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LIÇÃO Nº 11 – AS CONSEQUÊNCIAS DO PECADO DE DAVI    

As consequências do pecado de Davi mostram que a lei da ceifa está em pleno vigor. 

INTRODUÇÃO

 – Na sequência do estudo dos livros de Samuel, estudaremos as consequências do pecado de Davi. 

– As consequências do pecado de Davi mostram que a lei da ceifa está em pleno vigor.

 I – A LEI DA CEIFA ATINGE DAVI  

– Terminamos a lição anterior, com a sentença divina exarada na revelação do pecado de Davi pelo profeta Natã.

Apesar do perdão, o pecado de Davi teria consequências e são estas consequências que iremos estudar. 

– Imediatamente após o perdão do pecado, o profeta avisou Davi de que, para que não houvesse blasfêmia por parte dos inimigos do Senhor, o filho nascido de Bate-Seba morreria e, logo em seguida, a criança adoeceu e, posteriormente, morreu (II Sm.12:14).  

– Davi, já arrependido, tentou interceder pela criança, jejuando e orando em seu favor, mas a justiça de Deus tinha de ser feita e, como já dissemos na lição anterior, o “quádruplo” deveria ser pago, conforme a lei.

Assim, a criança morreu e Davi, ao saber de sua morte, cessou com seu jejum e oração, sabendo que não havia razão alguma para chorar mais a criança, já que a sentença de Deus havia sido devidamente executada.  

– Com Davi, percebemos bem o que muitos crentes não entendem: o pecado é perdoado, mas as suas consequências permanecem.

Não se trata de qualquer “maldição hereditária” ou coisa semelhante, como alguns desavisados têm pregado ou ensinado erroneamente, ou, mesmo, de um “carma” ou qualquer outra coisa parecida, como ensinam os espiritualistas, budistas, hinduístas ou outras seitas e religiões de origem oriental.  

– Trata-se da justiça divina: o pecado é perdoado, porque Jesus já pagou o seu preço na cruz do Calvário.

Por isso, podemos, sim, alcançar a salvação na pessoa de Jesus e não há outro meio de salvar-se, a não ser por Cristo.

No entanto, as consequências do pecado no campo social, biológico, psíquico, enfim, em tudo que não se refira ao relacionamento entre Deus e o homem, deverão ser devidamente colhidas pelo pecador, para que o nome do Senhor não seja blasfemado por seus inimigos.  

– Deus mostra Seu amor para conosco porque Cristo morreu por nós quando ainda éramos pecadores (Rm.5:8), mas também não Se deixa escarnecer e o que o homem semear, isto também ceifará (Gl.6:7,8). 

– Quando Paulo fala que Deus não Se deixa escarnecer, traz um ensino profundo.

A palavra grega, em questão, é “mukterízo” (μυκτηρίζω), cujo significado literal é “torcer o nariz”, “andar de nariz empinado”, ou seja,

tratar com desprezo ou demonstrar arrogância, soberba. Trata-se de uma afronta à soberania divina e isto jamais poderia ficar impune.

– Como salienta o pastor Silvano Doblinski (Assembleia de Deus – Ministério Madureira – Jabaquara, São Paulo/SP),

“…uma coisa temos de saber: toda semeadura vai resultar em colheita, seja ela boa, seja ela má…” (A lei da semeadura de Deus. Disponível em: http://www.adjabaquara.com.br/mensagens/semeadura.html Acesso em 14 out. 2009). 

– Esta realidade a respeito das consequências do pecado, leva-nos a uma reflexão a respeito do que é o pecado e quais os males que ele nos acarreta.

Não é à toa, aliás, que a Declaração de Fé das Assembleias de Deus, ao tratar do assunto, intitulou o capítulo a respeito do tema como “sobre o pecado e suas consequências”. 

– Como bem afirma a Declaração de Fé das Assembleias de Deus, “…o pecado é a transgressão da Lei de Deus…” (Cap.XIX, p.97), como, aliás, atesta I Jo.3:4:

“…porque o pecado é a transgressão da lei” (NAA). A Versão Almeida Revista e Corrigida (ARC), que é a outra versão oficial das Assembleias de Deus, ao lado da Nova Almeida Atualizada (NAA), traduz “transgressão da lei” por “iniquidade”. 

– A palavra grega em foco é “anomia” (ανομία), “…anomia, ilegalidade, i.e., violação da lei ou (no genitivo) impiedade: — iniquidade X transgredir, transgressão da lei, injustiça. De anomos, sem lei.

Ilegalidade, violação da lei, transgressão. Em o Novo Testamento, referindo-se, principalmente, à lei de Deus:

(I) Em sentido mais específico, como em I João 3.4, onde a ilegalidade está unida ao pecado…” (Bíblia de Estudo Palavras-Chave. Dicionário do Novo Testamento, n. 458, p. 2071). 

– Notamos, portanto, que, notadamente em I Jo.3:4, vemos que existe uma demonstração de que o pecado, além de ser uma ofensa diante de Deus, também provoca uma desordem que abrange tanto o pecador, quanto o próximo.

Cria-se uma desordem, uma situação de injustiça, que deve ser reparada. Como afirma a Declaração de Fé:

“…Atanásio, um dos pais da igreja, dizia que o pecado é a introdução dentro da criação de um elemento desintegrador que conduz à destruição e que somente pode ser expelido por meio de uma nova criação…” (ibid.). 

– Assim, o perdão divino restaura a comunhão que se perdeu com Deus, pois, como também diz a Declaração de Fé:  o pecado é

“…a quebra do relacionamento do ser humano com Deus…” (ibid.). 

Entretanto, a reparação da situação não se esgota com o perdão divino, exige outros fatores, pois toda a criação foi afetada, lembrando que a reparação da situação nada tem que ver com a restauração da comunhão com Deus. 

– O Senhor Jesus deixou isto bem claro ao ensinar que, inclusive, o perdão divino está condicionado ao fato de nós também perdoarmos aqueles que nos ofendem (Mt.6:14,15; 18:23-35; Mc.11:25,26),

prova de que Deus tanto leva em conta a reparação da situação promovida pelo pecado que chega mesmo a condicionar o nosso perdão diante d’Ele ao fato de permitirmos que as pessoas obtenham a reparação da situação provocada pelo pecado com o nosso perdão. 

–  O pecado, então, proporciona uma desordem na criação, que precisa ser revertida, e esta reversão nada mais é que a restauração da justiça,

pois o pecado, como vimos, gera uma injustiça, uma ilegalidade, que não pode subsistir, até porque Deus é justo e, como o juiz de toda a terra, tem de fazer justiça (Gn.18:25). 

– As ações praticadas pelos seres humanos têm a devida retribuição, já que o Senhor é justo, é a Justiça Nossa (Jr.23:6) e, ainda por cima,

deixa bem claro que cabe a Ele, e a Ele só, tal atitude, tanto que faz questão de dizer que a vingança é só d’Ele e de mais ninguém (Dt.32:35; Rm.12:19; Hb.10:30). 

– Ao longo da história da igreja, aliás, desenvolveu-se a ideia de que o pecado traria a culpa e a pena e que a pena tanto era a eterna, que é a morte espiritual, o rompimento da comunhão com Deus, como as penas temporais, ou seja,

as penalidades decorrentes da desordem provocada nos demais relacionamentos, penas estas que tinham de ser também reparadas, a fim de que se tenha a satisfação da justiça divina.

– É aí que se tem a chamada “lei da ceifa”, segundo a qual, tudo o que o homem plantar, ele semeará, ou seja, sofrerá legitimamente o dano que causar a outrem e quem se encarregará de fazer com que isto ocorra é o próprio Deus, o juiz de toda a terra. 

– Decorreu daí a ideia da “penitência”, ou seja, a prática de ações por parte do pecador para tentar reparar o mal cometido e, assim, cumprir a vontade divina, antecipando-se ao castigo.

Por isso, por exemplo, o Senhor Jesus só teria dito ter chegado salvação a Zaqueu, depois que ele se dispôs a reparar o dano cometido (Lc.19:8,9). 

 – Por ser um resumo bem elaborado desta ideia, transcrevemos aqui o Catecismo da Igreja Católica ao tratar da “penitência”:

“Muitos pecados prejudicam o próximo. É preciso fazer possível para reparar esse mal (por exemplo restituir as coisas roubadas, restabelecer a reputação daquele que foi caluniado ressarcir as ofensas e injúrias). A simples justiça exige isso.

Mas, além disso, o pecado fere e enfraquece o próprio pecador, como também suas relações com Deus e com o próxima.

A absolvição tira o pecado, mas não remedeia todas as desordens que ele causou.

Liberto do pecado, o pecador deve ainda recobrar a plena saúde espiritual.

Deve, portanto, faz alguma coisa a mais para reparar seus pecados: deve ‘satisfazer’ de modo apropriado ou ‘expiar’ seus pecados.

Esta satisfação chama-se também ‘penitência’ ” (§ 1459). 

– O problema do entendimento romanista da questão é que se entendeu que a Igreja poderia estabelecer qual seria a reparação e que tal reparação, inclusive,

pudesse e devesse ser feita inclusive após a morte da pessoa, o que gerou a chamada “doutrina das indulgências” e a “doutrina do Purgatório”, contra o que se levantou Martinho Lutero, nas suas 95 Teses, documento que deu início à Reforma Protestante.

– Lutero defendeu que a afirmação “fazei penitência”, como se encontrava na tradução latina de Mt.4:17, não significava uma ordem de reparação dos danos provocados pelos pecados, mas, sim, era, como de fato o é,

uma chamada de todos ao arrependimento pela prática dos pecados, o pedido de perdão pelas faltas cometidas, algo que não levava em consideração as consequências do pecado, mas a prática do pecado em si. 

– Assim, Lutero negou que pudesse a Igreja, através do sacramento da confissão, estabelecer quais seriam as formas de reparação das penas do pecado, como também que houvesse a possibilidade de reparação após a morte das pessoas, por meio das chamadas indulgências. 

– Entretanto, estes desvios doutrinários da Igreja Romana não podem fazer com que não reconheçamos o ensino bíblico de que o pecado gera, sim, danos que devem ser reparados e que a reparação não se dá apenas por ações humanas, que sempre são imperfeitas, como também foi ação direta de Deus, por meio da chamada “lei da ceifa”. 

– Além de as Escrituras dizerem que é Deus o juiz de toda a terra, também informa que a justiça já começa a se realizar sobre a face da Terra, onde está o verdadeiro “purgatório”, em passagens como Pv.22:8; Os.8:7; 10:12,13 e Gl.6:7. 

– Em Pv.22:8, o proverbista diz que “quem semear perversidade, segará males”.

Ora, perversidade aqui é a palavra hebraica “’ewel” ( ֶָצול), “…substantivo masculino singular que significa injustiça, iniquidade.

A palavra se refere a qualquer coisa que se desvie da maneira correta de fazer as coisas…” (Bíblia de Estudo Palavras-Chave. Dicionário do Antigo Testamento, n. 5766, p.1832).

Percebe-se, pois, que o texto fala da prática de pecado e afirma, categoricamente, que quem peca, semeia algo que deverá ser colhido. 

 

– E o que é colhido? “Males”, que é a palavra hebraica “’āwen” (ׇאוז), “…substantivo masculino, que significa nada, problema, tristeza, mal ou dano.

O significado principal é o de vazio e futilidade (…) o nada, no sentido de destruição total…” (Bíblia de Estudo Palavras-Chave. Dicionário do Antigo Testamento, n. 205, p.1512).

– Entendemos, portanto, que, quem pratica o pecado, acumula “problemas” e “danos” para si.

Este é o sentido da “lei da ceifa”: Deus promove a justa retribuição para o pecador, ainda sobre a face da Terra. 

– Em Os.8:7, o profeta afirma que os israelitas, as dez tribos do reino do norte, porque “semearam ventos”, “segariam tormentas”, justamente porque haviam cometido idolatria ao fabricar os bezerros que passaram a ser adorados no reino do norte.

Por causa da idolatria, os bezerros seriam feitos em pedaços e os israelitas também desapareceriam como nação, o que, efetivamente, aconteceu, tendo os bezerros sido destruídos pelo rei de Judá, Josias (II Rs.23:15) e os israelitas levados cativos e espalhados pelos assírios (II Rs.17:23). 

– Em Os.10:12,13, o profeta Oseias, uma vez mais, mostra as consequências dos pecados.

Propõe que os israelitas semeassem em justiça para ceifassem segundo a misericórdia, pois, se lavrassem a impiedade, segariam a perversidade.

– “Impiedade” aqui é a palavra hebraica “reša” (ֶָרַשע), “…substantivo masculino que significa iniquidade, injustiça e falta de retidão.

O vocábulo personifica o caráter que é oposto ao caráter de Deus(…). Esta palavra é apresentada como as ações más e perversas que são praticadas pela humanidade (Jó 34:8); e,

como tais, estas ações se tornam o objeto do juízo de Deus (veja Jó 34:26)…” (Bíblia de Estudo Palavras-Chave. Dicionário do Antigo Testamento, n. 7562, p.1937).

– Já “perversidade” é a palavra hebraica “’awōn” (ׇעוז), “…substantivo masculino que significa iniquidade, mal, culpa, punição.

Esta é uma das quatro principais palavras que indicam pecado no Antigo Testamento.

Esta palavra indica o pecado que é particularmente mau, uma vez que transmite fortemente a ideia de distorção ou perversão deliberada.

O substantivo traz consigo a ideia de culpa por delito consciente (Gn.44:16; Jr.2:22).

A punição que segue como consequência desse ato deliberado também é indicada pela palavra (Gn.4:13; Is.53:11)…” (Bíblia de Estudo Palavras-Chave. Dicionário do Antigo Testamento, n. 5771, pp.1832/3). 

– O sentido do texto sagrado, mais uma vez, é de que quem peca se submete a ter consequências danosas para si, a sofrer punições, castigos por causa do pecado. 

– Em Gl.6:7, é dito que Deus não Se deixa escarnecer, por isso tudo o que o homem semear, ele também ceifará, ou seja,

o texto, além de indicar que o pecado traz consequências, também diz que isto se deve ao fato de que “Deus não Se deixa escarnecer”, e “escarnecer” aqui é a palavra grega “myktēridzō” (μυκτηρίζω), cujo significado é “ridicularizar”, “zombar”. 

 – A falta de consequências para o pecado, então, seria como que uma zombaria do pecador em relação a Deus, uma ridicularização de Sua posição, o que nos leva à conclusão que é simplesmente impossível haver pecado sem que se tenham as devidas consequências. 

– Tanto é assim que o próprio Deus anunciou aos israelitas que os pecados deles trariam maldições, que nada mais são que consequências decorrentes da prática pecaminosa. 

– Lembremos, ainda, que a morte física é uma consequência do pecado que foi determinada a todos os seres humanos, uma consequência da sua própria natureza pecaminosa, consequência esta que só foi retirada a Enoque e a Elias e também o será a todos os salvos que vivos estiverem no dia do arrebatamento da Igreja. 

– Como bem diz a Declaração de Fé das Assembleias de Deus: “…A morte é uma das consequências primárias do pecado, sua punição e castigo.

Por essa razão, o mundo inteiro tem de experimentar esse terrível golpe:

‘Aos homens está ordenado morrerem uma vez, vindo, depois disso, o juízo’ (Hb.9:27). Esse é o resultado do pecado original de Adão [Rm.5:12,17]…” (Cap.XIX, p.103). 

– Por fim, com relação à lei da ceifa, não nos esqueçamos sete princípios que a regem,

como ensina o pastor e teólogo norte-americano John W. Lawrence (1927-1995) em sua obra “Escolhas da Vida”, citado pelo pastor e teólogo norte-americano J. Hampton Keathley III (1938-2002) (The Seven Laws of Harvest. Disponível em: http://bible.org/article/seven-laws-harvest Acesso em 14 out. 2009), a saber:

  1. a) somente colhemos aquilo que é semeado – se semeamos na carne, colhemos corrupção; se semeamos no Espírito, colhemos no Espírito a vida eterna (Jo.3:6; Gl.6:8).
  2. b) colhemos o mesmo em espécie do que semeamos – não há diferença de qualidade e de natureza entre o que é semeado e o que é colhido (Os.8:7; Jo.3:6; Gl.6:8).
  3. c) nunca colhemos na hora em que semeamos – entre o plantio e a colheita há um necessário decurso de tempo ( Sl.126:6; Mt.13:8).
  4. d) colhe-se bem mais o que se semeia – a colheita é sempre maior que o plantio, pois uma semente dá origem a muitas outras, daí porque o quádruplo que sobreveio a Davi.
  5. e) colhe-se proporcionalmente ao que se semeia – ainda que a colheita seja maior que a semeadura, haverá sempre maior colheita para quem mais semeou (II Co.9:6).
  6. f) colhemos a plenitude do bem semeado apenas se perseverarmos; mas o mal é colhido automaticamente – para colhermos o bem, é necessário que perseveremos no cultivo e na prevenção das ervas daninhas fora até o fim, é necessário esforço sem desânimo para se fazer o bem (Gl.6:9),

enquanto que as ervas daninhas aparecem e crescem naturalmente, sem que se precise fazer coisa alguma para isto (Mt.13:24-27; Rm.7:18).

  1. g) nada podemos fazer com relação à colheita do passado, mas somente para a colheita futura – não adianta querermos mudar a colheita do que semeamos no passado, mas podemos apenas semear hoje para termos uma boa colheita no futuro (Fp.3:13,14).

– Quando estamos no pecado, nossa semente é má, provém da carne e, por isso, colhemos frutos maus, a corrupção.

Quando aceitamos a Cristo como Senhor e Salvador, mudamos de semente, morremos para o mundo e começamos a dar frutos bons, que serão colhidos igualmente.

A salvação, porém, não nos impede de colhermos o que fizemos de errado, pois Deus é justiça e “…não faria justiça o Juiz de toda a terra?” (Gn.18:25 “in fine”).

– Estas consequências não se esgotam nesta dimensão terrena, pois há situações em que, evidentemente, a maldade não é devidamente reparada, como, aliás,

assinala Salomão em Ec.4:1; 7:15; 8:10,14. Por isso mesmo, haverá aplicação de penas diferenciadas de condenação quando do juízo final, como nos indicam textos como Mt.10:15; 11:22,24 e Lc.10:14, pois o julgamento será individual, cada um tendo julgadas as suas próprias obras.

 – O fato de não haver esgotamento das consequências dos pecados nesta dimensão terrena, porém, em hipótese alguma permite o pensamento de que, na eternidade, se possam “purgar” as penas do pecado.

Quem dorme em Cristo, alcança a salvação e, logicamente, no Tribunal de Cristo, terá o julgamento de suas obras e, até por causa de consequências não reparadas, possa perder seu galardão, mas jamais se pode imaginar que tenha de esperar a reparação de outros salvos, que ainda estão na Terra, para poderem entrar no Paraíso, como ensinam os romanistas. 

– Prova disso é o ladrão arrependido da cruz (e que, por ser perdoado, como bem dizem alguns, deixou de ser ladrão) que, mesmo sem ter como reparar os males cometidos, por ter crido em Jesus, alcançou a salvação, sendo o primeiro ser humano a entrar diretamente no Paraíso (Lc.23:40-43),

numa clara demonstração de que inexiste purgatório, um local ou estado na eternidade onde os salvos reparem os danos cometidos com os pecados e isto através da ação de terceiros, que ainda estão na Terra. 

– Davi foi imediatamente perdoado pelo Senhor, que o disse publicamente através do profeta Natã. Este perdão foi real e se deveu ao arrependimento de Davi, que confessou publicamente seu pecado.

Como resultado deste perdão, que foi total e irrevogável, Davi não morreu, nem Bate-Seba e, como se isto fosse pouco, teve um outro filho com Bate-Seba, Salomão,

que foi abençoado pelo próprio Deus, que mandou o profeta Natã para dizer que havia amado esta criança, que haveria de ser o sucessor de Davi, o primeiro da dinastia que levaria ao Messias (II Sm.12:24,25).

Bate-Seba, de pecadora, passou a ancestral de Cristo (Mt.1:6), prova de que não houve qualquer “maldição hereditária” ou qualquer coisa semelhante.

– Entretanto, Davi respondeu pelas consequências de seu ato. Como assassinou um homem inocente, que lhe era fiel, a fim de furtar a sua mulher, perdeu quatro filhos, três pela espada dos homens.

Como vulnerou o leito de um casal, teve também vulnerado o seu leito. Fê-lo em oculto, mas a desonra de seu leito foi pública e notória.

Destruiu uma família, viu a sua família se desfazer por causa de conflitos e mal-entendidos.

– Não nos iludamos: iremos ao céu com Jesus porque tivemos nossas vestes lavadas no sangue do Cordeiro e nossos pecados foram perdoados e esquecidos diante de Deus (Ap.22:14; Jr.31:34; Hb.8:12; 10:17),

 mas as consequências destes pecados teremos de levar até o fim. Tais consequências, assim como nossas responsabilidades na Igreja, constituem parte da nossa cruz que temos de tomar e levar até o fim (Mc.8:34).

Como ensina Russell Norman Champlin (1933-2018), “…devemos nos lembrar também que a crucificação de Jesus era ao mesmo tempo um ato divino de julgamento contra o pecado e um ato salvador.

É óbvio que o julgamento do crente (castigo) tem o propósito de disciplinar e melhorar a pessoa, não meramente de dar uma recompensa negativa pelos atos errados, Hb.12:8…” (Julgamento segundo as obras. In: Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia, v.3, p.666). 

– Tomar a cruz consiste, também, em levar sobre nós o resultado de nossos atos, as consequências daquilo que fizemos.

Obtivemos o perdão de Deus, tanto que estamos no caminho que nos conduz ao céu, seguindo a Cristo, mas temos de carregar o peso das consequências de nossos erros, pois Deus não Se deixa escarnecer.

Para que os inimigos do Senhor não blasfemem de nosso Senhor, respondemos pelas consequências de nossos atos, lembrando-nos sempre que este jugo é suave e que o fardo é leve (Mt.11:30), não nos impede de desfrutar da companhia e consolo de Deus.

A cruz não deixa de ser a justa medida para a reparação dos nossos erros cometidos diante dos homens (Lc.23:40,41) e é neste sentido que temos de responder pelas consequências de nossos pecados. Diante de Deus, o preço já está pago e, por isso, podemos ir para o céu. Aleluia! 

IV – AS CONSEQUÊNCIAS DO PECADO DE DAVI  

– Já vimos, na sentença de Deus proferida pelo profeta Natã, ainda que sucintamente, quais as consequências sofridas por Davi por causa do seu pecado.

Por primeiro, o filho que teve com Bate-Seba, cujo nome não é mencionado nas Escrituras, foi ferido pelo Senhor e morreu, a fim de que não houvesse blasfêmia contra Deus por causa do pecado horrendo cometido por Davi (II Sm.12:14). 

– A morte da criança, determinada por Deus, causa alguma reação entre leitores da Bíblia.

Dizem que é “mais uma prova” da “crueldade do Deus da Bíblia”, uma vez que teria feito “um inocente pagar pelos erros dos outros”, ou seja, a criança, que culpa alguma tinha, teria sofrido as consequências do pecado de Davi e de Bate-Seba. 

– Tal pensamento, no entanto, não tem qualquer fundamento e não passa de distorção de origem maligna.

Por primeiro, lembremos que esta criança, conforme nos diz a própria Escritura, ao morrer, ferida pelo Senhor, não perdeu a sua salvação.

O próprio Davi disse que iria a ela, mas ela não voltaria para ele (II Sm.12:23).

Certamente, dada a sua tenra idade, esta criança não tinha ainda adquirido a consciência, de sorte que pecado algum havia cometido.

Sua morte não era punição alguma a ela, mas, sim, uma necessidade para que não houvesse blasfêmia contra Deus da parte dos inimigos do Senhor e já uma demonstração de que a morte não sairia da casa de Davi, diante do que fizera na casa de Urias.

Além do mais, a morte da criança trouxe tristeza e sofrimento tanto para Davi quanto para Bate-Seba, como retribuição pelo sofrimento causado injustamente a Urias.

Esta criança era a própria materialização do pecado de ambos e seu desaparecimento era uma demonstração da injustiça de tal relacionamento. 

– A sentença divina, como era de consequência do pecado, não foi alterada apesar de todo o sacrifício efetuado por Davi.

É interessante observar que Davi, já arrependido de seu pecado (vemos isto no Salmo 51, que será estudado na próxima lição), fez jejum e oração pela vida da criança (II Sm.12:15-18).

Ao contrário de Saul, Davi primeiro confessou seu pecado e pediu perdão para, então, fazer o sacrifício que estava ao seu alcance, que era o jejum.

Não ousou oferecer sacrifícios a Deus, pois sacerdote não era, nem tampouco cuidou de tentar, com sacrifícios, dispensar o arrependimento e confissão de pecados,

como têm feito vários homens na atualidade, que ignoram que não há como obter perdão sem confissão nem arrependimento (Rm.10:8-10).  

– Depois da morte da criança, temos o relato de outra consequência do pecado de Davi, que foi a morte de Amnom, o filho primogênito de Davi e herdeiro presuntivo do trono, por Absalão, o segundo filho de Davi (II Sm.13).

Amnom apaixonou-se pela sua meia-irmã Tamar, irmã germana (i.e., mesmos pai e mãe) de Absalão, tendo esta paixão, verdadeira “concupiscência da carne”, levado Amnom a violentar sua meiairmã.

Absalão guardou este ultraje até achar ocasião para se vingar de seu meio-irmão, matando-o dois anos depois, em uma festa promovida com este objetivo.

Vemos aqui como todos os elementos do pecado de Davi estavam presentes:

o ardil de comemoração, a indução de Amnom à embriaguez e o próprio motivo do delito, que foi o descontrole do apetite sexual que levara à violação de Tamar.

Com o episódio, Davi não só perdeu seu primogênito, como também o convívio com o seu terceiro filho, que fugiu para Gesur, indo se asilar junto de seu avô, o rei Talmai, o que lhe trouxe muito sofrimento.

– Esta situação de indefinição no relacionamento entre Davi e Absalão fez com que se formasse a circunstância para outra consequência do pecado de Davi. Davi, embora amasse Absalão, por causa do assassínio de Amnom, quis manter distância de seu filho, então agora o herdeiro presuntivo da coroa (sobre o segundo filho de Davi, Quileabe, a Bíblia nada mais fala, presumindo-se que tenha morrido).

Graças a um estratagema de Joabe, acabou aceitando que Absalão voltasse para Israel, mas não permitiu que convivesse com ele no palácio real.

Depois de dois anos de seu retorno, acabou conseguindo que Joabe o trouxesse à presença de Davi e, a partir de então, urdiu um plano para destronar seu pai, o que teve resultado (II Sm.14). 

– Absalão, ao completar quarenta anos, rebelou-se contra Davi e se declarou rei em Hebrom, tendo sido seguido por todo o Israel, a quem, durante alguns anos, conseguiu conquistar, “furtando o coração dos homens de Israel” (II Sm.15:6).

Vemos aqui, uma vez mais, a consequência do pecado de Davi: assim como Davi furtou a ovelha de Urias, de igual modo “seu próximo”, Absalão, furtou as ovelhas de seu pai, fazendo com que toda a nação israelita, a quem tanto Davi se dedicara, o traísse (II Sm.15). 

– Davi foi obrigado a deixar Jerusalém e perdeu o trono. Na fuga, acabou sendo enganado por Ziba e amaldiçoado por Simei (como se vê no apêndice 1 deste trimestre),

cometendo uma grande injustiça com relação a Mefibosete. Na rebelião, Aitofel, que a tradição judaica diz ser o avô de Bate-Seba, ficou do lado de Absalão e Davi precisou recorrer a Deus para que seu conselho fosse transtornado, o que, efetivamente, ocorreu, tendo Aitofel, então, se suicidado e Davi conseguido organizar-se para a guerra contra Absalão (II Sm.16 e 17). 

– Ao entrar em Jerusalém, Absalão, seguindo o conselho de Aitofel, abusou das dez concubinas de Davi, que haviam sido deixadas guardando o palácio real, como a demonstrar que não havia chance alguma de acordo com o seu pai, que tinha ódio por Davi.

Cumpriu-se, assim, o que havia sido profetizado por Natã, com a pública desonra do leito real, aos olhos de todo o povo, como retribuição pela violação, em oculto, do leito conjugal de Urias e Bate-Seba.

Devemos lembrar que o adultério é um pecado que gera vergonha pública e notória, precisamente porque é a justa retribuição pela desonra, em oculto, do leito conjugal, leito este que deve ser honrado por tantos quantos servem a Deus (Hb.13:4).

Embora esteja banalizado em nossos dias, o adultério é algo extremamente sério, tanto que Deus toma para si o julgamento de quem o comete. Tomemos cuidado, amados irmãos! 

– Apesar de ter sido vitorioso na luta pelo trono, Davi colheu outra consequência de seu pecado.

Absalão, apesar de ordem em contrário de Davi, foi morto por dez mancebos sob o comando de Joabe.

Vemos aqui como Joabe, a quem Davi havia mandado matar Urias com a espada dos filhos de Amom, agora matava o segundo filho de Davi, com a espada de dez mancebos, em flagrante desrespeito ao que Davi havia mandado.

Davi era desmoralizado em sua autoridade e, ao chorar a morte do filho, foi obrigado a se conter, diante da pressão do mesmo Joabe.

Assim como havia feito cessar o choro de Bate-Seba por Urias, agora, também era feito cessar seu choro por Absalão (II Sm.18 e 19).

– Embora tivesse tornado a Jerusalém, Davi estava desfilhado também de Absalão, que era o herdeiro presuntivo do trono.

Mas não cessaram aí as consequências do pecado de Davi. Aproveitando-se de toda esta situação de abalo do trono real, Seba, um benjaminita, fez uma revolta, reacendendo a hostilidade que havia entre a tribo de Judá e as demais tribos.

Esta sedição é prova de que Absalão havia feito semear a discórdia no meio do povo e, mesmo após a vitória de Davi, a autoridade do rei havia sido abalada pela presença da espada em sua casa. Seba foi derrotado, mas, na batalha contra o rebelde,

Joabe se aproveitou da ocasião para dar cabo à vida de Amasa, que havia sido o comandante do exército de Absalão, mas que Davi havia mantido no exército e que rivalizava com Joabe pelo controle do exército.

A morte de Amasa, contra a qual Davi nada pôde fazer, era mais uma consequência do pecado cometido, pois Davi perdera sua autoridade moral diante de Joabe, ao pedir que fosse ele o instrumento pelo qual Urias fosse assassinado (II Sm.20). 

– Por fim, já no ocaso da vida, Davi ainda assistiu a uma rebelião, desta feita de Adonias, o seu quarto filho, mas, agora, o herdeiro presuntivo do trono.

Ante a velhice de Davi, Adonias quis precipitar a sucessão, declarando-se rei, ele que era irmão de Absalão, junto à pedra de Zoelete, que está junto da fonte de Rogel, local situado no vale do Cedrom, em Jerusalém.

Diante desta ocorrência, Natã e Bate-Seba vieram à presença de Davi para lhe dar notícia do fato e para pedir que o reino fosse dado a Salomão, conforme havia sido dito pelo Senhor.

Davi, então, teve de precipitar sua sucessão, mandando que Salomão fosse ungido pelo sumo sacerdote Zadoque como novo rei de Israel (I Rs.1). 

– Em suas instruções a Salomão, Davi silenciou a respeito de Adonias, mas, depois de sua morte, Adonias acabou sendo morto por Salomão já que demonstrou ter ainda pretensões reais,

ao pedir que Abisague lhe fosse dada por esposa, querendo, assim, ficar com uma ex-mulher de Davi, o que era nitidamente uma situação que prenunciava seu inconformismo com a perda do reinado.

De nada adiantou que Bate-Seba intercedesse por Adonias. Salomão, contrariando a vontade da mãe, mandou matar Adonias.

Era mais uma consequência do pecado de Davi: mais um filho que era assassinado e Bate-Seba, já como mãe do rei, desautorizada, contrariada (I Rs.2:12-25). 

– Como já dissemos no início deste esboço, Davi ficou manchado por este triste episódio. Não há leitor da Bíblia que, ao falar de Davi, não se lembre de seu pecado duplo de adultério e homicídio.

O cronista, que, segundo os estudiosos da Bíblia, escreveu durante ou após o cativeiro da Babilônia, apesar de ter omitido o relato do pecado de Davi, não deixou de observar, quando tratava do reinado de Abião,

neto de Davi, que “Davi tinha feito o que parecia r reto aos olhos do Senhor, e não se tinha desviado de tudo o que lhe ordenara em todos os dias da sua vida, senão só no negócio de Urias, o heteu” (I Rs.15:5).

Esta marca ficou para sempre na biografia de Davi, apesar de ter sido ele perdoado por Deus. 

– Não podemos, pois, deixar de aprender, com este episódio, que o pecado é totalmente perdoado por Deus, mas suas consequências ficam e, por vezes, ultrapassam até a vida terrena do servo do Senhor. 

– Muitos procuram tomar este exemplo de Davi para defender a impossibilidade de perdão ao pecado de adultério ou, pelo menos, a impossibilidade de o ministro do Evangelho que cometer tal pecado ser reconduzido ao ministério,

tendo havido até quem tenha pleiteado e conseguido incluir esta impossibilidade em regimentos internos e estatutos de igrejas locais e até sido vítimas destas mesmas inclusões por que tanto lutaram. 

– Não resta dúvida de que o pecado de adultério, que é pecado tanto quanto qualquer outro (pois não há “pecadinho” e “pecadão” nas Escrituras),

é uma ação extremamente reprovável diante do Senhor, que se incumbe de tomar para si o julgamento de tão abominável ato.

Não podemos, porém, nos esquecer de que o pecado de Davi não foi apenas o adultério, mas, em verdade, o adultério, a hipocrisia, a trapaça, a traição e, por fim, o homicídio.

“O pecado de Davi” envolve vários pecados, que explicam as consequências por ele sofridas ao longo do restante de sua vida, que chamamos, na introdução ao trimestre, da “fase de Davi, o rei atribulado de Israel”. 

– No entanto, apesar de todas as funestas consequências sofridas por Davi, é inegável que Deus perdoou o pecado de Davi e não o retirou do trono, a não ser momentaneamente quando da rebelião de Absalão.

O perdão de Deus foi completo, ainda que Davi tenha sofrido as consequências de seu erro e tenha sua reputação manchada para sempre, jamais tendo recuperado a autoridade que detinha antes de tamanho deslize. 

– Assim, com base neste texto bíblico, não podemos, em hipótese alguma, defender que o adultério não tem perdão, pois Davi foi perdoado.

Não podemos, também, dizer que o adúltero, mesmo perdoado, não pode mais exercer o ministério, pois Davi continuou sendo rei e profeta, os ministérios (na época, os ofícios) que Deus lhe havia dado.

Mas é inegável que Davi, a partir de então, não teve a mesma pujança, a mesma autoridade que detivera até cometer tais atos, de sorte que devemos ter em conta que, por vezes,

na administração da casa do Senhor, como não vivemos numa monarquia, não será mesmo possível dar ao perdoado e restaurado no ministério a mesma posição que detinha antes, vez que não mais terá a mesma credibilidade e condição de liderança.  

– Diante de tais considerações, entendemos que o adúltero comete pecado perdoável, que não está impedido, de forma alguma, de ser restaurado em seu ministério,

mas que tal ministério deverá recomeçar do zero, não se podendo dar-lhe, de imediato, o mesmo “status” e condição que tinha quando caiu.

Tudo isto, porém, deve ser feito nas mesmas condições que Deus fez a Davi, ou seja, que haja a devida publicidade para o erro cometido,

bem como que se tenha a mesma pública e notória confissão e arrependimento, com a devida aplicação da disciplina, em condições razoáveis e que levem em conta o “status” do envolvido e que, com o término desta disciplina,

evidentemente mais duradoura que o de algum outro membro, o ministro possa ser, primeiramente, reconduzido à comunhão da igreja e, posteriormente, com o tempo, aproveitado no ministério,

com os devidos cuidados e restrições, diante da sua inegável perda de credibilidade, que o acompanhará até o final de sua existência terrena. 

Ev.  Caramuru Afonso Francisco

Fonte: https://portalebd.org.br/classes/adultos/4708-licao-11-as-consequencias-do-pecado-de-davi-i

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