Jovens – Lição 10 – Aspectos Da Obra Redentora de Jesus Cristo
INTRODUÇÃO
A obra redentora de Jesus tem diversos aspectos. Neste livro, já contemplamos alguns. Procurar compreender a mecânica da obra de salvação é adentrar aos estudos de tais aspectos, de modo que tenhamos uma espécie de mapa para o entendimento de nossa Teologia.
Nas obras de Teologia Sistemática, especificamente as de perspectivas pentecostais, os aspectos da obra redentora de Jesus passa pela Eleição, o Arrependimento e fé, a Regeneração. Já estudamos esses aspectos num capítulo anterior.
Neste, porém, nos deteremos aos aspectos que ainda não foram abordados. São eles: a Justificação, a Adoção e a Perseverança.
Acerca da Justificação, trabalharemos seu conceito, como sua imagem aparece no Antigo e no Novo Testamento, para, então, a partir dessa análise, conceituarmos com segurança o termo tão importante na soteriologia — o estudo da doutrina da salvação.
Veremos ainda a importância de cultivarmos a convicção de que essa obra ocorreu de fato em nossa vida. Uma vez compreendida conforme expõem as Escrituras, essa doutrina se apresenta para nós de forma bastante consoladora e edificante.
Ainda, veremos a forma como a justificação opera em nós, isto é, tendo a livre graça de Deus como causa, sem a perspectiva de qualquer mérito humano para a efetivação dessa obra.
Outro aspecto da obra de salvação é a adoção. Uma doutrina igualmente relevante. Nessa oportunidade, perceberemos que a adoção bíblica é uma doutrina que remonta a nossa relação de filho e pai, onde podemos experimentar o amor, a proteção e o cuidado de Deus Pai.
Notaremos também que é o Espírito Santo que testifica conosco acerca da paternidade divina. E que há efeitos práticos dessa afiliação que reafirmam fundamentos essenciais de nossa fé:
o testemunho do Espírito Santo, a libertação do medo da condenação e a herança divina e eterna com Cristo.
Após justificados e adotados, cabe a pergunta: O crente perseverará até o fim? Infelizmente, este é um ponto controverso da teologia que gera muitas discussões.
Entretanto, nesta oportunidade, apresentaremos duas perspectivas acerca do assunto.
Primeiramente, falaremos sobre uma perspectiva positiva da perseverança do crente, ou seja, ele deve cultivar a certeza da salvação.
A partir de textos bíblicos claros, veremos que somos exortados, pela Palavra, a não termos dúvidas de nossa salvação enquanto estivermos em Cristo.
Em segundo lugar, apresentaremos uma perspectiva negativa da perseverança do crente em que a apostasia é uma possibilidade real e o crente, que uma vez experimentou a salvação em Cristo, pode retroceder e perdê-la. E que, por isso, há um clamor imperioso das Escrituras à santificação, à vigilância e à esperança ao Céu.
Estudar os aspectos da obra de salvação é uma excelente oportunidade de compreender o que as Escrituras Sagradas dizem a respeito de tão grande obra divina e, ao mesmo tempo, cultivar um momento de gratidão e comunhão com Deus.
Nele, fomos justificados, adotados e, assim, temos o compromisso de perseverar na fé que uma vez foi entregue aos santos.
I – JUSTIFICAÇÃO
A justificação pela fé é uma doutrina em que pecadores culpados e perdidos são declarados absolvidos, justificados por Deus.
Se a regeneração significa a mudança inteira de nossa natureza, a justificação é a mudança de nossa situação diante de Deus.
Essa doutrina é um antídoto gracioso contra qualquer forma de acusação ao crente salvo em Cristo.
Trata-se, portanto, de uma herança da Reforma Protestante. É Deus quem declara-nos justos. Logo, o conceito de justificação, o benefício de sua certeza na vida e a operação dela em nós são os pontos que passamos a analisar.
O que é Justificação?
O teólogo pentecostal Myer Pearlman refere-se ao termo “justificação” por meio de uma conotação do mundo jurídico em que a quitação da dívida e a declaração de justo são emitidas.1 Essa perspectiva encontra apoio no Antigo e no Novo Testamento.
Destacaremos pelo menos dois versículos do Antigo Testamento para mostrar isso. Em ambos a palavra hebraica aparece em forma de verbo, tsãdaq, ou seja, “ser justo, estar no direito, ser justificado, fazer justiça”.2
Primeiramente, veja Êxodo 23.7: “De palavras de falsidade te afastarás e não matarás o inocente e o justo; porque não justificarei o ímpio” (grifo meu).
Em seguida, Deuteronômio 25.1: “Quando houver contenda entre alguns, e vierem a juízo para que os juízes os julguem, ao justo justificarão e ao injusto condenarão” (grifo meu).
Note como os dois versículos trazem uma carga semântica do universo judicial. Nesses dois textos o justo é justificado e o injusto, condenado.
Em o Novo Testamento o termo empregado é a forma verbal dikaioõ, que significa “declarar ser justo, pronunciar justo”.3
Mas esse termo traz uma perspectiva especial, como também é o caso de tsãdaq. Ele encontra-se na voz passiva, ou seja, o indivíduo é quem recebe a ação.
Assim o termo encontra-se, por exemplo, em Mateus 12.37, por ocasião do dia do juízo, e do julgamento de nossas palavras: “Porque por tuas palavras serás justificado e por tuas palavras serás condenado” (grifo meu).
Ainda em Romanos 3.20: “Por isso, nenhuma carne será justificada diante dele pelas obras da lei, porque pela lei vem o conhecimento do pecado” (grifo meu). Ora, o que está claro é que Deus é quem justifica o pecador (Rm 8.33).
Nesse sentido a justificação bíblica é uma mudança de posição do pecador. Antes, ele estava condenado, completamente perdido; agora, sua quitação está paga, ele encontra-se completamente justificado de seus delitos e pecados. O teólogo Daniel Pecota faz uma declaração a respeito dessa tão grande e graciosa obra:
Já é glorioso receber em nossa conta corrente a retidão de uma pessoa perfeita, independente de qualquer bem que porventura façamos.
Mas é ainda mais glorioso não sermos considerados culpados de nossos pecados e más ações. Deus, ao nos justificar, tem graciosamente feito duas coisas — e de modo lícito, pois o sacrifício de Cristo pagou o preço.4
Assim, a justificação envolve o
perdão e remissão de pecados, pois fomos redimidos (At 13.38,39);
a restauração ao favor de Deus, não estando mais sujeito à sua ira (Rm 5.9);
a imputação da justiça de Cristo (2 Co 5.21), em que os nossos pecados foram atribuídos a Cristo (quando nEste não havia pecado), e a justiça de Cristo foi atribuída a nós (quando de fato estávamos mortos em delitos e pecados).
A certeza da justificação
Essa é uma doutrina poderosamente consoladora. Os erros do passado têm o poder de paralisar as nossas ações presentes.
Uma das especialidades do Inimigo é ser o acusador das nossas vidas. Tentar tirá-lo do eixo, acusando-o de tudo quanto você fez no passado é a sua estratégia.
Mas a Palavra de Deus nos traz uma mensagem consoladora, terapêutica e poderosa: “Quem intentará acusação contra os escolhidos de Deus? É Deus quem os justifica. Quem os condenará?
Pois é Cristo quem morreu ou, antes, quem ressuscitou dentre os mortos, o qual está à direita de Deus, e também intercede por nós” (Rm 8.33,34).
A libertação da culpa dos nossos pecados é a primeira grande liberdade do evangelho, pois assim podemos desfrutar da bondade e da misericórdia de Deus. É ter o fardo removido, o jugo da vida suavizado. Só o evangelho faz essas coisas.
No lugar de andar cansada, alquebrada e curvada pelas circunstâncias sufocantes da existência, a pessoa justificada por Deus ergue a sua face para o alto e estende os braços para cima porque sabe que as amarras da culpa lhe foram removidas e destruídas.
Essa é a certeza que a doutrina nos traz, uma convicção enraizada na alma, para o bem de nossa vida espiritual e psicológica.
A operação da justificação em nós
Como a justificação opera em nós? Qual a sua causa? Qual a nossa participação quanto à maravilhosa bênção da justificação? Para responder a essas perguntas, caminharemos pelos seguintes pontos:
1. A justificação tem origem na livre graça de Deus. Recebemos essa bênção de maneira gratuita mediante a redenção que há em Cristo Jesus (Rm 3.24).
Ou seja, a justificação tem origem na graça de Deus. Ela está fundamentada no sangue derramado de Cristo Jesus no Calvário, pois nEle a nossa posição diante de Deus virou (Rm 5.19). Tudo isso ocorre por meio da fé (Ef 2.8).
Aqui, é preciso deixar claro que a fé não é a causa da justificação, mas o meio. As Escrituras Sagradas mostram com clareza que a fé é o meio de receber a justificação, conforme nos mostra Daniel Pecota: “A Bíblia não considera meritória a fé, mas simplesmente como a mão vazia estendida para aceitar o dom gratuito de Deus”.5
E ainda, Myer Pearlman diz: “Não existe mérito nessa fé, como não cabem elogios ao mendigo que estende a mão para receber uma esmola.
Esse mérito fere a dignidade do homem, mas perante Deus, o homem decaído não tem mais dignidade; o homem não possui possibilidades de acumular bondade suficiente para adquirir a sua salvação”.6 Assim, a justificação está assentada na livre graça de Deus, em sua gloriosa iniciativa.
2. A justificação não é por causa das boas obras. Não há obra da lei, não há mérito capaz de garantir a nossa salvação, senão a única e maravilhosa graça de Deus.
Nesse sentido, a fé se opõe frontalmente às obras, quando esta quer dizer alguma tentativa para se garantir a salvação.
Não há merecimento algum de nossa parte: “E é evidente que, pela lei, ninguém será justificado diante de Deus, porque o justo viverá da fé” (Gl 3.11). Logo, qualquer tentativa de aplicar o mérito próprio na justificação significa voltar-se contra todo o ensino das Escrituras a respeito dessa nobre doutrina.
Entretanto, quando uma fé viva opera em nós, boas obras são produzidas como confirmação dessa fé: “Porque, assim como o corpo sem o espírito está morto, assim também a fé sem obras é morta” (Tg 2.26).
Assim, mediante a fé, sem mérito humano, fomos justificados; porém, as boas obras produzidas são o aperfeiçoamento da fé (Tg 2.22).
II – A ADOÇÃO
Deus não mudou somente a nossa posição diante dEle, justificando-nos, mas Ele também nos adotou e deu-nos o privilégio de sermos chamados seus filhos.
A adoção como imagem bíblica
Uma das mais belas imagens da Bíblia é a relação de Pai e filho. Essa imagem é empregada nas Sagradas Escrituras para demonstrar como Deus trata conosco. A palavra “adoção” aparece cinco vezes nas epístolas do apóstolo Paulo.
Na primeira vez, ela é aplicada a Israel como nação: “que são israelitas, dos quais é a adoção de filhos, e a glória, e os concertos, e a lei, e o culto, e as promessas” (Rm 9.4 – grifo meu).
Noutra oportunidade, o apóstolo emprega a palavra referindo-se à consumação de nossa redenção por ocasião da segunda vinda do Senhor: “E não só ela, mas nós mesmos, que temos as primícias do Espírito, também gememos em nós mesmos, esperando a adoção, a saber, a redenção do nosso corpo” (Rm 8.23 – grifo meu).
Em Gálatas 4.4,5, a palavra aparece como um fato presente na vida do cristão: “Mas, vindo a plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei, para remir os que estavam debaixo da lei, a fim de recebermos a adoção de filhos” (grifo meu).
Outras duas ocorrências nas epístolas de Paulo carregam a mesma conotação: “E nos predestinou para filhos de adoção por Jesus Cristo, para si mesmo, segundo o beneplácito de sua vontade” (Ef 1.5 – grifo meu);
“Porque não recebestes o espírito de escravidão, para, outra vez, estardes em temor, mas recebestes o espírito de adoção de filhos, pelo qual clamamos: Aba, Pai” (Rm 8.15 – grifo meu).
Os filhos de Deus
A partir desses textos, podemos afirmar que a palavra “adoção” tem o significado de “o lugar e condição de filho dados àquele a quem não lhe pertence por natureza”.7 Essa é exatamente a conotação da palavra grega huiothesia (posição de filho).
Nesse caso, filhos de Deus são os que recebem os privilégios, bem como os deveres, da afiliação divina por meio da experiência do novo nascimento. Não por acaso, pode-se dizer, como faz a maioria dos teólogos sistemáticos, que a regeneração, a justificação e a adoção ocorrem simultaneamente na vida do crente.
Uma vez adotados, ou seja, tornados filhos, alguns efeitos práticos acarretam a vida dos que foram alcançados pela graça divina.
Efeitos práticos da adoção/filiação
1. O Espírito Santo testemunha que somos filhos de Deus. O Espírito Santo cria, no filho de Deus, a convicção, a certeza da filiação divina e do amor que nos leva a reconhecer a Deus como Pai. É exatamente isso que está expresso em Gálatas 4.5,6: “Para remir os que estavam debaixo da lei, a fim de recebermos a adoção de filhos.
E, porque sois filhos, Deus enviou aos nossos corações o Espírito de seu Filho, que clama: Aba, Pai” (grifo meu). O teólogo pentecostal, William Simmons, a respeito da palavra Aba, mostra que “era um termo aramaico comum usado pelos filhos para se referirem a seu pai.
Expressa amor familiar, descrevendo o relacionamento íntimo entre um pai amoroso e seu filho”.8 O Espírito Santo proporciona esse mesmo relacionamento amoroso, paterno, acolhedor entre o filho de Deus e o Deus Pai. Ele é a base desse relacionamento íntimo com o Pai.
Ele testifica em nós que somos filhos de Deus (Rm 8.16), e que Deus é o nosso Pai. Isso é o fundamento para vivenciarmos um relacionamento maduro na presença de Deus, de imensa liberdade para fazer a sua vontade.
2. Completa libertação do medo. Outra consequência natural da atuação do Espírito de Deus em nós é a libertação do medo: “Porque não recebestes o espírito de escravidão, para, outra vez, estardes em temor, mas recebestes o espírito de adoção de filhos […]” (Rm 8.15).
Não há mais o porquê de temer a condenação. O Espírito que testifica a paternalidade divina em nosso coração, remove o temor da ira divina, pois “…agora, nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus, […] Porque a lei do Espírito de vida, em Cristo Jesus, me livrou da lei do pecado e da morte” (Rm 8.1,2).
Não há mais ameaça, não há mais acusação, não há mais afronta que possa atentar contra a nossa dignidade de filhos de Deus.
3. Feitos herdeiros e coerdeiros com Cristo. Temos agora uma herança: “E, se nós somos filhos, somos, logo, herdeiros também, herdeiros de Deus e coerdeiros de Cristo; se é certo que com ele padecemos, para que também com ele sejamos glorificados” (Rm 8.17).
Esse versículo nos mostra que estamos identificados com o Espírito, pois Ele nos testifica a filiação divina; e que, por isso, juntamente com Cristo, somos coerdeiros das promessas de Deus.
Há também uma dimensão presente de vivermos o sofrimento atual que nos assola, pois vivemos os últimos dias; mas também há a esperança escatológica de sermos “glorificados” com Cristo. Devemos anelar por esse grande e esperado dia.Assim, somos filhos. Temos uma herança. Temos uma esperança.
Não hajamos como aquele irmão do filho pródigo, que por não saber quem era, murmurou acerca da redenção de seu irmão:
“Eis que te sirvo há tantos anos, sem nunca transgredir o teu mandamento, e nunca me deste um cabrito para alegrar-me com os meus amigos […] E ele [o pai] lhe disse: Filho, tu sempre estás comigo, e todas as minhas coisas são tuas” (Lc 15.29-31). O Espírito Santo testifica conosco que somos filhos do Pai!
III – A PERSEVERANÇA
Esse é um assunto que é fruto de debates intensos. Nosso objetivo é tratá-lo a partir de uma perspectiva positiva da segurança da salvação, mas também não fugir do lado negativo do assunto.
Sim, de acordo com o que vimos até o momento acerca da Justificação e Adoção, a Bíblia nos mostra com clareza que devemos estar seguros em Cristo a respeito de nossa salvação.
Ninguém a pode tirar de nós. Esse é o ponto positivo do assunto. Entretanto, há um problema sério a respeito do tema.
Há uma multidão de pessoas que serviram a Deus na igreja, confessaram ter passado uma experiência de salvação, tiveram a evidência do Batismo no Espírito Santo e, hoje, estão longe de Deus e de sua Palavra.
Uns, para tentar dar uma resposta, afirmam que estes nunca foram verdadeiramente salvos. Mas não é assim que a Palavra de Deus nos mostra acerca do assunto, pelo contrário, é possível sim perder a salvação. Passamos agora a expor a respeito de tão importante tema.
A segurança da salvação
Todo crente deve ter uma perspectiva positiva a respeito de sua salvação. Em Cristo, ele está seguro. Ora, ele foi regenerado, justificado e adotado. Esse é um processo espiritual que Deus promoveu graciosamente na vida do crente. Foi o poder do Pai que fez essas coisas. Nesse sentido, em Cristo estamos seguros.
A Palavra de Deus traz fartos textos que nos mostram a verdade de que devemos cultivar a segurança em Cristo. Por exemplo, um texto que mostra que quem é nascido de Deus conserva a si mesmo e o Maligno não toca:
“Sabemos que todo aquele que é nascido de Deus não vive pecando; mas o que de Deus é gerado conserva-se a si mesmo, e o maligno não lhe toca” (1 Jo 5.18).
Outro texto diz que estamos guardados na virtude de Deus mediante a fé: “Que, mediante a fé, estais guardados na virtude de Deus, para a salvação já prestes para se revelar no último tempo” (1 Pe 1.5).
Outros textos mais diretos trazem a nós uma segurança espiritual, como por exemplo, mostrando-nos que a vontade de Deus é que ninguém se perca:
“E a vontade do Pai, que me enviou, é esta: que nenhum de todos aqueles que me deu se perca, mas que o ressuscite no último Dia” (Jo 6.39); que as ovelhas de Jesus ouvem a sua voz, o seguem e não perecem:
“As minhas ovelhas ouvem a minha voz, e eu conheço-as, e elas me seguem; e dou-lhes a vida eterna, e nunca hão de perecer, e ninguém as arrebatará das minhas mãos. Meu Pai, que mas deu, é maior do que todos; e ninguém pode arrebatá-las das mãos de meu Pai.
Eu e o Pai somos um” (Jo 10.27-30). Esses e outros textos afirmam claramente a nossa segurança salvífica em Cristo.
São garantias gloriosas, grandiosas. Devemos tomar posse delas e vivermos sua grande verdade. Ora, se estamos em Cristo, ninguém pode nos arrebatar de suas mãos.
Como arminianos-pentecostais, não há dificuldade alguma em aceitarmos e cultivarmos essas verdades bíblicas.
Entretanto, o Novo Testamento não diz somente isso. Não há nas Escrituras Sagradas somente versículos que apontam para essa perspectiva positiva da segurança da salvação.
Há textos robustos que nos advertem igualmente acerca do perigo de darmos lugar à apostasia, e de cairmos da graça de Deus. O teólogo Daniel Pecota nos mostra que “não é possível apenas a apostasia formal, mas também a real (Hb 6.4-6; 10.26-31).
A palavra grega apostasia (‘apostasia’, ‘rebelião’) provém de aphistêmi (‘partir’, ‘ir embora’) e transmite o conceito de modificar a posição em que a pessoa está de pé”.9 Vejamos agora a perspectiva negativa da doutrina da perseverança do crente.
A tragédia da Queda
Há uma quantidade imensa de textos bíblicos que nos exortam a zelar pela nossa salvação pois a tragédia da apostasia é imperiosa.
Nosso Senhor disse que “por se multiplicar a iniquidade, o amor de muitos se esfriará. Mas aquele que perseverar até ao fim será salvo” (Mt 24.12,13 – grifo meu); e que “ninguém que lança mão do arado e olha para trás é apto para o Reino de Deus” (Lc 9.62 – grifo meu); ainda remete-nos ao exemplo da mulher de Ló: “Lembrai-vos da mulher de Ló.
Qualquer que procurar salvar a sua vida perdê-la-á, e qualquer que a perder salvá-la-á” (Lc 17.32,33 – grifo meu); em João, nosso Senhor testifica: “Se alguém não estiver em mim, será lançado fora, como a vara, e secará; e os colhem e lançam no fogo, e ardem” (Jo 15.6).
Enfim há muitos outros textos que nos estimulam a refletir acerca da possibilidade real de o crente olhar para trás e cair.
A posição oficial de nossa denominação, de acordo com a sua Declaração de Fé, é a de que
Rejeitamos a afirmação segundo a qual “uma vez salvo, salvo para sempre”, pois entendemos, à luz das Sagradas Escrituras que, depois de experimentar o milagre do novo nascimento, o crente tem a responsabilidade de zelar pela manutenção da salvação a ele oferecida gratuitamente:
“Vede, irmãos, que nunca haja em qualquer de vós um coração mau e infiel, para se apartar do Deus vivo” (Hb 3.12).
Não há dúvidas quanto à possibilidade do salvo perder a salvação, seja temporariamente ou eternamente.
Mediante o mau uso do livre-arbítrio, o crente pode apostatar da fé, perdendo, então, a sua salvação:
“Mas, desviando-se o justo da sua justiça, e cometendo a iniquidade, fazendo conforme todas as abominações que faz o ímpio, porventura viverá? De todas as justiças que tiver feito não se fará memória; na sua transgressão com que transgrediu, e no seu pecado com que pecou, neles morrerá” (Ez 18.24).
Finalmente temos a advertência de Paulo aos coríntios: “Aquele, pois, que cuida estar em pé, olhe não caia” (1 Co 10.12).
Aqui temos mencionado uma real possibilidade de uma queda da graça. Assim, cremos que, embora a salvação seja oferecida gratuitamente a todos os homens, uma vez adquirida, deve ser zelada e confirmada.10
Coerente com esse texto, há uma Declaração Oficial do Presbitério Geral das Assembleias de Deus dos EUA, acerca da segurança do crente, em que está clara a posição da denominação desautorizando completamente a perspectiva que defende a segurança incondicional da salvação, a qual sustenta que é impossível uma pessoa se perder após a experiência salvífica.
É importante citar um documento como esse para mostrar que há uma unidade pentecostal no mundo, que fazem essa leitura comum das Escrituras a respeito da perseverança do crente. Essa perspectiva nos admoesta, chama a atenção e exorta quanto ao perigo da apostasia.
O perigo da apostasia é uma realidade porque, em primeiro lugar, a salvação é recebida e se conserva pela fé (Ef 2.8; Fp 3.9; Hb 10.38; 1 Pe 1.5; Rm 3.28; Gl 2.20.21);
em segundo, a prática contínua do pecado atinge diretamente a fé do crente (Rm 3.5-8; 1 Co 3.1-3; Hb 3.12-14; 12.1; 1 Jo 1.8; 3.8); e,
finalmente, o crente perde a salvação ao rejeitar a Cristo (Jo 17.12; 1 Tm 4.1; 5.12,15; Hb 6.4-6; 10.26,27,38; 2 Pe 2.20; 1 Jo 5.16).11
Uma vez que se perde a fé e se rejeita o Salvador a apostasia se estabeleceu. Nesse sentido, não podemos, nem devemos, ter receio de afirmar o que as Escrituras dizem de maneira clara. Entretanto, é importante ressaltarmos uma atenção em relação ao seguinte mal-entendido:
Alguns de persuasão wesleyana-arminiana insistem acreditarem os calvinistas que, uma vez salvos, podem cometer os pecados que quiserem, tantas vezes quantas quiserem, e ainda continuarem salvos como se acreditassem que obra santificadora do Espírito e da Palavra não os afeta.
Por outro lado, calvinistas insistem que os wesleyanos-arminianos acreditam que qualquer pecado cometido compromete a salvação, de modo que “caem dentro e fora” da salvação cada vez que pecam como se acreditassem que o amor, a paciência e a graça de Deus são tão frágeis que rompem à mínima pressão.
Qualquer pessoa bíblica e teologicamente alerta reconhecerá a mentira em cada uma dessas caricaturas. A presença de extremos tem levado a generalizações lastimáveis.12
Não precisamos fazer ilações nem espantalhos em relação ao que o outro pensa. O que precisamos afirmar é que a nossa perseverança está em Cristo.
Ele é a nossa maior garantia. Uma vez que a pessoa deixa a Cristo não há mais garantia. Não se pode esconder textos contundentes como este:
“Porque, se pecarmos voluntariamente, depois de termos recebido o conhecimento da verdade, já não resta mais sacrifício pelos pecados, mas uma certa expectação horrível de juízo e ardor de fogo, que há de devorar os adversários” (Hb 10.26,27).
Cuidados com nossa salvação hoje
Por isso, é imperioso mantermos uma vida avivada no Espírito Santo. É preciso pedir a Deus que nos encha do seu divino Espírito.
Aqui, é importante lembrar as lições que nos ensinou o teólogo pentecostal Donald Gee. Nesse sentido, uma primeira condição para manter-se cheio do Espírito é conservar um testemunho ousado, nos moldes do que o apóstolo Pedro apresentou (At 5.29).13
Viver em profunda comunhão com Deus, agindo sempre na força do Espírito Santo. Ele nos conduz, Ele nos fala, Ele intercede por nós.
A busca por uma vida consagrada deve ser contínua. Esse esforço passa inevitavelmente por uma disciplina espiritual: consagrando a nossa vida em oração e jejum, meditando nas Escrituras Sagradas. Precisamos desejar uma disciplina espiritual, exercitando um estilo de vida piedoso.
Uma vida que ame as coisas de Deus, priorize a sua presença, anele por estar diante dEle adorando-O e glorificando-O. Precisamos “operar a nossa salvação” (Fp 2.12). Ou seja, o processo de santificação pelo qual o crente busca a se parecer cada vez mais com Jesus Cristo.
CONCLUSÃO
Que obra maravilhosa e redentora foi o que o nosso Senhor fez por nós na Cruz! Aqui, podemos recordar um clássico louvor de nosso hinário, hino 541 da Harpa Cristã, composto pelo saudoso pastor José Pimentel de Carvalho:
No Calvário contemplamos
Nosso meigo Salvador!
Oh! Revelação de amor!
O mistério há tanto oculto
Deus em Cristo revelou!
Oh! Revelação de amor!
Calvário! Calvário!
Oh! Grande dor!
Calvário! Calvário!
Oh! Revelação de amor!
Deus amou a este mundo
E seu Filho ofereceu
Oh! Revelação de amor!
O Senhor, na cruz morrendo
De nós se compadeceu!
Oh! Revelação de amor!
Deus, o Pai, olhou o Calvário
E seu Filho abandonou!
Oh! Revelação de amor!
Mas sofrendo este abandono
Cristo deu-nos seu perdão!
Oh! Revelação de amor!
No Calvário a obra de redenção foi confirmada. O maravilhoso amor de Deus foi expresso ali em toda sua magnitude e generosidade.
Assim, fomos justificados, isto é, nossa posição foi inteiramente alterada diante de Deus, de injustos, feitos justos; de culpados, inocentes. Assim também fomos adotados como filhos e filhas de Deus, instados pelo Espírito Santo a ter uma relação fraterna de Pai e filho com o Criador de todas as coisas.
A partir desse ato de amor, resta-nos perseverar na fé. Nossa segurança deve ser desfrutada em Cristo. Nele, por meio do Espírito Santo, estaremos firmes até a sua vinda. Entretanto, precisamos estar alertas, vigilantes quanto a tudo o que potencialmente persiste em nos tirar do alvo: Cristo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Comentário Bíblico Pentecostal Novo Testamento: Romanos – Apocalipse. Vol. 2. Rio de Janeiro: CPAD, 2017.
Declaração de Fé das Assembleias de Deus. Rio de Janeiro: CPAD, 2017.
Dicionário Vine. 1.ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2002.
GEE, Donald. Como Receber o Batismo no Espírito Santo. Rio de Janeiro: CPAD, 2001.
HORTON, Stanley (Ed.). Teologia Sistemática: Uma Perspectiva Pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 1996.
PEARLMAN, Myer. Conhecendo as Doutrinas da Bíblia. 3.ed. São Paulo: Editora Vida, 2009.
Que Deus o(a) abençoe.
Telma Bueno
Editora Responsável pela Revista Lições Bíblicas Jovens
Fonte: http://www.escoladominical.com.br/home/licoes-biblicas/subsidios/jovens/1955-li%C3%A7%C3%A3o-10-aspectos-da-obra-redentora-de-jesus-cristo.html
1 PEARLMAN, Myer. Conhecendo as Doutrinas da Bíblia. 3.ed. São Paulo: Editora Vida, 2009, p.229.
2 Dicionário Vine. 1.ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2002, p.162.
3 Dicionário Vine, 2002, p.733.
4 HORTON, Stanley (Ed.). Teologia Sistemática: Uma Perspectiva Pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 1996, p.362.
5 HORTON, Stanley (Ed.)., 1996, p.373.
6 PEARLMAN, Myer, 2009, p.241.
7 Dicionário Vine, 2002, p.733.
8 Comentário Bíblico Pentecostal Novo Testamento: Romanos – Apocalipse. Vol. 2. Rio de Janeiro: CPAD, 2017, p.362.
9 HORTON, Stanley (Ed.)., 1996, p.376-77.
10 Declaração de Fé das Assembleias de Deus. Rio de Janeiro: CPAD, 2017, p.114.
11 Segurança do Crente. Declaração Oficial do Presbitério Geral das Assembleias de Deus do EUA. Trad. César Lopes. Disponível em: <https://medium.com/teo-notas/a-seguran%C3%A7a-do-crente-846b3741f19f> Acessado em 14 de Out. de 2019.
12 HORTON, Stanley (Ed.)., 1996, p.375.
13 GEE, Donald. Como Receber o Batismo no Espírito Santo. Rio de Janeiro: CPAD, 2001, p.45.
Video: https://youtu.be/n2s87FVltgI