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LIÇÃO Nº 8 – A DISCIPLINA NA IGREJA

 INTRODUÇÃO

-Na continuidade do estudo da Eclesiologia, analisaremos hoje a disciplina na Igreja.

-Cabe à Igreja ministrar o remédio da disciplina para cura do cristão faltoso.

I – O QUE É DISCIPLINA

-A palavra “disciplina” vem da palavra latina “disciplina” cujo significado é “ação de se instruir, educação, ciência, ordem, sistema, princípios de moral”.

Está ligada à palavra “discipulus”, cujo significado é “aluno”, “aprendiz”. Assim, já pela origem da palavra, vemos que “disciplina” é uma ação que deve ser aplicada a “alunos”, a “aprendizes”, aos “discípulos”.

Ora, quando abrimos as Escrituras Sagradas, vemos que os servos de Jesus, durante o Seu ministério terreno, eram chamados de “discípulos”. Desta maneira, não há como dizer que a “disciplina” seja uma atividade alheia à Igreja, que nada mais é que o conjunto dos “discípulos” de Jesus.

-Quando vamos ao Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, verificamos que “disciplina” é

“ensino e educação que um discípulo recebia do mestre; obediência às regras e aos superiores;

“regulamento sobre a conduta dos diversos membros de uma coletividade, imposto ou aceito democraticamente, que tem por finalidade o bem-estar dos membros e o bom andamento dos trabalhos;

ordem, bom comportamento;

obediência a regras de cunho interior;

firmeza, constância;

castigo, penitência, mortificação”.

-Quando vamos ao texto sagrado, vemos que a palavra “disciplina” aparece tanto no Antigo como em o Novo Testamento, na Versão Almeida Revista e Corrigida.

No Antigo Testamento, aparece apenas no capítulo 23 do livro de Provérbios (Pv.23:12,13,23), onde é tradução da palavra hebraica “muwcar” (מןםך), cujo significado é “instrução, castigo, correção”.

-Já em o Novo Testamento, a palavra “disciplina” é utilizada em duas referências (Cl.2:23; Hb.12:8), sendo que, em Hb.12:8, é ela tradução de “paideia” (παιδεία), cujo significado é também de “instrução, correção, ensino”, tanto que é a mesma palavra que traduz o hebraico “muwcar” na versão grega do Antigo Testamento (Septuaginta).

OBS: Em Cl.2:23, a palavra “disciplina” é tradução de “afeidia” (αφειδία), cujo significado é “privação, severidade”, tanto que a Versão Almeida Revista e Atualizada preferiu alterar a expressão “disciplina do corpo” por “rigor ascético” e a Nova Versão Internacional, repetindo a Tradução Brasileira, por “severidade com o corpo”, o que demonstra que o significado é outro, nada tendo que ver com o que aqui está a se tratar.

A Nova Tradução na Linguagem de Hoje traduziu a expressão por “modo duro de tratar o corpo” e a Versão do Pe. Antonio Pereira de Figueiredo por “mau tratamento do corpo”.

-O que se percebe, portanto, é que a “disciplina” é, sobretudo, uma ação de ensino, uma instrução, uma atitude que tem por objetivo ensinar alguém, ainda que por meio de uma correção, de um castigo.

Todavia, tem-se sempre um objetivo pedagógico, um propósito de ensinamento, uma finalidade de crescimento espiritual de alguém.

II– “DISCIPLINA” NAS ESCRITURAS

-Na primeira passagem que se fala de “disciplina” nas Escrituras Sagradas, em Pv.23:12, tem-se que o proverbista recomenda que seja aplicada a disciplina ao coração e aos ouvidos e, dentro da chamada estrutura do “paralelismo hebraico”, ou seja, de repetir um pensamento com outras palavras, chama a disciplina de “palavras do conhecimento”.

-Este pensamento inspirado do proverbista mostra-nos que a disciplina tem de ser construída tendo como alvo o homem interior (“coração” aqui refere-se à alma e ao espírito humanos, não ao órgão que bombeia o sangue em nosso corpo),

mediante instruções que lhe sejam audíveis, ou seja, a disciplina é um ensino, é um discurso, um ensinamento que se faz sob o aspecto espiritual, ou seja, como esclarece o proverbista logo em seguida, mediante o uso das “palavras do conhecimento”, que outras não são senão as palavras do Senhor, i.e., a Bíblia Sagrada.

-Disciplinar é ensinar a Palavra de Deus a quem precisa aprender, é expor a Palavra, é mostrar qual é a verdade, qual é a vontade de Deus para cada um de nós. É procurar ajudar no aperfeiçoamento e na submissão do homem interior a Deus. Isto é “disciplina”.

-No segundo texto sobre disciplina, no versículo seguinte ao analisado, o proverbista fala-nos a respeito da disciplina da criança, incentivando a que se discipline a criança, que se ensine a Palavra à criança, inclusive com o uso moderado de castigo corporal (“fustigando-a com a vara”), pois não é a correção, o castigo moderado que traz morte à criança, mas, sim, a falta de disciplina, a falta de cuidado, a falta de ensino (como verificaria, tristemente, no futuro, o profeta Oseias – Os.4:6).

-Quando vemos o texto, além de ser um importante guia de pedagogia infantil, vemos que quem deve ser disciplinado é a “criança”, ou seja, aquele que ainda não alcançou a maturidade espiritual.

“Criança” aqui é, em hebraico, “na`ar” (נעך), que significa não só “criança”, mas também “jovem”, “servidor”, ou seja, pessoas imaturas, pessoas que ainda não compreendem o exato sentido da vida por si sós (aliás, a palavra grega da Septuaginta traz, precisamente, este significado – “népios” – νήπιος).

-A disciplina, diz o texto, não deve ser retirada de sobre a pessoa imatura. Há a necessidade da disciplina sobre aqueles que ainda não são maduros, ou seja, sobre aqueles que não estão a produzir o devido fruto na forma requerida pela sua posição no corpo de Cristo.

Para tanto, diz o proverbista, será preciso até o uso da vara, ou seja, da correção, do castigo, pois isto não causa a morte da criança, mas, sim, o seu aprimoramento. Esta correção, no entanto, diz o trecho, deve ser feita moderadamente.

O proverbista fala em “fustigar”, ou seja, “dar uma pancada”, “tocar violentamente”, sendo a palavra utilizada para designar a batida na porta, ou seja, forte, mas rápida, tópica e passageira.

-Não devemos nos esquecer que a vara, típico instrumento do pastor de ovelhas, não servia apenas para bater ou corrigir o animal, mas, antes, era um instrumento utilizado para medir o animal e dar-lhe orientação.

Com a vara, o pastor verificava se o animal estava com tamanho ideal, bem como indicava o caminho a seguir.

“Fustigar com a vara”, pois, não é surrar, espancar a pessoa, mas, antes, mostrar-lhe, de forma dura e dolorida, mas numa pancada, num só golpe, qual o caminho que deve ser seguido.

É “falar a verdade que dói nos ouvidos”, é mostrar a Palavra de Deus aos ouvidos que, se não tiverem comichão, doerão, causarão dor, mas que imediatamente será seguida pelo consolo e conforto do Espírito Santo, para a cicatrização e o aprendizado da lição.

-O proverbista, a propósito, diz que este castigo é absolutamente necessário para livrar a pessoa imatura da morte eterna (Pv.23:14).

O proverbista, ao indicar que o que está em jogo é a própria salvação da pessoa, mostra que a disciplina tem por objetivo a vida, não a morte. Comprova que o uso da vara, o instante mais

sensível e dolorido da disciplina, jamais tem em vista machucar alguém, ferir uma pessoa, mas livrá-la da morte eterna, livrá-la da condenação eterna, do lago de fogo e enxofre.

-A terceira ocorrência da palavra “disciplina” mostra-nos que a verdade é composta de três elementos: a sabedoria, a disciplina e a prudência.

O proverbista diz que devemos comprar a verdade e jamais a vender. Comprar significa adquirir por um preço e, portanto, para o proverbista, a aquisição da verdade, o conhecimento e a guarda da verdade custa um preço para cada um de nós e nada é mais precioso do que ela, motivo por que não devemos vendê-la, pois sempre estaremos em prejuízo se o fizermos.

-O apóstolo Pedro lembra-nos que a aquisição da verdade, que é a aquisição de Cristo Jesus (Jo.14:6), a aquisição da Palavra de Deus (Jo.17:17) custou o preço do sangue de Jesus Cristo vertido na cruz do Calvário (I Pe.1:18,19).

O resgate de uma alma vale mais do que o mundo inteiro (Sl.49:8). Por isso, jamais podemos vender a verdade, não nos permitindo iludir pelo “comprador que se gaba” que vem tentar nos enganar e fazer com que menosprezemos este dom preciosíssimo que se nos deu (Pv.20:14).

-Mas, o proverbista, dentro do “paralelismo hebraico”, mostra-nos que a verdade é composta de três elementos: a sabedoria, a disciplina e a prudência. O temor do Senhor é o princípio da sabedoria (Pv.9:10).

A sabedoria vem do alto e é, portanto, o primeiro contacto que temos com a verdade (Tg.1:5; 3:17). A disciplina é o ensino, o aprofundamento nosso na verdade. Iniciados pela sabedoria, caminhamos e, como somos falhos e necessitamos andar diante de Deus de forma irrepreensível (Gn.17:1), somos repreendidos pelo Senhor para não sermos condenados com o mundo (I Co.11:32).

O resultado desta disciplina será a ciência do Santo, ou seja, o conhecimento de Deus, que é a prudência (Jó 34:35; Pv.9:10). Aliás, proverbista mostra que somente pelo conhecimento da sabedoria e da instrução é que se poderá entender as palavras da prudência (Pv.1:2).

-A disciplina surge, portanto, como um estágio intermediário necessário entre o princípio da vida com Deus e os seus níveis mais elevados, porquanto é por meio da disciplina que não só deixamos de correr o risco da morte, como também nos aprofundamos no conhecimento de Deus. Com a correção do Pai é que podemos estar atentos para conhecer a prudência (Pv.4:1).

-Na única referência do Novo Testamento em que temos propriamente a palavra “disciplina”, na Versão Almeida Revista e Corrigida, em Hb.12:8, o escritor diz que todos os filhos de Deus são participantes da disciplina e isto é uma demonstração de que são filhos e não bastardos, ou seja, que estão legitimamente pertencendo à família de Deus.

A disciplina é apresentada como uma correção de Deus que, embora tenha um presente de tristeza, é a produtora de um fruto de justiça nos exercitados por ela (Hb.12:11).

-O escritor aos hebreus, portanto, confirma a ideia já presente no Antigo Testamento de que a disciplina é uma necessidade para que haja um crescimento espiritual, para que se tenha a realização na vida do filho de Deus dos propósitos divinos estabelecidos para cada filho.

III– A DISCIPLINA É PARA E PELA IGREJA

-Neste texto do escritor aos hebreus, aliás, vemos como a disciplina é uma atividade própria e peculiar à Igreja, o povo de Deus sobre a face da Terra. Com efeito, o escritor afirma que todos os filhos de Deus são participantes da disciplina.

-Ora, se todos os filhos de Deus são participantes da disciplina, temos que a disciplina é uma atividade que deve existir entre os filhos de Deus e estes filhos de Deus, ou seja, aqueles que creram em Jesus como seu único e suficiente Senhor e Salvador (Jo.1:12), são nada mais, nada menos que os integrantes da Igreja, a nação santa (I Pe.2:9,10).

-Percebemos, pois, que a disciplina é apresentada por Deus como sendo uma atividade da qual todo o povo de Deus, isto é, a Igreja é participante. Isto é importantíssimo porque desmonta a tese que tem aumentado a

cada dia, no meio das igrejas locais, no sentido de que a Igreja não pode disciplinar pessoa alguma, que não é de sua competência disciplinar os crentes, que devem satisfação unicamente a Deus.

-Não é, porém, o que ensina a Palavra de Deus. Ela diz que a disciplina é uma atividade de que todos os filhos de Deus são participantes, ou seja, todos os filhos de Deus tomam parte na disciplina, na instrução da Palavra, na correção, na repreensão com vistas ao crescimento espiritual e à concessão de vida aos salvos.

-A disciplina é feita por Deus. Deus é o Pai de todos (Ef.4:6) e, portanto, como a disciplina, diz-nos o escritor aos hebreus, é uma ação de um Pai em relação a Seus filhos, temos que se trata de uma ação vinda diretamente da parte de Deus. É a correção do Senhor, como explicitamente denomina o referido escritor (Hb.12:5).

-Portanto, tem-se como verdadeiro que a disciplina é uma ação divina e não da parte de qualquer homem. Neste sentido, não têm fundamento algum certas práticas que se andam espalhando nas igrejas locais de se criar uma “confissão auricular”, ou seja, as pessoas que pecam vão até o ministério, ao pastor, ao dirigente local e lhe confessam a falta e ali perdem perdão e fica tudo por isto mesmo, pois o “pastor” é o “anjo da Igreja”, o “sacerdote” e, portanto, dispensável qualquer outra atitude disciplinar.

Isto é romanismo puro e a negação de que a correção é do Senhor, que a disciplina vem de Deus, de que a cabeça da Igreja é o Sumo Pastor (I Pe.5:4) e não qualquer ministro do Evangelho, que não tem domínio sobre o rebanho que é do Senhor (I Pe.5:3).

-Mas o fato de a correção ser do Senhor também não significa que o salvo não tenha que dar satisfação a pessoa alguma, nem à sua igreja local, que estaria privada da condição de lhe aplicar uma disciplina.

“Se a correção é do Senhor, então ninguém pode excluir ou suspender quem quer que seja”, pensam estes verdadeiros “anarquistas evangélicos”, esquecidos de que, embora a correção seja do Senhor, este Senhor estabeleceu a Igreja, um conjunto de salvos, para que ela Lhe sirva e Lhe adore em espírito e em verdade.

-A Bíblia diz que devemos admoestar uns aos outros (Rm.15:14; Cl.3:16; Hb.10:25), ensinar uns aos outros (Cl.3:16), exortar uns aos outros, edificar uns aos outros (I Ts.5:11; Hb.3:13), confessar as culpas uns aos outros (Tg.5:16), sujeitarmo-nos uns aos outros (I Pe.5:5).

Ora, isto mostra que, dentro do amor que deve existir entre cada irmão, está o de nos submetermos às lições que os outros querem nos ensinar, pois disto depende o progresso e o desenvolvimento de nossa vida espiritual, que não é feita de modo solitário, mas, sim, solidário e fraterno.

-É, pois, tarefa de cada um de nós, enquanto membros em particular do corpo de Cristo, ensinar os demais irmãos, exortá-los, admoestá-los, bem assim nos sujeitarmos a eles e a eles confessarmos nossas culpas.

Este é o sentido de “disciplina”, como temos visto, ou seja, faz parte da tarefa da Igreja fazer com que as pessoas possam ter crescimento espiritual, crescimento este que vem da nossa constante correção, da nossa constante repreensão para que andemos de modo irrepreensível diante dos homens e da Igreja.

-A correção é do Senhor mas o Senhor tem nos escolhido para vivermos em grupo, para vivermos na Igreja a fim de que ela nos proporcione uma vida espiritual abundante e vitoriosa, o que implica a necessidade de sermos corrigidos pelo Senhor NA e PELA Igreja.

-Na Igreja, somos confrontados com a Palavra de Deus, que é exposta por aqueles escolhidos pelo Senhor para o ministério da palavra, ou seja, os ministros do Evangelho, que a Bíblia denomina de apóstolos, presbíteros, anciãos, bispos e pastores.

Todos estes foram chamados para ensinar a Palavra e, no ensino da Palavra, exercerem, quando necessário, para a saúde da igreja local e de cada membro em particular, a disciplina, mediante a repreensão e a aplicação do castigo, mediante o “fustigar da vara”, que é a aplicação de uma penalidade destinada a promover a saúde espiritual e impedir a morte de um irmão faltoso.

-Por isso denominamos esta missão da Igreja de “missão medicinal”, tendo em vista que se trata de aplicação de um remédio, de um medicamento a uma alma que se encontra enferma por causa do pecado. Notemos que a Igreja tão somente aplica o medicamento, tão somente ministra o remédio.

-A prescrição do remédio provém do “Médico dos médicos”, pois a correção é do Senhor. O Senhor, através do Espírito Santo, determina qual é a Palavra que deve ser proferida, qual é o ensino que deve ser dado, pois tudo é baseado nas Escrituras, que testificam do Senhor, que é a Verdade, que permanece para sempre.

– Feita a prescrição, porém, faz-se necessário que o “farmacêutico” aplique o medicamento, utilize a Palavra para promover o tratamento.

É neste instante que surge o ministério da Igreja, que é constituído, diz a Bíblia, de pastores e doutores (Ef.4:11), ou seja, de pessoas constituídas pelo Senhor para ensinar a Palavra e aplicá-la, inclusive mediante o “fustigar da vara”, algo que só os pastores podem fazer, pois é nas mãos dos pastores que está a vara.

-Aos pastores cabe “apascentar o rebanho de Deus” (I Pe.5:2) e apascentar envolve, entre outras coisas, o uso da vara, isto é, a indicação da orientação e da direção a ser seguida, a aplicação de penalidades quando houver a prática de atos que não estejam de acordo com a Palavra de Deus, penalidades estas que chegam mesmo à retirada da pessoa do meio da comunidade até que haja a devida cura espiritual (I Co.5:13 “in fine”).

-A correção é do Senhor, deve ser feita conforme a orientação do Espírito Santo, com base na Palavra de Deus, mas deve ser ministrada por aqueles que o Senhor constituiu para presidir sobre o povo de Deus, com conhecimento e aquiescência de todos os demais.

Verifiquemos que, embora o uso da vara seja algo relacionado com o pastor, o apóstolo Paulo usa o plural para determinar a aplicação da penalidade (“tirar dentre vós este iníquo”), demonstrando, assim, que a decisão é também da comunidade, pois todos são feitos participantes da disciplina.

-Entretanto, a disciplina não se resume à aplicação de penalidades. Como vimos, a disciplina é, antes de mais nada, o ensino, a instrução, que, por vezes, se dá através da aplicação de um castigo.

Entretanto, para que haja a aplicação da penalidade, mister se faz que, antes, tenha havido o ensino, que tenha a redarguição, que é a repetição do ensino, para, então, haver a correção (II Tm.3:16).

Daí porque o discipulado, que já estudamos na lição 4 deste trimestre, é o primeiro passo da disciplina e daí porque se torna extremamente difícil aplicar penalidades numa “igreja local sem doutrina”, ou seja, uma igreja local onde os membros não são devidamente instruídos na Palavra de Deus antes de se tornarem membros da igreja local por intermédio do batismo nas águas.

-Mesmo quando se tem situação em que se deve recorrer à correção, porque já houve ensino e redarguição, é preciso que se tenha o devido cuidado, inclusive com a oportunidade para que se tenha o pleno exercício do direito de defesa por parte do disciplinando.

Deus dá-nos o exemplo ao dar plenitude de direito de defesa a Adão e a Eva no Éden, mesmo sendo onisciente e onipresente. Se Deus permitiu ao homem se defender, quem somos nós para impedir o exercício de tal direito?

-Os fatos devem ser analisados pelo ministério com muito cuidado antes de o caso ser levado ao conhecimento da Igreja.

É preciso ter a mesma cautela que o Senhor determinou que os sacerdotes tivessem antes de declarar alguém leproso no tempo da lei.

Jamais se declarava alguém leproso de sopetão, de inopino, sem um prévio exame do que estava acontecendo com ele (cfr. Lv.13,14).

Assim também, deve o disciplinando ser examinado, analisado, a fim de que se verifique se há realmente a presença do pecado como um “modus vivendi” daquela pessoa, o que fará com que seja apartada da vida comunitária.

-Tem-se, aliás, um outro motivo para que a disciplina seja ministrada NA e PELA Igreja. A vida espiritual é uma vida comunitária, feita na igreja local e não pode a Igreja permitir que haja comunhão entre a luz e as trevas.

Verificado, manifestado, descoberto que há, no meio do povo de Deus, pessoas que tem um modo pecaminoso de viver, que se deixaram dominar pelo pecado novamente, impõe-se a sua retirada do meio do povo, pois um pouco de fermento pode levedar toda a massa (I Co.5:6).

A Igreja é o corpo de Cristo e Cristo é simbolizado, na páscoa, pelos pães asmos, ou seja, pães sem fermento. Ora, só quem pode efetuar esta medida são aqueles que o Senhor pôs à frente daquela determinada igreja local.

-A disciplina, ademais, não abrange apenas a aplicação da penalidade de exclusão. Na própria passagem a respeito da lepra, que é figura do exercício da disciplina na Igreja, há vários graus de “infecções” e de “enfermidades”, que tem tratamento diferenciado, inclusive com a manutenção, às vezes, de um período relativamente longo da pessoa “em suspenso”, ou seja, em análise, para verificação se se tratava, ou não, de lepra.

Há, portanto, situações em que se deve “suspender” o disciplinando, mantendo-o parcialmente afastado da vida comunitária, para melhor análise a respeito de sua conduta, a respeito de sua vida espiritual. Pelos frutos conheceremos quem é salvo e quem não o é (Mt.7:15-20).

-Tudo, porém, deve ser feito com o objetivo de curar espiritualmente o enfermo. A cura não será feita pela Igreja, pois só o Senhor é quem pode curar espiritualmente quem se encontra afastado.

Devemos consolar o disciplinado, confortá-lo e perdoá-lo no que concerne às ofensas feitas em relação a cada um dos membros da igreja local, impedindo, assim, que seja consumido por demasiada tristeza (II Co.2:7).

-Se não é a Igreja quem cura, é ela quem deve ministrar o remédio e o remédio nem de longe se esgota na aplicação da penalidade, após um preciso e acurado exame. Após a aplicação da penalidade, é preciso que haja a ministração da Palavra, pois só a Palavra de Deus pode trazer vida e ânimo àquele que se encontra fraco na fé.

É com tristeza como vemos que muitas igrejas locais simplesmente abandonam e discriminam o disciplinado, demonstrando total falta de amor e de misericórdia.

-A missão medicinal da Igreja jamais se esgota na aplicação da penalidade, mas deve ser acompanhada da ministração e exposição da Palavra de Deus a fim de que o disciplinado possa ser curado, o que somente se dará pela Palavra, pois somente se nasce de novo pela água e pelo Espírito.

Não se deve discriminar o disciplinado e, bem ao contrário, é imperioso que se o mantenha integrado na igreja local, ainda que mantido à parte, para que não seja atirado de vez para o pecado e para o mundo sem Deus e sem salvação. Precisamos ajudar aqueles que manquejam e não, como muitos têm feito, empurrá-los precipício abaixo para a perdição (Hb.12:13).

-Os filósofos epicureus (At.17:18) ficaram notabilizados na história da filosofia porque teriam apresentado “quatro remédios para a alma humana”, já que diziam que a filosofia era a “medicina da alma”, a saber: “Não precisamos temer os deuses.

Não precisamos nos preocupar com a morte. É fácil alcançar o bem. É fácil suportar o que nos amedronta.” Assim procuravam dar sentido à vida das pessoas.

-A Igreja tem uma “missão medicinal” muito diferente e que traz muito maior esperança à humanidade, principalmente àqueles que foram repreendidos pelo Senhor para que não sejam condenados com o mundo. Senão vejamos.

-A Igreja deve dizer ao disciplinado que ele não deve ter medo de Deus. Deus o corrigiu, fê-lo passar por uma situação constrangedora diante da igreja local, mas isto fez porque o ama e quer que ele vá morar eternamente com o Senhor.

A Igreja deve mostrar ao disciplinado que Deus o ama tanto que fez com que a Igreja lhe aplicasse um remédio para tratá-lo.

O objetivo de Deus é fazer com que o disciplinado, num futuro não distante, produza fruto pacífico de justiça, algo que só é possível para aqueles que são exercitados por ela.

Assim, não só o disciplinado deverá produzir frutos de justiça, demonstrando sua cura, como a Igreja deve demonstrar frutos de justiça no tratamento e acompanhamento deste disciplinado.

-A Igreja deve dizer ao disciplinado de que ele deve, sim, se preocupar com a morte espiritual, que é o salário do pecado (Rm.6:23), pecado que está à espreita, pronto para dominar quem o praticar (Gn.4:7).

Entretanto, a disciplina é a prova de que Deus não deseja a sua morte, tanto que, para evitá-la, pôs a Sua Igreja para ministrar-lhe um remédio, que ocasiona tristeza imediata, mas cujo fim é preservar-lhe a vida, mantê-lo com chance de se arrepender dos pecados e de desfrutar da vida eterna.

Por meio da disciplina, o Senhor mostra o Seu grande amor para com o disciplinado e diz em alto e bom som: “Porque não tomo prazer na morte do que morre, diz o Senhor JEOVÁ; convertei-vos, pois, e vivei.” (Ez.18:32).

-A Igreja deve dizer ao disciplinado que, depois que Jesus morreu por nós, é fácil alcançar o bem, mas que este bem exige que creiamos em Jesus e crer em Jesus é obedecer-Lhe. Somente provamos que

amamos o Senhor quando guardamos os Seus mandamentos, quando fazemos aquilo que Ele nos manda (Jo.15:9,10,14). Ao disciplinado, a Igreja deve mostrar que obedecer a Deus não é um fardo pesado nem amargo, mas que o jugo de Jesus é suave e o Seu fardo, leve (Mt.11:30).

Devemos mostrar que o peso momentâneo sofrido pelo disciplinado é resultado do pecado, não da disciplina. Antes, o livramento oferecido pelo Senhor é demonstrado exatamente pelo exercício da disciplina.

-A Igreja, por fim, deve mostrar ao disciplinado que não precisamos suportar o que nos amedronta, simplesmente porque devemos ter fé em Jesus e, onde há fé, não há medo.

O medo e a ansiedade, que tanto caracterizam o homem sem Deus, devem ser lançados todos eles sobre Jesus, pois Ele tem cuidado de nós (I Pe.5:7).

A disciplina é uma prova concreta do cuidado de Deus para com o disciplinado. Dos mais altos céus, o Senhor acabou por revelar uma situação, por tornar descoberto uma circunstância que estava a levar o disciplinado para a perdição eterna, exatamente para que o disciplinado saiba que Deus tem cuidado dele, tem se interessado pela sua salvação e movimenta o Seu povo para que ele seja vitorioso.

Deve, pois, o disciplinado confiar em Jesus, retribuir este amor e cuidado com amor e cuidado, guardando a Palavra de Deus, passando a obedecer à Palavra e, assim, tomando cuidado dele mesmo e da doutrina (I Tm.4:16 “in initio”). Assim fazendo, será vitorioso, como foi o apóstolo Paulo (II Tm.4:7).

-Estes “quatro remédios” da Igreja devem seguir à aplicação da penalidade. Esta aplicação não é um julgamento da Igreja com relação ao disciplinado, nem tampouco um poder da Igreja para a salvação deste ou perdição daquele.

A disciplina é correção do Senhor e a aplicação da penalidade é apenas um momento desta disciplina, um instante em que, ante a dureza de coração que não retrocedeu ante o ensino e a redarguição, fez-se necessária para a salvação da alma do disciplinado.

-No entanto, após a aplicação da penalidade, é preciso que haja a “instrução em justiça”, o que raramente se tem feito.

A Igreja deve ministrar o remédio, seguir o tratamento determinado pelo Senhor, que, como Sumo Pastor e Sumo Médico, providenciará a cura.

Todavia, cada vez mais se vê verdadeiros “sinédrios” e não “partes do corpo de Cristo” nas igrejas locais. Muitos se apresentam para “condenar” as pessoas, mas poucos são aqueles que se dispõem a aplicar-lhes o medicamento da Palavra para a produção futura de frutos de justiça.

-A Igreja, como corpo de Cristo, não pode condenar pessoa alguma, pois o corpo de Cristo não veio para condenar, mas para salvar os que se haviam perdido (Lc.19:10; Jo.3:17).

Portanto, quando aplica penalidade a alguém, não está a julgar esta pessoa por sua livre e espontânea vontade, mas a aplicar um remédio por ordem do Sumo Pastor, a aplicar a Palavra de Deus, com o objetivo de impedir que esta mesma Palavra sele, no último dia, o destino eterno de perdição ao disciplinado (Jo.12:48).

-Assim, a Igreja deve, após a aplicação da penalidade, fazer a “instrução em justiça”, ou seja, expor a Palavra, ensinar a Palavra, promover a Palavra a fim de que o disciplinado possa ser curado pela Palavra, possa nascer da água e do Espírito e, deste modo, produzir frutos pacíficos de justiça e ser, desta maneira, reintegrado na comunidade, posto novamente em comunhão plena com o povo de Deus.

-Daí porque também não ser possível uma predeterminação de tempo de disciplina, como é costume em muitas igrejas locais, o chamado “tempo de prova”.

Estamos a tratar de assuntos espirituais, onde o tempo não conta. O que a Bíblia exige é que haja produção de frutos pacíficos de justiça.

Até que estes frutos sejam produzidos, a pessoa deve ser mantida “sob prova”, isto é, “sob exame”. Demonstrada a cura espiritual, deve, sim, ser restabelecido na comunhão plena com a igreja local.

-Este restabelecimento, porém, deve ser gradativo. Alguém que ocupava uma posição de destaque e realce na igreja local não pode ser reconduzido incontinenti àquela mesma posição.

Se demorou um determinado tempo para que chegasse àquela função, deverá, também, demorar outro tanto para ali ser novamente reconduzido, pois terá de produzir frutos que revelem estar novamente em condições de exercer novamente aquilo que estava a fazer quando enganado pelo pecado. A quem muito se dá, muito deve ser cobrado (Mt.25:29).

-A Igreja deve cuidar dos doentes, deve ministrar-lhes o remédio da instrução em justiça, porque foi para os doentes que veio o Sumo Pastor (Mt.9:12; Mc.2:17; Lc.5:31).

Não tem qualquer respaldo bíblico o entendimento daqueles que acham que os disciplinados devem ser ignorados e desprezados, tratados como “gentios e publicanos”.

Os “gentios e publicanos” foram tratados com amor e Jesus foi buscá-los, tanto pessoalmente como através da Igreja (Mc.2:15; 16:15; At.1:8). Tratar como “gentio e publicano” não é, pois, menosprezar, mas ir ao seu encontro, pregar-lhes o Evangelho a fim de que o Espírito Santo possa convencê- los.

– Como estamos a realizar a nossa “missão medicinal”? Como responderemos à indagação do Senhor por boca do profeta Jeremias: “Acaso, não há bálsamo em Gileade? Ou não há lá médico? Por que, pois, não se realizou a cura da filha do meu povo?” (Jr.8:22). Que Deus nos guarde de sermos assim repreendidos pelo
Senhor e que possamos providenciar a ministração dos remédios a tantos quantos, por causa da multiplicação da iniquidade, têm deixado o seu amor esfriar.

Que os crentes de nossa igreja local nunca nos ouça a dizer, como aqueles impiedosos do tempo de Isaías: “Não sou médico, não há pão em minha casa, nem veste alguma; não me ponhais por príncipe do povo.”(Is.3:7).

Mas que possamos ministrar o remédio da instrução em justiça aos doentes para que todos eles sejam curados (cfr. At.5:16).

Pr. Caramuru Afonso Francisco

Fonte: https://www.portalebd.org.br/classes/adultos/10251-licao-8-a-disciplina-na-igreja-i

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