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Lição 1 – Conhecendo os dois livros de Samuel

ESBOÇO Nº 1

A) INTRODUÇÃO AO TRIMESTRE

 Estamos a terminar mais um ano letivo da Escola Bíblica Dominical e o fazemos agradecendo a Deus pela oportunidade de podermos ter aprendido mais um pouco da Sua Palavra.

 Depois de três trimestres temáticos, teremos, neste último trimestre, um trimestre bíblico, ou seja, estaremos a estudar um, mais propriamente, dois livros das Escrituras Sagradas:

os dois livros de Samuel que, na Bíblia Hebraica, compõem apenas um livro, mas que, desde as mais remotas épocas, foi dividido em dois livros, tendo a morte do primeiro rei de Israel, Saul, como o marco que separa ambas as obras. 

     Os dois livros de Samuel, são assim chamados porque, além de iniciarem sua narrativa com o aparecimento deste importante profeta da história israelita, que foi profeta, sacerdote e juiz, o último juiz de Israel, teria sido escrito majoritariamente por ele e a sua iniciativa da escrita teria sido primordial para que a narrativa continuasse após a sua morte, o que teria sido feito pelos profetas Gade e Natã (I Cr.29:29). 

     A tradição judaica atribui a autoria destes dois livros para estes três profetas e, neste passo, Samuel estaria dando continuidade a sua obra escrita, que teria abrangido também os livros de Juízes e de Rute. 

     Estes dois livros, por terem sido escritos por profetas, pertencem ao grupo dos “profetas” da Bíblia Hebraica (os “Neviim”), enquanto que, na classificação feita pelos teólogos, compõem os chamados “livros históricos”,

já que são, essencialmente, livros que narram a história de Israel do final do período dos juízes até a consolidação da monarquia, com o reinado de Davi. 

     É, portanto, o período em que Israel deixa de ser uma teocracia, ou seja, uma nação governada por Deus, que era o seu rei (I Sm.8:7), para ser uma monarquia, ou seja, uma nação governada por um rei, como ocorria com todas as outras nações (I Sm.8:5). 

     Esta mudança de forma de governo e suas consequências, inclusive no plano de Deus para a salvação da humanidade, é o tema que permeia os livros de Samuel e explica o título deste trimestre, a saber, “o governo divino em mãos humanas”, a nos mostrar que, a pedido do povo,

Deus entrega o governo de Israel nas mãos dos reis, Seus ungidos para a tarefa, “in casu”, basicamente Saul e Davi, ainda que tenha havido dois outros reis, estes não escolhidos pelo Senhor,

Isbosete, filho de Saul que reinou sobre todas as tribos menos Judá por dois anos, e Absalão, que chegou a usurpar o trono de seu pai Davi, mas acabou sendo derrotado por seu pai. 

     Estes livros servem, como bem afirma o subtítulo do trimestre, para que reflitamos sobre o exercício da liderança do povo de Deus, pois, a exemplo do que ocorreu naquele período, o Senhor Jesus,

embora seja a cabeça da Igreja, constitui ministros para administrar o seu povo, há os “governos” (I Co.12:218), ainda que, ao contrário de Israel, não há propriamente a abdicação de governo que se teve naquela época por parte do Senhor.

A capa da revista mostra-nos uma Escritura e uma coroa real. Isto nos remete ao que está escrito em Dt.17:14-20, onde Deus, na Sua presciência, já previa a hipótese de Israel ter um rei, estabelecendo, então, os deveres que o rei teria diante de Deus e do povo. 

     Um destes deveres era o de ter um traslado da lei num livro, para que pudesse lê-lo todos os dias de sua vida, para que aprendesse a temer ao Senhor e guardar todas as palavras nela contidas para que as fizesse. 

     A coroa real, portanto, não significaria poderes ilimitados, qualidades divinas, como acontecia com as nações gentílicas, e isto desde Ninrode, o primeiro a divinizar o poder político e de onde surgiu a idolatria, mas,

bem ao contrário, era a consciência de que o fato de ser rei o tornava um escolhido de Deus para governar o povo, governo este que deveria respeitar os ditames da lei divina, pois Deus continuava o Senhor de toda a terra, como bem disse quando propôs que Israel fosse Seu povo (Ex.19:5,6). 

     Foi, precisamente, por não respeitar esta submissão à vontade divina que Saul foi rejeitado, enquanto que Davi, ainda que tenha cometido pecados, foi considerado um homem segundo o coração de Deus. 

     O trimestre pode ser dividido em quatro blocos.

O primeiro, a introdução, onde teremos uma visão geral dos dois livros de Samuel, de que faz parte a lição 1. 

     O segundo bloco trata do período final dos juízes, onde temos a figura proeminente de Samuel, o último juiz de Israel, mas que também cuida do governo de seu antecessor, o sumo sacerdote Eli, que abrangerá as lições 2 a 5. 

     O terceiro bloco trata do período do reinado de Saul, o primeiro rei de Israel, que abrangerá as lições 6 a 8. 

     O quarto e último bloco trata do reinado de Davi e abrangerá as lições 9 a 13. 

     O comentarista deste trimestre é o pastor Osiel Gomes da Silva, presidente das Assembleias de Deus em Tirirical, São Luís/MA, sendo esta a segunda lição comentada por este homem de Deus, que é teólogo, escritor, com formação em Direito e Filosofia. 

     Depois de termos estudado sobre a mordomia cristã no trimestre passado, temos uma ótima oportunidade de ver, na prática, no exercício da liderança em Israel, como esta submissão ao Senhor é fundamental para o progresso do povo do Senhor. 

     Que Deus nos abençoe nesta empreitada. 

     Feliz 2020! 

B) LIÇÃO Nº 1 – CONHECENDO OS DOIS LIVROS DE SAMUEL

     Os dois livros de Samuel mostram a transformação de Israel de uma teocracia em uma monarquia. 

INTRODUÇÃO

– Estamos dando início a um trimestre bíblico, em que estudaremos os dois livros de Samuel. 

– Os dois livros de Samuel mostram a transformação de Israel de uma teocracia em uma monarquia.

I – OS LIVROS DE SAMUEL 

– Neste trimestre, estaremos a estudar os dois livros de Samuel, livros que fazem parte, para os judeus, dos “Neviim”, ou seja, “os Profetas”, que é a segunda porção das Escrituras, a chamada TANACH (Torá, Neviim e Ketubim, ou seja, lei, profetas e escritos, como mencionado pelo Senhor Jesus em Lc.24:44), que é o que denominamos de Antigo Testamento. 

– Segundo os estudiosos da Bíblia, os livros de Samuel fazem parte dos chamados “livros históricos”, que são livros que têm por objetivo narrar a história do povo de Israel a partir da morte de Moisés até o período de Esdras,

que reorganizou a sociedade judaica após o retorno do cativeiro da Babilônia, livros estes que compreendem a “segunda porção temática” da ordem dos livros do Antigo Testamento, adotada na versão grega e acolhida pelos cristãos, que reúne os livros de Josué a Ester (Josué, Juízes, Rute, os dois livros de Samuel, os dois livro dos Reis, os dois livros de Crônicas, Esdras, Neemias e Ester).

– Os livros de Samuel fazem parte do “segundo momento” de inspiração divina para a redação das Escrituras.

Depois do início da sua composição, por meio de Moisés (o que abrangeria não só o Pentateuco, mas o livro de Jó e o Salmo 90) e a sua continuação por Josué (que escreveu o livro que tem o seu nome), o fato é que houve uma interrupção na elaboração das Escrituras, consequência direta da grande corrupção espiritual causada no período dos juízes e que é bem descrita em Jz.2:7-23.

– A inspiração das Escrituras somente seria retomada já no período do profeta Samuel, que, segundo a tradição judaica, teria sido o autor dos livros de Juízes e de Rute, bem como de parte dos dois livros que levam o seu nome, Samuel, e que são o objeto do nosso estudo neste trimestre.

– Notamos, pois, que os próprios livros de Samuel representam uma intervenção divina no meio do povo de Israel, com a retomada da inspiração das Escrituras, inclusive para que se mantivesse a presença do Senhor no meio do povo num instante em que havia uma importante mudança no “modus vivendi” dos israelitas, que poderia ser fatal para a sua preservação como “propriedade peculiar de Deus dentre todos os povos” (Ex.19:5).

– Assim, o aparecimento de Samuel no cenário de Israel como profeta foi fundamental para que não só se quebrasse o “círculo vicioso” do período dos juízes, mas se pudesse manter viva a presença do Senhor no meio do povo mesmo com a alteração do regime de governo de teocrático para monárquico.

– Os livros de Samuel revelam esta mudança ocorrida entre os israelitas e são um importante indicador de como se deve exercer, em mãos humanas, o governo divino, pois, se Deus deixou de reinar diretamente sobre Israel, Israel não deixou de ser o povo de Deus.

Se, nas monarquias constitucionais de nossos dias, diz-se que o “rei reina mas não governa”, em Israel, esta “propriedade peculiar de Deus dentre todos os povos”, vamos verificar que “O rei governa, mas não reina”.

– Os dois livros de Samuel que aparecem em nossas Bíblias compõem apenas um livro no cânon judaico, o que é atestado pelo fato de se conter, no texto hebraico, uma nota marginal em I Sm.28.24 onde consta que ali se encerra ‘a metade do livro’, nota que, evidentemente, não consta de nossa versão em língua portuguesa. 

– Este livro era chamado como “livro de Samuel” pelos hebreus, mas, quando da versão para o grego (a Septuaginta), devido a sua extensão, foi dividido em dois livros, cada um dos quais denominado de “livros dos reinos” (em grego, “bíbloi basileiõn”), já que tratavam, basicamente, do período dos reinados de Saul e de Davi. 

– Assim, tínhamos o Primeiro Livro dos Reinos e o Segundo Livro dos Reinos. Quando da tradução da Bíblia para o latim (a Vulgata), Jerônimo nominou estes livros de “livros dos Reis”, chamando cada livro de Primeiro Livro dos Reis e Segundo Livro dos Reis.

Posteriormente, a Vulgata acabou alterando o título dos livros, acolhendo a denominação hebraica, mas mantendo a divisão em dois livros: Primeiro Livro de Samuel e Segundo Livro de Samuel. “Samuel” significa “ouvido por Deus”.

– A tradição hebraica atribui a autoria dos livros a Samuel, como se pode verificar no tratado do Talmude (o segundo livro sagrado do judaísmo) denominado Baba Bathra, “in verbis”:

“…E quem escreveu os livros da Bíblia? Moisés escreveu seu próprio livro, ou seja, a Torá e a porção de Balaão na Torá e o livro de Jó. Josué escreveu seu próprio livro e oito versos na Torá, que descrevem a morte de Moisés.

Samuel escreveu seu próprio livro, o livro dos juízes e o livro de Rute.…” (Baba Bathra 15a. Disponível em: https://www.sefaria.org/Bava_Batra.14b.12?lang=bi&with=all&lang2=en Acesso em 03 ago. 2019) (tradução do inglês pelo Google).

– Tal atribuição não pode conter todos os dois livros, pois Samuel morreu ainda durante o reinado de Saul (Cf. I Sm.25:1; 28:3).

Entretanto, as Escrituras indicam que Samuel era escritor (Cf. I Sm.10:25) e que os registros históricos do período abrangido pelos dois livros de Samuel (ou seja, as judicaturas de Eli e Samuel e os reinados de Saul e de Davi) foram obra de Samuel, Natã e Gade (Cf. I Cr.29:29).

Daí, devemos concluir que Samuel escreveu boa parte do Primeiro Livro de Samuel e que o restante do primeiro livro e o Segundo Livro foram obra dos profetas Natã e Gade.

Os “críticos bíblicos”, como sempre, negam que o livro tenha sido produzido durante o reinado de Davi e defendem que os livros teriam sido escritos pouco antes ou até depois do cativeiro da Babilônia, o que não tem qualquer respaldo, sendo mais um clamor daqueles que querem tão somente contrariar a Bíblia e buscar negar a sua autenticidade (I Tm.6:20,21).

– Também não se pode esquecer que, no segundo livro de Samuel, foram também compiladas palavras de Davi, que compõem o capítulo 22, que é, na verdade, o Salmo 18, como a primeira porção do capítulo 23, até o versículo 7, que são as últimas palavras do rei.

Assim, de certa maneira, teria ele uma “participação” no livro, se bem que, neste caso, a exemplo do que ocorre com o capítulo 4 do livro de Daniel, que foi escrito por Nabucodonosor, temos uma compilação feita por Natã e Gade da palavra de terceiro. 

– Alguns estudiosos, com base em II Cr.32:32, entendem que estes livros foram compilados, ou seja, organizados e tiveram a sua redação final por obra do profeta Isaías, nos dias de Ezequias.

Entendem assim porque alguns textos não têm a conjunção “e” que separa a expressão “visão do profeta Isaías” de “livro da história dos reis de Judá e de Israel”, o que permitiria entender que o profeta Isaías tanto escreveu o seu livro profético, quanto organizou os livros a respeito da história de Israel e de Judá, que, na época, eram os livros de Juízes, Rute, Samuel e Reis.

OBS: “A versão Frenton traduz: ‘Mas o restante dos atos de Ezequias, a sua piedade, podem ser vistos escritos nas Visões de Isaías-bemAmós, no Pregador, na História dos Reis de Judá e de Israel’.

A versão Berkeley também exclui a palavra ‘e’, que na nossa versão está em itálico, significando que foi acrescida pelos tradutores.

Pode-se presumir, a partir disso, que Isaías poderia ter escrito a história de Israel em sua forma final, como a encontramos hoje nos livros de Juízes, Rute, 1 e 2 Samuel, 1 e 2 Reis, exceto pelos últimos 4 ou 5 últimos capítulos de 2 Reis, que registram coisas acontecidas depois de sua época.

Alguns acreditam que Isaías foi morto no reinado de Manassés, filho de Ezequias.…” (BÍBLIA DAKE, CPAD/Atos, nota 32.32c, p.753).

– Mas, se Samuel não foi o autor da totalidade dos livros, por que recebem eles o seu nome? Porque, inegavelmente, é Samuel o responsável por este movimento que resultou na retomada do estudo e ensino da lei do Senhor e da própria busca da presença de Deus neste período, cortando, assim, o “círculo vicioso” construído após a morte de Josué e dos anciãos da sua geração, como descrito em Jz.2:7-23.

– Esta descrição, que foi obra do próprio Samuel, a quem se atribui a autoria do livro de Juízes, mostra, claramente, que a falha da educação doméstica doutrinária era a principal responsável pela corrupção da população israelita, geração após geração, que levava às opressões continuadas que Israel sofria e que eram como que meios para que o povo se lembrasse do Senhor e pedisse a libertação, o que era feito por intermédio dos juízes.

– Samuel, então, criou uma importante instituição, as “escolas dos profetas” (I Sm.10:5; 19:20), onde se preparavam pessoas no estudo e ensino da lei, bem como a ter uma vida de serviço a Deus. Assim, dar o título do livro a Samuel é o reconhecimento de que a produção profética literária se deve a este homem de Deus que, ademais, é a primeira personagem principal do relato do livro.

– Dizemos ter sido ele o criador de tal instituição, pois, antes dele, não há qualquer menção dela nas Escrituras e, mais, é com Samuel que se passa a dar valor à Palavra de Deus, passando o povo a reconhecer a palavra profética (I Sm.3:19-21;9:6).

– Lembremos, ainda, que o título foi dado pelos judeus, que consideram ser este parte dos “Profetas”, de modo que nada mais natural que, sendo Samuel a primeira personagem do livro e o principal profeta deste período, que, inclusive, ungiu os dois reis cujos reinados neles são narrados (Saul e Davi), seja, mesmo, o seu nome o escolhido para dar título ao livro.

Estaríamos aqui como que debaixo do “espírito de Samuel”, que teria repousado sobre os demais escritores do livro, como, no futuro, se estaria debaixo do “espírito de Elias” (II Rs.2:15).

OBS: Isto se mostra bem no Talmude, ainda no tratado Baba Bathra, quando se procura justificar a ordem dos livros na Bíblia hebraica:

“…Os Sábios ensinaram: A ordem dos livros dos Profetas, quando eles estão juntos, é a seguinte:

Josué e Juízes,

Samuel e Reis,

Jeremias e Ezequiel, e Isaías e os Doze Profetas.…” (Baba Bathra 14b. Disponível em: https://www.sefaria.org/Bava_Batra.14b.8?lang=bi&with=all&lang2=en Acesso em 03 ago. 2019).

II – O PRIMEIRO LIVRO DE SAMUEL

– Como já tivemos ocasião de mencionar, no cânon judaico, o livro de Samuel é único, mas foi dividido em dois, em virtude de sua extensão, quando efetuada a versão para o grego, a chamada Septuaginta, de modo que a divisão ocorrida revela que a obra é um todo, que,

por motivos alheios à composição, acabou sendo dividido em dois, motivo pelo qual, inclusive, serão estudados conjuntamente. Entretanto, tendo em vista a divisão operada, veremos a estrutura de cada livro separadamente.

– Segundo Finis Jennings Dake (1902-1987), o Primeiro Livro de Samuel, o 9º livro da Bíblia, possui 

31 capítulos,

810 versículos,

157 perguntas,

50 versículos de profecias cumpridas,

1 versículo de profecia não cumprida,

29 mensagens distintas de Deus (2:27; 3:4,6,8,10; 8:7,22; 9:15,17; 10:1,18,22; 13:11; 15:2,11,18; 16:1,2,7-10,12; 22:5; 23:2,4,11,12; 30:8),

4 promessas,

117 ordens e

57 predições.

– O Primeiro Livro de Samuel pode ser dividido em três partes:

a) 1ª parte – a história de Samuel – I Sm.1-8

b) 2ª parte – a história de Saul – I Sm.9-15

c) 3ª parte – a história de Davi – I Sm.16-31

– O Primeiro Livro de Samuel inicia-se com a história do próprio Samuel, as circunstâncias de seu nascimento e como, não sendo um descendente de Arão, pôde exercer o sacerdócio.

A verdade é que Ana, sua mãe, pediu a Deus que fosse aberta a sua madre e ela o prometeu a dar em voto a Deus, de sorte que, em sendo atendida, cumpriu o voto, passando, então, Samuel a pertencer ao Senhor, a ser como que um filho adotivo do sumo sacerdote Eli, o que lhe deu acesso à linhagem sacerdotal.

– Na verdade, vê-se aqui que o Senhor estava, em virtude da degeneração completa do sacerdócio levítico, que atingiria seu ponto culminante na devassidão operada por Hofni e Fineias, os filhos do sumo sacerdote Eli, que levaria à própria destruição do tabernáculo em Siló (Sl.78:56-66)

e a mudança da linhagem do sumo sacerdote, ainda que dentro da casa de Eleazar (I Rs.2:27), erguendo alguém que, com o sacerdócio e a judicatura, pudesse operar, segundo os ditames do Senhor, este período de transição que levaria Israel da teocracia à monarquia.

– Após narrar as circunstâncias do nascimento e do ingresso de Samuel no serviço sacerdotal, segue-se a narrativa do fim trágico do período em que Eli exerceu tanto a judicatura quanto o sumo sacerdócio e a opressão mais violenta da parte dos filisteus.

Em seguida, há a narrativa de como Samuel foi usado por Deus para libertar o povo do jugo dos filisteus, tornando-se ele, então, o juiz de Israel.

– Preocupado com o segundo fator que identificara no “círculo vicioso” do período dos juízes, ou seja, a existência de um hiato de tempo entre a morte de um juiz e o surgimento de outro, Samuel tentou se fazer substituir pelos seus dois filhos, ainda em vida, e esta tentativa de tornar hereditária uma função que não era, revelou-se um desastre, pois seus filhos eram corruptos e o povo de Israel acabou querendo mudar de forma de governo, instituindo a monarquia, a exemplo das demais nações.

– Samuel não viu com bons olhos este pedido do povo, mas Deus o permitiu, e Samuel, então, acabou por ungir o primeiro rei de Israel, Saul, que, ao contrário do que se costuma dizer, não foi “escolhido pelo povo”, mas, sim, pelo próprio Deus. 

– Começa, então, a segunda parte do Primeiro Livro de Samuel, que nos fala da história de Saul, desde as circunstâncias de sua escolha, repetimos, da parte de Deus, no episódio em que procurava ele as jumentas de seu pai, até o término de seu reinado, pois a sua morte é, precisamente, o último fato relatado no Primeiro Livro de Samuel.

– É interessante notar que, no Primeiro Livro de Samuel, não há a menção da duração do reinado de Saul, o que é interessante e singular, pois todos os demais reis têm sempre consignado o tempo de seu reinado, talvez como uma demonstração de que o tempo cronológico não foi levado em conta, tendo em vista a rejeição divina ao rei já no seu segundo ano de reinado.

OBS: De qualquer modo, sabemos que o reinado de Saul foi de quarenta anos por meio de At.13:21.

– Apesar de o Primeiro Livro de Samuel se encerrar com a morte de Saul, entende-se que a segunda parte do livro, que fala da história de Saul, termina no capítulo 15.

A partir de então, a personagem central deixa de ser Saul para ser Davi, o filho de Jessé que é ungido por Samuel como rei em lugar de Saul.

– Tem-se, pois, a terceira parte do livro, que fala da história de Davi, desde a sua unção, depois que tirado foi de detrás das ovelhas de seu pai, até o momento em que se encontrava em Ziclague, cidade que lhe fora dada pelo rei de Gate, onde morava com sua família, impedido que estava de morar em Israel por causa da perseguição que lhe fazia o rei Saul, ou seja, do capítulo 16 até o capítulo 31.

– Dentro desta linha de transição e mudanças que retrata o período dos livros de Israel, vemos, nesta terceira parte, o antagonismo entre Saul e Davi, o que, em termos de estudo de liderança e de atitudes de líderes,

é um manancial de ensinamentos, pois vemos como age um líder que sai da presença de Deus, e que tenta, a todo custo, manter o poder, usando de todas as artimanhas e armas humanas para tanto, e alguém que, mesmo tendo promessa divina, jamais ousa ou se atreve a “criar atalhos”, mas espera em Deus o cumprimento das promessas.

– “O Livro de 1 Samuel e seu cumprimento em o Novo Testamento –  1 Samuel encerra duas prefigurações proféticas do ministério de Jesus como profeta, sacerdote e rei.

(1) Samuel, nos seus dias, o principal representante profético e sacerdotal de Deus em Israel, prefigurava o ministério de Jesus como supremo expoente profético e sacerdotal de Deus para Israel.

(2) Davi, nascido em Belém, um pastor e rei, ungido por Deus, que levou a cabo os propósitos de Deus para sua própria geração (Ate.13.36), veio a ser a prefiguração e precursor principal do rei messiânico de Israel.

O NT refere-se a Jesus Cristo como ‘Filho de Davi’ (e.g. Mt.1.1; 9.27; 21.9), a ‘descendência de Davi segundo a carne’ (Rm.1.3) e a ‘Raiz e a Geração de Davi’ (Ap.22.16). (BÍBLIA DE ESTUDO PENTECOSTAL, p.429).

– “Cristo Revelado (1 Samuel, observação nossa) – As semelhanças entre Jesus e o pequeno Samuel são surpreendentes. Ambos são filhos de promessa.

Ambos foram dedicados a Deus antes do nascimento. Ambos foram pontes de transição de um estágio da história da nação para outro.

Samuel acumulou os ofícios de profeta e sacerdote. Cristo é profeta, sacerdote e rei. O fim trágico de Saul ilustra o destino final dos reinos terrenos.

A única esperança é um Reino de Deus na terra, cujo soberano seja o próprio Deus. Em Davi começa a linhagem terrena do Rei de Deus. Em Cristo, Deus vem como Rei e virá novamente como Rei dos reis.

Davi, o pequeno e humilde pastor, prefigura o Cristo, o bom Pastor. Jesus torna-se o Rei-pastor definitivo.” (BÍBLIA DE ESTUDO PLENITUDE, p.289).

– Outros veem a figura de Jesus Cristo no Primeiro Livro de Samuel como a do profeta confiável. Assim como Samuel era um homem cuja palavra se podia confiar e tudo quanto dizia se cumpria infalivelmente (I Sm.3:19-21; 9:5), assim também tudo quanto é dito pelo Senhor Jesus é de cumprimento certo e inevitável (Mt.24:35; Lc.21:33).

Assim como Samuel permitiu a transição do sacerdócio levítico, apesar da destruição de Siló, de modo que de Eli, da casa de Eleazar, se pudesse manter a linhagem sacerdotal em Zadoque, que, embora da casa de Eleazar não era descendente de Eli, também o Senhor Jesus permitiu a transição entre o sacerdócio segundo a ordem de Arão para o sacerdócio segundo a ordem de Melquisedeque.

– Mas este profeta confiável não estava tipificado apenas em Samuel, mas, também, em Davi, pois Davi também é profeta (At.2:29,30).

Davi, ao ser ungido, recebeu o Espírito Santo e sempre se conduziu com prudência e fidelidade, mesmo sendo injustamente perseguido por Saul, tendo, inclusive, se negado a matar, por duas vezes, o rei que o perseguia, tendo oportunidade concreta para isto.

De igual forma, o Senhor Jesus, mesmo sendo impiedosamente perseguido pelas autoridades de Seu povo, jamais Se levantou contra elas, tudo sofrendo para cumprir a missão que Lhe fora dada pelo Pai.

– A perseguição que sofre Davi, que ocupa uma boa porção do Primeiro Livro de Samuel, também é uma demonstração eloquente de que uma pessoa segundo o coração de Deus e que é ungida pelo Espírito Santo passará, neste mundo, aflições, como, aliás, bem o disse Nosso Senhor e Salvador (Jo.16:33).

São passagens que demonstram a falácia da teologia da prosperidade ou da teologia da confissão positiva, tão em voga em nossos dias.

– Já o rei Saul é a tipificação do sistema rebelde de poder que se instalou no mundo desde a comunidade única pós-diluviana, que teve em Ninrode a sua figura emblemática e que é o sistema gentílico de poder.

Os israelitas queriam ter um rei como as demais nações e Saul, embora escolhido por Deus, quis realmente se tornar um rei nos mesmos ditames deste sistema rebelde contra o Senhor.

– A sua rejeição está umbilicalmente relacionada com esta sua atitude de insubmissão ao Senhor, com sua postura de dizer o que seria, ou não, agradável a Deus, uma atitude de soberba que o faz se voltar contra a autoridade divina e é precisamente por isso que acabou sendo rejeitado.

Este uso da liderança e do poder político em oposição a Deus é um grande perigo que tem levado muitos ao mesmo fim trágico de Saul, que acabou, por seu orgulho e impenitência, perdendo a oportunidade de desfrutar da benignidade divina, sendo apartado dela (II Sm.7:15).

III – O SEGUNDO LIVRO DE SAMUEL

– Segundo Finis Jennings Dake (1902-1987), o Segundo Livro de Samuel, que é o 10º livro da Bíblia, tem:

24 capítulos,

695 versículos,

125 perguntas,

679 versículos históricos,

9 versículos de promessas cumpridas,

7 versículos de promessas não cumpridas,

11 mensagens distintas de Deus (2:1,2; 5:19,23; 7:4; 12:1,7; 21:1; 24:11,16.18),

70 ordens,

25 predições e

13 promessas. 

– O Segundo Livro de Samuel pode ser dividido em quatro partes:

a) 1ª parte – a consolidação do reino de Davi – II Sm.1-6

b) 2ª parte – o crescimento do reino de Davi – II Sm.7-10

c) 3ª parte – os pecados de Davi e suas consequências – II Sm.11-21

d) 4ª parte – epílogo – cântico, últimas palavras de Davi e o castigo pela numeração do povo – II Sm.22-24

– O fato que divide os dois livros de Samuel, consoante a nota marginal constante do texto hebraico, é a morte de Saul, que faz cessar o antagonismo que caracterizara a terceira e última parte do Primeiro Livro de Samuel, entre Saul e Davi.

– No entanto, ao contrário do que se poderia imaginar, a morte de Saul não significou a imediata ascensão de Davi ao trono de Israel.

O chefe do exército de Saul, Abner, pôs no trono o único filho legítimo de Saul que escapara da morte na guerra contra os filisteus, Isbosete (II Sm.2:8-10).

– Verdade é que a tribo de Judá não aceitou Isbosete como rei e constituiu a rei sobre si a Davi, que, assim, começa a reinar sobre a sua tribo, em mais uma indicação da sua tipologia em relação a Cristo, que, primeiro, reina sobre os Seus irmãos, a Igreja, para depois reinar sobre Israel e todas as nações do mundo.

– Inicia-se, então, uma guerra entre Davi e Isbosete, com a contínua fortificação de Davi, que chega, inclusive, a receber o apoio do próprio Abner que, porém, é morto por Joabe, chefe do exército de Davi. Isbosete acaba sendo assassinado e, diante disto, os israelitas todos resolvem se submeter a Davi.

O reinado de Davi, porém, só vai se consolidar de vez quando, no sétimo ano de seu reinado, Jerusalém é conquistada e passa a ser a capital de Israel, terminando, assim, a primeira parte do Segundo Livro de Samuel.

– A segunda parte do Segundo Livro de Samuel trata do crescimento do reino de Davi. Depois de consolidar seu poder internamente e de conquistar Jerusalém, que passa a ser a capital, Davi começa a conquistar diversos reinos limítrofes, conquistas estas que, longe de representarem uma sede de poder, estavam dentro dos parâmetros estabelecidos pelo Senhor, ou seja, Davi conquista terras que Deus havia prometido dar a Abraão e que a negligência dos israelitas, desde os dias de Josué, não havia permitido fossem devidamente conquistadas.

– Davi, assim, apresenta-se como um tipo de Jesus Cristo, praticamente conquistando toda a terra que Deus havia prometido a Abraão, algo que somente voltará a ocorrer por ocasião do reino milenial de Cristo, o “Filho de Davi”.

– A terceira parte do Segundo Livro de Samuel, no entanto, traz um outro lado desta história, um lado trágico. Davi, até então um exemplo, passa a revelar uma face que, até então, em a narrativa, estava presente mas sem tanta ênfase por parte do escritor.

A péssima vida familiar de Davi, já demonstrada desde o seu casamento com Mical, encontra aqui o seu apogeu, quando o rei, em vez de ir para a guerra, fica no palácio e acaba cometendo um adultério com Bate-Seba, adultério que acabaria gerando o homicídio de Urias, o marido de Bate-Seba e um dos “valentes de Davi”.

– Estes pecados do rei foram publicamente revelados pelo profeta Natã e, a partir daí, apesar do perdão dado por Deus ao rei, que se arrependeu cabalmente de todos estes erros, sobrevieram funestas consequências para Davi, sua família e para Israel, notadamente nos episódios que envolveram Absalão, filho de Davi, que acabou destronando o pai, usurpando o reino e sendo, posteriormente, derrotado pelo próprio Davi.

– Esta terceira parte do Segundo Livro de Samuel revela-nos coisas muito importantes. Por primeiro, que a Bíblia é um livro imparcial, que não esconde os erros de seus heróis, de modo que que o mesmo Davi que era louvado e teve suas virtudes eloquentemente apresentadas, também tem seus erros, defeitos e pecados igualmente apresentados, a nos indicar, portanto, que a Bíblia é um livro de inspiração divina e não, humana.

– Por segundo, estabelece aqui, uma vez mais, um antagonismo entre a liderança escolhida por Deus e que se guia segundo os ditames divinos e a liderança que se estriba única e exclusivamente na sede de poder e nas artimanhas e artifícios humanos.

Cria-se um novo antagonismo, agora entre Davi e Absalão. Neste novo antagonismo, Davi, que agora é o governante da vez, nada faz para se prevalecer contra o filho rebelde froa dos parâmetros éticos divinos e, apesar de, aparentemente, ter “levado a pior”, na verdade, acaba retornando ao povo, enquanto que é Absalão que, a exemplo de Saul, tem um final trágico.

– Por terceiro, mostra-nos, com absoluta clareza, como se relacionam o perdão divino e a lei da semeadura. Davi teve seu pecado perdoado, mas as consequências de seu pecado foram por ele sofridas, a um altíssimo preço, numa ilustração paradigmática de que como operam a justiça e a misericórdia divinas.

– A quarta parte do Segundo Livro de Samuel é como que um apêndice, contendo um salmo de Davi e o registro de suas últimas palavras, que têm um teor profético e messiânico, como também a narrativa do episódio da numeração do povo e o castigo daí advindo, onde, inclusive, se revela o local onde deveria ser construído o templo, em novo entrelaçamento da justiça e da misericórdia divinas.

– ” O Livro de 2 Samuel e o Novo Testamento – O reinado de Davi nos capítulos 1-10 é uma prefiguração do reinado messiânico de Cristo.

O estabelecimento de Jerusalém como a cidade santa, o recebimento do gracioso concerto davídico da parte de Deus e a promessa profética de um reino eterno, apontavam para o perfeito ‘Filho de Davi’, Jesus Cristo, e Seu reino presente e futuro conforme revela o NT ( Is.9.7; Mt.21.9; 22.45; Lc.1.32,33).…” (BÍBLIA DE ESTUDO PENTECOSTAL, p.479).

 – “Cristo Revelado (2 Samuel, observação nossa) – Davi e seu reino esperavam a vinda do Messias. O cap.7, em especial, antecipa o futuro Rei.

Deus interrompe os planos de Davi de construir uma casa para a arca e explica que enquanto Davi não pode construir uma casa para Deus, Deus está construindo uma casa para Davi, ou seja, uma linhagem que dure para sempre.

Pela sua vitória sobre todos os inimigos de Israel, pela sua humildade e compromisso com o Senhor, pelo seu zelo a favor da casa de Deus e pela associação dos ofícios de profeta, sacerdote e rei na sua pessoa(sic), Davi é um precursor da Raiz de Jessé, Jesus Cristo.” (BÍBLIA DE ESTUDO PLENITUDE, p.323). (Observação nossa: discordamos que Davi tenha sido sacerdote, pois não era da tribo de Levi. Somente Jesus acumulou os três ministérios. Davi foi apenas profeta e rei).

O Segundo Livro de Samuel tem a figura de Davi como personagem principal, ainda que antagonizada por Absalão, a nos mostrar que, mesmo no trono, Davi, por ser uma pessoa segundo o coração de Deus, sofreu oposições ao longo de seu governo. 

– O Segundo Livro de Samuel, ademais, traz um novo passo dado no plano salvífico, ao revelar que o Messias seria da descendência de Davi, ou seja, todo o estabelecimento da monarquia, feito aparentemente pelos israelitas para serem como as demais nações, como um passo em direção à mistura com as demais nações e, por conseguinte, um obstáculo ao cumprimento da promessa da redenção, revelou-se, isto sim, um movimento em prol da realização da salvação.

A monarquia dava a linhagem do Messias, ou seja, nada ou ninguém poderia frustrar os planos divinos (Jó 42:2 ARA). Aleluia!

– São estas, em linhas gerais, as estruturas de ambos os livros de Samuel que passaremos a estudar mais amiúde a partir da próxima lição.

Ev.  Caramuru Afonso Francisco

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