entre o que é provação, dificuldades postas pelo próprio Deus para o nosso crescimento espiritual, da tentação, que só nos conduzirá ao pecado e à morte.

Assim, este pedido constante da oração-modelo nos faz perceber a nossa integral dependência na luta contra o mal e contra o pecado, mostrando-nos que, apesar da tentação, não ficamos longe de Deus.

Pelo contrário, “…Deus não quer impor o bem, Ele quer seres livres… Para alguma coisa a tentação serve.

Todos, com exceção de Deus, ignoram o que nossa alma recebeu de Deus, até nós mesmos. Mas a tentação o manifesta, para nos ensinar a conhecer-nos e, com isso, descobrir-nos nossa miséria e nos obrigar a dar graças pelos bens que a tentação nos manifestou (parágrafo 2847 do Catecismo da Igreja Romana).”

– Esta integral dependência do Senhor na luta contra o mal, revelada por este sexto pedido da oração-modelo, traz-nos, também, a consciência de que vivemos um combate incessante contra as hostes espirituais da maldade e que jamais seremos vencedores se não nos socorrermos do Senhor.

Esta petição lembra-nos que a oração é indispensável para alcançarmos a vitória sobre o maligno e, assim, perseverarmos até o fim. Esta petição recorda-nos que a atitude do cristão na sua jornada de fé é a de um combatente, a atitude da vigilância.
Como nos ensina o Senhor Jesus: “E as coisas que vos digo digo-as a todos: Vigiai” (Mc.13:37).

– A sétima e última petição da oração-modelo apresenta-se desta forma: “livra-nos do mal, porque Teu é o reino, o poder e a glória para sempre. Amém” ou, na versão de Lucas, “mas livra-nos do mal”.

– O Senhor volta a nos mostrar que estamos num embate contra o maligno e o pecado. Se se pede, num primeiro instante, para que o Senhor nos conduza durante a tentação, não nos deixe, agora se requer ao Pai que sejamos libertos do mal, que aqui não é algo abstrato, mas o diabo e seus anjos, as hostes espirituais da maldade.

– A tentação é uma atividade desencadeada pelo mal, mas que se desenvolve em nosso interior. A partir da tentação, é sensibilizada a natureza pecaminosa que há em nós (a carne), que, se não houver a necessária ajuda divina e a nossa ida ao encontro de Deus, acabará gerando a concupiscência, o pecado e a morte (Tg.1:14,15).

– No entanto, o inimigo de nossas almas também ataca o servo de Deus, procurando atingir-lhe em todos os aspectos, pois seu trabalho é matar, roubar e destruir (Jo.10:10). O adversário, então, usa de todas as forças que possui, com o fim de impedir a sequência da jornada de fé do servo do Senhor (Lc.10:19).

– No entanto, Jesus nos faz entender, com esta derradeira petição, que o Senhor está pronto a nos livrar do mal, a fazer com que toda a força do inimigo seja inócua e não nos faça dano alguma. Precisamos, porém, pedir-Lhe que assim haja, a fim de que provemos a nossa fé n’Ele e, no tempo oportuno, desfrutemos da vitória e Lhe rendamos graças.

– Como disse João, “Filhinhos, sois de Deus e já os tendes vencido, porque maior é o que está em vós do que o que está no mundo(I Jo.4:4)”.

Somos de Deus, tanto que, no início da oração-modelo, chamamo-l’O de Pai e, por causa disso, podemos confiar no Senhor de que venceremos o mal, porque conosco está Aquele que já venceu o mundo (Jo.16:33), que tem em Suas mãos a chave da morte e do inferno (Ap.1:18).

”…Isso significa autoridade suprema sobre qualquer força do mal (Mt.16:18; 28:18; Cl.2:15)…” (SILVA, Severino Pedro da.
Apocalipse versículo por versículo. 3. ed., p.26).

– Nesta sétima petição da oração-modelo, o Senhor nos ensina a tomarmos consciência de que a vida cristã é uma contínua luta contra o inimigo, luta esta que somente será vencida se estivermos seguindo ao Senhor.

A oração é o exercício espiritual que nos faz ficar em forma para podermos usar da armadura de Deus (Ef.6:18). Como costumam dizer os crentes chineses: “muita oração, muito poder; pouca oração, pouco poder; nenhuma oração, nenhum poder”.

– Na doxologia final da oração-modelo, presente apenas na versão de Mateus, é dada a razão pela qual podemos ser libertos do mal: o poder, o reino e a glória são do Pai.

Assim, se nos aproximarmos do Pai, certamente seremos libertos do mal, já que o poder, o reino e a glória Lhe pertencem. Temos nos aproximado de Deus?

– Que esta sublime lição de Jesus, a oração-modelo, seja por nós aprendida e seguida a cada momento em que formos orar.

V- O QUE É O JEJUM

– Depois de ter apresentado seu ensino sobre o jejum, Jesus, então, vai tratar da outra prática devocional muito valorizada pelos israelitas: o jejum, que alcançara também, entre escribas e fariseus, uma proeminência, a ponto de os fariseus terem o costume de jejuarem duas vezes por semana (Lc.18:12).

– O jejum é a abstenção total ou parcial de alimentação com a finalidade de aprimoramento do exercício da oração e da meditação.

É uma prática encontrada nas mais antigas religiões da humanidade, em todos os lugares e nos mais variados estágios da civilização.

Assim, tanto foram encontrados sacerdotes de tribos nos mais distantes continentes que jejuavam para ter maior contacto com as divindades ou os espíritos dos antepassados, como também, como o jejum tem sido prática regular em todas as grandes religiões da atualidade (islâmicos, hinduístas, budistas, judeus e, por fim, os próprios cristãos).

– Por trás do jejum, existe a crença (que é válida) de que a mortificação do corpo, o sacrifício faz com que o homem se aproxime mais da divindade, porquanto revela seu desapego aos prazeres e às coisas materiais mais importantes, que são as referentes à sobrevivência, com o intuito de melhor perceber a vontade de Deus e de melhor agradá-l’O.

– Verdade é que não podemos entender o jejum, como muitos que assim fazem nas outras religiões, como um necessário desprendimento do corpo, como se o corpo fosse um mal em si e, portanto, um obstáculo para que tenhamos uma vida espiritual.

Esta ideia, como veremos ainda neste trimestre, não corresponde ao ensino bíblico a respeito do assunto, pois Deus fez o homem corpo, alma e espírito (Gn.2:7, I Ts.5:23) e a Bíblia infirma que tudo quanto Deus fez foi por Ele considerado bom (Gn.1:31), o que inclui o nosso corpo.

OBS: “…Dentro de certas escolas filosóficas greco-romanas e fraternidades religiosas jejuar, como um aspecto de ascese, foi aproximado à convicção de que a humanidade tinha experimentado um estado primordial de perfeição que foi perdida por uma transgressão original.

Por várias práticas ascéticas como jejuar, praticar a pobreza voluntária e a penitência, o indivíduo poderia ser restabelecido a um estado onde a comunicação e a união com o divino foram tornadas possíveis novamente.

Consequentemente, em várias tradições religiosas, um retorno a um estado primordial de inocência ou felicidade ativou várias práticas de ascese julgadas necessárias ou vantajosas, provocando tal retorno.

Para tal se agrupa a suposição subjacente básica de que aquele jejum era, de algum modo, propício para iniciar ou manter contato com Deus.

Em alguns grupos religiosos (por exemplo, Judaísmo, Cristianismo e Islã) jejuar, gradualmente, se tornou um modo de expressar devoção e adoração a um ser divino específico.

Além da suposição subjacente básica de que jejuar é uma preparação essencial para revelação divina ou para algum tipo de comunhão com o espiritual ou o sobrenatural, muitas culturas acreditam que o jejum é um prelúdio em tempos importantes na vida de uma pessoa.

Purifica ou prepara a pessoa (ou grupo) para maior receptividade em comunhão com o espiritual.…” (BINGEMER, Maria Clara Lucchetti. Jejum e fome zero: elementos quaresmais. www.google.com.br/search?q=cache:2JwR9lGw40MJ:www.adital.org.br/asp2/noticia.asp%3Fidioma%3DPT%26noticia%3D6706+jejum&hl=p t-BR&ie=UTF-8)

– É por isso que a Bíblia não considera o jejum como uma penitência ou um sacrifício necessário para o desenvolvimento espiritual, pois devemos também ter o nosso corpo envolvido no anúncio da salvação, tanto que Deus o tornou templo do Espírito Santo (I Co.6:19).

O jejum é uma prática recomendada, mas é um método para reforço da oração, não algo que possa trazer algum mérito ou que demonstre haver algum merecimento na vida de algum homem, pois tudo o que recebemos de Deus é fruto da Sua imensa misericórdia e graça (Lm.3:22).

Este errôneo conceito de jejum próprio dos gentios, foi o motivo da reprovação da prática farisaica, como vemos no sermão do monte (Mt.6:16). Assim, ao contrário do que argumentam alguns falsos mestres nos nossos dias, Jesus não reprovou o jejum mas, sim, este errado conceito de jejum.

OBS: A ideia do jejum como penitência está difundida em muitos credos religiosos. Entre os muçulmanos, o jejum, ao lado de ser uma forma de agradecimento a Deus pela revelação do Alcorão durante o mês de Ramadã, que é um dos pilares da fé islâmica, também é prescrito como penalidade em virtude de algumas faltas.

Assim, por exemplo, um muçulmano que mata outro acidentalmente e não tem condições de pagar uma indenização à família da vítima, deve jejuar dois meses consecutivos como pena(Alcorão, 4:92).

Entre os católicos romanos, também, o jejum é considerado uma prática obrigatória durante o tempo de penitência (cânon 1249 do Código Canônico).

O Catecismo da Igreja Romana afirma que uma das formas de penitência é o jejum (artigo 1434), que corresponderia à penitência interior consigo mesmo, baseando-se, para tanto, no escrito do livro apócrifo de Tobias que diz :

“…vale mais a oração com jejum e a esmola com justiça do que a riqueza adquirida com a injustiça…” (mias uma vez vemos um livro apócrifo dar base a um pensamento da doutrina romanista).

Ainda recentemente o Papa João Paulo II reforçou este entendimento romanista a respeito do jejum ao afirmar que o jejum é

“…prática penitencial que exige um esforço espiritual mais profundo, isto é, a conversão do coração com a firme decisão de se afastar do mal e do pecado, para se predispor melhor à realização da vontade de Deus.

Com o jejum físico, e ainda mais interior, o cristão prepara-se assim para seguir Cristo e ser sua fiel testemunha em qualquer circunstância. Além disso, o jejum ajuda a compreender melhor as dificuldades e os sofrimentos de tantos irmãos nossos, oprimidos pela fome, pela miséria e pela guerra.

Ele estimula também a um movimento concreto de solidariedade e de partilha com quem se encontra em necessidade.” (Angelus de 2 de março de 2003. www.vatican.va/holy_father/john_paul_ii/angelus/2003/documents/hf_jp-ii_ang_20030302_po.html).

– Quando falamos em jejum, há aqueles que entendem que o jejum é a abstinência completa de todo e qualquer alimento, tanto água quanto os demais alimentos, não aceitando a ideia de que possa existir um jejum parcial.

Entretanto, devemos compreender o jejum como uma abstinência total ou parcial de alimentação. O jejum envolve uma abstinência, uma privação, que pode não ser completa.

Um exemplo bíblico de jejum parcial encontramos em Dn.10:3, onde o profeta afirma que não comeu manjar desejável, num exemplo de que a abstinência não era total. Desta forma, não temos respaldo bíblico para afirmar que todo e qualquer jejum somente é válido se for total.

OBS: Atualmente, não há mais, entre os católicos romanos, uma definição do que seja o jejum, mas, no Código Canônico anterior, datado de 1917 e que vigorou na Igreja Romana até 1983, o jejum era considerado como uma abstinência em que, no mínimo, não se deveria tomar mais do que uma refeição completa, permitida a ingestão de outro alimento outras duas vezes ao dia, regra que, embora não conste mais do Código Canônico, ainda tem sido considerada como válida entre os católicos romanos.

No Brasil, entretanto, a Igreja Romana não tem incentivado esta prática (com exceção talvez dos carismáticos), tanto que o jejum semanal prescrito para as sextas-feiras foi substituído pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) pela prática de obras de caridade e exercícios de piedade.

– O conceito de jejum, ademais, não envolve apenas a ideia de privação alimentar. O jejum, também, é caracterizado pela existência de um propósito, de uma finalidade precisa e clara.

– É exatamente este o ponto em que Jesus discordava dos jejuns praticados pelos fariseus, que eram práticas rituais, formais, meras ostentações, sem qualquer propósito senão o da autoglorificação e da autoexaltação.

Devemos jejuar sempre que temos um motivo, um propósito, um objetivo definido e estabelecido. Sem que haja este propósito, o jejum será tão somente uma privação alimentar, uma dieta.

Daí porque não podermos concordar com a definição de jejum que teria sido supostamente anunciada numa “aparição” na cidade sérvia de Medjugorje, segundo a qual “jejum é refrear a nossa gula e disciplinar o nosso comer” (apud O jejum. www.google.com.br/search?q=cache:GjTEA6a3JLQJ:www.diocese- sjc.org.br/jejum.php+jejum&hl=pt-BR&ie=UTF-8).

– É a existência deste propósito e desta finalidade que difere o jejum de uma simples privação alimentar. Jejuar é muito mais do que simplesmente passar fome e sede e é neste particular que muitos têm fracassado:

buscam no jejum uma ostentação, uma autoglorificação e o que conseguem, com isso, além da reprovação divina, é tão somente instantes de privação alimentar, uma dieta que, às vezes, nem benefícios traz para a saúde física do que jejua.

OBS: A preocupação com a saúde física do que jejua, aliás, é algo que sempre norteou a prática do jejum nas religiões ao longo da história da humanidade e que, aliás, tem faltado no meio evangélico.

Com efeito, já os rabinos judeus diziam que o jejum, como todos os preceitos bíblicos, foi dado como “Torat Chaim” , ou seja, como ensinamentos pertinentes à vida e que os homens devem viver e não morrer por eles.

Daí porque os enfermos e as crianças eram isentos desta obrigação, que também não poderia colocar em risco a vida do jejuador.

O Código Canônico da Igreja Romana exclui água e remédio do jejum que deve ser observado uma hora antes da sagrada comunhão, como também dispensa as pessoas idosas e enfermas desta prática(cânon 919), revelando, assim, o cuidado que deve haver quanto a estas situações. Daí porque ter o pastor Elinaldo Renovato de Lima, em seu artigo sobre a prática do jejum, na revista Ensinador Cristão, afirmado, sabiamente, que

“…pessoas portadoras de doenças do estômago tenham cuidado com seu organismo. Não é aconselhável que pessoas com úlceras ou gastrites façam jejum. Deus não quer sacrifício. Ele quer obediência, fidelidade, santidade.” (Evite os exageros: esclarecimentos importantes sobre a prática do jejum na vida cristã. Ensinador Cristão, ano 4, nº 15, jul.-ago.-set./2003, p.14).

VI – O JEJUM NA BÍBLIA E O ENSINO DE JESUS SOBRE O JEJUM

– Na lei de Moisés, o jejum foi estabelecido como obrigatório no dia da expiação, quando o povo deveria “afligir a sua alma”, expressão que significa, precisamente, praticar o jejum (Lv.16:29 – na Nova Versão Internacional, o texto diz : vocês de humilharão (ou jejuarão)).

Vemos, portanto, que o primeiro propósito do jejum que se encontra na Palavra de Deus é o de humilhação, de arrependimento de seus pecados. Esta mesma idéia para o jejum encontramos no tempo de Samuel (I Sm.7:1-12) e até mesmo fora de Israel, como ocorreu entre os ninivitas após a pregação de Jonas (Jn.3:6-10).

– Na primeira manifestação voluntária de jejum que se tem notícia no meio de Israel, em Jz.20:26, temos um novo propósito para a prática do jejum.

No tempo do terceiro sumo-sacerdote, Finéias, no início do período dos juízes, vamos observar os soldados israelitas jejuando buscando uma orientação divina a respeito da guerra civil contra a tribo de Benjamim. O jejum, portanto, também era utilizado para se ter uma orientação da parte de Deus.

– Quando Deus, em cumprimento à Sua Palavra, feriu o primeiro filho de Davi com Bate-Seba de enfermidade, Davi recorreu ao jejum para tentar alcançar a cura da criança, num novo propósito estabelecido para esta prática (II Sm.11:16,17).

É interessante observar que, morta a criança, Davi cessou de jejuar, numa clara demonstração de que o seu jejum tinha um propósito definido e que assim deve proceder alguém que, como Davi, tem um coração segundo o coração do Senhor (I Sm13:14; 16:1).

– Também é exemplo de jejum como pedido de orientação e de súplica a Deus o que foi convocado pelo rei Josafá (II Cr.20:3), ocasião em que, ao contrário do que ocorrera com Davi, Deus concedeu o desejo do coração do povo.

Outro exemplo de jejum em dias difíceis é o que foi feito pela rainha Ester, que, neste particular, foi acompanhada pelo seu povo (Et.4:16,17), bem como o de Neemias (Ne.1:4) ou de Esdras(Ed.7:21).

– O Talmude, segundo livro sagrado dos judeus, contém um livro a respeito dos jejuns ( o “Rolo dos Jejuns”, em hebraico “Meguilat Ta’anit”), onde se estabeleceu, precisamente, que os jejuns têm um tríplice propósito: arrependimento, súplica pela ajuda de Deus, o luto ou a comemoração.

OBS: “…O jejum que levava ao arrependimento era considerado significativo só na medida em que era um ato de livre e espontânea vontade, para que incentivasse um autoexame honesto de parte do jejuador.

O jejum como súplica pela intervenção de Deus em época de grandes dificuldades era, frequentemente, um ato coletivo.

Na história conturbada do povo judeu, espalhado por dezenas de diferentes lugares através do mundo, a observância de dias especiais de jejum era bastante usual.

Podia ser ordenada pelas autoridades rabínicas de uma só comunidade – ou mesmo de toda uma região ou país – com o fito de implorar a ajuda de Deus para antepor-se a qualquer decreto severo da Igreja ou do Estado, ou para frustrar as intrigas dos inimigos implacáveis em seu ódio aos judeus.

Em épocas de seca, as comunidades rurais se reuniam para jejuar a fim de provocar a chuva. Quando a peste atacava, os guetos judaicos jejuavam para suplicar a proteção divina. O terceiro objetivo, em importância, do jejum – que havia sido instituído pelos Profetas – era o de fazer relembrar aos descendentes de Abraão as muitas calamidades que se haviam abatido sobre eles em diversas ocasiões desde o Cativeiro no Egito.…” (AUSUBEL, Nathan. Jejum e dias de jejum. In: A JUDAICA, v.5, p.393-4).

– Ao lado deste jejum, porém, a Bíblia também informa ter surgido um jejum cerimonial, um desdobramento do jejum obrigatório do dia da expiação, de tal maneira que o próprio calendário judaico ficou recheado de dias de jejum a ponto de, no tempo dos fariseus, haver dois jejuns semanais, o das segundas-feiras e o das quintas-feiras (Lc.18:12).

O Senhor sempre demonstrou Seu desagrado e reprovação a este tipo de jejum, formalista e ritualístico, despido de qualquer outro propósito senão de autoexaltação e de autoglorificação (Is.58:3-7; Zc.7:3-14; Mt.6:16-18). O jejum banalizou-se tanto que era até forma de sinal de acordo homicida, ou seja, passou a ser até uma garantia para a prática de um crime (At.23:12,13).

OBS: “…Entre todos os dias de jejum, só o Iom Kipur, o Dia da Expiação, havia recebido a sanção da Torah como mandamento.

Na medida em que o costume tem um poder de perpetuação tão poderoso quanto o da lei canônica, toda uma série de jejuns extra-escritura ocupam um lugar firmemente plantado na vida religiosa judaica.

O jejum de Tishah b’Av, o nono dia de Ab, era objeto de maior reverência. É um dia de dor nacional e de contrição, comemorativo da Destruição ( 586 a.E.C. e em 70 E.C., respectivamente) tanto do Primeiro quanto do Segundo Templos, em Jerusalém.

A implicação deste e de outros jejuns comemorativos é a seguinte: se as calamidades se abateram sobre o povo judeu, foi, segundo as palavras da liturgia, ‘por causa de nossos pecados’- como castigo de Deus.(…).

Outro dia de jejum tradicional é o Tzom Guedaliahu (o Jejum de Gedalias). Tem lugar no dia que se segue a Rosh Hashanah (o Ano Novo judaico, observação nossa), e é observado pelos judeus ortodoxos em memória de Guedalias, apelidado ‘o Virtuoso’.

O rei Nabucodonosor da Babilônia, depois de haver reduzido o Primeiro Templo a ruínas, em 586 a.E.C., havia indicado a Guedalias para governador de Judá.

Por razões desconhecidas, ele foi assassinado por seus irmãos judeus. Em represália, houve um massacre de judeus.

O jejum de Assarah B’Tevet (o décimo dia de Tevet) rememora o começo do cerco de Jerusalém por Nabucodonosor.

O jejum do décimo-sétimo dia de Tamuz comemora uma série de calamidades nacionais arroladas no Talmud. Segundo o Êxodo 32:19, Moisés quebrou as tábuas dos Dez Mandamentos naquele dia; e também naquele dia os sacrifícios diários do Templo foram abolidos, Tito conseguiu abrir uma brecha nos muros de Jerusalém durante o cerco daquela cidade, o general sírio Atsotomos queimou os Rolos da Torah, e um ídolo pagão foi colocado no próprio santuário do Monte Sion pelos sacerdotes acovardados do Templo.

Essas eram algumas das razões que os sábios religiosos da era rabínica davam para explicar e justificar o castigo que Deus impôs a Israel, quando destruiu o Templo e espalhou o Seu povo no Exílio(…) por todos os mais longínquos recantos da terra. Ta’anit Ester (o jejum de Ester) é observado pelos tradicionalistas na véspera de Purim, em gratidão à memória do jejum patriótico que a rainha Ester fez quando em busca de orientação divina e de força para levar a efeito a súplica que devia fazer pelas vidas de seus irmãos judeus perante seu marido, o rei Assuero, da Pérsia.

A véspera do Pessah (Páscoa, observação nossa) é comemorada pelos ultra-ortodoxos com o Ta’anit Bechorim ( o jejum dos Primogênitos), como expressão da gratidão a Deus por haver poupado os primogênitos de Israel à época do extermínio dos primogênitos egípcios, antes do Êxodo do Egito pelos israelitas.

Na categoria de jejuns comemorativos, também os aniversários presumíveis das mortes de figuras eminentes da Bíblia, tais como Moisés, Aaarão, Miriam, Josué e Samuel, e dos mártires rabínicos que haviam perecido nas mãos dos romanos (Akiva ben José, os Dez Mártires, e outros) eram observados, em geral, com jejuns de meios dias, em séculos passados. Esses dias de jejum, porém, não são mais observados, exceto por um punhado de tradicionalistas ferrenhos.…” (AUSUBEL, Nathan. Jejum e dias de jejum. In: A JUDAICA, v.5, p.394).

– Nos dias de Jesus, como vimos, o jejum era uma prática constante e regular entre os judeus, desde os essênios, que se isolavam da sociedade, até os fariseus, que era o grupo religioso mais numeroso daqueles dias. Os discípulos de João Batista também jejuavam (Mt.9:14).

– Indagado sobre o motivo pelo qual Seus discípulos não jejuavam, Jesus respondeu aos discípulos de João Batista que não era o período de Seu ministério o tempo oportuno de jejuar, mas dias viriam em que deveria haver jejum por parte dos cristãos (Mt.9:15).

Assim, ao contrário do que se tem apregoado por falsos mestres, de que o jejum seria uma prática da antiga dispensação, não presente entre os crentes, o próprio Jesus afirmou, categoricamente, que os crentes haveriam de jejuar, prova de que isto não foi abolido pelo Senhor.

– Jesus não disse que os crentes não jejuariam, mas que não se fazia necessário jejuar enquanto Jesus estivesse ali, ao lado dos discípulos, em carne e osso, orientando-os, ensinando-os e os guardando de todo o mal. Por que precisariam jejuar numa situação como esta?

Entretanto, após a glorificação do Senhor, já vemos a igreja jejuando para buscar a orientação do Espírito Santo (At13:2). Deste modo, não há qualquer base bíblica para ensinamentos de que o jejum não tem lugar na dispensação da graça.

– Jesus reprovou o jejum ritualístico, sem propósito outro que não o da ostentação do jejuador, o típico jejum dos fariseus, jejum este, aliás, que, infelizmente, está presente em muitas igrejas locais por parte de “santarrões” que gostam de, em seus testemunhos e palavras, fazer questão de dizer aos ouvintes que estão jejuando ou que jejuam tantas e quantas vezes ao dia, pessoas que, assim como o fariseu da parábola, estarão apenas prestando um desserviço para suas próprias almas (Lc.18:9-14).

Que sejamos verdadeiros servos do Senhor, seguindo os conselhos do Senhor sobre como jejuar (Mt.6:16-18).

– O primeiro ensino de Jesus sobre o jejum é de que devemos jejuar. Disse o Senhor “quando jejuardes”, ou seja, Jesus já avisava que a Sua Igreja teria necessidade de jejuar, tanto assim que, no episódio em que expulsou um demônio após ter descido do monte da Transfiguração (Jo.17:12), foi claro ao afirmar que expulsão de determinada casta depende necessariamente de jejum e oração.

– O segundo ensino de Jesus é de que o jejum deve ser algo entre Deus e o jejuador, de tal modo que ninguém deverá saber sobre o propósito que apresentamos diante do Senhor.

Trata-se de um propósito que deve permanecer em oculto, daí porque devemos nos mostrar diante dos demais homens como se não estivéssemos jejuando, não mostrando que estejamos nos abstendo de alimentação ou fazendo algum sacrifício, mas, muito pelo contrário, dando a entender que estamos normais e que nada está ocorrendo.

Não se está dizendo que devemos ser hipócritas, mas que devemos manter o assunto em segredo com o Senhor. Quem jejua está querendo ter maior intimidade, aproximar-se mais do Senhor e não é possível que não possa, diante deste propósito, manter um ambiente de segredo, que é uma característica primeira da intimidade. A maior intimidade com Deus começa na existência deste segredo entre o jejuador e o Senhor.

– O terceiro ensino de Jesus é de que o jejum deve ter um propósito, uma finalidade. Ao mesmo tempo que há um segredo entre o jejuador e Deus, faz-se preciso que o jejum tenha um fim, um objetivo a ser perseguido. Disse Jesus que Deus, vendo o nosso jejum, nos recompensará.

Ora, o que é a recompensa? É um prêmio, é um galardão que se dá. Sendo assim, o jejum deve ter um propósito, pois, se não fosse assim, não teria como Deus nos dar uma recompensa, nos dar o galardão, o prêmio pretendido. Se Deus no-lo concede, é porque existe um objetivo, um fim que foi perseguido pelo jejuador.

 Pr. Caramuru Afonso Francisco

Fonte: https://www.portalebd.org.br/classes/adultos/7381-licao-9-orando-e-jejuando-como-jesus-ensinou-i

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