LIÇÃO Nº 11 – A ILUSÓRIA PROSPERIDADE DOS ÍMPIOS
O final dos ímpios é estarrecedor, não nos iludamos com as vantagens existentes na vida debaixo do sol.
INTRODUÇÃO
– Na sequência do estudo do livro de Eclesiastes, veremos hoje a questão relativa à prosperidade dos ímpios.
– O final dos ímpios é estarrecedor, não nos iludamos com as vantagens existentes na vida debaixo do sol.
I – A MALDADE NA VIDA DEBAIXO DO SOL
– Na sequência do estudo do livro de Eclesiastes, estudaremos a questão da prosperidade dos ímpios, tema que é recorrente nesta reflexão de Salomão.
– Ao se propor a analisar a “vida debaixo do sol”, o pregador teve de enfrentar uma questão que é das mais tormentosas para aqueles que servem a Deus, qual seja, a aparente prosperidade que têm os ímpios, aqueles que não servem ao Senhor.
– Ao iniciar a reflexão a respeito da “vida debaixo do sol”, o pregador, como vimos na lição 9, de pronto percebe que o homem é incapaz de intervir na ordem natural das coisas, pois sua passagem pela Terra é muito rápida e não há como impedir que “uma geração vá, outra geração venha e a terra para sempre permaneça” (Ec.1:4).
– Após verificar a impotência do homem ante a ordem natural das coisas, o pregador também se ocupa da circunstância de que as coisas criadas e buscadas pelo homem sobre a face da Terra não têm sentido em si mesmas, das chamadas “obras que se fazem debaixo do sol”, tais como a alegria, o gozo e o prazer; as criações magníficas do homem; as riquezas materiais; o conhecimento humano e o próprio trabalho (Ec.2).
– Verdade é que, ao observar a questão do trabalho, pôde ver que havia algo “além do sol”, vindo da parte de Deus, Aquele “que tudo quanto faz durará eternamente”, precisamente para que se tenha temor diante d’Ele (Ec.3:14), até porque Deus pede conta de tudo quanto se faz, é o Reto e Supremo Juiz (Ec.3:15,16)
– Salomão chega, então, a uma conclusão, qual seja, a de que a impotência do homem leva-nos à conclusão de que Deus está no controle de todas as coisas e que, por isso mesmo, Deus é o juiz, Aquele que levará tudo a julgamento, fazendo justiça no devido tempo (Ec.3:17).
– Esta confiança na justiça divina levou o pregador a entender que o homem não se diferencia, na vida debaixo do sol, dos demais animais, já que todos morrem fisicamente, ainda que o homem vá prestar contas a Deus no mundo-além a respeito do que tiver feito sobre a face da Terra (Ec.3:18-22).
– No entanto, após ter chegado a esta conclusão, qual seja, a de que Deus julgará tanto o justo como o ímpio no seu devido tempo, Salomão percebe, em suas investigações (Ec.1:13) que, debaixo do sol, há opressões e sofrimento (Ec.4:1), opressões estas que se mantinham sem que os oprimidos pudessem ter qualquer oportunidade de se livrarem desta situação.
– O pregador, então, começa a perceber que há maldade debaixo do sol (Ec.4:3), de modo que chegou a louvar os que já morreram, pois estes, pelo menos, não mais contemplavam o mal.
– No entanto, Salomão não se deixa desesperar por causa desta situação, pois, embora haja opressão, confia que, além dos homens, “o que é mais alto do que os altos” para isso atenta (Ec.4:8).
– O pregador apresenta, sempre, um quadro realista, própria de quem é um arguto observador. Ao ver a “vida debaixo do sol”, ele não esconde o que vê. No mundo, há opressões, sofrimentos e os opressores parecem que sempre têm vantagem. Verifica que há tanto o dia da prosperidade, quanto o dia da adversidade, e isto independentemente da pessoa ser justa ou ímpia (Ec.7:14).
– A opressão é um fato que não pode ser negligenciado e, mais, ela é capaz até de endoidecer o sábio (Ec.7:7). Há justos que perecem na sua justiça, enquanto que ímpios prolongam seus dias na sua maldade (Ec.7:15).
– Este realismo do pregador é tanto que ele chega a constatar que não existe homem justo sobre a face da Terra, que nunca peque, motivo pelo qual orienta a todos os homens para que fossem moderados, não sendo demasiadamente ímpios, nem demasiadamente jutos, porque tais atitudes somente causam a autodestruição ou a morte fora de tempo (Ec.7:16,17).
– Diante da maldade existente na vida debaixo do sol, Salomão recomenda que as pessoas sejam equilibradas, procurem passar pela sua peregrinação terrena não querendo “transformar o mundo”, mas vivê- lo ciente da necessidade de recorrermos a Deus.
– Esta postura do pregador é extremamente atual, porquanto, nos dias em que vivemos, o que prevalece hoje é a chamada “mentalidade revolucionária”, que pretende “transformar o mundo”, que não aceita a ordem das coisas e que pretende tudo modificar, tudo alterar, tudo mudar.
– Esta mentalidade, porém, não tem qualquer cabimento. Por primeiro, porque, como diz Salomão, devemos atentar para a obra de Deus, “porque quem poderá endireitar o que Ele fez torto?” (Ec.7:13).
– A mentalidade revolucionária, não por acaso, parte de uma premissa: a de que não há Deus, a de que Deus não existe ou, se existe, não tem controle sobre o que acontece na história da humanidade, naquilo que sucede debaixo do sol.
– Não é à toa que as filosofias e doutrinas revolucionárias, ao longo da história, tenham sido as mesmas que negam a existência de Deus, tais como o marxismo (comunismo), que é, aliás, a filosofia e doutrina predominante no mundo ocidental na atualidade.
– Como ensina o filósofo brasileiro Olavo de Carvalho, “…’a mente revolucionária’ não é um fenômeno essencialmente político, mas espiritual e psicológico, se bem que seu campo de expressa mais visível e seu instrumento fundamental seja a ação política.(…). ‘Mentalidade revolucionária’ é o estado de espírito, permanente ou transitório,no qual um indivíduo ou grupo se crê habilitado a remoldar o conjunto da sociedade — senão a natureza humana em geral — por meio da ação política; e acredita que, como agente ou portador de um futuro melhor, está acima de todo julgamento pela humanidade presente ou passada, só tendo satisfações a prestar ao ‘tribunal da história’. Mas o tribunal da história é, por definição, a própria sociedade futura que esse indivíduo ou grupo diz representar no presente; e, como essa sociedade não pode testemunhar ou julgar senão através desse seu mesmo representante, é claro que este se torna assim não apenas o único juiz soberano de seus próprios atos, mas o juiz de toda a humanidade, passada, presente ou futura. Habilitado a acusar e a condenar todas as leis, instituições, crenças, valores, costumes, ações e obras de todas as épocas sem poder ser por sua vez julgado por nenhuma delas, ele está acima da humanidade histórica que não é inexato chamá-lo de super-homem.…” (A mentalidade revolucionária. In: BRASIL, Felipe Moura (org.). O mínimo que você precisa saber para não ser um idiota. 3.ed., pp.186-7).
– Querer “remoldar” o mundo é pôr-se no lugar do Criador, é desconsiderá-l’O por completo, sendo simplesmente a acolhida da velha proposta satânica no Éden de querer “ser igual a Deus” (Gn.3:5). Trata-se de desconsiderar que há um “além do sol”, de enxergar de modo totalmente tíbio o que existe “debaixo do sol” como sendo a única realidade existente.
– Antes de querer “transformar o mundo”, temos, isto sim, de entendê-lo, de estudá-lo e observá-lo, como fez o pregador, pois, para isto nos fez o Senhor seres racionais e pensantes (Ec.1:13).
– Há maldade na vida debaixo do sol, mas esta maldade não pode ser imputada a Deus, mas, sim, ao pecado, pois “não há homem justo sobre a terra, que faça bem, e nunca peque” (Ec.7:20).
– Se não há homem justo, não podemos exigir justiça do próximo, não podemos exigir impecabilidade de qualquer ser humano, pois, se defendermos tal tese, acabaremos nos destruindo a nós mesmos, pois, em defendendo a justiça absoluta do ser humano, estaremos nos condenando. A irredutibilidade na exigência da justiça, a ferro e fogo, levar-nos-á à própria destruição.
– Esta situação vemos bem ilustrada no próprio povo judeu, como atesta o apóstolo Paulo na carta aos romanos. Ali, ele aponta que os judeus, ao se basearem na lei para a própria salvação, acaba causando a sua própria condenação: “Eis que tudo que tens por sobrenome judeu, e repousas na lei, e te glorias em Deus(…). Tu, pois, que ensinas a outro, não te ensinas a ti mesmo? Tu, que pregas que não se deve furtar, furtas? (…) Tu, que te glorias na lei, desonras a Deus pela transgressão da lei? Porque, como está escrito, o nome de Deus é blasfemado entre os gentios, por causa de vós” (Rm.2:17-24).
– Assim, a demasiada justiça, a exigência de que tudo seja correto e sem qualquer mal nesta vida debaixo do sol é uma situação que leva ao próprio que exige à sua autodestruição. Assim como o revolucionário francês Maximilien François Isidore de Robespierre (1758-1794), de tanto querer que rolem as cabeças dos “ímpios”, a própria pessoa acabará perdendo a sua na guilhotina.
– Salomão é bem claro ao nos mostrar que de nada adianta sabermos dos erros dos outros e querermos punir os injustos, se nós também somos injustos, não somos nem um pouco melhores que os demais. O pregador, inclusive, diz que, ao descobrirmos que um servo nosso nos amaldiçoa, jamais devemos nos esquecer que também, em algum momento de nossa vida, também chegamos a amaldiçoar alguém (Ec.7:21,22).
– Mas, a demasiada impiedade também não é possível na peregrinação terrena. Quando se quer aproveitar da injustiça existente na vida debaixo do sol para se tirar vantagem e dela se fazer um “modus vivendi”, também não se procede bem, e o demasiadamente ímpio acaba morrendo antes de tempo.
– Quantos casos não temos visto de pessoas que passam a ter uma vida desregrada ao extremo, sem qualquer temor, morrer na flor da idade, bem antes do tempo de expectativa de vida, precisamente por causa da sua maneira de viver extremamente pecaminosa? Basta ver a média da expectativa de vida entre homens e mulheres no Brasil para vermos quantos jovens do sexo masculino têm tido morte precoce por causa de seu envolvimento com a criminalidade e com as drogas.
– Diante da maldade do mundo, não podemos ter a ilusão de que poderemos “transformar o mundo” e, com as nossas próprias forças, extirparmos o mal, mas, reconhecendo a nossa pequenez e a nossa pecaminosidade, lutarmos para adquirir sabedoria, pois só ela nos poderá ensinar como viver sobre a face da Terra (Ec.7:23).
– Esta sabedoria que deve ser buscada está sempre longe do homem, pois a pecaminosidade do ser humano o torna afastado dela. O homem, por suas próprias forças, jamais conseguirá adquirir sabedoria. Embora Deus tenha feito o homem reto, o certo é que ele buscou muitas invenções e, por isso, tem de saber que não é fácil adquirir a sabedoria, isto exige muito esforço da parte do homem nesta vida debaixo do sol (Ec.7:24,29).
– Como primeiro ponto para esta aquisição de sabedoria e uma vida equilibrada que faça o homem fugir tanto da demasiada justiça quanto da demasiada impiedade, o pregador apresenta a necessária “observância do mandamento do rei” (Ec.8:2).
– Não há como se adquirir a sabedoria na vida debaixo do sol contestando-se a Deus, que é quem constituiu as autoridades (Rm.13:1-3). É exatamente o oposto do que defende a “mentalidade revolucionária”, que defende a subversão da ordem e o repúdio a toda e qualquer autoridade.
– Alguém poderá dizer que Salomão estava “advogando em causa própria”, já que ele era rei e, naturalmente, não quereria ter “opositores”, mas isto não procede, porquanto o que ele aqui escreveu, fê-lo inspirado pelo Espírito Santo (II Pe.1:21) e o que defende não é uma subserviência cega, mas, a exemplo do que ensina o apóstolo Paulo (este um perseguido pelo governo e, portanto, que não teria a mesma “conveniência” de Salomão em dizê-lo), a “prática do bem”.
– Não se enfrenta a maldade na vida debaixo do sol a não ser através do abandono da prática do mal e da obediência ao “mandamento do rei”. Quem obedecer às autoridades não experimentará nenhum mal e a sabedoria lhe orientará o tempo e o modo de cumprir o que foi determinado (Ec.8:3-6).
– A luta contra as autoridades é inglória, diz o pregador, porquanto detêm elas o poder em suas mãos (Ec.8:4), poder este que, como tudo na vida debaixo do sol, é ilusório, pois quem realmente manda é o Senhor, visto que ninguém tem poder sobre o dia da morte e a impiedade não livra os ímpios (Ec.8:7-10).
– Assim, embora o pregador tenha visto a vitória dos opressores, a circunstância de que os oprimidos não podem se levantar contra aqueles, nada disso o deixa “revoltado” ou “desesperado”, porquanto ele observou que os ímpios vão para a sepultura, mais cedo ou mais tarde e o que o domínio de homens sobre outros homens somente causa a desgraça daqueles que se aproveitam da posição de dominadores para fazer o mal.
II – A CORRETA VISÃO SOBRE PROSPERIDADE DOS ÍMPIOS NA VIDA DEBAIXO DO SOL
– Salomão tem convicção de que Deus está no controle de todas as coisas, de que todos serão julgados pelo Senhor por aquilo que fazem na vida debaixo do sol, mas também reconhece que, para todo propósito, há tempo e modo (Ec.8:6) e, por isso mesmo, nem sempre o juízo sobre a má obra é executado de imediato (Ec.8:11).
– Como há uma aparente “demora” na execução do juízo divino, isto acaba estimulando a prática do mal, pois se tem uma sensação de impunidade, sensação esta, entretanto, que não pode contaminar aqueles que buscam adquirir a sabedoria, que querem ver “o reino de Deus”, ou seja, a soberania divina sobre todas as coisas, algo que somente alcançam aqueles que nascem de novo (Jo.3:3).
– Quem vê o reino de Deus sabe que, apesar de toda a demora aparente no julgamento dos ímpios, “…Deus existe. E: Deus é verdadeiramente Deus, quer dizer, Ele tem nas Suas mãos os cordelinhos do mundo…” (BENTO XVI. Jesus de Nazaré: primeira parte – do batismo no Jordão à transfiguração, p.64).
– Por isso, o pregador, ao ver a aparente impunidade no mundo, não hesita em afirmar que “ainda que o pecador faça mal, cem vezes, e os dias se lhe prolonguem, eu sei com certeza que bem sucede aos que temem a Deus, aos que temerem diante d’Ele, mas ao ímpio não irá bem, e ele não prolongará os seus dias; será como a sombra, visto que ele não teme diante de Deus” (Ec.8:12,13).
– Esta afirmação do pregador não era movida pelo que ele via, mas, sim, pela fé, pela confiança que tinha em Deus. Vemos aqui, claramente, que é preciso ter uma visão de fé para superar as situações injustas que se veem diariamente no mundo, pois este mundo está no maligno (I Jo.5:19), de sorte que não podemos esperar que se faça justiça por aqui.
– Quem não anda por fé, mas por vista está no caminho diametralmente oposto do que deve ser seguido pelo servo de Deus (II Co.5:7). O verdadeiro discípulo de Cristo tem olhos espirituais, que contemplam o invisível, a exemplo de Moisés (Hb.11:27), pois a fé é a prova das coisas que não se veem (Hb.11:1).
– O pregador, realista e observador como era, estava a ver, na vida debaixo do sol, que “há justos a quem sucede segundo as obras dos ímpios, e há ímpios a quem sucede segundo as obras dos justos” (Ec.8:14). Quantas vezes vemos os ímpios cometerem injustiças, maldades e, aparentemente, terem êxito e sucesso, sendo até admirados por isso, algo, aliás, que cada vez mais acontece em nosso mundo, onde a iniquidade está a se multiplicar (Mt.24:12).
– Muitos, ao perceberem que, por terem praticado o mal, os ímpios alcançam posições de destaque e vantagens inúmeras em virtude das maldades praticadas, desencantam-se com Deus e perdem seu fervor espiritual, passando, inclusive, senão a invejar os ímpios por causa de seu sucesso (Sl.73:3; Ec.4:4), também a imitá-los, a fim de que tenham o mesmo êxito, abandonando, deste modo, a vida de santidade, a vida de separação do pecado.
– São pessoas que se guiam apenas pelo que veem fisicamente, que se conduzem dentro de uma perspectiva exclusiva da “vida debaixo do sol”, que “não enxergam um palmo adiante do nariz”, cegos espirituais, assim como o anjo da igreja de Laodiceia (Ap.3:17), que, a propósito, simboliza, precisamente, aqueles que, dizendo-se cristãos, não serão arrebatados pelo Senhor ao término desta dispensação.
– O pregador, entretanto, sendo uma pessoa com visão espiritual, não se deixa enganar pela aparência de sucesso dos ímpios, mas, ao ver este aparente sucesso do mal conclui que isto é tão somente “vaidade”, ou seja, algo que não tem sentido, que não é verdadeiro, uma mera ilusão que deve ser imediatamente rechaçada.
– O pregador não cometeu o mesmo erro do salmista Asafe que, mesmo sendo um profeta de Deus (I Cr.25:1), ao contemplar o sucesso dos ímpios, passou a invejá-los e, por causa disso, quase se desviou dos caminhos do Senhor, quase fracassou espiritualmente (Sl.73:2,3).
– Asafe teve a mesma visão do pregador, mas se deixou envolver pela segurança, pela posse das riquezas por parte dos ímpios, pela sua própria soberba que afrontava a Deus e parecia que nada lhes aconteceria (Sl.73:4- 12), enquanto que ele, Asafe, embora fosse fiel ao Senhor, passava por aflições e situações difíceis.
– No entanto, o salmista, quando estava perturbado com estes pensamentos, entrou no santuário do Senhor e pôde perceber o fim dos ímpios e entender que, no tempo e modo certos, eles sofrerão a pena que lhes é devida, quando toda a aparência se desfará e a verdade triunfará (Sl.73:17-20).
– O pregador não chegou a se perturbar, porque não se deixou levar pela visão física, mas se manteve com a visão espiritual, com o olhar da fé, sabendo que, apesar das vicissitudes que observava, podia confiar em Deus, que tem o controle de todas as coisas e que, no Seu tempo e modo, cumpriria o Seu propósito, julgando ao justo e ao ímpio.
– Nos dias difíceis em que vivemos, não podemos deixar de olhar para Jesus, o autor e consumador da nossa fé (Hb.12:2), a fim de que não sermos afogados pelos agitados mares desta vida debaixo do sol. Se, a exemplo de Pedro, ficarmos a olhar para o vento, para as ondas e para a tempestade (Mt.14:30,31), certamente naufragaremos, mas, se fitarmos os olhos em Cristo, saberemos que, no tempo e modos previamente determinados por Ele, tudo se aquietará e se fará bonança (Mt.14:32). OBS: Por sua biblicidade, reproduzimos aqui trecho da encíclica “Lumen Fidei”, de autoria conjunta dos Papas Bento XVI e Francisco: “…urge recuperar o caráter de luz que é próprio da fé, pois, quando a sua chama se apaga, todas as outras luzes acabam também por perder o seu vigor.
De fato, a luz da fé possui um caráter singular, sendo capaz de iluminar toda a existência do homem. Ora, para que uma luz seja tão poderosa, não pode dimanar de nós mesmos; tem de vir de uma fonte mais originária, deve porvir em última análise de Deus. A fé nasce no encontro com o Deus vivo, que nos chama e revela o seu amor: um amor que nos precede e sobre o qual podemos apoiar-nos para construir solidamente a vida. Transformados por este amor, recebemos olhos novos e experimentamos que há nele uma grande promessa de plenitude e se nos abre a visão do futuro. A fé, que recebemos de Deus como dom sobrenatural, aparece-nos como luz para a estrada orientando os nossos passos no tempo.
Por um lado, provém do passado: é a luz duma memória basilar — a da vida de Jesus –, onde o seu amor se manifestou plenamente fiável, capaz de vencer a morte. Mas, por outro lado e ao mesmo tempo, dado que Cristo ressuscitou e nos atrai de além da morte, a fé é luz que vem do futuro, que descerra diante de nós horizontes grandes e nos leva a ultrapassar o nosso « eu » isolado abrindo-o à amplitude da comunhão. Deste modo, compreendemos que a fé não mora na escuridão, mas é uma luz para as nossas trevas.…” (FRANCISCO. Lumen Fidei, n. 4. Disponível em: http://www.vatican.va/holy_father/francesco/encyclicals/documents/papa-francesco_20130629_enciclica-lumen-fidei_po.html Acesso em 25 out. 2013).
– Esta visão por fé, indispensável para quem quer agradar a Deus (Hb.11:6), somente é possível para aquele que não confiar no homem (Jr.17:17), que reconhecer que o ser humano não pode jamais alcançar a obra de Deus, ainda que seja sábio e fiel ao Senhor (Ec.8:17).
– Em nossos dias, não faltam aqueles que cristãos se dizem ser que não têm esta compreensão a respeito da impotência humana e de uma dimensão sobrenatural da existência. Insistem em racionalizar tudo e todos, em considerar “atraso” ou “mito” tudo quanto se refira a uma ação sobrenatural do Senhor em nossas vidas e em nosso cotidiano.
– Tomemos cuidado com este “humanismo”, que sobrevaloriza a pessoa humana, que menospreza a ação divina. O pregador era bem consciente de que, na vida debaixo do sol, algo a se notar é a completa insuficiência do homem e a sua extrema necessidade de Deus para todas as coisas. Assim agindo, jamais seremos levados ao engano de que o ímpio pôde driblar a justiça divina e levar vantagem duradoura e efetiva na prática do mal.
III – AS DIFERENÇAS ENTRE O JUSTO E O ÍMPIO NA VIDA DEBAIXO DO SOL
– Por isso, o pregador não se abala ao afirmar que, embora os justos e os sábios se encontrem nas mãos de Deus, o mesmo sucede ao justo e ao ímpio, ao bom e ao puro, como ao impuro; assim ao que sacrifica como ao que não sacrifica: assim ao bom como ao pecador; ao que jura como ao que teme o juramento (Ec.9:1,2).
– O pregador chega à mesma conclusão de Jó que, em meio ao seu atroz sofrimento, era injustamente acusado de pecado por seus “amigos”. Embora estivesse naquela situação lamentável, Jó defendia a sua integridade e, embora não entendesse porque estava a sofrer, dizia que todo este sofrimento não era resultado de qualquer pecado, mas de uma permissão divina que se deveria respeitar. Tão certo estava Jó de que Deus poderia infligir-lhe o sofrimento sem que concorresse para tal circunstância a prática de qualquer pecado, que afirmava sua confiança em Deus, como, por exemplo, ao dizer que ainda que o Senhor o matasse, ele permaneceria fiel a Ele (Jó 13:15).
– Temos esta convicção, amados irmãos? Ou servimos a Deus apenas porque Ele tem nos abençoado, porque tudo está bem em nossas vidas? Estamos a buscar a Deus das bênçãos ou, tão somente, às bênçãos de Deus?
– O fato de estarmos nas mãos de Deus, diz o pregador, não é garantia nem imunidade a qualquer vicissitude que se tenha na vida debaixo do sol. “O mesmo sucede igualmente a todos”, diz o pregador. O próprio Cristo afirmou-nos que Deus dá a chuva e o sol tanto a justos quanto a injustos (Mt.5:45).
– Nosso Deus não faz acepção de pessoas (Dt.10:17) e, portanto, não privilegia este ou aquele por causa da conduta que se adote em relação ao Criador. Deus é responsável pela sustentação deste mundo e o homem, como já temos estudado na lição 9, não tem qualquer condição de interferir na ordem estatuída pelo Senhor no dia-a-dia desta Terra.
– No entanto, o homem que busca ao Senhor e procura d’Ele aprender, temendo o Seu nome, este estará nas mãos de Deus e, por isso mesmo, seu fim será diferente daquele que não serve ao Senhor. Esta diferença não decorre de um privilégio, de um tratamento parcial de Deus, mas da própria ordem natural das coisas, que faz com que Deus seja galardoador daqueles que O buscam (Hb.11:6).
– O justo, por ter buscado adquirir a sabedoria, por ser temente a Deus, já desfruta, nesta vida debaixo do sol, de bênçãos que os ímpios não podem usufruir.
– Por primeiro, diz Salomão, o homem temente a Deus consegue ter a sua porção, ou seja, gozar do seu trabalho, se Deus lhe deu riquezas e fazenda, gozo este que tanto mais importante porque é uma resposta divina na alegria do seu coração (Ec.5:18,19).
– Ao contrário, aquele a quem Deus dá riquezas e fazenda mas não busca ao Senhor cairá no amor ao dinheiro, a raiz de toda a espécie de males (I Tm.6:10) e, por causa dele, nunca se fartará de dinheiro. Ora, na visão materialista predominante em nossos dias, é esta uma grande vantagem, o “sonho de consumo” de quase todos, inclusive dos que cristãos se dizem ser. Não é bom ter muito, muito dinheiro e querer mais e mais e alcançar este crescimento de fortuna?
– Esta aparente vantagem e posição invejável, entretanto, é algo ruim para um tal homem. Salomão adverte que quem procede deste modo somente lhe atrairá enfermidade, insônia, aumento de pessoas que desta riqueza tirarão proveito, sendo que, ao final de tudo, este rico voltará nu para a terra como nu veio do ventre da mãe, não tendo, com isso, conseguido coisa alguma que o possa levar para a eternidade (Ec.5:10-17).
– Como se isso fosse pouco, o pregador ainda adverte que, mesmo nesta vida, uma má aventura pode, inclusive, privar-lhe da riqueza auferida (Ec.5:14) como também toda a sua riqueza ser totalmente vã, vez que, em virtude de um comportamento desta natureza, é bem provável que, quando morrer, este rico homem nem sequer tenha um enterro, por ser execrado por todos os homens, situação que faz com que a sua vida seja menos valiosa e produtiva do que a de uma criança que tenha sido abortada (Ec.6:1-6).
– Por segundo, vemos que Deus concede àqueles que O buscam, que querem adquirir a sabedoria, o livramento da “mulher cujo coração são redes e laços e cujas mãos são ataduras” (Ec.7:26). O justo consegue escapar das armadilhas do prazer e da imoralidade, que, conforme já estudamos na lição 2 deste trimestre, causam imensos males não só para o que é infiel ao seu casamento mas para toda a sociedade.
– Aliás, o pregador diz que tal “mulher” é “coisa mais amarga do que a morte”, já que a morte, se trouxe a perdição eterna para aquele que não observou a Palavra de Deus em vida, serve de despertamento para os demais, para que, a tempo, alterem a sua maneira de viver desregrada e inconsequente, enquanto que a “mulher estranha” produz nefastas consequências não só para que o com ela adultera mas para toda a sociedade, a começar do cônjuge traído e dos filhos desta família que é destruída por conta de tal insensatez.
– O justo, porém, fica livre disto, pois o pregador nos afirma que “quem for bom diante de Deus escapará dela, mas o pecador virá a ser preso por ela” (Ec.7:26 “in fine”). Se a tradição judaica estiver correta, Salomão, ao escrever este livro de Eclesiastes, tinha acabo de se arrepender de seus pecados e, por conseguinte, bem sabia o que estava a falar, pois havia sido pervertido pelas suas mulheres, o que lhe causara sensível prejuízo espiritual. Busquemos a Deus para termos, em nossas vidas, a mesma vitória que teve José ao resistir ao assédio da mulher de Potifar (Gn.39:7-21).
– Por terceiro, o justo, o sábio é uma bênção para os que o cercam, ainda que não seja reconhecido por estes. O pregador diz ter visto, numa pequena cidade, em que havia poucos homens, um sábio que livrou, com a sua sabedoria, a cidade de um sítio efetuado por um grande rei e, apesar deste livramento, este pobre sábio não foi reconhecido, sendo esquecido pelo benefício que havia feito (Ec.9:13-18).
– No entanto, em que pese não ter sido reconhecido, o fato é que o pobre sábio realmente salvou aquela cidade do inimigo, o que fez o pregador diferençá-lo do pecador que “destrói muitos bens” (Ec.9:18). Temos, então, aqui, uma diferença entre o justo e o ímpio, pois este, ainda que, por vezes, seja reconhecido, a ponto de ter a sua sepultura visitada (Ec.8:10), causa males, destrói muitos bens, deixa exemplos nefastos que geram problemas e malefícios inclusive para as gerações vindouras, ao passo que o justo, ainda que não reconhecido, é sempre uma bênção para os que o cercam.
– Por isso, o pregador afirma que “as palavras dos sábios devem em silêncio ser ouvidas, mais do que o clamor do que domina sobre os tolos” (Ec.9:17) e que “melhor é a sabedoria do que as armas de guerra” (Ec.9:18a). O justo, o sábio, mesmo que esquecido, se for ouvido, tratará paz aos que o ouvirem.
– Por quarto, o justo recebe a bênção de andar, nesta vida, segundo a “vista dos olhos” , ou seja, enxerga a realidade da vida debaixo do sol, a impotência humana e, por isso, tem como entender que se trata de um mero ser humano, que há alguém mais forte do que ele, o Senhor Deus, a quem ele deve recorrer para ter uma peregrinação terrena exitosa, e, com esta consciência, sabe, inclusive, que está aqui apenas de passagem e, portanto, deve tudo fazer para ter uma eternidade feliz (Ec.6:7-12).
– Entretanto, aquele que não busca a Deus, aquele que não adquire a sabedoria, em vez de andar segundo “a vista dos olhos” é iludido pelo pecado e passa por este mundo segundo “o vaguear da cobiça” (Ec.6:9), de sorte que nunca se satisfará neste mundo, ainda que trabalhe incessantemente e tenha o suficiente para sobreviver (Ec.6:7). Nesta cobiça extremada, acabará por contender com o Criador e aumentará a sua vaidade, a falta de sentido nesta vida e perderá a oportunidade ímpar de ter uma eternidade feliz.
– Como estamos vivendo sobre a face da Terra? Estamos levando em conta a existência de Deus e a necessidade que temos d’Ele ou temos nos deixado envolver pelo “vaguear da cobiça”? Pensemos nisto!
– Para tanto, ensina-nos o pregador que existe um instante, um momento que o Senhor preparou para todos os homens terem a oportunidade de abandonar este desvario, esta ilusão da cobiça, que é o luto, a casa do luto. “Melhor é ir à casa onde há luto do que ir à casa onde há banquete, porque ali se vê o fim de todos os homens e os vivos aplicam ao seu coração” (Ec.7:2).
– O momento em que vemos a morte física de alguém, em que comparecemos à casa do luto é uma oportunidade que Deus nos dá para que reavaliemos como estamos a viver, se, efetivamente, estamos vivendo de uma forma realista, sabendo que tudo aqui é passageiro e que estamos apenas em uma peregrinação para a eternidade ou se estamos nos deixando envolver com a falta de sentido da vida debaixo do sol quando vista tão somente sob a perspectiva terrena.
– Não é à toa, aliás, que, em nossos dias, se tem procurado diminuir ao máximo o período de luto, com a criação de tantos artifícios para que não se tenham mais velórios ou, então, rapidíssimas cerimônias fúnebres, pois, ante a mentalidade predominante no mundo, ante a multiplicação da iniquidade, trata-se de um momento em que será possível uma reflexão sobre a brevidade e vaidade da vida debaixo do sol, algo que, à evidência, o inimigo de nossas almas não deseja que se desperte na mente daqueles que caminham celeremente para a perdição.
– Ora, é exatamente isto que nos ensina o profeta Malaquias, quando, numa época em que o povo de Judá se comportava como o salmista Asafe e dizia ser inútil servir a Deus e invejava os soberbos pelas aparentes vantagens que estavam a usufruir nesta vida debaixo do sol (Ml.3:13-15).
– Diante da aparente prosperidade dos ímpios, o profeta exortava os que temiam a Deus a que falassem cada um com seu companheiro e se dessem conta de que há um memorial escrito diante do Senhor para os que temem a Ele e para os que se lembram do Seu nome e, diante desta lembrança, soubessem que o Senhor os haveria de poupar do juízo eterno, ocasião em que se verá a diferença que há entre o justo e o ímpio, entre o que serve a Deus e o que não O serve (Ml.3:16-18).
– Assim, além das bênçãos que os justos já experimentam nesta vida debaixo do sol, quais sejam, o desfrute do trabalho, o livramento da perversão, uma visão realista da vida e o ser uma bênção para os outros, ao justo está prometido o livramento do juízo divino, a salvação, o escape da ira divina no mundo-do- além, no mundo vindouro. – O justo tem uma esperança, sabe que este mundo aqui é apenas uma passagem, que sua cidade está nos céus, donde esperamos o nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo (Fp.3:20).
– Quem vive pela fé age como os patriarcas Abraão, Isaque e Jacó, habitando neste mundo como em terra alheia, esperando a cidade que tem fundamentos da qual o artífice e construtor é Deus (Hb.11:8-10). – “…Quem é justo, em sua geração, será salvo com uma salvação eterna; pois, como Deus conhece a maldade dos homens, assim, também, conhece a justiça dos Seus servos. Em todos os tempos, o Senhor tem tirado os Seus do perigo; antes que a tempestade rompesse, destruindo Sodoma e Gomorra, Ele salvou a Ló. Assim, Ele deu ordens a Noé, a fim deste preparar, para a sua salvação, uma arca. E, por meio desta, salvou não só a Noé, mas, também, a sua família. Deus limpou a terra, com água, no tempo de Noé; mas, ainda uma vez, Ele vai limpá-la, porém com fogo; e, assim, até a terra que já teve o seu batismo de água, o terá de fogo. I Pe.2:12,13. Todavia, antes que venha a Grande Tribulação e o castigo sobre a humanidade, o Senhor tirará do mundo a Sua eleita, a Sua igreja. ‘Horrenda coisa é cair nas mãos do Deus vivo’ (Hb.10:31)…” (KASTBERG, Nils. Lição 3 – Noé, o justo. 19 jan. 1036. Coleção Lições Bíblicas, v.1, p.327).
– Para o anjo da igreja de Filadélfia, símbolo da igreja que será arrebatada ao término desta dispensação, o Senhor Jesus promete guardar da hora da tentação que há de vir sobre todo o mundo, para tentar os que habitam na terra (Ap.3:10). O apóstolo Paulo corrobora esta promessa, dizendo que o Senhor Jesus nos livra da ira futura (I Ts.1:10). – O ímpio não tem qualquer esperança no mundo vindouro. Entenebrecida a sua visão pelo “vaguear da cobiça”, extremamente insatisfeito pelo amor ao dinheiro e preso pela imoralidade, o ímpio tenta se embriagar com os prazeres e as ilusões deste mundo, mas, além de não ter uma vida verdadeiramente abençoada nesta dimensão terrena, acaba por perder tudo na eternidade.
– Certo é que, neste mundo que jaz no maligno, o ímpio é até louvado na sepultura (Ec.8:10), mas de que adianta este louvor se, na eternidade, onde ele está, padecerá para sempre tormentos e ranger de dentes? – Certo é que o sábio, ainda que tenha ocasionado a salvação dos seus, é, por vezes, desprezado neste mundo (Ec.9:15,16), mas, além de ser um fator que traz benefícios aos que o cercam, ser uma bênção, também alcançará a vida eterna, algo muito mais valioso do que todo este mundo, pois ganhar a própria alma, viver de modo a alcançar esta bênção que nos oferece a graça de Deus, é ganhar algo que vale mais do que o mundo inteiro (Sl.49:7-9).
– A ressurreição de Jesus é a garantia de que vale a pena sermos sábios neste mundo e sermos “bons diante de Deus”. Assim como a morte não pôde prendê-l’O (At.2:24), de igual modo nós, se ficarmos fiéis, também teremos um corpo incorruptível (I Co.15:51-54) e viveremos para sempre com Ele (I Ts.4:16,17).
– Por isso, vale a pena sermos fiéis ao Senhor e O buscarmos de todo o nosso coração, ainda que, nesta vida debaixo do sol, nos suceda o mesmo que sucede aos ímpios, ainda que os ímpios pareçam ter vantagens e benefícios, a despeito e por causa de suas maldades, de seus pecados, pois sabemos que o seu fim será bem diferente daqueles que servem a Deus. Perseveremos, pois, até o dia da nossa glorificação. Amém!
Ev. Dr. Caramuru Afonso Francisco
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