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Lição 6: A infidelidade conjugal

A fidelidade é nota essencial do casamento bíblico.
INTRODUÇÃO
– A fidelidade é nota essencial do casamento bíblico.
– Por causa da fidelidade, o casamento pode ser figura do relacionamento entre Deus e Israel, entre Cristo e a Igreja.
I – OS SIGNIFICADOS DE FIDELIDADE
– O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa dá, entre os muitos significados de fé, o de “compromisso assumido de ser fiel à palavra dada, de cumprir exatamente o que se prometeu”. Por sua vez, o mesmo dicionário identifica “fidelidade” como sendo “característica, atributo do que é fiel, do que demonstra zelo, respeito quase venerável por alguém ou algo; lealdade”. Percebe-se, portanto, que a ideia de fidelidade está vinculada à ideia de compromisso, ou seja, a uma persistência num acordo, num pacto que foi firmado entre duas partes.
– Ora, é precisamente este o sentido da fé ou fidelidade enquanto fruto do Espírito Santo. Quando somos salvos, passamos a ser participantes da natureza divina (II Pe.1:4) e, sendo assim, temos de assumir o mesmo caráter de Deus, já que, em nós, foi restaurada a imagem e semelhança de Deus, que deve ser refletida por nós aos homens (Mt.5:16; II Co.3:18).
– Uma das principais características divinas é a Sua imutabilidade. Deus não muda e n’Ele não há sombra de variação (Tg.1:17). A Bíblia ressalta, ainda, que Jesus Cristo é o mesmo ontem, hoje e eternamente (Hb.13:8). Desta maneira, o salvo não pode, também, no tocante aos valores morais e espirituais, sofrer qualquer variação. Tem de ser firme, tem de manter a sua posição, custe o que custar, aconteça o que acontecer.
– Esta firmeza é o respeito, o zelo ao compromisso assumido, que é a fidelidade, como vimos na definição supra. A fé enquanto fruto do Espírito traz ao homem esta atitude de firmeza, de imutabilidade, que o leva a manter as suas posições apesar das circunstâncias adversas. O homem que morará no santo monte do Senhor é aquele, diz o salmista, que “mesmo que jure com dano seu, não muda” (Sl.15:4 “in fine”).
– A fé é, portanto, enquanto fruto do Espírito, a característica de manutenção dos compromissos assumidos diante do Senhor e de imutabilidade de suas posições frente aos desafios e obstáculos que se lançam diante do crente. Quando observamos a galeria dos “heróis da fé” no capítulo 11 dos Hebreus, vemos que a fé existente naqueles homens fez com que tivessem eles atitudes firmes, imutáveis, que não se alteraram mesmo diante das tribulações e das dificuldades apresentadas, que, aliás, chegaram mesmo a levar, algumas vezes, os fiéis à morte. Entretanto, a fidelidade não se abala mesmo diante da morte, tanto que o próprio Senhor, em Sua carta à igreja de Smirna, reconhece esta circunstância, prometendo, porém, aos que forem fiéis até a morte, a coroa da vida (Ap.2:10).
– A fé importa em tomada de posição firme ante o compromisso assumido com o Senhor quando de nossa salvação. Ao aceitarmos a Cristo como nosso Senhor e Salvador, a exemplo do que fez Israel quando do pacto que selou com Deus no deserto, dizemos ao Senhor: “tudo o que o Senhor tem falado, faremos” (Ex.19:8 “in medio”). O próprio Jesus afirma que só seremos Seus amigos se fizermos o que Ele manda (Jo.15:14). Ora, como o Senhor é sempre o mesmo, Sua Palavra não muda, permanece para sempre (I Pe.1:25), de sorte que não temos dificuldade em saber o que devemos fazer. Por isso, Paulo dizia que não se cansava de ensinar aos crentes as mesmas coisas (At.13:42; Fp.3:1).
– Falar de imutabilidade de posição e de firmeza nos nossos dias é algo difícil de se pensar, pois o mundo defende exatamente o oposto. Estamos na “era da flexibilização”, onde tudo pode ser modificado, alterado, onde se defende a “tolerância” e a “flexibilidade”. Entretanto, devemos lembrar que não é isto que ensina a Palavra de Deus. É evidente que o mundo está sujeito à mudança, que o homem é, por natureza, mutável, que as relações sociais, políticas e econômicas são sujeitas a alterações e devem, mesmo, se modificar, pois o homem é imperfeito e esta sua imperfeição abre espaço para que haja uma contínua alteração. Até mesmo no campo espiritual há espaço para mudança, pois a Bíblia diz que o homem deve atingir a perfeição espiritual, tanto que, para isto, Cristo dotou a Igreja de dons ministeriais (Ef.4:12,13).
– Todavia, a mudança prevista nas Escrituras é uma mudança com vistas a atingirmos o alvo que é a plenitude de Cristo em nós. Devemos ser iguais a Cristo, atingir a Sua estatura, a medida de Cristo. Portanto, o que temos de mudar é o que há em nós para sermos iguais a Cristo e não mudar os princípios e os valores que nos foram ensinados e revelados através da Palavra de Deus. Nosso mudar é um caminhar em busca da perfeição e a perfeição está em Cristo e quem nos diz quem é Cristo e como devemos viver para sermos como Ele é a Bíblia Sagrada, as Escrituras que d’Ele testificam (Jo.5:39). Por isso, não podemos permitir que o “espírito da flexibilização” venha a habitar na Igreja ou em nós mesmos. Não podemos mudar a Palavra de Deus e esta Palavra permanece para sempre. Repudiemos, portanto, as inovações, as novidades, os modismos e modernismos que querem encontrar guarida na Igreja e na nossa vida. Quem pretende mudar a Palavra do Senhor apenas está indicando que já foi cortado da videira verdadeira, pois uma das qualidades do fruto do Espírito é a fidelidade, que é uma atitude de imutabilidade quanto aos princípios e valores escriturísticos, que é uma atitude de firmeza, de repúdio à mudança.
– Esta firmeza na vida do crente faz com que ele se relacione também desta maneira com os outros. Sendo imutável no seu relacionamento com Deus e consigo mesmo, o crente é, também, firme no seu relacionamento com os outros e aí vemos um outro aspecto da fidelidade, que é a lealdade. Lealdade é entendida como sendo “fidelidade aos compromissos assumidos, caráter do que é inspirado por este respeito ou fidelidade”, sendo palavra que se origina de “legal + dade”, ou seja, é a observância de uma lei, de uma regra, de um acordo.
– O crente tem de ser leal, ou seja, deve cumprir com os compromissos assumidos diante de Deus e dos outros homens. A lealdade é um dos aspectos da fidelidade, aquele que diz respeito a nosso relacionamento com outrem. Em Dt.32:20, no cântico de Moisés, é dito que Israel seria desleal, porque se esqueceria da Rocha que o havia gerado, do Deus que o havia formado (Dt.32:18). Esta deslealdade, como se verifica, foi o fato de Israel não ter cumprido o compromisso assumido com o Senhor em Ex.19:6, quando afirmou que faria tudo o que Senhor havia falado. Entretanto, como bem sabemos, a geração que assumiu este compromisso, cedo se distanciou do Senhor, como vemos a partir do episódio do bezerro de ouro. O escritor aos hebreus diz que a geração do êxodo não entrou na Terra Prometida por causa da sua incredulidade (Hb.3:19), ou seja, por causa da sua falta de fé. A deslealdade nada mais é que produto da falta de fé.
– Ser leal é cumprir os compromissos assumidos, é observar os preceitos e normas estabelecidos. O crente é leal, em primeiro lugar, ao Senhor e, em segundo lugar, ao próximo. Na Bíblia, temos vários exemplos de servos de Deus que demonstraram a sua lealdade não só para com Deus como para com o próximo. Daniel e seus amigos são exemplos de lealdade, pois, mesmo na corte babilônica, assentaram no seu coração não se contaminar com o manjar do rei e, já dotados de posição na corte, mantiveram esta resolução, mesmo diante das ameaças da fornalha de fogo ardente ou da cova dos leões. Davi demonstrou sua lealdade para com Jônatas, fazendo bem a Mefibosete, mesmo depois que Jônatas havia morrido e não havia qualquer força ou circunstância que pudesse forçá-lo a cumprir a promessa feita a seu amigo, promessa, aliás, que não teve qualquer outra testemunha a não ser o próprio Deus. Temos sido leais? Temos cumprido com os compromissos assumidos?
– A lealdade é tão importante na vida do cristão que Jesus proibiu terminantemente que o crente faça juramentos(Mt.5:34-36), pois, a um verdadeiro filho de Deus, basta a palavra que for dita. Quando juramos, reconhecemos que precisamos de algo superior a nossa palavra para confirmarmos o que estamos a prometer, reconhecemos que nossa palavra não tem força suficiente para se impor. Todavia, o crente em Cristo Jesus não pode jurar, ou seja, o crente em Cristo tem de ter uma conduta, uma credibilidade tal que sua palavra é suficiente, bastante. O falar do crente deve ser sim, sim, não, não. Tudo o que vem além disto, que é contrário à fidelidade, tem procedência maligna (Mt.5:37).
– Uma das características dos homens ímpios é o fato de serem “infiéis nos contratos” (Rm.2:31), “traidores” (II Tm.3:4), “nuvens levadas pela força do vento” (II Pe.2:17) e “nuvens sem água, levadas pelo vento de uma a outra parte”(Jd.12), ou seja, pessoas que não cumprem com os compromissos assumidos, que faltam à confiança neles depositada. Assim, uma característica do verdadeiro servo de Deus é ser cumpridor de seus deveres, de suas obrigações. Um verdadeiro cristão nada pode dever a não ser o amor (Rm.13:8). É inadmissível que um cristão ligado na videira verdadeira seja um devedor contumaz, um indivíduo que não tenha crédito na sociedade onde viva, alguém cuja palavra nada valha. O crente é leal, porque produz o fruto do Espírito e um dos gomos deste fruto é a fidelidade.
OBS: Por isso mais do que acertada a providência que alguns ministérios tem tomado de exigir, dos indicados à separação para o ministério, certidões dos cartórios de protestos de títulos e dos órgãos de proteção ao crédito. O cristão verdadeiro produz o fruto do Espírito e o crente tem de mostrar que é fiel, que é leal, que é cumpridor de suas obrigações. A deslealdade é um indício de que a pessoa não está ligada à videira verdadeira, pois foi Jesus quem disse que pelos frutos conheceríamos os salvos e os ímpios (Mt.7:20)
– Fidelidade também é, segundo os dicionaristas, “constância nos compromissos assumidos com outrem”, “constância de hábitos, de atitudes”. Não basta assumirmos um compromisso com alguém e cumpri-lo, nem mesmo tomar a iniciativa de fazer algo de acordo com a vontade de Deus, mas é indispensável, para que haja fidelidade, que haja “constância”, ou seja, assiduidade, frequência, prosseguimento, continuidade. Jesus disse aos smirnitas que eles deveriam ser fiéis “até a morte”, ou seja, até o fim(Ap.2:10). Paulo afirmou, no final de sua vida, que havia “guardado a fé”(II Tm.4:7). Ainda Paulo, quando escrevia aos coríntios, afirmou que eles precisavam ser “firmes e constantes”(I Co.15:58). Não basta que tenhamos uma ação isolada de lealdade ou de observância de um mandamento divino, mas isto tem de ser algo constante, algo sempre presente em nossas vidas. A fidelidade implica em constância, em continuidade. O profeta Ezequiel é claro ao afirmar que uma vida justa que não for constante leva à perdição, se o momento da morte for, precisamente, o da falta de continuidade (Ez.18:24).
OBS: Esta noção de fidelidade, aliás, ficou evidenciada no campo comercial, como se pode ver pelos “cartões de fidelidade” que foram lançados por algumas administradoras de cartões de crédito e pelo próprio conceito de “fidelidade do cliente”, algo que tem sido perseguido no mundo dos negócios, notadamente na área da publicidade e propaganda.
– É interessante notar que, no Novo Testamento, o verbo “pisteuo”, quando empregado no tempo presente, sempre o é numa ideia de continuidade, a nos indicar que “…a fé não é uma fase passageira. Mas é uma atitude contínua.…”(L.L. MORRIS. Fé. In: J.D. DOUGLAS(org.). O Novo Dicionário da Bíblia, p.607). A propósito, Paulo afirmou que no Evangelho se descobre a justiça de Deus “de fé em fé”, “…que significa literalmente ‘ fé do começo ao fim’. O justo deve viver sempre pela fé e, assim fazendo, continua a viver uma vida espiritualmente cada vez mais rica.…” (BÍBLIA DE ESTUDO PENTECOSTAL, com. Rm.1.17, p.1694).
– Fidelidade também é “compromisso que pressupõe dedicação amorosa à pessoa com quem se estabeleceu um vínculo afetivo de alguma natureza”. Neste ponto, vemos, claramente, que a fidelidade é fruto, é consequência, é efeito do amor. Já vimos que o amor é o fruto por excelência, ou seja, é o verdadeiro pressuposto para todas as demais qualidades do fruto do Espírito. Somente apresentaremos fidelidade se tivermos amor por quem somos fiéis. Isto é bem ilustrado no caso do casamento: o dever de fidelidade conjugal é consequência única e exclusiva do amor que um cônjuge nutre pelo outro. Somente seremos fiéis a alguém, se amarmos este alguém. Os estudiosos da publicidade e da propaganda têm, nos últimos tempos, enfatizado a necessidade de se criar um vínculo afetivo entre o consumidor e um determinado produto, sem o que não será possível se estabelecer fidelidade no consumo.
– Fidelidade também é “característica de um sentimento que não esmorece com o decorrer do tempo”, ou seja, fidelidade é algo que não envelhece, que não sofre os efeitos do tempo. Isto é importante, porque muitos acham que a fidelidade ou aumenta, ou diminui com o tempo. Verdade é que a fidelidade pode aumentar. Os próprios discípulos de Jesus pediram ao Senhor que se lhes acrescentasse a fé (Lc.17:5) e o próprio Senhor afirmou que a fé tem diferentes graus, pois falou de pequena ou pouca fé (Mt.8:26), de fé grande (Mt.15:28). A possibilidade de aumento da fé está evidenciada na figura da mostarda, que, sendo uma das menores sementes, produz a maior das hortaliças. Jesus disse que a nossa fé deve ser assim, ou seja, ter a capacidade de crescer e se tornar a maior das nossas qualidades espirituais(Mt.13:31,32; 17:20). Entretanto, não é o tempo que faz aumentar ou diminuir a fidelidade, mas uma continuidade de comunhão com Deus.
-Quando vemos pessoas que, no ministério de Jesus, foram tidas como de grande fé, eram, via de regra, pessoas que não tinham uma vida religiosa segundo os padrões judaicos (a mulher cananeia, o centurião romano, que nem mesmo judeus eram), enquanto que os discípulos, que estavam ao lado do Senhor, vez por outra, são chamados de homens de pouca fé. Isto é a prova indelével que “tempo de casa”, que religiosidade não demonstram fidelidade, nem são critérios para isto, pois a fidelidade independe do tempo. O tempo apenas serve para denotar a fidelidade no aspecto da constância, é mais um fator que exige a sua prática do que que indique a sua presença.
OBS: Os mais longos reinados da história de Judá, os de Manassés e de Uzias, são exemplos de que tempo nada tem a ver com fidelidade. Uzias era fiel ao Senhor, que o fez prosperar, mas, depois, se ensoberbeceu e morreu leproso, afastado do trono. Manassés, por sua vez, foi um dos mais impiedosos reis de Judá, tão mau que Deus o entregou nas mãos dos seus inimigos. Porém, no cárcere se humilhou e se arrependeu e, por isso, foi reconduzido ao trono, onde passou seus dias finais servindo a Deus.
– Fidelidade, ainda, é “compromisso rigoroso com o conhecimento; exatidão, sinceridade”, significado, aliás, que levou, na física, a se considerar como fidelidade:
a) característica de um sistema de reprodução acústica, relacionada com a capacidade deste em reproduzir, com maior ou menor exatidão, as componentes de frequência de um sinal acústico, mantendo as intensidades relativas destas componentes (por isto se diz que um aparelho de som tem “alta fidelidade”)
b) em uma balança, propriedade que esta tem de assumir uma única posição, ou fornecer a mesma leitura, quando submetida repetidas vezes às mesmas forças
– Este significado de fidelidade mostra-nos, claramente, que a fidelidade se traduz por um compromisso rigoroso com a Palavra de Deus, com uma busca incessante para se conhecer e se saber o que Deus deseja de nós, qual é a Sua vontade, algo que é revelado sobretudo pela Palavra de Deus. A fidelidade exige um aprendizado contínuo e sincero das Escrituras, que se tenha uma vida que não vá além do que está escrito (I Co.4:6). Somente assim, seremos um “instrumento de alta fidelidade”, ou seja, uma pessoa que transmita aos outros, com exatidão, a frequência de Jesus Cristo, a Sua mensagem.
Somente assim poderemos ser pessoas que sempre forneçam a mesma posição, a posição da vontade de Deus, ainda que sejamos submetidos a diversas forças, a diversas situações. Como dizem os inspirados poetas Nils Katsberg e Emílio Conde, na letra do hino 342 da Harpa Cristã, quando aceitamos a Cristo, somos afinados pelo Senhor, passamos a ter nova harmonia e tom, mas isto somente se dará se formos fiéis.
II – A FIDELIDADE CONJUGAL
– Vistos os significados do que seja fidelidade, voltemo-nos para a questão da fidelidade no casamento. Sendo, como é, o casamento o máximo compromisso que se assume entre um homem e uma mulher, consoante o modelo bíblico de família (Gn.2:24), tem-se como evidente que tal compromisso deve ser mantido ao longo de toda a vida, sem qualquer mudança. É, em virtude disto, que o casamento tem como nota essencial a fidelidade.
– Tanto assim é que a Bíblia Sagrada deixa bem claro que a veneração devida ao matrimônio envolve a proibição do adultério (Hb.13:4), adultério que é definido por Russell Norman Champlin como sendo o “contato sexual de uma mulher casada ou comprometida com alguém que não seja esteja seu marido ou noivo. Ou de um homem casado com sua mulher que não fosse sua esposa.…” (Adultério. In: Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia. v.1, pp.65-6).
– A proibição do adultério está presente no princípio bíblico que instituiu o casamento, como vemos em Gn.2:24, quando se fala que cada homem terá a sua mulher, estabelecendo, deste modo, a monogamia, princípio este que é reforçado pelo Senhor Jesus não só em Mt.19:4,5 e Mc.10:5-12, quando trata da questão do divórcio, mas também quando fala com o chamado “mancebo de qualidade”, como se verifica em Mt.19:18, Mc.10:19 e Lc.18:20, como ainda no episódio da mulher adúltera, narrado apenas no evangelho segundo João (Jo.8:1-11).
– O casamento faz surgir o máximo compromisso entre um homem e uma mulher, para que ambos tenham comunhão de vida, complementem-se um ao outro e, deste modo, não há mesmo possibilidade de que se possa ter, simultaneamente, mais de um marido ou mais de uma mulher. Nesta exclusividade é que se encontra o fundamento da proibição do adultério.
– Não é por outro motivo que, nas legislações mais antigas da humanidade, o adultério já era proibido, como um resquício do princípio divino estabelecido para o primeiro casal ainda no Éden. No Código de Hamurábi, vigente na Mesopotâmia desde tempos um pouco anteriores a Abrão, já havia dispositivo que proibia o adultério.
OBS: Eis o dispositivo do Código de Hamurábi a respeito do adultério: “129º – Se a esposa de alguém é encontrada em contato sexual com um outro, se deverá amarrá-los e lançá-los n’água, salvo se o marido perdoar à sua mulher e o rei a seu escravo.”
– Deste modo, não é surpresa que, ao conferir os dez mandamentos ao povo de Israel, o Senhor tenha estatuído um mandamento específico a respeito do adultério, o sétimo mandamento, que é claro, simples e objetivo: “Não adulterarás” (Ex.20:14; Dt.5:18). A palavra hebraica aqui utilizada é “na’aph” (נאף ), cujo significado é de “quebra de compromisso de casamento”, ideia esta que também é presente no vocábulo grego correspondente, presente em o Novo Testamento, a saber, “moicheuo” (μοιχεύω), onde a ideia de “quebra de compromisso” é tão presente que se aplica, também, ao gesto de se ir adorar outros deuses entre os judeus da diáspora.
– Como aduz Russell Norman Champlin, o adultério é proibido “ …a fim de preservar a santidade do lar…” (op.cit., p.66). “Deus é amor e vive em si mesmo um mistério de comunhão pessoal de amor. Criando-a à Sua imagem… Deus inscreve na humanidade do homem e da mulher a vocação e, assim a capacidade e a responsabilidade do amor e da comunhão.” (§ 2331 do Catecismo da Igreja Católica Apostólica Romana – CIC). Cada um dos dois sexos é, com igual dignidade, embora de maneira diferente, imagem do poder e da ternura de Deus. A união do homem e da mulher no casamento é uma maneira de imitar na carne a generosidade e a fecundidade do Criador: “O homem deixa seu pai e sua mãe, se une à sua mulher, e eles se tomam uma só carne” (Gn 2,24). Dessa união procedem todas as gerações humanas. Jesus veio restaurar a criação na pureza de sua origem. No Sermão da Montanha, Ele interpreta de maneira rigorosa o plano de Deus: “Ouvistes o que foi dito: ‘Não cometerás adultério’. Eu, porém, vos digo: todo aquele que olha para uma mulher com desejo libidinoso já cometeu adultério com ela em seu coração” (Mt 5,27-28).…” (§§ 2335 e 2336 CIC).
– Tem-se, portanto, que a proibição do adultério é muito mais do que uma determinada opção de organização social, é muito mais que um dado cultural, pois é um princípio divino que, deste modo, se estende a todas as épocas e a todos os lugares, não se podendo, portanto, considerar que seja algo que possa ser modificado ou tolerado através dos tempos, como, lamentavelmente, temos visto nas sociedades contemporâneas, onde a figura do adultério tem sido cada vez mais aceita e tolerada, como, por exemplo, entre nós, onde, inclusive, deixou de ser uma conduta criminosa (a lei 11.106/2005 revogou o artigo 240 do Código Penal, que tratava do crime de adultério).
– Para que seja possível a comunhão de vida entre um homem e uma mulher, para que ambos possam se complementar e, desta maneira, cumprir o propósito divino estabelecido para o ser humano, faz-se necessário que haja uma entrega mútua, a construção de um projeto de vida que inclua a exclusividade de um cônjuge para o outro, um relacionamento onde se verifique o compromisso de cada um viver ao lado do outro e para o outro até o término da existência terrena.
– Não é por outro motivo que o casamento se constitui em uma figura, um sinal, um símbolo do relacionamento entre Deus e o homem. Deus, também, firmou um compromisso de abençoar o homem, de com ele conviver para sempre, fazendo-o administrador da criação terrena, compromisso este que é imutável, exclusivo e duradouro. Deus é fiel (II Co.1:18), tem uma natureza que não permite a infidelidade (II Tm.2:13) e, portanto, exige de cada um de nós que, em firmando compromisso com Ele, também sejamos fiéis (I Co.4:2).
– Já vimos supra o significado de fidelidade, ou seja, a manutenção do compromisso assumido, a imutabilidade dos propósitos, o cumprimento do compromisso assumido, a imunidade do compromisso através do tempo e é precisamente isto que caracteriza o relacionamento conjugal tal como estatuído pelo Senhor: marido e mulher prometem, ao se casar, ser um o complemento do outro e este compromisso deve perdurar até o término da existência terrena, a despeito das circunstâncias, a despeito da passagem do tempo.
– Deus estabeleceu que marido e mulher, assim como devem ser fiéis ao Senhor, devem, também, ser fiéis um em relação ao outro, o que significa afirmar que devem ser exclusivos um para o outro, enquanto complementares, formadores de uma comunhão e unidade de vida, a fim de que ambos, sob a orientação do Senhor, possam cumprir os propósitos estatuídos ao ser humano pelo seu Criador (frutificação espiritual; multiplicação, ou seja, reprodução biológica; enchimento da terra e dominação sobre a criação terrena – Gn.1:28).
– A fidelidade, portanto, envolve a exclusividade de ser complementado pelo cônjuge, o dever de com ele formar uma carne, o que envolve muito mais do que o simples relacionamento íntimo. Esta realidade precisou ser retomada pelo Senhor Jesus, o que faz no sermão do monte.
– Com efeito, nos dias do Senhor Jesus, o entendimento da lei de Moisés assumia um caráter meramente material, sem a dimensão exigida pelo próprio Deus quanto ao aspecto sagrado do casamento. Para os doutores da lei, o adultério somente se verificava quando houvesse o contato sexual entre uma pessoa casada e alguém que não fosse o seu cônjuge. Sem a prova da conjunção carnal, sem a prova da manutenção do relacionamento sexual, não havia que se falar em adultério.
– Tal entendimento, aliás, é ainda hoje vigente nos ordenamentos jurídicos. Não se pode dizer que alguém cometeu adultério com outrem se não houver prova de que houve o relacionamento sexual entre as pessoas. Assim, tecnicamente falando, o simples fato de se encontrarem duas pessoas, uma casada e outra que não é seu cônjuge, nus em uma mesma cama não significa que tenham adulterado, a não ser que haja prova de que mantiveram relacionamento sexual.
OBS: Por este motivo, embora o adultério seja motivo para o divórcio, é raramente invocado como causa para um pedido judicial de divórcio, diante da dificuldade de se ter a prova da manutenção do relacionamento íntimo, preferindo as pessoas a figura prevista em lei da “injúria grave” (art.1573, III CC), que é toda e qualquer conduta de desrespeito, de afronta ao outro cônjuge, inclusive no aspecto moral, que dispensa a prova do relacionamento íntimo.
– Tal compreensão do adultério, entretanto, não abarcava todo o significado desta conduta. Não se tratava de reduzir a figura ao aspecto meramente físico, genital, mas o princípio divino exigia uma exclusividade de complementaridade, algo muito mais profundo.
– Por isso, no sermão do monte, o Senhor Jesus deu o verdadeiro alcance do princípio divino, ao estabelecer que há adultério sempre que alguém, mesmo em seu interior, em sua mente, já cobiça alguém que não é seu cônjuge, por nesta pessoa posto a sua atenção (Mt.5:28).
– Não se tratou de inovação alguma do Senhor Jesus, mas de retorno ao princípio. Jó, cujo testemunho de homem sincero, reto, temente a Deus e que se desviava do mal era dado pelo próprio Deus (Jó 1:8; 2:3), mostra bem isso, ao dizer que havia feito um concerto com seus olhos para jamais fixá-los em uma virgem (Jó 31:1) e é este comportamento do patriarca que nos faz entender como, mesmo hostilizado por sua própria mulher, Jó não a tenha abandonado apesar de tudo quanto estava a passar (Jó 2:9,10).
– Salomão, também, quando fala sobre este assunto no livro de Provérbios, mostra, com absoluta clareza, que o segredo para se evitar o adultério é, precisamente, o de não dar lugar em seu cotidiano à “mulher estranha”, que sempre busca, através das sensações, conquistar as suas vítimas, consideradas pelo sábio como sendo pessoas faltas de juízo (Pv.7:7-23).
– Deste modo, tem-se como adultério toda e qualquer conduta de uma pessoa casada que intente se complementar, manter uma unidade, física, espiritual e emotiva com quem não seja a pessoa com quem se casou, independentemente de ter havido, ou não, a conjunção carnal.
III – OS MALES TRAZIDOS PELO ADULTÉRIO
– O adultério, conforme visto, portanto, trata-se de uma conduta de infidelidade, de quebra do compromisso assumido diante de Deus e dos homens de se formar uma unidade com o cônjuge.
– É evidente que uma prática desta causa muitos males, que trasbordam o próprio relacionamento entre o marido e a mulher, daí porque seja uma atitude cuja gravidade seja maior, ainda que, à evidência, não estejamos aqui a considerar que se trate tal conduta de um “pecado grave”, como muitos que, ao se falar em pecado, logo pensam no adultério, como se houvesse “pecadão” e “pecadinho”.
– Todo pecado traz, como consequência, a morte espiritual (Rm.6:23) e não têm direito à vida eterna tanto os adúlteros, como, por exemplo, os mentirosos (Ap.21:8; 22:15). Assim, não se deve entender que o adultério seja um pecado cujo tratamento deva ser muito mais rigoroso do que a mentira, pois tanto um quanto o outro excluem a pessoa da comunhão com Deus.
– Todavia, entende-se porque o adultério seja tratado como um pecado de maior gravidade do que os demais, pois ele não só afeta o relacionamento com Deus, mas também tem reflexos em relação ao cônjuge, à família e à sociedade, sendo, pois, muito mais visível o mal cometido.
– Não resta dúvida que a prática do adultério, por primeiro, produz um abalo muito grande no relacionamento conjugal, pois há uma quebra na confiança que é fundamental entre marido e mulher, quebra esta que, em muitas vezes ocasiões, torna-se irreversível, inviabilizando a própria continuidade da convivência, com a destruição da família e de tudo o que isto representa.
– Ora, quando alguém gera tal quebra de confiança junto àquele com quem se comprometeu a compartilhar a sua existência, temos um mal que atinge o próprio adúltero, visto que a quebra da confiança e da complementaridade representa a própria perda da identidade daquela pessoa, que passara a viver em função do outro, que construíra uma própria vida com o cônjuge, o que gerará mazelas que, muitas vezes, também não terá qualquer possibilidade de se retornar.
– A própria Bíblia Sagrada mostra-nos, com um exemplo, como fica manchada a própria imagem da pessoa perante a sociedade por causa do adultério, uma “trinca” no vaso que prejudica não só o restante de sua existência terrena mas até mesmo a sua imagem perante a posteridade. Em I Rs.15:5, o historiador sagrado (que a tradição judaica diz tratar-se de Jeremias), séculos depois, ao narrar o reinado do bisneto de Davi, Abião (ou Abias), fez questão de dizer que Davi fizera o que era reto aos olhos do Senhor, “senão só no negócio de Urias, o heteu”, ou seja, o adultério seguido de homicídio praticado pelo rei Davi ficou como u’a mancha na reputação do rei que, mesmo séculos depois, isto ainda era lembrado para denegri-lo.
– Verdade é que, embora o adultério autorize a dissolução do vínculo matrimonial (o que haveremos de estudar na próxima lição), não se pode, somente por este fato, desistir-se da reconciliação entre os cônjuges por causa desta prática, ainda que se saiba que a quebra de confiança é de difícil superação. O próprio Código de Hamurábi, como visto supra, abria já a possibilidade do perdão do cônjuge traído, algo que deve ser sempre buscado e que deve compor as características de quem cristão se diz ser, visto que precisamos perdoar para que alcancemos o perdão divino (Mt.6:12,15).
– Mas, além dos males provocados no relacionamento conjugal, o adultério traz uma péssima imagem em relação aos filhos. Com efeito, o pai ou mãe destroem, com o adultério, a imagem de confiabilidade que é fundamental no relacionamento entre pais e filhos, sem dizer que o adultério, ao quebrar o relacionamento entre os cônjuges, põe os filhos numa situação delicadíssima, visto que, ante a ruptura da unidade entre os pais, terão eles, muitas vezes, de tomar partido, o que é algo traumático e que causa perturbações e sequelas que, não poucas vezes, perdurarão pelo restante da vida dos filhos.
– Aqui, também, temos, como exemplo bíblico, o que se passou na família de Davi após a prática do adultério com Bateseba e do homicídio de Urias. A partir desta circunstância, a vida familiar de Davi sempre foi extremamente tumultuada, a ponto de, até mesmo no ocaso da vida, ter o rei de enfrentar a disputa entre os filhos (Adonias e Salomão), como subproduto da falta de confiabilidade gerada pelo seu gesto impensado.
– O adultério, entretanto, por fulminar o relacionamento familiar, faz com que se tenha uma repercussão social, que também traz graves consequências ao adúltero. O esfacelamento da família faz com que a imagem do responsável por tal destruição se veja arranhada em toda a sociedade. A quebra do compromisso solene com o cônjuge dá ao adúltero uma justa imagem de pessoa indigna de confiança em todos os que o cercam, fazendo com que seja considerada uma pessoa desacreditada, não confiável. Esta circunstância explica porque o adultério era punido com a morte na lei de Moisés (Lv.20:10), pois se entendia que a convivência desta pessoa em sociedade, a partir de seu ato, era impossível, impraticável.
– Em termos de igreja, então, o adultério tem um efeito devastador, pois seu praticante é um nítido instrumento de escândalo e, como tal, sujeito a um rigoroso e duro juízo da parte de Deus (Mt.18:6,7), máxime se se tratar de pessoa que tenha proeminência na igreja local. Já na antiga aliança, o Senhor mostrou todo o duro tratamento para com os sacerdotes que eram desleais para com a mulher da sua mocidade (Ml.3:12-16). Se isto ocorreu quando havia a permissão do divórcio na lei mosaica, que podemos dizer do período da igreja, onde tal permissão se reduziu drasticamente, visto que Jesus restaurou o princípio divino do matrimônio?
– Recuperar a credibilidade perdida diante do cônjuge, dos filhos, da igreja local e da sociedade é, sem dúvida, algo muito difícil de ocorrer e que deixará marcas que jamais serão esquecidas por todos os envolvidos. Trata-se, pois, de uma conduta altamente destruidora da reputação e da própria identidade do adúltero, de sorte que se deve sempre evitar tal conduta. Não é por outro motivo que o sábio Salomão diz que quem assim age, destrói a sua própria alma (Pv.6:32).
– A tolerância e o estímulo ao adultério em uma dada sociedade é um sinal eloquente da perversão vigente no ambiente social, é uma evidência do aspecto doentio da sociedade, do esgarçamento dos laços de convivência e de confiança entre as pessoas, um forte indício do esfacelamento da sociedade. Por isso, em Israel, o reino do norte, em seus últimos dias, havia uma prevalência do adultério na sociedade (Os.4:2).
– O Senhor Jesus disse que, nos dias imediatamente anteriores ao arrebatamento da Igreja, viveríamos “os dias de Noé” (Mt.24:38,39), dias caracterizados pela banalização do casamento, onde o adultério era uma prática normal, haja vista que as uniões eram feitas com base na atração física (Gn.6:1,2) e, como tal, fugazes por natureza.
– São estes os dias em que estamos a viver. O adultério é estimulado pela mídia (basta ver os enredos de todas as telenovelas, onde esta prática está sempre presente e é vendida aos telespectadores como algo bom, elogiável e prazeroso) e as próprias legislações estão, há décadas, trazendo cada vez mais incentivos a esta prática, reduzindo todos os efeitos negativos a ela associadas. No Brasil, mesmo, depois da descriminalização do adultério em 2005, já há até uma proposta de lei (o famigerado “Estatuto das Famílias”- PL 2285/2007, em trâmite na Câmara dos Deputados) em que se está a querer dar direito de alimentos a “amantes”. Tudo isto é demonstração de quanto afastados estamos da Palavra de Deus, de quanto nossa sociedade caminha para seu completo esfacelamento.
OBS: Reproduzimos aqui o artigo 64, parágrafo único do Estatuto das Famílias que concede alimentos a “amantes”: “Art. 64…. Parágrafo único. A união formada em desacordo aos impedimentos legais não exclui os deveres de assistência e a partilha de bens.”. Como se verifica, qualquer “união” feita em adultério garantirá ao comparsa do adultério direito a alimentos e a bens. Que absurdo!
COMO EVITAR O ADULTÉRIO
– Visto o que é o adultério, como podemos evitar que tal prática, cada vez mais costumeira e estimulada em nossa sociedade pervertida?
– Por primeiro, devemos impedir que esta apologia, estímulo e incentivo ao adultério ingresse na intimidade do nosso lar. Lamentavelmente, nos dias hodiernos, a esmagadora maioria dos que cristãos se dizem ser são assíduos acompanhantes dos capítulos das telenovelas que, como já dissemos, são os principais veículos de incentivo e estímulo à prática do adultério, pois promovem uma verdadeira “engenharia social” com a finalidade de mudar os hábitos e valores da família brasileira (recomendamos, neste passo, que se assista a vídeo que trata do assunto, apresentado pelo Padre Paulo Ricardo de Azevedo Júnior – A engenharia social e as novelas. Disponível em: http://padrepauloricardo.org/episodios/as-novelas-e-a-engenharia-social Acesso em 07 mar. 2013).
– Deve-se, portanto, fazer-se um rígido controle sobre o conteúdo de mídia que adentra nos nossos lares, que tenham nossos familiares contato, a fim de que não haja uma “lavagem cerebral” que faça com que seja considerado “normal” e “tolerável” a prática do adultério.
– À evidência, tem-se que não basta apenas que se tenha este conteúdo negativo, de se impedir que haja a “doutrinação maligna da mídia” na formação dos valores entre nossos familiares, mas que, ao lado disto, se tenha um conteúdo positivo, que é o ensino da Palavra de Deus, a fim de que saibam todos os familiares qual é a vontade de Deus com relação ao casamento e à família.
– Por segundo, é imperioso que se adote a mesma conduta do patriarca Jó, ou seja, que haja um concerto com os olhos de cada cônjuge para que não se atente nem se cobice terceira pessoa. A santificação dos olhos é fundamental para que não se ingresse num processo que culminará na prática do adultério.
– O Senhor Jesus foi claríssimo ao mostrar que todo adultério começa no olhar impudico, no olhar impuro, devendo, pois, todo cristão casado vigiar para que os seus olhos, que são candeia do corpo, não se tornem em razão para ingresso em densas trevas (Mt.6:22,23).
– Neste ponto, aliás, vemos quão indispensável é que os cônjuges não se deixem vencer pela pornografia, este terrível mal que tem dilacerado e destruído muitas famílias em nossos dias. Com o avanço da telemática, a pornografia está hoje extremamente acessível e seu efeito deletério sobre a pureza sexual das pessoas é algo evidente. Dezenas e dezenas de milhões de pessoas estão atualmente dominadas pela pornografia e o adultério tem, nesta ação maligna, uma de suas principais fontes nos dias de hoje.
– É importante, aliás, verificar que o chamado “sexo virtual”, outra das ferramentas extremamente nocivas da internet, é, sim, adultério, quando praticado por quem é casado com uma terceira pessoa. Aliás, trata-se de prática que, lamentavelmente, tem se repetido cada vez mais entre pessoas que cristãs se dizem ser.
– Mas não é somente fazendo concerto com os olhos que se conseguirá evitar o adultério. Torna-se, também, fundamental que os cônjuges realmente assumam o compromisso de compartilharem a sua vida, de serem uma unidade.
– Nos dias hodiernos, é cada vez mais frequente que os cônjuges somente se encontrem no final do dia e travem algumas poucas palavras, não convivam no sentido exato da palavra, mas estejam solitários, ainda que sob o mesmo teto. Por trabalharem ambos, resta pouquíssimo tempo de real convivência, o que ainda se agrava com relação aos cônjuges cristãos que têm uma vida ativa nas igrejas locais que frequentam.
– Esta convivência entre marido e mulher precisa realmente existir, é absolutamente necessário que marido e mulher compartilhem todas as experiências, tenham no cônjuge o seu confidente, o seu amparo afetivo, o seu conselheiro, aquele com quem tenham intimidade e transparência. Tirante os assuntos espirituais particulares e peculiares, pois a maior intimidade de um cristão sempre será com Deus, tudo o demais deve ser compartilhado com o cônjuge, pois é ele quem é sua “cara metade”, é ele quem nos complementa em nossa vida debaixo do sol.
– A intensa vida cotidiana e a falta de tempo para compartilhamento entre os cônjuges da vida de cada qual, que deve ser sempre uma vida em comum, tem levado muitos casados a “adotarem” confidentes, companheiros de jornada e aconselhadores com pessoas outras que não seus cônjuges, o que já em si o início de uma vida adulterina, já que passam a ter como complementos de afetividade, como correspondentes, como parceiros de caminhada pessoas que não são seus cônjuges.
– Como temos dito ao longo do trimestre, a sexualidade não envolve tão somente a genitalidade, mas a própria ideia de complementação. Se “adotamos” alguém com quem compartilhar nossas ansiedades, sentimentos, emoções, frustrações, este alguém estará a ocupar o lugar que é exclusivo do nosso cônjuge e o resultado disto será a criação de vínculos que levarão, mais cedo ou mais tarde, ao adultério propriamente dito.
– As Escrituras bem demonstram esta realidade quando o apóstolo Paulo demonstra a necessidade de que haja um relacionamento íntimo e constante entre marido e mulher para que não venham eles a se prostituir por causa da incontinência (I Co.7:5), estabelecendo, quanto a isto, inclusive uma parcimônia de abstinência sexual, movida por dedicação à oração, a nos mostrar que mesmo nosso relacionamento com o Senhor deva ser devidamente equacionado para não dar vazão a uma circunstância que facilite o adultério.
– Vê-se que a falta de compartilhamento de vida entre marido e mulher lançam os cônjuges a uma situação de solidão que é a própria negação da razão de ser da formação da família e do casamento e, ante a própria natureza gregária do ser humano, tal circunstância de solidão leva o cônjuge a uma nítida tendência natural a busca de um companheirismo com alguém que não será o seu cônjuge, o que é nada mais, nada menos que adultério.
– Eis porque não podem ser admitidas certas variações da vida conjugal, verdadeiras “invenções” (Ec.7:29) que se têm criado ao longo dos anos, como casamentos em que os cônjuges apenas se encontram periodicamente, mantendo cada qual seu domicílio e residência próprios, situações que estão ao arrepio do princípio bíblico e que apenas propiciarão ambientes propícios para a prática do adultério.
– Este compartilhamento de vida com o cônjuge leva ao ponto que o nosso comentarista denominou de “apreciação do cônjuge”, ou seja, é preciso que o cônjuge seja devidamente valorizado, seja visto como a única e exclusiva pessoa com quem podemos nos complementar e, portanto, a única pessoa em função de quem deveremos viver a partir do casamento sobre a face da Terra.
– Nosso cônjuge é nossa “cara metade”, ou seja, é a pessoa com quem nos completamos, com quem formamos uma unidade, aquele complemento sem o qual não poderemos realizar a vontade de Deus em nossas vidas. É preciso termos consciência desta realidade para evitarmos criar circunstâncias que facilitem o adultério.
– Quando sobrepomos qualquer outra coisa acima de nosso cônjuge, tais como o trabalho, a igreja ou, mesmo, os filhos, estamos nos afastando do melo bíblico e criando uma situação de “adultério” que poderá não só nos levar a preencher este vazio com uma outra pessoa, como também levar nosso cônjuge a buscar alguém para suprir-lhe esta lacuna.
– A situação é tão séria que o apóstolo Paulo mostra a indispensabilidade desta valorização do cônjuge quando fala que o casado não pode dedicar-se às coisas do Senhor senão depois de ter devidamente satisfeito o seu cônjuge (I Co.7:32-34). Embora devamos amar a Deus sobre todas as coisas, no cotidiano de nossa vida terrena, temos de dar prioridade a cuidar do cônjuge para só então cuidarmos das coisas referentes ao Senhor.
– É evidente que, quando o apóstolo Paulo está a tratar aqui das “coisas do Senhor” e das “coisas do mundo”, não está se referindo a uma possibilidade de pecarmos tão somente para agradarmos nosso cônjuge. A salvação é individual e não se pode abrir mão da comunhão com o Senhor por causa do casamento, como haveremos de discutir na próxima lição. Não obstante, em não se tratando de questão relativa a pecado, tudo o mais que agrade ao cônjuge deve ser levado em consideração precipuamente.
– Ora, se até as coisas atinentes ao Senhor devem ser sopesadas com o agrado do cônjuge, como podemos admitir que coisas outras, puramente terrenas, possam sobrepujar em valor a nosso cônjuge? Quando deixamos de dar o devido valor ao nosso cônjuge, estamos, sim, criando condições para que se desenvolva um clima que seja favorável ao adultério.
– Por fim, ante estas condutas que devem ser tomadas a fim de que não se tenha a prática do adultério, bem percebemos que não é tão simples assim, como muitos querem crer, culpar unilateralmente qualquer dos cônjuges quando se tem a ocorrência do adultério em uma família.
– Não é simplesmente dizer que o único culpado pela ocorrência da infidelidade conjugal é aquele que foi apanhado em contato sexual com um terceiro que não é seu cônjuge. Além do contato sexual em si, há de se perquirir porque aquele cônjuge chegou a essa situação. Terá sido deixado solitário pelo cônjuge, que não lhe deu o devido valor, que já está a ter um compartilhamento de vida com terceira pessoa? Evidentemente que isto não justifica nem absolve aquele que pecou contra o seu próprio corpo, mas não podemos simplesmente considerá-lo como o único culpado sem bem avaliar o caso concreto, até porque uma das características do justo é sempre bem investigar o que ocorre (Sl.10:4).
– De tudo o que se disse, tem-se que a observância do modelo bíblico da família, a instituição de uma vida familiar de acordo com as Escrituras Sagradas se constitui na maior garantia para que afugentemos a possibilidade do adultério em nosso relacionamento conjugal. Quando somos fiéis à Palavra de Deus, quando obedecemos ao que estatui a Bíblia, não há como criarmos brechas e embaraços que podemos nos levar ao adultério e à destruição de nossas famílias. Obedeçamos ao Senhor e Ele nos livrará de qualquer infidelidade conjugal.
 Ev. Dr. Caramuru Afonso Francisco
Fonte: http://www.portalebd.org.br/files/2T2013_L6_caramuru.pdf

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