Lição 06 – A Despensa vazia
Deus é o provedor do homem.
INTRODUÇÃO
– Na sequência do estudo dos “dramas sociais”, estudaremos hoje a despensa vazia, ou seja, a questão da carência de recursos materiais mínimos para a sobrevivência da pessoa humana sobre a face da Terra.
– A fome, a carência de recursos mínimos materiais para a sobrevivência da pessoa humana sobre a face da Terra é uma realidade que pode atingir a todos os que vivem neste planeta.
I – A FALTA DE RECURSOS MATERIAIS MÍNIMOS PARA SOBREVIVÊNCIA É FRUTO DA ENTRADA DO PECADO NO MUNDO
– Temos visto neste segundo bloco do trimestre que o pecado, ao entrar no mundo, causou uma profunda desordem na ordem social, a ponto de retirar a igualdade que havia no relacionamento entre os homens, a começar da assimetria que se estabeleceu no próprio relacionamento entre homem e mulher (Gn.3:16).
– Este efeito nefasto do pecado originou uma vida social perversa, injusta, que leva a certas circunstâncias totalmente indesejadas pelo Senhor quando da criação do homem, mas que são resultado de sua vida pecaminosa, como a violência, que estudamos na lição 4 e a exclusão social, que estudamos na lição passada (lição 5).
– Na continuidade da análise de aflições decorrentes da entrada do pecado no mundo na vida em sociedade, hoje estudaremos o que o comentarista denominou de “despensa vazia”, ou seja, a carência de recursos materiais mínimos para a garantia da sobrevivência do ser humano sobre a face da Terra.
– A palavra “despensa” é encontrada, na Versão Almeida Revista e Corrigida, apenas uma vez, em Lc.12:24, tradução da palavra grega “tameion” (ταμειον), cujo significado é o de uma câmara secreta, um local reservado para a guarda de alimentos e mantimentos.
– Quando o ser humano foi criado, o Senhor sabia que, como criatura terrena, deveria ele se alimentar para sobreviver. Como disse o Senhor Jesus, nem só de pão viverá o homem (Mt.4:4), prova de que o homem necessita de alimento para sobreviver fisicamente sobre a Terra, como o próprio Cristo falaria no sermão do monte (Mt.6:31,32).
– Tanto assim é que, ao criar o homem, o Senhor plantou um jardim no Éden com toda árvore boa para comida (Gn.2:9), sem falar que cuidou, também, para que um rio regasse o jardim (Gn.2:10), precisamente para dar ao homem as condições para a sua subsistência, com suficiente alimentação.
– Deus, pois, como Criador do homem, sabe mais do que ninguém da necessidade que o ser humano tem de comida e bebida para sua sobrevivência e, diante deste conhecimento, mostrou-se como sendo o Provedor do homem, criando o jardim no Éden para que houvesse o suprimento das necessidades básicas para a vida física do homem.
– Com o pecado, entretanto, o homem foi privado de morar neste lugar de plena satisfação de suas necessidades básicas e, como consequência do pecado, teria de trabalhar para fim de sobrevivência (Gn.3:19), numa Terra que, ao contrário do que ocorrera antes do pecado, não existiria para suprimento de suas necessidades, mas passaria a ter elementos que não serviam para a satisfação do homem, numa espécie de competição que, então, surgiria entre o homem e a natureza, na luta pela sobrevivência (Gn.3:17,18).
– Diante da entrada do pecado no mundo, também, o homem percebeu que estava nu e quis criar para si vestimentas para esconder esta nudez, vestimenta que era totalmente inapropriada (Gn.3:7), de modo que o próprio Deus, também, providenciou os primeiros vestidos adequados para o primeiro casal (Gn.3:21). Acrescentou-se, pois, com o pecado, mais uma necessidade além da comida e bebida, a saber, a vestimenta.
– Vemos, pois, que, antes mesmo do pecado, no próprio ato da criação do homem, Deus já sabia todas as necessidades que teríamos como seres humanos para sobreviver e, por isso, o Senhor Jesus disse, no sermão do monte, que nosso Pai tem pleno conhecimento do que precisamos (Mt.6:31,32).
– Isto é importante deixarmos claro de antemão, pois toda a questão atinente às necessidades materiais precisa partir da segurança de que nosso Deus conhece plenamente as nossas necessidades e quer supri-las.
– Com o pecado, porém, o homem, para poder satisfazer as suas necessidades mínimas para sua sobrevivência, teve de trabalhar com dificuldade, uma vez que foi esta a sentença imposta por Deus para sua estada aqui na Terra, tendo de enfrentar, a um só tempo, tanto a “competição” da natureza, pois não ficou mais ela à plena disposição do ser humano, quanto a própria maldade dos outros homens, um grande obstáculo para a sobrevivência humana.
– De qualquer modo, o Senhor, apesar da sentença imposta ao primeiro casal por causa do pecado, não deixou de dar ao homem condições para que se sustentasse sobre a face da Terra materialmente, bastando apenas que trabalhasse, ainda que com penosidade, para que pudesse sobreviver.
– Verificamos, portanto, que, apesar das dificuldades decorrentes da mudança da situação da natureza em relação ao homem, seria bem possível que o homem obtivesse da natureza a sua sobrevivência, pois o Senhor não foi mesquinho na criação de condições pelas quais o homem pudesse sobreviver.
– Tanto é assim que, mesmo hoje, com toda a devastação da natureza empreendida pelo homem, mesmo diante do crescimento populacional, que nos faz ser 7 bilhões de seres humanos sobre a face da Terra, os dados são de que há alimento suficiente para a sobrevivência de toda a humanidade. Há comida suficiente para todos os homens, embora, lamentavelmente, a fome assole todo o mundo.
– No entanto, apesar disso, milhões de seres humanos estão a padecer e a morrer de fome. E por que isto se dá?
Porque o pecado tem dominado a humanidade e a sociedade se apresenta de tal maneira injusta que nega a uma boa parcela da população a própria sobrevivência, os recursos mínimos para que possa se alimentar.
OBS: “…A questão, entretanto, é a seguinte: como os 860 milhões de seres humanos que passam fome podem ter acesso aos alimentos? Alternativas técnicas, como a transgenia, poderiam contribuir para combater a fome?…” (ANDRIOLI, Antônio Inácio. end.cit.).
– Como disse o atual chefe da Igreja Romana ao discursar na cúpula da FAO em 2009 (FAO, inclusive, que tem como secretário-geral o brasileiro José Graziano, o organizador do programa “Fome Zero” em nosso país, que, aliás, se revelou um verdadeiro fracasso…), assim afirmou: “…O momento de crise que investe atualmente todos os aspectos da realidade econômica e social exige, de fato, todos os esforços para colaborar para a eliminação da pobreza, primeiro passo para libertar da fome milhões de homens, mulheres e crianças que não têm o pão de cada dia.
Como podemos ignorar o fato de que também o alimento se tornou objeto de especulações e está ligado aos andamentos de um mercado financeiro que, privado de regras certas e pobre de princípios morais, parece pegado ao único objetivo do lucro?
– No entanto, o pecado faz com que, apesar de o Senhor tudo providenciar a fim de que o homem possa ser sustentado, isto não ocorra e que, a cada minuto, cinco crianças morram de fome no mundo, segundo as estimativas mais recentes. O egoísmo e a ganância, como relatou o chefe da Igreja Romana, contribuem decisivamente para que o objetivo do diabo em relação à humanidade, que é matar, roubar e destruir (Jo.10:10) seja atingido neste ponto delicado da sobrevivência humana.
OBS: “A organização não governamental (ONG) Salvem as Crianças divulgou hoje (16) relatório informando que a cada minuto morrem cinco crianças no mundo em decorrência da desnutrição crônica. O documento adverte que cerca de 500 milhões de crianças correm risco de sequelas permanentes no organismo nos próximos 15 anos.…” (GIRALDI, Renato. Pelo menos cinco crianças morrem de fome por minuto, diz ONG. 16 fev. 2012. Disponível em: http://exame.abril.com.br/economia/mundo/noticias/pelo-menos-cinco-criancas-morrem-de-fome-por-minuto-diz-ongAcesso em 12 jun. 2012).
II – A FOME É UMA REALIDADE QUE PODE ATINGIR OS HOMENS
– Visto que a fome é decorrência e consequência do pecado e que o Senhor não deixou de ser o Provedor de toda a humanidade, veremos que a realidade da carência de recursos mínimos materiais para a sobrevivência é algo que acompanha a vida humana sobre a face da Terra, inclusive dos que servem a Deus fielmente, já que consequência de estarmos numa terra que foi amaldiçoada pelo pecado.
– Quando o Senhor sentenciou o primeiro casal, determinou que o homem tivesse necessariamente de trabalhar para conseguir o seu sustento diário, trabalho este que seria duplamente penoso: primeiro, porque a natureza não lhe seria favorável neste processo e, em segundo lugar, porque teria de enfrentar, como já vimos, o egoísmo e a ganância dos demais homens, que, dominados pelo pecado, seriam egoístas e indispostos a ajudar o próximo.
– Assim é que as condições naturais e sociais poderiam, como podem, de improviso, repentinamente, comprometer a obtenção dos recursos mínimos materiais para a sobrevivência do homem.
– E isto vemos ocorrer na vida do “pai da fé”, do patriarca Abraão que, ainda quando se chamava Abrão, teve na fome o seu primeiro grande teste na sua vida com Deus. Partindo para a terra de Canaã, que lhe fora indicada por Deus como a terra que lhe seria dada e onde deveria peregrinar, o patriarca, após este grande gesto de fé, vê-se diante da privação dos recursos para sua sobrevivência. Em Gn.12:10, é dito com objetividade: “E havia fome naquela terra…”.
– O Senhor, após Abrão ter obedientemente saído de sua terra para uma terra que lhe seria mostrada por Deus e de ter passado a peregrinar em Canaã, quando o Senhor disse ali a terra da promessa, teve de enfrentar a fome.
Sim, embora fosse a terra da promessa, embora fosse o local onde Deus prometeu abençoá-lo, não era uma terra que estivesse livre da aflição da “despensa vazia”.
– E qual foi a reação do patriarca diante da fome que assolava Canaã, diante da dificuldade de sua manutenção e de sua casa? Foi descer ao Egito: “…e desceu Abrão ao Egito, para peregrinar ali, porquanto a fome era grande na terra” (Gn.12:10b).
– O “pai da fé”, em sua atitude, demonstrou que ainda estava distante do padrão espiritual requerido pelo Senhor. Sem consultar a Deus, num gesto movido pelo próprio instinto de sobrevivência, desceu ao Egito e ali se afastou da presença de Deus, pois, neste tempo, além de mentir, não edificou qualquer altar ao Senhor.
Seriam ainda necessários alguns anos para que, após uma vida de intimidade com Deus, Abraão pudesse reconhecer que Deus é “Javé-Jiré”, ou seja, o “Deus da provisão” (Gn.22:14).
– Mesmo caminho tomou Elimeleque e sua mulher Noemi, que, diante da fome que se abateu sobre Belém de Judá (e “Belém” significa “casa de pão”), emigraram para Moabe (Rt.1:1), terra idólatra e cujos habitantes eram inimigos de Israel, a ponto de não ser permitido aos moabitas que adentrassem no pátio do tabernáculo (Dt.23:3).
– Quantos, na atualidade, não se encontram na mesma situação de imaturidade espiritual que se encontrava Abrão neste episódio?
Quantos, diante da sobrevinda repentina da necessidade material, não fazem como o patriarca, buscando amealhar recursos segundo os ditames deste mundo e não esperam em Deus, descrendo que o Senhor é o Provedor? Tomemos cuidado, amados irmãos, pois, a exemplo do patriarca, por causa deste desespero pela situação aflitiva da carência material podemos deixar o lugar da bênção e comprometer o bem maior que é a nossa salvação.
– Devemos agir como Isaque que, da mesma maneira que seu pai Abraão, também teve de enfrentar a fome em Canaã, mas, ao revés de seu pai, buscou orientação divina e o Senhor lhe mandou que, apesar da fome, não saísse de Canaã (Gn.26:1,2).
– Diante da fome, Isaque confiou em Deus, permanecendo em Gerar (Gn.26:6) e não deixando de trabalhar, semeando mesmo diante das dificuldades existentes, porque sua confiança não estava nas circunstâncias climáticas adversas mas em Deus que lhe mandara ficar naquela terra e o resultado foi que o Senhor o fez prosperar, dando-lhe produção abundante (Gn.26:12).
– Vemos, pois, que, embora o salvo não esteja livre de sofrer o comprometimento de sua sobrevivência por causa de fatores que lhe trazem uma drástica redução dos recursos mínimos necessários à sua sobrevivência, o caminho é a confiança em Deus, pois é Ele o nosso Provedor e não as circunstâncias naturais ou sociais que estejam a nossa volta.
– Jacó, também, teve de enfrentar a fome quando já estava na terra de Canaã e, também, tendo tido notícia de que havia alimento no Egito, não deixou Canaã para se dirigir onde havia pão enquanto não teve a orientação divina para fazê-lo (Gn.46:1-5), mesmo diante do convite de seu filho José que, então, governava aquela nação e, inclusive, mandara carros para levá-lo (Gn.45:26-28).
– Vemos aqui que o Senhor é soberano. Para Isaque, o Senhor mandou que permanecesse em Canaã e ali o abençoou. Já com relação a Jacó, houve ordem divina para que o patriarca descesse ao Egito, pois havia providenciado que José sustentasse a família ali, pois ainda haveria cinco anos de fome sobre a Terra.
– A provisão dada por José a sua família não dispensou o trabalho. Apesar de José ter providenciado o sustento para Israel e os seus (Gn.45:11; 47:12), destinou-lhes uma porção da terra onde pudessem exercer a sua atividade pecuária, o seu ganha-pão (Gn.46:31-34). A provisão divina, como percebemos, jamais dispensa a obrigatoriedade do trabalho como fonte de obtenção de recursos para a subsistência.
– Isto fica bem realçado quando vemos a história de Israel no deserto. Liberto do Egito com mão forte pelo Senhor, Deus mostra, ao introduzir o Seu povo no deserto, local onde não se podia exercer qualquer atividade econômica, como é Ele o Provedor da humanidade e, em especial, do povo que escolheu para Si.
– No caminho para a Terra Prometida, os israelitas tiveram, a exemplo de Abrão, de se confrontar com a carência de recursos mínimos para a sua sobrevivência. Logo em seguida ao grande milagre da passagem do Mar Vermelho, tiveram de enfrentar a realidade da falta de água do deserto. Lamentavelmente, a reação dos israelitas não foi das melhores: foi a murmuração em Mara, porque, ao encontrarem águas, elas eram amargas.
Deus, ante aquela murmuração, mandou Moisés lançar um lenho nas águas, que se tornaram doces (Ex.15:23-25).
– Quantos de nós também não seguimos o caminho da murmuração quando somos deparados, em nossas vidas, com a carência material? Quantos não passam a resmungar e até a se revoltar contra o Senhor por causa desta situação aflitiva? E olha que Israel estava a caminho da Terra Prometida, como nós, em nossa peregrinação terrena, estamos a caminho da cidade celeste.
– O Senhor Jesus, mesmo, quando caminhava para o Calvário, ao Se dirigir para as carpideiras profissionais que choravam a Sua iminente morte, deu-nos um ensino a respeito: “Porque, se ao madeiro verde fazem isso, que se fará ao seco? “ (Lc.23:31).
– A presença de Cristo Jesus em nossas vidas, a nossa intimidade com o Senhor faz-nos ver que todo o sofrimento que podemos ter, mesmo diante da carência material, não é para comparar com o que nos está reservado.
– Ante a carência material, ante o amargor do momento difícil por que somos levados a passar, mesmo diante de tanta dificuldade, temos de confiar em Deus, jamais murmurar, sabendo que o “lenho verde” faz com que o amargo se torne doce em nossas vidas. Como dizem os poetas sacros Eufrosine Kastberg e Emílio Conde: “Em vez de murmurares, canta um hino de louvor a Deus; Jesus quer te dar vida santa, qual noiva levar-te pra os céus” (refrão do hino 302 da Harpa Cristã).
– Mas, além de tornar as águas amargas em doces, o Senhor, na peregrinação de Israel no deserto, revelou ser o Provedor de Seu povo porque lhes deu o maná, com o que os sustentou, impedindo que tivessem fome durante todo o tempo em que estiveram no deserto.
– Confrontados com a fome, os israelitas, uma vez mais, usaram da murmuração como arma, chegando, mesmo, a ter saudades do Egito porque ali “comiam pão até fartar sentados junto às panelas de carne” (Ex.16:2,3). A esta atitude infeliz, o Senhor, em Seu tão profundo amor mas, também, cumprindo o Seu papel de Provedor, respondeu com a “chuva do pão dos céus“ (Ex.16:4).
– Na provisão do maná, o Senhor mostrou a Israel não só que é o Provedor do homem, mas, também, que, por vezes, permite que soframos as carências materiais a fim de que saibamos que d’Ele somos dependentes, não só material como espiritualmente (Dt.8:3), ensino que, aliás, será retomado pelo Senhor Jesus quando da primeira tentação que sofrerá do diabo no deserto no limiar de Seu ministério terreno (Mt.4:4).
– A carência de recursos mínimos para a sobrevivência é uma lição que Deus nos dá, por vezes, para que nos humilhemos debaixo da potente mão de Deus, aguardando em Deus a nossa exaltação e, principalmente, fazendo com que aprendamos que é Ele que cuida de nós (I Pe.5:6,7).
– Também no episódio do maná, vemos que Deus não dispensa o trabalho como forma de obtermos o necessário para a nossa manutenção e a de nossa família. Chovia pão dos céus diariamente, com exceção dos sábados, mas o povo tinha de sair todos os dias para colher a porção para cada dia para que, assim, o Senhor visse se eles andavam, ou não, na Sua lei (Ex.16:4).
– A nossa dependência de Deus é uma provação diária para mostrarmos se estamos, ou não, servindo ao Senhor.
A fartura excessiva cria uma sensação de autossuficiência que é extremamente danosa aos seres humanos, que pode levar-lhes à perdição.
– Devemos depender de Deus em nossas carências materiais, pois o Senhor não está disposto a nos matar de fome ou de sede, mas, ao revés, quer tão somente que compreendamos que Ele é o Provedor e que d’Ele dependemos para sobreviver sobre a face da Terra. A carência material vem como um sinal de que precisamos nos aproximar do Senhor. Não é à toa que uma das primeiras demonstrações de desagrado de Deus para com Israel era a criação de condições de carência material (Dt.28:21-24; II Sm.21:1).
– As carências vêm de inopino em nossas vidas, mas devemos estar sempre em comunhão com o Senhor, pois, assim fazendo, nós não seremos tragados pela dificuldade material, mas, sim, providos pelo Senhor nem que, para tanto, tenha Deus de fazer um milagre de multiplicação, sem dispensar, é claro, como temos visto, a necessidade de nos esforçarmos e trabalharmos, como aconteceu com os israelitas durante os quarenta anos que foram sustentados pelo maná no deserto.
– No momento crucial, quando não tivermos forças para agir, o Senhor estará pronto a fazer o que não podemos.
É o que vemos, por exemplo, na vida de Sansão. Após ter lutado contra mil homens, num esforço sobrehumano e que só foi possível pelo poder que recebera da parte do Espírito Santo, Sansão, com grande sede e sem condições de obter água, clamou a Deus, que não lhe permitiu a morte, mas, de forma miraculosa, fendeu a caverna que estava em Lei e pôde o juiz beber água e reviver (Jz.15:14-19).
Nas horas de extrema dificuldade, se estivermos em comunhão com o Senhor e tivermos feito tudo quanto nos era possível realizar, o Senhor não deixará de nos dar “uma fonte do que clama” para suprir a nossa necessidade. Aleluia!
– O povo de Israel nada tinha para se alimentar. Sansão, também, nada tinha para poder saciar a sua sede, mas o Senhor, que do nada fez todas as coisas, também fez com que suas necessidades fossem supridas, pois é Ele quem traz tudo à existência.
– Por vezes, entretanto, o Senhor opera o milagre da multiplicação, ou seja, não cria do nada algo para suprir as nossas necessidades materiais, mas faz com que o que já temos e que, aos nossos olhos é insignificante, para dali providenciar o nosso sustento e o de nossa família. É por isso que devemos seguir o que nos diz o profeta Zacarias para não desprezar o dia das coisas pequenas (Zc.4:10).
– É o que vemos no caso da viúva de Sarepta de Sidom. Aquela mulher gentia estava certa de que morreria de fome, juntamente com seu filho, diante daquela fome decorrente da ordem de Elias para que não chovesse sobre Canaã. Interpelada pelo profeta, disse que nada possuía a não ser um punhado de farinha numa panela e um pouco de azeite numa botija, suficiente apenas para uma pequena refeição, que entendia aquela mulher ser a última de sua vida (I Rs.17:12).
– No entanto, aquilo, que parecia ser tão insignificante, foi, pela fé daquela mulher, utilizado para que se fizesse um bolo pequeno para o profeta Elias e, a partir de então, não faltou mais farinha nem azeite até que voltasse a haver chuva sobre a terra (I Rs.17:15,16). O pouco que temos não deve ser desprezado, mas posto nas mãos do Senhor que tornará este pouco no suficiente para nosso sustento. Aleluia!
– Diferente não foi com outra viúva, agora nos dias de Eliseu, viúva de um dos filhos dos profetas. Premida pelos credores, sem recursos para satisfazer as dívidas e na iminência de perder seus filhos, a mulher correu até o profeta. Indagada sobre o que tinha em casa, também disse que nada tinha, a não ser uma botija de azeite (II Rs.4:1,2). Desta botija de azeite, como, aliás, vimos na lição anterior, a mulher não só obteve os recursos para pagar as dívidas, como também para sustentar a si e a seus filhos (II Rs.4:7).
– Ainda nos dias de Eliseu, um homem de Baal-Salisa veio trazer-lhe pães das primícias, vinte pães de cevada e espigas verdes na sua palha. Pelo que se deduz do texto sagrado, esta oferta daquele homem veio em boa hora, pois não havia ali nada para que o povo comesse.
OBS: É interessante notar que “Baal-Salisa” significa “senhor da terça parte”, como a indicar que nosso Deus é o Senhor do pouco e que, portanto, pode torná-lo muito. Aleluia!
– E, por falar em multiplicação, não podemos nos esquecer de dois milagres de Jesus, que estão entre os mais conhecidos do Senhor, em que Cristo multiplicou os pães para saciar a multidão que O acompanhava.
– Na primeira multiplicação (Mt.14:13-21; Mc.6:30-34; Lc.9:10-17; Jo.6:1-14), Jesus estava num lugar retirado no deserto, para onde o povo havia ido para ouvi-l’O. Passaram ali o dia todo e, chegada a tarde, quiseram os discípulos que Jesus despedisse a multidão para que fosse para as aldeias a fim de se alimentar.
– Na segunda multiplicação (Mt.15:29-39; Mc.8:1-10), Jesus Se encontrava em um monte perto do mar da Galileia e a multidão foi ao Seu encontro, ficando com Ele por três dias. O Senhor, então, mais uma vez compadecido das necessidades materiais da multidão, não quis despedi-la, pois o desfalecimento dela era coisa certa. Indagando Seus discípulos sobre o que possuíam, foi-lhe dito que havia ali sete pães e uns poucos de peixes. Mais uma vez, o Senhor abençoou aquele pouco e este pouco foi multiplicado e suficiente para alimentar quatro mil homens, além de mulheres e crianças, com sobejo de sete cestos cheios de pedaços.
– Estes relatos de multiplicações trazem-nos preciosas lições. A primeira é de que não podemos desprezar as coisas pequenas. O pouco que para nós é insignificante, insuficiente, se posto nas mãos do Senhor tornar-se-á suficiente. Quando consideramos que o pouco, nas mãos de Deus, será o suficiente, estamos, na verdade, aplicando a lição do maná, ou seja, reconhecendo que temos de nos humilhar e reconhecer que dependemos de Deus e não de nós mesmos.
– Deus pode do nada saciar a carência material de alguém, mas, também, pode fazer com que o pouco se torne o suficiente e, neste ponto, aliás, vem a tarefa da Igreja de ser aquela que reparte com os necessitados o pouco
– Temos de ter o mesmo sentimento de Cristo Jesus que, nas duas oportunidades em que operou o milagre da multiplicação dos pães, fê-lo porque teve compaixão da multidão. Será que temos tido compaixão daqueles que estão a ter carência do mínimo necessário para a sua sobrevivência? Ou temos agido como os discípulos, querendo que sejam despedidos, pouco importando se desfalecerão pelo caminho?
– A quarta lição que nos advém das multiplicações é a de que a multiplicação não dispensa o nosso trabalho. Mais uma vez vemos que é necessário fazermos a nossa parte.
Assim, a viúva de Sarepta de Sidom teve de fazer o bolo pequeno para o profeta, continuar o serviço que começara; a viúva do filho do profeta teve de ir atrás dos vasos, enchê-los na companhia de seus filhos e, depois, vendê-lo no mercado para obter os necessários recursos financeiros de que precisava; a oferta recebida pelo profeta teve de ser preparada e a mesa posta para ser dada àqueles cem homens; a multidão teve de ser organizada para receber a alimentação e os discípulos tiveram de entregar os pães e os peixes a todos. Multiplicação não se dá sem trabalho!
– Tanto assim é que a multidão, como nos relata o apóstolo João em seu evangelho, ao querer ir atrás de Jesus para passar a viver às custas do Senhor, foi duramente repreendida pelo Senhor (Jo.6:22-71), num discurso que, inclusive, fez com que muitos deixassem de servir a Jesus, como, aliás, ainda ocorre em nossos dias… A mensagem de que Jesus está pronto a nos dar uma vida regalada, de “sombra e água fresca”, tão presente nos falsos pregadores de prosperidade, não é uma mensagem que tenha respaldo bíblico. Lembremo-nos disto!
– A quinta lição que nos advém das multiplicações é a de que Deus sempre está interessado em saciar as necessidades legítimas do ser humano. Em todos os episódios de multiplicação, vemos o interesse divino em suprir as aflições daqueles que estavam na iminência do perecimento por falta de recursos mínimos para a sua sobrevivência.
– A sexta lição que nos advém das multiplicações é a de queé preciso que tenhamos fé e a exerçamos para que a multiplicação se realize. Sem fé, é impossível agradar a Deus, pois temos que crer que Deus existe e é o galardoador dos que O buscam (Hb.11:6). Se a viúva não faz primeiro o bolo pequeno ao profeta Elias; se a viúva do filho do profeta não pede emprestados os vasos aos vizinhos; se o servo do profeta não dá o alimento insuficiente para os cem homens; se os discípulos não começam a entregar os pães e os peixes à multidão, os milagres não teriam se realizado. É preciso que, diante da orientação divina, façamos aquilo que Deus nos manda, para que a multiplicação se opere.
– A sétima lição que nos advém das multiplicações é a de que a multiplicação é incompatível com o desperdício. O pouco torna-se o suficiente nas mãos de Deus e este suficiente se redundar em sobejo, tal sobejo não pode ser desperdiçado, mas, sim, recolhido e dado a quem está a necessitar. Por isso, se, no caso da viúva de Sarepta de Sidom, sobejo não houve, no caso da viúva do filho dos profetas foi mandado que vivesse do resto depois do pagamento da dívida, tendo havido também o recolhimento dos sobejos em alcofas após os milagres de multiplicação de Jesus.
– Uma das formas pelas quais se contribui para o flagelo da fome no mundo, como já dito supra, é o desperdício de alimentos. Por incrível que pareça, não são poucos os servos de Deus que jogam comida fora, que não têm qualquer preocupação no consumo de alimentos, deixando-os estragar. Assim fazendo, estamos afrontando a Palavra do Senhor e demonstrando todo um egoísmo que é incompatível com quem serve a Cristo. Mudemos nossas atitudes!
OBS: “É de conhecimento de todos que, no Brasil, de 30 a 40% de todos os alimentos produzidos vão parar no lixo. Segundo a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), só em hortaliças o total de perda a cada ano é de 37 quilos/habitante, sendo que a ingestão desses vegetais não passa de 35 quilos nesse mesmo período.…” (CENTRO DA CULTURA JUDAICA. Ajuda “alimentando”. Disponível em:http://www.culturajudaica.org.br/ajuda-alimentandoAcesso em 12 jun. 2012).
IV – NOSSO DEUS NÃO DESAMPARA O JUSTO
– Uma síntese de tudo quanto vimos é o texto áureo desta lição, que se encontra em Sl.37:25: “Fui moço e agora sou velho; mas nunca vi desamparado o justo, nem a sua descendência a mendigar o pão”. Neste salmo, Davi mostra toda a sua confiança em Deus e revela a sua experiência de que um justo jamais fica desamparado, nem a sua descendência será de mendigos.
– Este texto tem sido utilizado indevidamente pelos “pregadores da prosperidade” para a construção de uma doutrina de que o salvo em Cristo Jesus não pode ser pobre nem padecer necessidades materiais pois, “se for justo, nunca empobrecerá”. Não é isto, porém, o que diz o salmista.
– Quando verificamos o contexto do salmo, vemos que Davi está a mostrar exatamente o contrário do que falam estes falsos pregadores. O contexto do salmo é de que não devemos invejar os ímpios, ainda que eles pareçam estar em situação confortável, inclusive e principalmente do ponto-de-vista material. Os ímpios podem “estar por cima” nesta terra, mas isto tudo é passageiro e a eternidade revelará claramente o que é ser ímpio (Sl.37:1,2). Estamos daqui diante do “espelho da Providência”, como diz o pai da Igreja Tertuliano (160-220).
– O caminho para o justo é confiar em Deus e entregar-Lhe o caminho, pois, certamente, o Senhor concederá o desejo de nossos corações (Sl.37:3-5). Devemos fazer o bem e confiar em Deus, é esta a mensagem do salmista (Sl.37:6-8).
– “Vale mais o pouco que tem o justo do que as riquezas de muitos ímpios” (Sl.37:16), diz Davi que, antes de setornar rei, quando já era casado com a filha do rei, também passou pela fome, a ponto de ter de se alimentar dos pães da proposição, quando, de repente, perdeu posição, mulher e tudo quanto possuía, tendo de fugir com a roupa do corpo e nada mais (I Sm.19:18, 21:1-6).
– Neste salmo, também, Davi mostra que é possível, sim, que o justo tenha percalços ao longo da sua jornada terrena, mas não ficará prostrado, pois o Senhor o sustém na Sua mão (Sl.37:24), algo que foi, como já dissemos, vivenciado na própria vida do salmista.
– O que Davi nos ensina, portanto, amados irmãos, é que, apesar das carências materiais que possam ser encontradas ao longo da vida, o justo nunca está desamparado, pois ele vai ao encontro do Senhor, que o sustém, que tem compromisso para o livrar, desde que ele se comporte como justo, ou seja, seguindo a orientação do Senhor e jamais dispensando o trabalho.
– Por isso, não age como justo aquele que, não querendo trabalhar, passa a querer fazer da mendicância um meio de vida, passa a querer viver às custas do trabalho dos outros, algo que é totalmente contrário ao que nos ensina a Palavra de Deus. E quantos mendigos temos hoje em dia em nossas organizações eclesiásticas…
EV. CARAMURU AFONSO FRANCISCO